Massa Falida De Cia. Piagentini De Bebidas E Alimentos x Acbf Administracao Judicial Ltda e outros
Número do Processo:
0024821-64.2020.8.26.0100
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJSP
Classe:
INCIDENTE DE DESCONSIDERAçãO DE PERSONALIDADE JURíDICA
Grau:
1º Grau
Órgão:
Foro Central Cível - 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais
Última atualização encontrada em
02 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: Foro Central Cível - 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais | Classe: INCIDENTE DE DESCONSIDERAçãO DE PERSONALIDADE JURíDICAProcesso 0024821-64.2020.8.26.0100 (apensado ao processo 0264669-31.2007.8.26.0100) (processo principal 0264669-31.2007.8.26.0100) - Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica - Convolação de recuperação judicial em falência - Massa Falida de Cia. Piagentini de Bebidas e Alimentos - Luiz David Travesso - Empresa Brasileira de Vinificação Ltda. - ACBF Administracao Judicial Ltda - Vistos. Nos termos do art. 1023, §2º, do Código de Processo Civil, manifeste-se o embargado quanto aos embargos de declaração de fls. 746 - 749. Na sequência, ao Ministério Público. Após, conclusos. Int. - ADV: ANTONIA VIVIANA SANTOS DE OLIVEIRA CAVALCANTE (OAB 303042/SP), DAIANA TROIAN (OAB 86453/RS), ANDERSON DA SILVA MENEZES (OAB 384934/SP), LUCIANO CAREGNATO (OAB 50802/RS), SÉRGIO GONINI BENÍCIO (OAB 195470/SP), ANTONIA VIVIANA SANTOS DE OLIVEIRA CAVALCANTE (OAB 303042/SP)
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25/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Foro Central Cível - 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais | Classe: INCIDENTE DE DESCONSIDERAçãO DE PERSONALIDADE JURíDICAProcesso 0024821-64.2020.8.26.0100 (apensado ao processo 0264669-31.2007.8.26.0100) (processo principal 0264669-31.2007.8.26.0100) - Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica - Convolação de recuperação judicial em falência - Massa Falida de Cia. Piagentini de Bebidas e Alimentos - Luiz David Travesso - Empresa Brasileira de Vinificação Ltda. - ACBF Administracao Judicial Ltda - Nota cartorária ao Administrador Judicial: para integral cumprimento da r. Decisão de fls. 724/739, apresente Ficha Cadastral da Falida, com a informação referente aos sócios-administradores e os seus respectivos endereços. - ADV: ANTONIA VIVIANA SANTOS DE OLIVEIRA CAVALCANTE (OAB 303042/SP), ANTONIA VIVIANA SANTOS DE OLIVEIRA CAVALCANTE (OAB 303042/SP), SÉRGIO GONINI BENÍCIO (OAB 195470/SP), LUCIANO CAREGNATO (OAB 50802/RS), DAIANA TROIAN (OAB 86453/RS), ANDERSON DA SILVA MENEZES (OAB 384934/SP)
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11/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Foro Central Cível - 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais | Classe: INCIDENTE DE DESCONSIDERAçãO DE PERSONALIDADE JURíDICAProcesso 0024821-64.2020.8.26.0100 (apensado ao processo 0264669-31.2007.8.26.0100) (processo principal 0264669-31.2007.8.26.0100) - Incidente de Desconsideração de Personalidade Jurídica - Convolação de recuperação judicial em falência - Massa Falida de Cia. Piagentini de Bebidas e Alimentos - Luiz David Travesso - - Empresa Brasileira de Vinificação Ltda. - I - RELATÓRIO Trata-se de Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, com o objetivo de estender os efeitos da falência da sociedade empresária Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos, movido pela respectiva massa falida em face da Empresa Brasileira de Vinificação Ltda. (EBV) e de Luiz David Travesso. A requerente narrou que teve sua quebra decretada em 02/07/2018. Sustentou haver provas indicando a transferência irregular de maquinários da requerente para a primeira requerida. Destacou que a transferência de bens, a utilização de funcionários e a configuração de sucessão empresarial também encontram respaldo em declarações de ex-funcionários. Alegou que a EBV foi constituída em momento no qual a sociedade falida Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos já se encontrava em estado avançado de crise financeira, na iminência de ter sua falência decretada. Afirma que a EBV passou a exercer as mesmas atividades econômicas anteriormente desenvolvidas pela falida, sob a gestão das mesmas pessoas que, à época, integravam o quadro de controle da Cia Piagentini. Apontou que os sócios da