Roberto Selva Carneiro Monteiro Filho x Itau Unibanco
Número do Processo:
0014299-71.2025.8.17.2001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPE
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Seção B da 7ª Vara Cível da Capital
Última atualização encontrada em
01 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: Seção B da 7ª Vara Cível da Capital | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELTribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção B da 7ª Vara Cível da Capital Avenida Desembargador Guerra Barreto - Fórum do Recife, S/N, Ilha Joana Bezerra, RECIFE - PE - CEP: 50080-900 - F:(81) 31810373 Processo nº 0014299-71.2025.8.17.2001 AUTOR(A): ROBERTO SELVA CARNEIRO MONTEIRO FILHO RÉU: ITAU UNIBANCO SENTENÇA EMENTA. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. APLICAÇÃO EM INVESTIMENTO FINANCEIRO COM RESGATE ANTECIPADO. LCI E LCA. PERDA SUBSTANCIAL DE VALOR. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO. RESTITUIÇÃO DAS PERDAS FINANCEIRAS. DANO MORAL CONFIGURADO. PROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME 1. Ação de indenização por danos materiais e morais proposta por investidor que, orientado por gerente bancário, aplicou recursos em títulos LCI e LCA com vencimento superior ao prazo de sua necessidade de liquidez, sofrendo perdas significativas no resgate antecipado. Pretensão de restituição das perdas e compensação por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se o banco descumpriu o dever de informação ao oferecer aplicação financeira incompatível com o perfil do cliente e com sua necessidade de resgate antecipado, e se tal conduta configura ato ilícito a ensejar reparação por danos materiais e morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Restou evidenciado que o autor foi mal orientado quanto à natureza do investimento, sendo induzido a aplicar valores em títulos com baixa liquidez e alta penalização por resgate antecipado, situação incompatível com sua necessidade declarada de curto prazo. 4. A falha na prestação do serviço é manifesta, configurando violação do dever de informação previsto no art. 6º, III, do CDC. A instituição financeira responde objetivamente pela inadequação do produto oferecido, nos termos do art. 14 do CDC. 5. O dano material foi quantificado na perda patrimonial decorrente da diferença entre o valor aplicado e o valor resgatado, sendo devida a restituição do prejuízo. 6. O dano moral, por sua vez, decorre da frustração da legítima confiança, do abalo psicológico e da angústia gerada pela perda patrimonial relevante, sendo cabível sua compensação pecuniária. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Pedido parcialmente procedente. Condenação da instituição financeira ao pagamento dos danos materiais comprovados e de indenização por danos morais no valor arbitrado na sentença. 8. Indeferido o pedido incidental de tutela de urgência formulado pelo autor, por ausência de demonstração do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. Teses de julgamento: “1. A oferta de aplicação financeira incompatível com o perfil e a necessidade de liquidez do consumidor, sem adequada informação dos riscos de resgate antecipado, configura falha na prestação do serviço. 2. A perda patrimonial decorrente do resgate de investimento incompatível enseja reparação por danos materiais. 3. O dano moral é cabível quando comprovada a frustração de legítima expectativa e o abalo emocional resultante da conduta do fornecedor de serviços financeiros.” Vistos etc... Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais proposta por Roberto Selva Carneiro Monteiro Filho, em nome próprio, contra o Banco Itaú Unibanco S.A., em razão de suposta falha na prestação do serviço bancário, concernente à gestão de investimentos de renda fixa do autor, os quais, segundo sustenta, foram ofertados com promessa de liquidez pós-carência sem prejuízo ao capital aplicado, mas que, no momento do resgate, apresentaram perda significativa de valor, resultando em danos patrimoniais e morais. Aduz o autor que, em decorrência das dificuldades enfrentadas durante a pandemia da COVID-19, optou por realizar investimentos exclusivamente em títulos de renda fixa, priorizando segurança e liquidez. Sustenta que tal diretriz foi expressamente comunicada às gerentes responsáveis por sua conta, Cláudia Regina Monteiro e Simone Cantanhede, tendo esta última recomendado aplicações em LCI e LCA prefixadas emitidas pelo próprio Banco Itaú, com promessa de rendimento fixo e saque após a carência, sem risco de perda. Relata que, no ano de 