Elaine De Souza Martins x Luiz Henrique Piccaglia Pereira Cardoso
Número do Processo:
0100823-49.2024.5.01.0531
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRT1
Classe:
RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO
Grau:
1º Grau
Órgão:
Gabinete 29
Última atualização encontrada em
21 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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25/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara do Trabalho de Teresópolis | Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMOINTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID e111a33 proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: 01ª VARA DO TRABALHO DE TERESÓPOLIS Processo n.º 0100823-49.2024.5.01.0531 S E N T E N Ç A Relatório ELAINE DE SOUZA MARTINS ajuizou ação trabalhista em face de LUIZ HENRIQUE PICCAGLIA PEREIRA CARDOSO, em que postula as parcelas destacadas na petição inicial. Conciliação rejeitada. A reclamada apresentou contestação com documentos. Alçada fixada no valor da inicial. A parte autora manifestou-se em réplica. Na audiência realizada em 20 de março de 2025 (ID f2debeb – fls. 187), foi rejeitada a conciliação. Foram colhidos depoimentos pessoais e ouvida uma testemunha. Com o encerramento da instrução, após o prazo de razões finais e permanecendo inconciliáveis, o processo foi encaminhado para julgamento. Fundamentação Gratuidade de Justiça A parte autora afirma na inicial que não possui meios para arcar com as despesas processuais, sem prejuízo do sustento próprio e da família. Dispõe o art. 99 do CPC de 2015: “Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso”. O § 3º do mesmo artigo estabelece que: “Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural” (grifados) No caso dos autos, a parte não tinha a CTPS anotada e ainda assim auferia remuneração mensal até 40% do limite máximo do RGPS. Acresça-se que apresentou declaração de hipossuficiência no ID. 26a0cfd – fls. 24. Saliento que o §4º do art. 790 da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, deve ser interpretado sistematicamente e, assim, nos termos do que dispõe o § 3º do art. 790 da CLT, c/c com os artigos 15 e 99, § 3º, do CPC de 2015, conclui-se que a comprovação destacada no §4º do art. 790 da CLT pode ser feita mediante a simples declaração da parte, viabilizando o acesso do trabalhador ao Poder Judiciário em cumprimento ao art. 5º, incisos XXXV e LXXIV, da Constituição Federal. Desse modo, presumo verdadeira a condição de hipossuficiência financeira, nos termos da nova redação introduzida ao §3º do art. 790 da CLT pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Defiro o benefício da justiça gratuita e rejeito a impugnação da reclamada. Estimativa de valores Cabe destacar o que dispõe o art. 324 do CPC de 2015, aplicável subsidiariamente ao processo do trabalho, conforme art. 769 da CLT: "Art. 324. O pedido deve ser determinado. § 1° É lícito, porém, formular pedido genérico: (...) II - quando não for possível determinar, desde logo, as consequências do ato ou do fato; III - quando a determinação do objeto ou do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu." Vejamos, ainda, o que estabelece o art. 840, § 1º, da CLT: “Art. 840. A reclamação poderá ser escrita ou verbal. § 1o Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. “ (grifado). Friso que o art. 840, § 1º, da CLT não exige liquidação do pedido, mas apenas a “indicação de seu valor”, e o § 2º do art. 879 da CLT não foi revogado, ainda passou a ter nova redação, estabelecendo que as partes possuem "prazo comum de oito dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto da discordância, sob pena de preclusão". Fica evidenciado que não há exigência de liquidação do pedido, mas mera estimativa de valores, o que não poderia ser diferente, uma vez que a Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, não extinguiu a fase de liquidação. Assim, os valores indicados na inicial são uma mera estimativa e não podem limitar o pedido, ficando o juiz adstrito ao pedido considerando o direito pleiteado e não o valor estimado. Acrescento que, em caso de eventual condenação, as custas serão fixadas com base no valor da condenação arbitrada pelo juízo (art. 789, I, da CLT) e não com respaldo no valor atribuído à causa pelo autor; e que o depósito para fins de recurso está limitado ao fixado na legislação vigente à época da