EBV, Alejandro Alberto Cardozo Rappeti e Julio Francisco Slovinski, mantinham vínculo com a falida, sendo, respectivamente, diretor e ex-empregado da Cia Piagentini. Relatou, ainda, que a EBV assumiu dívida trabalhista da falida e que há declaração de sócio da EBV em que teria sido reconhecida a sucessão das atividades. Aduziu que houve transferência de bens da falida para a EBV e que esta contratou parte dos trabalhadores que integravam o quadro da falida. Mencionou, por fim, que a EBV é representada pelo mesmo patrono que atuava em defesa da falida. Em relação ao corréu Luiz David Travesso, alegou que, na condição de vice-presidente da falida, participou da celebração de contrato de confissão de dívida firmado entre a Cia Piagentini, a credora Saint Gobain e a empresa interveniente anuente Travessia Consultoria, da qual é sócio. Referido contrato previa que, em caso de inadimplemento, haveria alienação fiduciária de dois imóveis da falida, constando, ainda, cláusula em que a Saint Gobain se comprometeria a requerer a suspensão da execução ajuizada em face da Travessia Consultoria. A autora sustenta que tal operação teria resultado em prejuízo à falida e aos credores. Ao final, requereu a desconsideração da personalidade jurídica, com a extensão dos efeitos da falência aos requeridos. Foi requeridaa decretação de indisponibilidade de bens dos requeridos, medida que foi deferida, conforme decisão de fls. 90/91. Em contestação (fls. 147/171), a requerida EBV sustentou que foi constituída em 12/08/2016 por dois ex-funcionários da requerente e que sua criação não teve como finalidade suceder a Cia Piagentini, inexistindo identidade entre as atividades desenvolvidas por ambas. Alegou que foi contratada para prestar serviços terceirizados à falida e que a transferência de bens ocorreu a título de comodato e depósito. Afirmou que a inclusão da EBV no polo passivo de reclamação trabalhista decorreu de equívoco, tendo o acordo sido celebrado em nome de ex-diretor da falida. Refutou a alegação de contratação de empregados da falida, informando que admitiu apenas alguns profissionais, em razão de suas qualificações técnicas. Negou, ainda, que qualquer sócio da EBV tenha declarado formalmente a existência de sucessão empresarial em relação à Cia Piagentini. O requerido Luiz David Travesso por sua vez, apresentou contestação (fls. 477/497), na qual alegou sua ilegitimidade passiva, afirmando que jamais integrou o quadro societário da falida ou da corré EBV. Esclareceu que ocupou o cargo de vice-presidente da Cia Piagentini durante o período em que esta se encontrava em recuperação judicial, com atribuições restritas à gestão administrativa, financeira e comercial. Defendeu que não praticou qualquer ato ilícito ou fraudulento. Informou que os imóveis dados em garantia no contrato de confissão de dívida já haviam sido objeto de dação em pagamento desde 1999. Alegou, ainda, que a celebração do referido contrato decorreu de liberalidade entre as partes, sem qualquer objetivo de causar prejuízo à massa falida ou beneficiar-se indevidamente. Quanto ao contrato de comodato, afirmou que sua finalidade era assegurar a preservação dos bens da falida. Sobrevieram réplicas às fls. 405/421 e 575/583, em que a requerente reiterou os fundamentos apresentados na inicial. Em audiência instrutória, foram ouvidas as testemunhas Tatiane Freitas Brazeiro e Marcia Gujel (fls. 650/651). Na sequência, foram apresentadas as alegações finais do requerido Luiz David Travesso (fls. 653/663), pela requerida EBV (664/677) e da massa falida (fls. 684/694). Por fim, o Ministério Público apresentou parecer às fls. 701/710, manifestando-se pela procedência do pedido. Destacou que, com base na análise dos elementos constantes dos autos, há prova documental e testemunhal indicando que a empresa EBV foi constituída com a finalidade de dar continuidade às atividades empresariais anteriormente exercidas pela falida Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos, circunstância que teria resultado em prejuízo aos credores, com caracterização de desvio de finalidade. Ressaltou a existência de indícios de confusão patrimonial, especialmente em razão da transferência de ativos da falida para a EBV sem contraprestação e sem autorização do juízo falimentar. Apontou, ainda, que não foi apresentado instrumento contratual capaz de comprovar a alegação