2024, realizou quatro aplicações: (a) LCI Pré Itaú – 9,13% a.a., em 18/03/2024; (b) LCI Pré Itaú – 9,54% a.a., em 09/04/2024; (c) LCA Pré Itaú – 9,85% a.a., em 03/05/2024; e (d) LCA Pré Itaú – 10,79% a.a., em 04/07/2024. A informação recebida da gerente de investimentos era de que os resgates, após o prazo de carência, seriam efetuados pela taxa contratada, sem qualquer desvalorização, inclusive havendo incentivo por parte da instituição financeira de que o autor não deixasse recursos fora das aplicações, por não haver necessidade. Em dezembro de 2024, tendo surgido a oportunidade de aquisição de salas comerciais pelo valor de R$ 810.000,00, o autor afirma que voltou a consultar as gerentes acerca do resgate, tendo sido informado de que os valores poderiam ser integralmente retirados, sem qualquer deságio, a partir de 05/02/2025. Fundamentado nessa promessa, firmou contrato de compra das salas e obteve empréstimo junto ao próprio banco para pagamento do sinal no valor de R$ 66.000,00, parcelado para quitação também em fevereiro e março de 2025. Afirma que, na véspera do vencimento das obrigações contratuais, foi surpreendido com a informação de que, para resgatar o montante necessário, teria que suportar uma perda de R$ 82.468,89, em razão de desvalorização momentânea dos títulos prefixados — informação esta que, segundo o autor, jamais fora prestada anteriormente, nem no momento da aplicação, nem no momento em que comunicou à instituição sua intenção de utilizar os recursos. Alega ainda que, por ausência de alternativas, autorizou o resgate com a perda mencionada, a fim de honrar os compromissos assumidos. Dias depois, teve que resgatar novo valor para pagamento de outras obrigações, sofrendo adicional prejuízo de R$ 5.020,43. Assim, sustenta que o prejuízo material totalizou R$ 87.489,32, valor que, segundo defende, reverteu-se em proveito da própria instituição financeira, emitente dos títulos. Sustenta, ademais, que o episódio causou-lhe grave abalo emocional, frustrando o projeto de aquisição do imóvel próprio para o exercício profissional, gerando sensação de angústia, indignação e constrangimento, além da incerteza de continuidade do vínculo com a instituição financeira. Por tais razões, postula, ainda, a liberação futura dos valores ainda investidos, após o prazo de carência, pela taxa contratada e sem novas perdas, de modo que possa encerrar sua relação com o banco sem prejuízo adicional. Requer, ao final: (a) a citação do réu para apresentar defesa, sob pena de revelia; (b) o reconhecimento de sigilo processual, com base no art. 189 do CPC; (c) a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC; (d) a condenação do réu ao pagamento de danos materiais no valor de R$ 87.489,32, corrigidos desde fevereiro de 2025 e com juros desde a citação; (e) a condenação por danos morais, em valor a ser arbitrado por este Juízo; (f) a condenação do réu a liberar os valores dos investimentos remanescentes pela taxa contratada e sem perdas, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00; (g) a condenação do réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios no percentual de 20%. A petição veio instruída com diversos documentos, dentre os quais se destacam: (a) o contrato de compra e venda do imóvel comercial; (b) extratos bancários de aplicações e investimentos; (c) registros de conversas com as gerentes do banco e com o vendedor das salas comerciais (IDs 195215977, 195217945, 195217946 e 195217963). Despacho de ID nº 195225810 deferindo a postergação do preparo. Regulamente citado, o réu ITAÚ UNIBANCO S.A. apresentou contestação tempestiva (ID nº 200028649), em que, preliminarmente, impugna o pedido de justiça gratuita, ao argumento de que o autor, advogado que litiga em causa própria, não logrou demonstrar situação de hipossuficiência econômica, nem sequer apresentou a declaração de pobreza prevista em lei. Alega que, além de constar como investidor com aplicações vultosas, o autor declarou ser proprietário de imóveis comerciais avaliados em mais de oitocentos mil reais, razão pela qual sustenta que há presunção de capacidade contributiva, nos termos do art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal, sendo imprescindível a comprovação da miserabilidade jurídica para a concessão do benefício, conforme jurisprudência colacionada. Ainda em sede preliminar, suscita incompetência relativa do juízo da 7ª Vara Cível da Capital, sob o argumento de que o autor possui domicílio no Rio de Janeiro/RJ, local também em que se situa a agência bancária envolvida nos fatos narrados. Sustenta que a escolha