interposição. Ilegitimidade passiva ad causam A legitimidade ad causam é a pertinência subjetiva da ação. Legitimado ativo para causa é aquele que alega ser titular do direito material e, passivo, aquele que é capaz de suportar o ônus da demanda. Baseando-se nos ensinamentos de José Carlos Barbosa Moreira, in Temas de Direito Processual Civil, a presente preliminar deve ser analisada conforme os fatos alegados e expostos na petição inicial. Alega a autora que foi empregada do réu, sendo, portanto, parte legítima. A existência ou não de vínculo de emprego é matéria de mérito, oportunidade em que deve ser reexaminada. Rejeito a preliminar. Reconhecimento do vínculo de emprego Alega a autora que foi contratada em 08/06/2024 para exercer a função de cuidadora da idosa Sra. Wally, genitora do Reclamado, no âmbito da residência da idosa, que morava sozinha. Informa que o rompimento contratual ocorreu em 05/08/2024, quando recebeu comunicado de sua dispensa. Relata que trabalhava das 08:00 horas às 20:00 e que dividia a escala com outra cuidadora, Sra. Kátia, que chegava às 08:00 horas, momento em que a Reclamante deixava finalmente o posto de trabalho. Informa que recebia R$100,00 (cem reais) por plantão e que tinha um salário mensal de R$3.000,00 (três mil reais). Alegando que prestou serviços com pessoalidade, subordinação, onerosidade e não eventualidade, pede o reconhecimento do vínculo de emprego. O réu contesta dizendo que a autora nunca lhe prestou serviços, mas sim à sua mãe em cuja residência prestou serviços e que é seu curador. Diz : “Não se nega que a RECLAMANTE tenha prestado serviços em favor da Sra. WALLY PIA PICCAGLIA PEREIRA CARDOSO, laborando na casa da mesma e recebendo pagamentos à partir de recursos da própria Sra. WALLY PIA PICCAGLIA PEREIRA CARDOSO, todavia importa esclarecer que tal prestação de serviços se deu de forma absolutamente diversa do que que se encontra narrado na exordial.” Passo a decidir. São requisitos da relação jurídica de emprego, conforme art. 3º da CLT: prestação de serviços por meio de pessoa física, com pessoalidade, onerosidade, subordinação e não eventualidade. Nos termos do art. 1º da Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015, o empregador é a família, e não apenas o beneficiário direto da prestação de serviços (no caso do cuidador, o paciente idoso). Dispõe Art. 1º da lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015: “ Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana, aplica-se o disposto nesta Lei.” ( grifo nosso) O vínculo de emprego doméstico, além dos requisitos comuns a toda relação de emprego, possui ainda elementos especiais: finalidade não lucrativa dos serviços; prestação de serviço à pessoa ou à família; âmbito residencial da prestação laborativa. O trabalho doméstico não deve ter objetivos e resultados comerciais ou industriais e, por isso, não tem finalidade lucrativa. Os serviços prestados não podem, então, constituir fator de produção para o empregador. Quanto à prestação de serviço à pessoa ou à família, o legislador ampliou o conceito de empregador doméstico para incluir todas as pessoas da família, não se limitando apenas a uma pessoa física. Deixou claro também que não o empregador doméstico não pode ser pessoa jurídica. Todavia, o empregador pode ser a família, e não apenas o beneficiário direto da prestação de serviços ( idoso, menor). Quanto ao âmbito residencial, significa que deve ser prestado em ambiente vinculado à vida pessoal do indivíduo ou da família, não apenas a moradia do empregador, mas também sua extensão, como casa de campo, por exemplo. Registro que o benefício “bolsa família” não é motivo para afastar o reconhecimento do vínculo de emprego. Há, inclusive, falsa suposição que a CTPS anotada inviabiliza o recebimento do benefício. O fato de o trabalhador ter carteira assinada não o impede de continuar recebendo o Bolsa Família, desde que a renda mensal seja ainda adequada ao programa. No caso em análise, é fato incontroverso que a autora prestava serviços na residência da sra. Wally, sendo responsável por seus cuidados pessoais. Os extratos bancários apresentados pela autora confirmam que as transferências eram feitas com recursos da própria Wally; todavia, o réu confirma, em depoimento pessoal, que era ele quem gerenciava tudo, sendo, inclusive, posteriormente seu curador. No caso, durante a prestação de serviços sequer havia o pedido