de que havia contrato de terceirização formalmente celebrado entre as partes. No tocante ao corréu Luiz David Travesso, consignou que o contrato de confissão de dívida foi firmado no período em que exercia o cargo de vice-presidente da falida e, concomitantemente, figurava como sócio da empresa interveniente anuente, caracterizando desvio de finalidade, uma vez que foram utilizados bens imóveis da falida como garantia de obrigação vinculada à empresa da qual era sócio, em benefício próprio e em prejuízo aos credores. É o que importa relatar. II FUNDAMENTAÇÃO A presente demanda tem por objeto a desconsideração da personalidade jurídica com a extensão dos efeitos da falência às partes requeridas. A regra geral no ordenamento jurídico brasileiro é a preservação da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas. Trata-se de princípio fundamental para o desenvolvimento das atividades econômicas, expressamente previsto no artigo 49-A, parágrafo único, do Código Civil, que assim dispõe: Art. 49-A, parágrafo único: A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos. Desse modo, a simples existência de grupo econômico, relações de controle ou outros vínculos jurídicos não é, por si só, suficiente para afastar os efeitos da autonomia patrimonial das sociedades de responsabilidade limitada. Contudo, a autonomia patrimonial pode ser exercida de forma abusiva, quando utilizada em desconformidade com sua função econômica e social. Nesses casos, o ordenamento jurídico considera como ilícito o exercício abusivo do direito, nos termos do artigo 187 do Código Civil, de modo que os efeitos decorrentes do abuso são considerados ineficazes em relação aos prejudicados. Tratando-se de análise pela via do abuso de direito, torna-se desnecessária a análise de elemento subjetivo (dolo ou culpa) dos envolvidos. A caracterização do abuso de direito independe da análise da intenção do agente ou de outros elementos de ordem subjetiva. É o que leciona Bruno Mirage: O advento da cláusula geral do art. 187 do Código Civil, ao definir como ato ilícito o exercício de direito que viole seu fim econômico ou social, a boa-fé e os bons costumes, retirou expressamente do suporte fático da norma a exigência da culpa para caracterização do ilícito (MIRAGEM, Bruno. Abuso do direito: proteção da confiança e limite ao exercício das prerrogativas jurídicas no direito privado. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 86) Nessa perspectiva, a confusão patrimonial e o desvio de finalidade constituem modalidades de abuso da autonomia patrimonial que podem justificar a extensão dos efeitos da falência para outras empresas além daquela originalmente declarada insolvente. Nesse ponto, é preciso indicar a adequada interpretação do art. 82-A da Lei 11.101/2005: Art. 82-A. É vedada a extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida, admitida, contudo, a desconsideração da personalidade jurídica. A interpretação meramente literal do referido dispositivo levaria à equivocada conclusão de que, em nenhuma hipótese, seria possível a extensão dos efeitos da falência a terceiros. Entretanto, tal interpretação não se mostra a mais adequada. A literalidade oferece importantes elementos para a interpretação, sendo, ao mesmo tempo, o início e o limite da atividade interpretativa. Contudo, outros critérios devem ser observados, seja para enfrentar o problema da pluralidade de significados literais possíveis, seja, até mesmo, para afastar o sentido literal mais evidente, em prol de outro significado. O art. 82-A da Lei 11.101/2005 tem que ser compreendido em conjunto com a cláusula geral de vedação ao abuso de direito (art. 187 do Código Civil), o que impõe uma interpretação restritiva do dispositivo da Lei de Recuperações e Falências. Se considerada a interpretação literal da norma, dar-se-ia proteção a mecanismos fraudulentos de lesão aos credores, baseando-se de uma autonomia formal entre as pessoas jurídicas, mas que na prática se revela inexistente. Além disso, igualar-se-iam cenários absolutamente distintos, tratando de maneira idêntica situações em que a autonomia patrimonial inexiste na prática com situações em que a autonomia patrimonial, apesar de existente, é pontualmente utilizada de forma abusiva. O primeiro passo para a correta interpretação do art. 82-A da Lei 11.101/2005 é a compreensão de que existem graus de