da comarca de Recife/PE carece de justificativa, o que configura tentativa de burla ao princípio do juiz natural, sendo aplicável o art. 53, inciso V, do CPC, que estabelece como competente o foro do domicílio do autor ou do local do fato. Por tais razões, pugna pela remessa dos autos ao foro do domicílio do autor, no Rio de Janeiro/RJ. A seguir, o réu requer o levantamento do segredo de justiça, sob o fundamento de que a presente demanda não versa sobre direitos da personalidade, tampouco envolve menores ou questões sensíveis, não se enquadrando, pois, nas hipóteses do art. 189 do CPC. Argumenta que se trata de demanda sobre investimentos bancários regulares e documentados, cujo trâmite deve respeitar o princípio da publicidade dos atos processuais. Adiante, afirma a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, argumentando que o autor, na qualidade de investidor, não se enquadra no conceito de consumidor final, tendo em vista que a aplicação em LCI e LCA constitui atividade de natureza financeira intermediária, destinada à obtenção de lucro e sujeita à dinâmica do mercado, não se caracterizando como relação de consumo, à luz da teoria finalista consagrada no art. 2º do CDC. Para reforçar a tese, cita o REsp 1.685.098/SP, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, no qual se reconheceu a inaplicabilidade do CDC nas relações de investimento com instituições financeiras. No mérito, o réu aduz que não houve qualquer falha na prestação dos serviços bancários e que os investimentos foram realizados com pleno conhecimento do autor, cuja rentabilidade era prefixada e com vencimento em datas determinadas. Destaca que o resgate antecipado de tais aplicações está sujeito à chamada marcação a mercado, ou seja, à variação das taxas de juros vigentes, o que pode ocasionar deságio no valor resgatado, conforme devidamente informado ao autor no momento da aplicação e reiterado por sua gerente, inclusive por meio de mensagens anexadas à exordial. Argumenta que a decisão de resgatar antecipadamente os valores foi tomada pelo próprio autor, por iniciativa própria, a fim de realizar aquisição de imóveis, o que configura risco assumido pelo investidor, não podendo a instituição financeira ser responsabilizada pelas consequências naturais e previsíveis dessa opção. Salienta que não houve qualquer ato ilícito, tampouco enriquecimento sem causa por parte do banco, inexistindo, portanto, os pressupostos para responsabilização civil, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil. Em relação aos danos morais pleiteados, sustenta o réu que não há qualquer comprovação de abalo psíquico ou lesão a direitos da personalidade, tratando-se de alegações genéricas de insatisfação com rendimento financeiro, o que configura mero aborrecimento decorrente de risco inerente à atividade de investimento, não ensejando reparação moral. Invoca doutrina e jurisprudência segundo as quais o dano moral não pode ser presumido, devendo ser efetivamente comprovado, o que não teria ocorrido nos autos. Aduz ainda que, caso eventualmente se entenda pela existência de dano moral indenizável, o que se admite apenas por argumentação, o valor pleiteado de R$ 30.000,00 é manifestamente excessivo, devendo ser arbitrado com moderação, segundo os critérios de equidade, proporcionalidade e vedação ao enriquecimento sem causa. Ao final, pugna pelo acolhimento das preliminares, com a extinção do feito sem resolução de mérito. Sucessivamente, requer a total improcedência dos pedidos, com a condenação do autor por litigância de má-fé, à luz do art. 81 do CPC, ao argumento de que a demanda teria sido proposta de forma temerária, em tentativa de transferir ao banco os riscos próprios da atividade de investimento. Requer, ainda, que eventual condenação observe a aplicação exclusiva da taxa SELIC como índice de correção e juros, conforme jurisprudência pacífica do STJ. Protesta pela produção de provas e requer que todas as intimações sejam expedidas em nome dos patronos Evaristo Aragão Ferreira dos Santos e Maria Lúcia Lins Conceição de Medeiros. Em réplica de ID nº 200028649, o autor refutou todas as preliminares suscitadas e reafirmou a procedência integral dos pedidos formulados na exordial. Quanto à gratuidade de justiça, alegou que a decisão que a concedeu foi devidamente fundamentada e já preclusa, destacando que a impossibilidade de arcar com as custas decorre da própria perda patrimonial enfrentada, tendo juntado faturas de energia elétrica para comprovação de residência e renda limitada. No tocante à incompetência territorial, sustentou