de curatela, de modo que o réu não estaria atuando como seu representante legal, o que de fato o excluiria pessoalmente da responsabilidade das dívidas assumidas em benefício da sua mãe. Há várias mensagens do réu dirigidas à autora, direcionando o trabalho, de modo que, não sendo ele, na ocasião, o seu curador, não se pode afastar o reconhecimento do vínculo de emprego. O conteúdo das conversas trocadas pelo réu com a autora e que foi disponibilizado no link que consta da inicial confirma que era o réu quem dava ordens e comandava a residência. ( https://drive.google.com/drive/folders/15NzptClmjEjOrav5kEoN63D4TLb9J_hV?usp=sharing) Desse modo, restou configurada entidade familiar típica, como se observa do depoimento pessoal do próprio réu. Vejamos a prova oral. A parte autora, em depoimento pessoal, fez as seguintes declarações: disse que trabalhava das 8:00 às 20 todos os dias, sem folga; que trabalhou de Junho a 05 de agosto; que foi dispensada pelo seu Luiz; que recebia R$100,00 por dia mas ele ficou devendo alguns plantões; que acha que ele ficou devendo R$1.800,00 de plantões; que não lembra quem é Ana Carolina Pfister.” O réu foi ouvido em depoimento pessoal e disse: “ inquirido, disse que é auditor fiscal do Estado; que atualmente está trabalhando em Três Rios; que seus dois irmãos abandonaram sua mãe e também não falam com depoente há um ano; que a autora trabalhou de fevereiro a julho de 2024 que foi contratada pelo seu irmão Augusto; que a autora foi contratada para atuar como cuidadora de sua mãe; que confirma os áudios encaminhados para a autora; que falava com a autora porque seus irmãos abandonaram sua mãe; que o depoente fez transferência via PIX de maio a julho para a autora; que pagava à autora R$100,00 por turno; que a autora fazia no mínimo uns três turnos por semana; que o depoente pediu a autora que ela contratar as pessoas até porque senão ficaria muito cansativo para ela; que a senhora Elaine também trabalhava no mínimo três turnos e recebia R$100,00 por plantão; que tanto a autora quanto a senhora Elaine e outras trabalhavam o plantão de 12 horas; que havia um rodízio; que cada uma trabalhava no mínimo três plantões por semana; que não havia um horário fixo; que elas se organizavam; que o depoente comprava alimentação tanto para as cuidadoras como para sua mãe; que as cuidadoras também cuidavam da casa; que não tem como especificar com precisão o período da Elaine, mas acha que foi parecido com o da dona Kátia; que não pagava o vale-transporte; que elas residiam perto que a dona Elaine começou um pouco depois da dona Kátia; que não tem como precisar exatamente os dias trabalhados, mas efetuou o pagamento por transferência via pix; que olhou em seu celular o nome das cuidadoras Ana Carolina, Cleusa, Mônica Oliveira, Selma, Silvia, Marta e Vitória; que a senhora Elaine e a senhora Kátia trabalhavam mais dias na semana, no mínimo três dias; que as outras trabalhavam menos vezes na semana; que não controlava a escala delas. Nada mais.” O depoimento do réu é esclarecedor, não sendo necessário ter ouvido testemunha, mas diante da insistência e do risco de nulidade da sentença, foi ouvida a testemunha por ele indicada que não trouxe nenhum fato relevante. Diante de todo o exposto, não há dúvidas de que a prestação de serviços deu-se em benefício tanto do réu, quanto de sua mãe, podendo qualquer um dos dois registrar o vínculo de emprego. Como o pedido foi formulado ao filho da sra. Wally, ele deve registrar o vínculo de emprego na CTPS. Julgo procedente o pedido de reconhecimento do vínculo de emprego no período de 08/06/2024 a 05/08/2024. Verbas rescisórias Nos termos da Súmula 212 do TST, presumo verdadeira a alegação de foi dispensada imotivadamente e julgo procedente o pedido de pagamento do aviso prévio de 30 dias, férias proporcionais, com acréscimo de 1/3, 13º salário proporcional, fgts, multa de 40%, multa do art. 477 da CLT. Deduza-se o valor de R$1.800,00 recebido pela autora como empréstimo e reconhecido em depoimento pessoal. Anotação da CTPS Em razão da projeção do aviso prévio, julgo procedente o pedido anotação da CTPS com datas de admissão e dispensa, respectivamente, em 08 de junho de 2024 e 05 de setembro de 2024, no cargo de cuidadora doméstica e salário de R$3.000,00. Salários de 24/07/2024 a 05/08/2024 Como o réu não comprovou o pagamento dos plantões desses dias 13 dias no valor diário de