abuso da personalidade jurídica. Pode ser que o abuso da personalidade jurídica seja pontual e delimitado. Cuida-se de hipótese em que em que a autonomia patrimonial existe não apenas formalmente, mas também materialmente. Contudo, é utilizada em uma particular situação de forma abusiva, o que impõe o reconhecimento de ineficácia da autonomia patrimonial de forma também pontual. A caracterização do abuso pontual da personalidade jurídica pode ser feita a partir de 03 critérios: 1- identificação de credores especificamente prejudicados pelo ato abusivo; 2- identificação de específico e particular benefício com o ato abusivo; 3- identificação de exercício legítimo da autonomia da pessoa jurídica na generalidade das situações, tratando-se o ato abusivo de circunstância pontual e isolada. A rigor, é essa a situação abarcada pelo art. 50 do Código Civil, que prevê a desconsideração da personalidade jurídica quanto a específicas e determinadas relações jurídicas, quando identificados os benefícios diretos ou indiretos do abuso: Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. Por outro lado, existem situações de abuso da personalidade jurídica que não são pontuais. Cuida-se de hipóteses em que a autonomia patrimonial existe apenas formalmente, mas não materialmente. Não se trata de um exercício abusivo da posição jurídica em uma situação específica, mas a absoluta inexistência real de autonomia. Nessas circunstâncias, a própria existência formal de pessoas jurídicas autônomas é abusiva. Acerca de situações de abuso que acarretam a absoluta inexistência material de autonomia das pessoas jurídicas, bem leciona Marcelo Sacramone, que conclui pela possibilidade de extensão dos efeitos da falência: Situação diversa ocorre quando, no interior do grupo, as diversas personalidades jurídicas não são preservadas como centros de interesses autônomos, mas não apenas prejudicar o integrante em benefício de outro, mas como forma de atuação única do grupo perante terceiros. A disciplina do grupo societário não é respeitada por quaisquer dos seus integrantes, os quais atuam conjuntamente com confusão patrimonial, unidade de gestão e de empregados e com o prevalecimento de um interesse comum do grupo em detrimento dos interesses sociais de todas as pessoas jurídicas que lhe integram. Nessa forma de atuação, o terceiro contratante não mensura o risco da contratação apenas em face do patrimônio individual da sociedade que com ele diretamente contrata. A existência de um caixa único de pagamento e as garantias cruzadas dos demais integrantes do grupo demonstram que o patrimônio é considerado pelo contratante como um todo. Mas não só. A unidade de gestão implica que todas as sociedades são representadas pelas mesmas pessoas, de modo que a pessoa jurídica que efetivamente aparece revela-se apenas como uma formalidade. Tal característica é ainda mais acentuada se o grupo opera com uma única marca ou marcas semelhantes para todo o grupo, o que indica que seus produtos são desenvolvidos de forma conjunta por todos os integrantes. Por fim, a comunhão de empregados, sem a devida contrapartida entre os integrantes, evidencia que não apenas perante terceiros o grupo é visto como entidade única, mas que as próprias sociedades integrantes desconsideram a personalidade jurídica entre si e não garantem a sua autonomia patrimonial. Nessa hipótese excepcional, de fraude à personalidade jurídica, os credores não podem ser tratados de forma diversa caso tenham contratado com sociedade sem qualquer ativo ou se tiverem contratado com uma holding patrimonial que concentra os ativos do grupo. Ao se comportar como uma unidade, o grupo contratante deverá ser tratado dessa mesma forma na hipótese de crise econômico-financeira, e de modo a não gerar uma distinção entre os diversos credores contratantes. Por meio da aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, devem-se considerar as diversas sociedades não como simples integrantes de um grupo de fato, mas como verdadeiros sócios de uma sociedade em comum, a qual desenvolve uma única atividade perante terceiros e em benefício de todos os integrantes. Como nessa hipótese os sócios integrantes respondem com os bens pessoais ilimitada e solidariamente entre si pelas obrigações sociais contraídas no exercício da empresa, a decretação da falência dessa sociedade em comum, formada pelas diversas sociedades que operam com confusão patrimonial e que exerçam perante terceiros atividade sob unidade gerencial, laboral e patrimonial, sem consideração aos respectivos interesses sociais, acarreta a extensão da falência a todas as suas sociedades integrantes (SACRAMONE, Marcelo Barbosa. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2024, p. 411). Portanto, a hipótese de aplicação da norma extraída do art. 82-A da Lei 11.101/2005 que veda a extensão da falência, mas permite a desconsideração da personalidade jurídica diz respeito ao abuso pontual da autonomia da pessoa jurídica. Nesses casos, como o abuso não é generalizado e há prejuízo apenas para alguns credores específicos, de fato não é adequada a extensão dos efeitos da falência, com submissão da totalidade do patrimônio ao passivo da Massa Falida. A ineficácia decorrente do ato abusivo deve ocorrer na medida da abusividade. Por outro lado, quando a abusividade é tamanha que a autonomia entre as pessoas jurídicas existe apenas formalmente, mas não em substância, o afastamento dos efeitos do abuso significa o reconhecimento de que não autonomia patrimonial alguma. Se não há autonomia patrimonial, não há alternativa que não a extensão dos efeitos da falência. Cuida-se de imposição da cláusula geral de vedação ao abuso de direito (art. 187 do Código Civil), com o qual o art. 82-A da Lei 11.101/2005 deve ser compatibilizado. Além disso, trata-se de medida necessária à garantia da isonomia entre os credores. Se a autonomia entre as pessoas jurídicas é inexistente na prática, os credores formalmente vinculados a uma das sociedades não podem ter tratamento distinto daqueles formalmente vinculados à outra sociedade. Separar o patrimônio e os credores de cada uma das sociedades seria dar tratamento diferenciado para sujeitos que merecem tratamento isonômico, justamente porque contrataram com sociedades que, apesar de formalmente distintas, em substância não possuíam autonomia. Sobre a distinção entre os fenômenos da desconsideração pontual da personalidade jurídica e a extensão da falência, leciona João Pedro Scalzilli: a primeira hipótese, que designamos 'desconsideração pontual', consiste na ineficácia episódica da personalidade jurídica para que um determinado bem, geralmente subtraído do patrimônio da sociedade falida fraudulentamente, seja reintegrado ao patrimônio desta ou, melhor ao conjunto de bens que compõem a massa falida objetiva. Neste caso, a desconsideração possui a eficácia de uma ação revocatória falencial. A segunda hipótese, que chamamos 'desconsideração extensiva', está consubstanciada no caso de extensão dos efeitos da falência em direção de outras sociedades, geralmente integrantes de um grupo de fato ou que estejam em condições de confusão patrimonial, resultando na quebra de todas (extensão dos efeitos da falência) e, por via de consequência, na arrecadação dos seus patrimônios (SCALZILLI, João Pedro. Confusão Patrimonial no Direito Societário. São Paulo: Quartier Latin, 2015, p.174.) Com raciocínio parcialmente distinto, mas admitindo a extensão dos efeitos da falência mesmo após a vigência do art. 82-A da Lei 11.101/2005, há julgados do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: Falência Incidente de desconsideração da personalidade jurídica Deferimento da extensão dos efeitos da quebra Interpretação do art. 50 do CC/2002, respeitado o rito especial previsto nos arts. 133 a 137 do CPC/2015 e conjugado o art. 82-A, parágrafo único da Lei 11.101/2005 - Frente ao prévio reconhecimento da responsabilidade patrimonial da pessoa jurídica (primeiro pressuposto), ao reconhecimento da insuficiência do patrimônio da pessoa jurídica (segundo pressuposto) e à afirmação da fraude ou do abuso de direito (terceiro pressuposto), chega-se à desconsideração Pressupostos presentes Constatação do desvio de receitas de uma pessoa para outra - Confirmação da prática de ato ilegítimo e indicativo de confusão patrimonial ou utilização espúria da pessoa jurídica - Decisão mantida Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2118439-96.2024.8.26.0000; Relator Fortes Barbosa; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Julgamento: 30/07/2024) Agravo de instrumento Incidente para apuração de eventual extensão de falência e desconsideração da personalidade jurídica Decisão recorrida que julgou parcialmente o mérito