residir em Recife/PE desde dezembro de 2020, após 16 anos no Rio de Janeiro, tendo mantido a agência bancária naquele estado por razões de comodidade operacional. Juntou comprovantes de residência no bairro das Graças, rechaçando qualquer alegação de domicílio diverso. Defendeu a manutenção do segredo de justiça, com fundamento no art. 189, III, do CPC, por se tratar de demanda que expõe dados sensíveis e documentos bancários, com implicações patrimoniais relevantes. Quanto à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, invocou a Súmula 297 do STJ e a ADI 2591, asseverando que a relação bancária, ainda que envolva investimento em renda fixa, se sujeita ao regime consumerista, especialmente em razão do dever de informação. Ressaltou que os títulos eram emitidos pelo próprio banco e que a gerente de investimentos participou ativamente da estratégia de aquisição dos imóveis, inclusive viabilizando empréstimo, sem jamais alertar sobre a possibilidade de deságio no resgate. Quanto ao mérito, reiterou que houve falha na prestação do serviço, consubstanciada na ausência de informação clara e prévia sobre o risco de perda, mesmo diante do resgate após o período de carência. Alegou que o réu confessou o prejuízo de R$ 87.489,32, sendo incontroverso o dano material. As conversas de WhatsApp juntadas com a inicial demonstrariam que o banco só informou sobre o deságio em 03/02/2025, às vésperas da data do pagamento da entrada das salas comerciais, quando o compromisso contratual já havia sido firmado com base em informações fornecidas pela própria gerente do banco. Contestou a alegação de litigância de má-fé, sustentando que a omissão do banco é evidente, configurando enriquecimento ilícito pela frustração de aplicação prefixada, sem transparência quanto ao risco de oscilação de mercado. Por fim, reiterou o cabimento da indenização por danos morais, diante do sofrimento intenso e frustração vivida ao ser surpreendido com perda expressiva em momento crucial de sua vida profissional e pessoal, tendo sido impedido de dar continuidade à reforma do imóvel adquirido. Defendeu o valor mínimo de R$ 30.000,00, a ser fixado com base na extensão do abalo, gravidade da conduta e caráter pedagógico da reparação. Ao final, reiterou os pedidos da inicial, pleiteando a inversão do ônus da prova, a aplicação do CDC, a condenação pelos danos materiais e morais, e a tramitação sigilosa do feito, protestando por todas as provas admitidas em direito. Seguiu-se decisão de ID nº 200616281 ordenando levantamento do sigilo, indagando os contendores sobre interesse na autocomposição e/ou na dilação probatória; ainda, fora invertido o ônus da prova em desfavor da instituição financeira. Em resposta, o autor pediu colheita da prova testemunhal (ID nº 200805319), enquanto o banco réu opôs embargos de declaração contra a incidência da legislação consumerista e contra a não apreciação das preliminares (ID nº 201813078). Por meio da decisão de ID nº 202847975 foram rejeitados os embargos, mantendo-se a incidência do CDC, a competência territorial deste foro e a postergação do recolhimento das custas processuais e taxa judiciária. Em sequência, a instituição financeira suscitada pugnou pelo julgamento antecipado da lide (ID nº 203569236). Por sua vez, o demandante formulou novo pedido para “apreciação e deferimento da LIMINAR para que o Réu libere todos os valores dos quatro investimentos em LCI e LCA do próprio Banco Réu feitos pelo Autor remunerados pelas taxas contratadas em cada um deles, após o prazo previsto de carência, e sem perda de valores“ (ID nº 204948841). Nas suas alegações finais (ID nº 205355731), o autor sustenta que o dano material de R$ 87.489,32 está incontroverso, resultante de resgate de investimento em LCA/LCI com taxa prefixada, realizado após o término do prazo de carência, mas com perda não informada previamente. Alega que a responsabilidade é exclusiva do Banco Itaú, que não prestou as informações devidas, apesar de sua gerente ter acompanhado todo o processo de investimento e, posteriormente, da compra das salas comerciais. O autor afirma que o banco não produziu provas aptas a demonstrar que houve prévia ciência do risco de deságio, especialmente porque a única conversa juntada ocorreu na véspera do saque, não tendo o réu requerido oitiva de suas funcionárias. Reforça que houve falha na prestação do serviço bancário e omissão na orientação ao cliente, o que caracteriza violação ao CDC, já declarado aplicável por decisão preclusa com inversão do ônus da prova. Quanto aos danos morais, reitera que são devidos em razão do