R$100,00, julgo procedente o pedido de pagamento do saldo de salários de 8 dias de salário de julho no valor de R$800,00 e 5 dias de saldo de salários de agosto no valor de R$500,00. Jornada de trabalho Alega a autora trabalhou todos os dias sem folgas das 08:00 às 20:00 e, em certas ocasiões, trabalhou 24 horas. Diz que trabalhou em 2 feriados: 13/06/2024 (Dia de Santo Antônio) e 06/07/2024 (aniversário da cidade), nunca gozou folgas. Relata que fez, ainda, a seguinte jornada: - Em 08/06/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 20:00 e trabalhou sem intervalos até as 20:00 do dia 10/06/2024: - Em 11/06/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 20:00 e trabalhou sem intervalos até as 20:00 do dia 12/06/2024: - Em 26/07/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 08:00 e trabalhou sem intervalo até as 20:00 do dia 27/07/2024 - Em 30/07/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 08:00 e trabalhou sem intervalo até as 08:00 do dia 05/08/2024: 12 plantões de 12 horas, 144 horas trabalhadas e 11 intervalos interjornadas suprimidos. Pede o pagamento do intervalo intrajornada, folgas com adicional de 100%, horas extras acima da 44ª hora semanal e feriados, sem reflexos. O réu reconheceu o trabalho em 3 dias na semana, dizendo que havia outras cuidadoras atuando no acompanhamento de sua mãe. Passo a decidir. Dispõe o Art. 12 da lei Complementars 150, de 1º de junho de 2015: “ É obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo. Art. 13. É obrigatória a concessão de intervalo para repouso ou alimentação pelo período de, no mínimo, 1 (uma) hora e, no máximo, 2 (duas) horas, admitindo-se, mediante prévio acordo escrito entre empregador e empregado, sua redução a 30 (trinta) minutos. § 1o Caso o empregado resida no local de trabalho, o período de intervalo poderá ser desmembrado em 2 (dois) períodos, desde que cada um deles tenha, no mínimo, 1 (uma) hora, até o limite de 4 (quatro) horas ao dia. § 2o Em caso de modificação do intervalo, na forma do § 1o, é obrigatória a sua anotação no registro diário de horário, vedada sua prenotação. Numa primeira leitura a conclusão seria aplicar a pena de confissão, presumindo-se verdadeira a jornada da inicial, em caso de ausência de controle de ponto. Todavia, algumas ressalvas precisam ser feitas. A parte ré não trouxe aos autos os controles de ponto, à luz do disposto no artigo 12 da LC 150 de 2015. Comungo do entendimento no sentido de que esse dispositivo legal deveria ser interpretado de forma sistemática com o artigo 74, §2º da CLT, não se exigindo do empregador doméstico a adoção do sistema de ponto quando tiver menos de 20 empregados. A regra imposta ao empregador doméstico é desproporcional, pois enquanto empresas estão dispensadas da marcação de ponto desde que tenham no máximo 20 empregados, o empregador doméstico deve fazê-lo com apenas um empregado. Da mesma forma, entendo ser desproporcional a aplicação da Súmula 338 do C. TST ao empregador doméstico. Neste sentido, citamos dois acórdãos deste Eg. TRT da 1ª Região, in verbis: VÍNCULO DOMÉSTICO. CONTROLE DE FREQUÊNCIA PARA EMPREGADOR COM MAIS DE 10 EMPREGADOS. Não tem sentido a lei ser mais exigente ao empregador doméstico, que não tem finalidade de lucro, do que com as empresas. Portanto, o art. 12 da Lei Complementar 150 de 2015 deve ser interpretado de forma sistemática, seguindo o princípio da não discriminação do empregador doméstico, sob o risco de ser encarada a interpretação como inconstitucional". (TRT-1 - RO 0101293-15.2017.5.01.0244, Relator Desembargador Ivan da Costa Alemão Ferreira, DEJT 05.06.2019) " RECURSO DA RECLAMANTE. HORAS EXTRAS. LEI COMPLEMENTAR Nº 150/2015. SÚMULA N. 338, DO TST. INAPLICABILIDADE. Quando editada a Súmula n. 338, do Eg. TST, estava em vigor o texto originário do parágrafo único, do art. 7º., da Constituição, que somente foi alterado pela Emenda n. 72 /2013. Mantida até hoje a redação de 2005 do mencionado verbete sumular, não há como supor a sua automática aplicação às relações de trabalho doméstico, cujas especificidades sequer foram cogitadas quando da edição desse mesmo verbete e, por certo, à luz da experiência da vida em sociedade (CPC, art. 375), não recomendam essa automática transposição de aplicação. Fazê-lo, seria um salto no extremo oposto, passando-se da injusta exclusão dos domésticos do direito às horas extras, como era na mencionada redação originária do dispositivo constitucional, para a injustiça da aplicação literal da exigência legal de controle escrito, sem considerar as peculiaridades de cada caso. Recurso da autora ao qual se nega provimento. (...)" (TRT-1 - RO: 01018444420165010045 RJ, Relator: EDUARDO HENRIQUE RAYMUNDO VON ADAMOVICH, Data de Julgamento: 27/04/2021, Terceira Turma, Data de Publicação: 04/05/2021) AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 . EMPREGADO DOMÉSTICO. HORAS EXTRAS. LEI COMPLEMENTAR 150/2015. ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DA APRESENTAÇÃO DOS CONTROLES DE PONTO. PRESUNÇÃO RELATIVA DE VERACIDADE DA JORNADA DE TRABALHO INDICADA NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. Recentemente, este Colegiado se manifestou a respeito da aplicação da Súmula 338, I, do TST na hipótese de vínculo de emprego doméstico, ao examinar o processo Ag-AIRR-1196-93.2017.5.10.0102 (Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 24/02/2023), oportunidade na qual se entendeu pela impossibilidade de condenação do empregador doméstico ao pagamento de horas extras pela mera presunção de veracidade da jornada declinada na inicial, à míngua de prova do direito constitutivo perseguido. II. Com efeito, se para a pessoa jurídica que explora atividade econômica a presunção de veracidade da jornada declinada na petição inicial somente ocorre para os estabelecimentos com mais de 20 (vinte) empregados ( CLT, art. 74, § 2º), não se pode, da mesma forma, aplicar a presunção de veracidade da jornada declinada na exordial no caso de empregador doméstico, pessoa física sem finalidade lucrativa. IV. A aplicação subsidiária da CLT é expressamente determinada pelo art. 19 da LC 150, observadas as peculiaridades do trabalho doméstico. V. Aplica-se a regra da distribuição do ônus da prova prevista no art. 818 da CLT, cabendo ao reclamante a comprovação dos fatos constitutivos de seu direito. VI. Na hipótese, o TRT registra as conclusões da sentença, na qual se indeferiu o pedido , sob a alegação de que o "reclamante não demonstrou o cumprimento da jornada declinada na inicial nem a supressão do intervalo intrajornada." VII. Logo, deve-se manter a improcedência dos pedidos relativos à jornada de trabalho, em razão da aplicação da distribuição do ônus da prova. Ileso, portanto, o art. 12 da LC 150/15. VIII . Não há falar em negativa de prestação jurisdicional, tendo em vista que a Corte Regional manifestou-se sobre os pontos relevantes para o deslinde da matéria. O inconformismo com a solução dada à lide não se confunde com a nulidade processual por ausência de prestação jurisdicional. IX. Assim, deve ser mantida a decisão agravada, na qual se manteve o óbice da art. 896, c, da CLT, aplicado pelo despacho de admissibilidade "a quo". X. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento. (TST - Ag-RRAg: 00001707420215130025, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 18/04/2023, 4ª Turma, Data de Publicação: 28/04/2023) Todavia, este não é o entendimento que vem prevalecendo no âmbito do C. TST: "(...) 2 - HORAS EXTRAS. EMPREGADO DOMÉSTICO. CONTROLE DE JORNADA . LC 150/2015. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. O artigo 12 da LC 150/2015 estabelece a obrigatoriedade do registro de horários pelo empregador doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo. Assim, a ausência de controle do horário de trabalho do empregado doméstico enseja a presunção relativa da jornada alegada na inicial, a qual pode ser elidida por prova em contrário. Pleiteado, portanto, em juízo o pagamento de horas extras, cabe ao empregador a demonstração da inexistência do direito postulado, o que não ocorreu na presente demanda. Agravo não provido" (AgAIRR-1001110-22.2018.5.02.0061, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 27/05/2022). Ressalvado meu entendimento, conclui-se que o ônus probatório acerca da jornada de trabalho, na relação jurídica de emprego doméstico, pertence ao empregador, presumindo-se, a partir do entendimento consagrado na Súmula nº 338, item I, do C. TST, a veracidade da jornada declinada na petição inicial na hipótese de ausência de juntada dos controles de ponto (exigência do art. 12 da LC 150/2015). Como o réu não anexou os controles de ponto, atraiu para si o ônus de afastar a jornada informada pela autora na petição inicial, por outros meios. Cabe verificar se há provas nos autos a anular a