apenas para estender os efeitos da quebra da Nova Mercante de Papéis Ltda. para a Mercante de Papéis Ltda. (...) Ausência, na prática, de separação gerencial, laboral e patrimonial Desvio de finalidade e confusão patrimonial em detrimento de credores configurados, a autorizar a extensão dos efeitos da falência da Nova Mercante para a Mercante (Lei nº 11.101/2005, art. 82-A, par. ún.; CC, art. 50) Decisão mantida Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2029847-13.2023.8.26.0000; Relator Maurício Pessoa; 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Julgamento: 04/03/2024) No caso concreto, restou evidenciado nos autos que a Empresa Brasileira de Vinificação Ltda foi criada com o objetivo de explorar atividade empresarial no mesmo segmento da sociedade falida. Além disso, ficou demonstrado que a Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos cedeu à EBV, a título de depósito e sem qualquer remuneração, máquinas e equipamentos essenciais ao desenvolvimento de sua atividade operacional (fls. 213/217). Tal prática destoa da lógica empresarial, pois não é razoável que uma sociedade empresária empreste gratuitamente, a uma concorrente direta, ativos fundamentais para o exercício de sua própria atividade econômica, sobretudo quando em estado de crise financeira. Some-se a isso o fato de que a EBV admitiu, em seu quadro funcional, diversos ex-empregados da massa falida, conforme demonstrado nas fls. 21/22 e em depoimento prestado pelas testemunhas nos autos. O reaproveitamento da mão de obra anteriormente vinculada à falida reforça o indício de continuidade estrutural. Os elementos coligidos demonstram que houve a transferência irregular de maquinário, esvaziamento patrimonial da falida, contratação de empregados e exploração do mesmo ramo de atividade, configurando-se, assim, uma única atividade econômica sob duas pessoas jurídicas formalmente distintas, mas substancialmente unificadas. Percebe-se, portanto, confusão patrimonial e desvio de finalidade, este consubstanciado na constituição da EBV como instrumento de continuidade empresarial da falida, à margem do controle judicial e sem observância do devido processo de falência. A EBV atuou como sucedânea informal da massa falida, absorvendo sua estrutura produtiva com o objetivo de manter a operação econômica, mas dissociada das obrigações anteriormente contraídas. Já a confusão patrimonial restou evidenciada pela ausência de segregação entre os ativos das empresas, notadamente em razão da transferência de bens da falida à EBV, sem qualquer documentação contratual idônea, sem autorização do juízo falimentar e sem contraprestação financeira. Esses fatos justificam a extensão dos efeitos da falência pretendida, por comprovarem a inexistência de autonomia real entre as pessoas jurídicas Entretanto, no tocante ao requerido Luiz David Travesso, embora sua conduta revele provável ilícito civil, consistente na utilização do patrimônio da falida para garantir obrigação vinculada à empresa de sua titularidade, tal circunstância não configura, tecnicamente, hipótese de extensão dos efeitos da falência. A atuação do requerido não caracteriza ausência estrutural de autonomia patrimonial, mas, sim, fato isolado, apto a ensejar eventual responsabilização civil, mas não a decretação de sua quebra. Note-se que não é qualquer ilícito que autoriza a extensão da falência, mas aqueles que revelam abuso da personalidade jurídica caracterizador de inexistência de de efetiva autonomia. Portanto, impõe-se, quanto a Luiz David Travesso, o reconhecimento de extensão dos efeitos da falência. III DISPOSITIVO Diante do exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado, nos seguintes termos: A) decreto a extensão dos efeitos da falência de Empresa Brasileira de Vinificação Ltda. EBV; B) fixo o termo legal da falência da requerida o mesmo fixado para Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos; C) julgo improcedente o pedido de extensão dos efeitos da falência em relação ao requerido Luiz David Travesso; e Condeno a parte autora a arcar com as despesas processuais e com honorários advocatícios de sucumbência, que fixo em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 82 e 85 do Código de Processo Civil, em face ao patrono do requerido Luiz David Travesso, observada a gratuidade já deferida. Tratando-se de extensão da falência, fica