sofrimento contínuo, frustração do sonho de adquirir salas comerciais para uso profissional, e angústia de não poder reformá-las sem novos prejuízos. Pede sua fixação em valor superior a R$ 30.000,00, diante da gravidade da conduta do réu. Por fim, pugna pela procedência total da demanda, com a condenação do réu ao ressarcimento integral do dano material, à indenização por dano moral e à liberação dos investimentos remanescentes pela taxa contratada, sem prejuízo. De sua feita, no seu memorial final de ID nº 207704678, o Banco Itaú Unibanco S.A. reitera que os investimentos realizados pelo autor em LCI e LCA eram de renda fixa prefixada, com condições de aplicação e resgate previamente conhecidas e informadas. Sustenta que o autor optou, por conta própria, por antecipar o resgate antes do vencimento, estando ciente da possibilidade de deságio decorrente da marcação a mercado, conforme comprovam os extratos, comprovantes de aplicação e conversas via WhatsApp com a gerente de investimentos. Alega que não houve falha na prestação de serviço, tampouco qualquer enriquecimento indevido, pois a perda sofrida é efeito natural do comportamento de mercado diante da oscilação das taxas de juros. Ressalta que o banco apenas recompra os títulos a valor de mercado, não obtendo lucro com o deságio, inexistindo, portanto, dano material indenizável. Quanto ao dano moral, sustenta ser incabível, por ausência de ilicitude e de qualquer lesão a direito da personalidade, tratando-se de risco ordinário de uma operação financeira consciente. Destaca que o autor é investidor experiente, com patrimônio superior a R$ 2 milhões, e que sua narrativa beira a má-fé. Ao final, requer improcedência total dos pedidos, nos termos do art. 355, I, c/c art. 487, I, do CPC. Em caso de eventual condenação, requer que os juros moratórios sejam calculados pela taxa SELIC, nos moldes do art. 406 do Código Civil. Nestes termos, vieram-me os autos conclusos para julgamento. Do que importa, é o relato. Decido. Estando o feito em ordem, passo de imediato à análise do mérito. Trata-se de ação indenizatória proposta por Roberto Selva Carneiro Monteiro Filho em face de Itaú Unibanco S.A., em virtude de prejuízo financeiro suportado com o resgate antecipado de aplicações prefixadas em LCI/LCA contratadas junto à instituição financeira ré, sob a alegação de que não fora previamente informado sobre o risco de deságio incidente em caso de liquidação antecipada. Consta dos autos que o autor realizou investimentos vinculados à aquisição de salas comerciais, tendo resgatado os valores aplicados após o período de carência, mas antes do vencimento contratual, ocasião em que se surpreendeu com perda financeira superior a R$ 87.000,00, frustrando o cronograma de reforma e ocupação dos imóveis adquiridos. Sustenta que em nenhum momento lhe foi alertado que, mesmo após ultrapassado o prazo mínimo de carência, haveria redução no valor a ser resgatado, em razão de variação das taxas de juros e da chamada "marcação a mercado". Defende, assim, que houve falha na prestação de serviço, violação ao dever de informação e consequente dever de indenizar. É forçoso reconhecer, à luz do conjunto fático-probatório delineado nos autos, que assiste razão à parte autora em sua pretensão indenizatória. De início, registre-se que é inequívoca a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica ora em exame, não apenas porque consolidada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido (Súmula 297/STJ), mas também porque o autor se apresenta como destinatário final dos serviços bancários e não figura como investidor profissional ou agente do mercado financeiro. A aquisição de produtos financeiros de renda fixa, como LCI e LCA, insere-se no escopo da atividade bancária dirigida ao público consumidor, e sua complexidade técnica exige do fornecedor conduta reforçada de esclarecimento e transparência. Nesta senda, deve-se invocar o princípio da vulnerabilidade do consumidor, reconhecido no caput do art. 4º do CDC como premissa ontológica da própria legislação consumerista. Ainda que o autor seja pessoa instruída ou disponha de certo patrimônio, tal condição não o torna imune à assimetria informacional existente em face das instituições financeiras, as quais detêm domínio técnico e acesso privilegiado às variáveis que impactam a rentabilidade de produtos vinculados ao mercado de capitais. A própria jurisprudência do STJ tem reconhecido que, mesmo diante de consumidores qualificados, subsiste a incidência da legislação consumerista, notadamente quanto aos deveres de informação. No caso concreto, restou evidenciado que o autor não fora suficientemente alertado, de forma clara, específica e tempestiva, quanto à possibilidade de deságio no valor a ser resgatado, ainda que o pedido de liquidação ocorresse após a carência contratual. Os documentos colacionados com a exordial, notadamente as conversas mantidas com a gerente de investimentos, demonstram que a comunicação sobre a perda patrimonial decorrente da "marcação a mercado" somente se deu na véspera do resgate, quando o autor já se encontrava comprometido com a aquisição do bem imóvel, tendo firmado escritura e assumido obrigações contratuais. Tal circunstância revela grave afronta ao dever de informação e ao dever de transparência, ambos decorrentes do art. 6º, inciso III, do CDC, e que constituem desdobramentos normativos do princípio da boa-fé objetiva. Com efeito, a boa-fé objetiva, princípio norteador das relações contratuais por força do art. 422 do Código Civil, impõe conduta ética, leal e cooperativa entre as partes, sendo inadmissível que o fornecedor de serviço financeiro se omita quanto aos riscos de prejuízo ao investidor, sobretudo quando este se guia pelas informações técnicas fornecidas pelo próprio agente bancário. A ausência de advertência clara e expressa quanto à possibilidade de rentabilidade negativa compromete a higidez do vínculo contratual e configura violação à confiança legítima, expectativa essa criada pela própria instituição ré ao indicar os investimentos como forma segura de aplicação prefixada, útil à programação de compra de ativos imobiliários. Sob tal ótica, cumpre também destacar o princípio do risco do empreendimento, segundo o qual, àquele que aufere os benefícios de atividade econômica, incumbe suportar os ônus derivados de sua má condução. A atividade bancária, notadamente quando voltada à captação de recursos junto ao público, demanda rigor redobrado quanto à lisura da informação e à comunicação dos riscos envolvidos. No presente caso, a inércia informacional do banco, ainda que não intencional, provocou grave perturbação na esfera patrimonial do autor, frustrando um planejamento econômico legítimo e induzindo o consumidor a crer na inexistência de riscos relevantes. Não bastasse, como bem decidido no curso do processo, operou-se a inversão do ônus da prova, na forma do art. 6º, inciso VIII, do CDC, de modo que competia à instituição ré comprovar, de modo cabal, que prestou ao consumidor informações suficientes, claras e adequadas sobre o funcionamento do produto, seus riscos e suas variações conforme o mercado. Ocorre que tal demonstração não foi feita, limitando-se a parte ré a afirmar genericamente que o cliente "deveria saber", sem trazer documentação objetiva ou termo contratual claro que amparasse sua alegação. Nem mesmo houve requerimento de oitiva da gerente envolvida nos fatos, o que reforça a presunção de veracidade das alegações do consumidor, diante da inércia probatória da instituição fornecedora. Assim, diante do conjunto harmônico de dispositivos legais, princípios e fatos apurados, resta configurada a responsabilidade civil objetiva do réu, seja pela falha na prestação do serviço, seja pela violação aos deveres contratuais de lealdade e informação, impondo-se a reparação do dano material, bem como a análise do pleito de indenização por danos morais, diante das circunstâncias concretas e da repercussão dos fatos sobre a vida do autor. Pois bem, A apreciação detida das provas carreadas aos autos conduz, com segurança, ao reconhecimento da falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira demandada, cuja omissão informacional comprometeu a autodeterminação do consumidor e resultou em substancial prejuízo patrimonial. A documentação constante dos autos revela não apenas a ausência de orientação prévia sobre os riscos de deságio em caso de resgate antecipado das aplicações prefixadas, mas sobretudo a conduta omissiva da instituição ré em momento crucial da relação contratual, precisamente quando o autor estruturava operação de aquisição imobiliária amparado na confiança de que os valores aplicados retornariam em sua integralidade. Em efeito, a leitura do ID nº 195217963, que contém as conversas travadas entre o autor e a gerente de investimentos da instituição ré, revela que o primeiro aviso sobre o deságio incidente nas aplicações somente foi feito em 03 de fevereiro de 2025, véspera do efetivo resgate dos recursos. Tal informação, embora tecnicamente relevante e de alta sensibilidade econômica, jamais foi antecipada no momento da aplicação dos recursos, tampouco constou de qualquer