nomeado o mesmo administrador judicial da Massa Falida de Cia Piagentini de Bebidas e Alimentos, que deverá cumprir seus deveres nos autos do processo principal, notadamente: 1.1. Promover pessoalmente, com sua equipe, a arrecadação de bens, documentos e livros, bem como a avaliação dos bens, separadamente ou em bloco, no local em que se encontrem, sem necessidade de mandado, bem como autorizado o acompanhamento da diligência pelos órgãos competentes para o uso de força em caso de resistência, servindo cópia dessa sentença, assinada digitalmente, como ofício; 1.2. Realizar todos os atos necessários à realização do ativo, na forma da Lei 14.112/2020; 1.3. Notificar o representante da falida para prestar declarações e apresentar relação de credores, diretamente ao(à) Administrador(a) Judicial, sob pena de desobediência, publicando-se, em seguida, o edital para habilitações/impugnações, nos termos do art. 99, parágrafo único, da Lei 11.101/05. 1.4. Manter endereço eletrônico na internet, com informações atualizadas e com a opção de consulta às peças principais do processo, salvo decisão judicial em sentido contrário; 1.5. Manter endereço eletrônico específico para o recebimento de pedidos de habilitação ou a apresentação de divergências, ambos em âmbito administrativo, com modelos que poderão ser utilizados pelos credores, salvo decisão judicial em sentido contrário; 1.6. Providenciar, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, as respostas aos ofícios e às solicitações enviadas por outros juízos e órgãos públicos, sem necessidade de prévia deliberação do juízo; Determino ainda: 2. Suspensão de ações e execuções contra a falida, com as ressalvas legais. 3. Proibição de atos de disposição ou oneração de bens da falida, com expedição das comunicações de praxe. 4. A publicação de edital eletrônico com a íntegra desta sentença e a relação de credores apresentada pelo falido (art. 99, XIII, § 1º - Lei 11.101/2005), constando o prazo de 15 dias para apresentação das habilitações de crédito, em que constem as seguintes advertências: 4.1. No prazo de 15 dias as habilitações ou divergências deverão ser apresentadas diretamente ao(à) Administrador(a) Judicial, no seu endereço acima mencionado, ou por meio do endereço eletrônico a ser informado no compromisso a ser prestado, e de que as habilitações apresentadas nos autos digitais não serão consideradas; 4.2. Na ocasião da apresentação das habilitações e divergências, os credores deverão indicar dados completos de conta bancária (nome do titular da conta, número do CPF/CNPJ do titular da conta, número da agência e da conta bancária) para que, conforme previsão do artigo 1.113, §§ 3º, 4º e 5º das NSCGJ/TJSP (PROVIMENTOS nº 50/1989 e 30/2013), possam receber eventuais valores através da prévia expedição de ofício ao banco; 4.3. Ficam dispensados de habilitação os créditos que constarem corretamente do rol eventualmente apresentada pelo falido. 5. Intimação eletrônica, nos termos da legislação vigente e respeitadas as prerrogativas funcionais, respectivamente, do Ministério Público e das Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados, Distrito Federal e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência, nos termos do artigo 99, XIII, da Lei 11.101/2005. Havendo filiais em outros Estados, o próprio Administrador Judicial deverá providenciar a intimação. 6. Oficie-se: a) através do sistema Sisbajud, para determinação do bloqueio de ativos financeiros em nome da falida; b) ao Banco Central, para bloqueio das contas e ativos financeiros em nome da falida; c) à Receita Federal, pelo sistema Infojud, para que forneça cópias das 3 últimas declarações de bens da falida; d) ao Detran, através do sistema Renajud, determinando-se o bloqueio (transferência e circulação) de veículos existentes em nome da falida; e) à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens, para pesquisa e bloqueio de imóveis em nome da falida. 7. Poderá o(a) Administrador(a) Judicial adotar todas as providências para a preservação dos interesses da massa e eficiente administração de seus bens, colhendo informações diretamente junto a credores, falido, órgãos públicos, pessoas jurídicas de direito privado, sem necessidade de prévia autorização judicial, servindo esta sentença de ofício. 