documento fornecido no ato da contratação. Ao contrário: a narrativa das mensagens sugere que a gerente atuou não apenas como mera interlocutora, mas como agente indutora da operação de investimento, ao apresentar as aplicações como rentáveis, seguras e adequadas ao objetivo traçado pelo consumidor – qual seja, adquirir e reformar salas comerciais para fins profissionais. A conduta omissiva da preposta da instituição não se limitou à neutralidade, mas revelou-se ativa na indução à expectativa de rentabilidade plena, criando no autor uma legítima confiança quanto à estabilidade do investimento. A corroborar esse quadro, os documentos de ID nºs 200028653 a 200028656, que correspondem aos comprovantes de aplicação em LCI e LCA, também são eloquentes ao não consignarem, de forma expressa, ostensiva e compreensível, a existência de risco de deságio após o período de carência. Embora tais documentos contenham dados técnicos como taxa prefixada, data de vencimento e rentabilidade estimada, não há qualquer menção à possibilidade de perda de capital em caso de resgate antecipado após a carência, tampouco alerta gráfico, textual ou sinalização que permita ao consumidor médio compreender a incidência da chamada “marcação a mercado”. Em se tratando de produto bancário de complexidade técnica, seria exigível da instituição financeira a adoção de linguagem acessível, advertência destacada e explicitação dos riscos econômicos envolvidos, conforme preceituam os arts. 6º, III, e 31 do Código de Defesa do Consumidor, cuja aplicação ao caso é inconteste, conforme a Súmula 297 do STJ. Nesse cenário, constata-se a inequívoca violação ao dever de informação, dever esse que constitui pilar basilar das relações de consumo e que se encontra intimamente associado ao princípio da boa-fé objetiva, consagrado no art. 422 do Código Civil. Não se trata, no caso, de mero inadimplemento contratual, mas de quebra do dever de lealdade, que impõe ao fornecedor comportamento proativo, claro e diligente no trato com o consumidor, sobretudo quando este se revela vulnerável sob o ponto de vista técnico e informacional. Ainda que o autor disponha de certo grau de instrução ou exerça profissão jurídica, tal circunstância não o torna isento da presunção de vulnerabilidade reconhecida no art. 4º, I, do CDC, sendo ônus da instituição financeira adaptar sua conduta à assimetria inerente à relação contratual estabelecida. É oportuno destacar, ademais, que operou-se nos autos a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, decisão esta que restou preclusa. Caberia, pois, ao banco comprovar de forma robusta e documental que prestou as informações devidas ao consumidor, advertindo-o com precisão técnica e clareza quanto à possibilidade de rentabilidade negativa. Ocorre que tal encargo não foi minimamente cumprido. A ré não trouxe qualquer termo contratual, panfleto explicativo, gravação ou cláusula destacada que sustentasse a tese de que o consumidor estava ciente da perda possível. Limitou-se a alegar, em tese, que tais riscos são inerentes ao mercado, mas olvidou-se de demonstrar que tais riscos foram transmitidos ao cliente, tal como exige o sistema de proteção consumerista. A omissão informacional, nesse contexto, não se presume – exige demonstração inequívoca da ciência do consumidor, o que não ocorreu. Desse contexto resulta plenamente configurado o dano material, cuja extensão é líquida e incontroversa. O próprio banco reconhece, nas planilhas de resgate, que o autor suportou perda patrimonial de R$ 87.489,32, decorrente exclusivamente do deságio aplicado ao valor investido. Tal prejuízo não decorreu de oscilação natural assumida conscientemente pelo investidor, mas sim de vício de informação, ou melhor, de sua ausência, que comprometeu a liberdade contratual do autor e o induziu a erro quanto à previsibilidade do retorno financeiro. Trata-se de típica hipótese de responsabilidade civil objetiva, fundada na falha do serviço, cuja recomposição patrimonial se impõe nos moldes do art. 14, §1º, do CDC, e dos arts. 186 e 927 do Código Civil. A restituição do valor subtraído, corrigido monetariamente, é medida que se impõe, não apenas como forma de compensar o lesado, mas também de reafirmar o princípio do risco do empreendimento, segundo o qual cabe à instituição financeira suportar os efeitos jurídicos de sua atuação negligente. Quanto ao dano moral, igualmente assiste razão ao autor. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem reconhecido que a violação ao dever de informação e a frustração de legítimas expectativas criadas pelo fornecedor de serviços bancários são aptas a ensejar indenização por abalo moral, especialmente quando o consumidor é surpreendido com resultado econômico oposto ao prometido, em contexto de desorganização de sua vida pessoal e financeira. No presente caso, não se trata de mero dissabor ou de risco inerente à atividade de investimento. A narrativa demonstra que o autor planejou e adquiriu imóveis comerciais com base na promessa de rentabilidade prefixada, confiando nas orientações técnicas de sua gerente bancária, que jamais mencionou a possibilidade de desvalorização dos papéis. A perda financeira inesperada, em momento sensível e de alta carga emocional, impactou diretamente seus projetos profissionais, obstando reformas e causando apreensão diante de compromissos previamente assumidos com terceiros. Não se exige, para fins de caracterização do dano moral, prova de sofrimento psíquico em sua dimensão clínica. A dor moral é presumida (in re ipsa) em hipóteses de conduta omissiva grave, perpetrada por instituição financeira contra consumidor vulnerável, frustrando interesses existenciais e lesando a dignidade de quem, de boa-fé, confiou nas informações recebidas. A surpresa, o sentimento de traição contratual, a angústia pela impossibilidade de cumprir compromissos firmados e a perda substancial de recursos que integravam projeto de vida são elementos que justificam, com sobras, a reparação moral pretendida. O dano, pois, não é presumido por ficção, mas revela-se concreto, real e derivado de conduta reprovável, que deve ser reprimida não só em nome do caso individual, mas como forma de prevenção de práticas semelhantes por parte do setor bancário. A fixação do quantum indenizatório deve, portanto, observar os princípios da proporcionalidade, razoabilidade e função pedagógica, equilibrando o porte econômico da instituição financeira ré, o montante do prejuízo, a gravidade da conduta omissiva e a intensidade do sofrimento causado. A reparação moral, nesse contexto, não configura prêmio nem sanção exemplar, mas sim mecanismo civilizatório de restauração do equilíbrio violado. Com apoio nessas considerações, arbitro compensação por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Ainda neste contexto, deixo assentado que a fixação da compensação financeira em patamar inferior ao pretendido não importa sucumbência, consoante diretriz da Súmula 326, do STJ. Ao enfim desta digressão, destaco que não entrevejo, no caso concreto, o perigo da demora invocado no pedido incidental de tutela da urgência (não houve pedido na inicial neste sentido), para imediata devolução de quantia vultosa, devendo-se aguardar o trânsito em julgado deste julgamento. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por Roberto Selva Carneiro Monteiro Filho em face de Itaú Unibanco S.A., com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: a) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 87.489,32 (oitenta e sete mil, quatrocentos e oitenta e nove reais e trinta e dois centavos), quantia que deverá ser corrigida monetariamente desde a data do efetivo prejuízo (resgate dos investimentos), nos termos do art. 402 do Código Civil, de acordo com os critérios pactuados, até o efetivo pagamento; b) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais, que fixo, com base nos princípios da proporcionalidade, razoabilidade e função pedagógica da responsabilidade civil, em R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que deverá ser corrigida monetariamente pela Tabela ENCOGE a partir desta data, nos termos da Súmula 362 do STJ, e acrescida de juros de mora desde o evento danoso (resgate dos investimentos), conforme Súmula 54 do STJ; Nada obstante, rejeito o pedido incidental de tutela de urgência formulado pelo autor, diante da ausência de comprovação do perigo de dano irreparável ou de difícil reparação, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, porquanto a controvérsia posta em juízo refere-se a valores líquidos e disponíveis, passíveis de recomposição por meio da via executiva ordinária, não se evidenciando risco concreto de frustração da eficácia do provimento jurisdicional. Por enfim, ao tempo em que soluciono o mérito por sentença (art. 487, I, CPC), condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais em aberto, além dos honorários advocatícios, que arbitro em 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação total, considerando os critérios previstos no art. 85, §2º, do CPC. Intimem-se. Cumpra-se. Recife-PE, data digitalmente certificada. Robinson José de Albuquerque Lima Juiz de Direito bfsma