8. Providencie o(a) Administrador(a) Judicial a comunicação a todas as Fazendas, - PROCURADORIA DA FAZENDA NACIONAL - UNIÃO FEDERAL - Alameda Santos, 647 - 01419-001 - São Paulo/SP; PROCURADORIA DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO - Av. Rangel Pestana, 300, 15º andar - Sé - 01017-000 - São Paulo SP - email pgefalencias@sp.gov.br: SECRETARIA DA FAZENDA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO - PROCURADORIA FISCAL DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO - Rua Maria Paula, 136 Centro - 01319-000 - São Paulo/SP, a respeito da existência desta falência, informando-lhe nome da falida, número do processo e data da quebra, bem como seus dados (AJ) e endereço de email, para que as Fazendas Públicas encaminhem, nos termos do art. 7º- A, da Lei 11.101/2005, e no prazo de 30 dias, diretamente ao Administrador Judicial, a relação completa de seus créditos inscritos em dívida ativa, acompanhada de cálculos, classificação e informação sobre a situação atual. O Administrador Judicial, de posse de tais documentos, instaurará incidente de classificação de crédito público para cada Fazenda Pública. 9. Servirá cópia desta sentença, assinada digitalmente, ainda, de OFÍCIO aos órgãos elencados abaixo: BANCO CENTRAL DO BRASIL BACEN - Av. Paulista, 1804, CEP 01310-200, São Paulo/SP: Proceder e repassar às instituições financeiras competentes, o bloqueio das contas correntes ou outro tipo de aplicação financeira de titularidade da falida, bem como seja expedido ofício informando o cumprimento da presente ordem diretamente ao Administrador Judicial nomeado nos autos da falência. JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO: Rua Barra Funda, 930 - 3º andar Barra Funda - CEP: 01152-000 - São Paulo/SP: Encaminhar a relação de livros da falida levada a registro nesse órgão, e informes completos sobre as alterações contratuais havidas em nome da mesma. Deverá, ainda, contar a expressão falido nos registros desse órgão e a inabilitação para atividade empresarial, nos termos do art. 99, VII, da Lei 11.101/2005. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS: Rua Mergenthaler, 500, Vila Leopoldina Gerência GECAR, CEP: 05311-030 São Paulo/SP: Encaminhar as correspondências em nome da falida para o endereço do administrador judicial nomeado; CENTRO DE INFORMAÇÕES FISCAIS -DI Diretoria de informações - Av. Rangel Pestana, 300, CEP: 01017-000 São Paulo/SP: Deverá encaminhar a DECA referente à falida, para o endereço do administrador judicial nomeado; SETOR DE EXECUÇÕES FISCAIS DA FAZENDA PÚBLICA - Ofício das Execuções Fiscais Estaduais - Rua Vergueiro, 857, CEP: 01013-001 São Paulo/SP: informar sobre a existência de ações, bens e direitos em nome da falida; BOLSA DE VALORES DO ESTADO DE SÃO PAULO - Rua XV de Novembro nº 275, 7º andar, CEP: 01013-001 São Paulo/SP: Informar a existência nos seus arquivos, sobre bens e direitos em nome da falida; BANCO BRADESCO S/A. - Cidade de Deus, s/nº Vila Iara - CEP: 06023-010 Osasco/SP: Informar acerca da posição de ações do sistema TELEBRÁS (Telesp e cindidas) em nome da falida e, se houver dividendos, sejam estes depositados em nome da massa falida, no Banco do Brasil S/A., Agência 5905-6 S. Público São Paulo, à ordem deste Juízo; DEPARTAMENTO DE RENDAS MOBILIÁRIAS - Rua Pedro Américo, 32, CEP: 01045-000 São Paulo/SP: Informar sobre e a existência de bens e direitos em nome da falida; CARTÓRIO DISTRIBUIDOR DE TÍTULOS PARA PROTESTO - Rua XV de Novembro, 175 Centro - CEP: 01013-001 São Paulo/SP: Remeter as certidões de protestos lavrados em nome da falida, para o endereço do administrador judicial nomeado, independente do pagamento de eventuais custas. Advirto que embargos de declaração manifestamente protelatórios serão apenados com multa de até 2% sobre o valor da causa, por imposição do art. 1.026, § 2º, CPC. Fls. 721/723 (Luiz David Travesso): Intime-se o requerente para que, no prazo de 5 dias, apresente cópia integral dos Embargos de Terceiro mencionados, bem como esclareça a qual serventia imobiliária pertence o imóvel matriculado sob o nº 31.198. Com a resposta, certifique a zelosa serventia se recai sobre referido imóvel alguma medida de constrição determinada por este juízo. P.R.I.C - ADV: DAIANA TROIAN (OAB 86453/RS), ANDERSON DA SILVA MENEZES (OAB 384934/SP), ANTONIA VIVIANA SANTOS DE OLIVEIRA CAVALCANTE (OAB 303042/SP), SÉRGIO GONINI BENÍCIO (OAB 195470/SP), LUCIANO CAREGNATO (OAB 50802/RS)