jornada de trabalho declinada na petição inicial. Vejamos a prova oral: A parte autora, em depoimento pessoal, fez as seguintes declarações: disse que trabalhava das 8:00 às 20 todos os dias, sem folga; que trabalhou de Junho a 05 de agosto; que foi dispensada pelo seu Luiz; que recebia R$100,00 por dia mas ele ficou devendo alguns plantões; que acha que ele ficou devendo R$1.800,00 de plantões; que não lembra quem é Ana Carolina Pfister.” Como não há provas de que a jornada informada na petição inicial não ocorria na prática, presumo verdadeira a seguinte jornada de trabalho: - trabalhou todos os dias sem folgas das 08:00 às 20:00 da manhã do dia seguinte, sem folgas e ainda nos dias: - Em 08/06/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 20:00 e trabalhou sem intervalos até as 20:00 do dia 10/06/2024: - Em 11/06/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 20:00 e trabalhou sem intervalos até as 20:00 do dia 12/06/2024: - Em 26/07/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 08:00 e trabalhou sem intervalo até as 20:00 do dia 27/07/2024 - Em 30/07/2024, a Reclamante iniciou a jornada de trabalho às 08:00 e trabalhou sem intervalo até as 08:00 do dia 05/08/2024: 12 plantões de 12 horas, 144 horas trabalhadas e 11 intervalos interjornadas suprimidos. - 2 feriados: 13/06/2024 (Dia de Santo Antônio) e 06/07/2024 (aniversário da cidade) e recebeu o valor de R$100,00. Julgo procedente o pedido de pagamento das horas extras, considerando-se como tais aquelas superiores a 44 horas semanais, adicional de 100% de folgas e feriados ( só é devido o adicional, pois recebeu por ter trabalhado). Como a autora tinha pausa para cuidados pessoais, dormir e se alimentar, entendo que havia ao longo do dia intervalos que somados chegavam a uma hora e julgo improcedente o pedido de pagamento do intervalo de uma hora Julgo procedente o pedido de pagamento do adicional noturno. Não houve pedido de reflexos das horas extras, folgas, feriados e adicional noturno. Vale transporte Alega que nunca recebeu vale-transporte e pede o valor do seu custeio. As reclamadas requerem em síntese a improcedência do pedido. Passo a decidir. O art. 7º do Decreto nº 95.247, de 1987, que regulamentava a Lei nº 7.418, de 1985, e mais recentemente, o art. 112 do Decreto n. 10.854, de 10 de novembro de 2021, dispõe que o empregado deve informar ao empregador por escrito ou por meio eletrônico seu endereço residencial, bem como os serviços e os meios de transportes mais adequados ao deslocamento residência-trabalho e vice-versa, para o exercício do direito de receber o vale-transporte. Em razão desta disposição, pressupõe-se que o empregador deve possuir todas essas informações na empresa, de forma que mesmo quando o empregado resida em local próximo e não use vale-transporte, o empregador deve possuir uma declaração do empregado que contenha o endereço de sua residência, bem como uma declaração de que não há de necessidade de receber vale-transporte. Em resumo, deve o empregador manter em seu poder um documento em que constem os dados relativos ao local de residência do empregado, para que possa se eximir de efetuar o pagamento do mesmo, quando for o caso. Essa é a melhor interpretação deste dispositivo legal, até porque seria praticamente impossível que o empregado pudesse comprovar que forneceu o requerimento de vale-transporte por escrito à empresa. Se tais documentos que o empregado elabora são direcionados à empregadora, presume-se que esta possui a guarda, devendo apresentar a documentação nos autos. Se a empregadora não os apresenta, presumem-se verdadeiras as alegações da parte autora, inclusive quanto ao trajeto, linhas de ônibus e valores das passagens utilizadas. Destaco, ainda, que nos termos do parágrafo único do art. 114 do Decreto n. 10.854, de 2021, “O empregador fica autorizado a descontar mensalmente o valor da parcela de que trata o inciso I do caput do salário básico ou vencimento do empregado que utilizar o vale-transporte”. O caput destaca o desconto de 6% do salário base ou vencimento “excluídos quaisquer adicionais ou vantagens”. A lei, portanto, autoriza o desconto quando o empregador concede o vale-transporte. Tendo em vista que não foi provado pela parte reclamada que concedia vale-transporte, julgo procedente em parte o pedido de pagamento de indenização correspondente ao vale transporte , considerando o transporte diário de R$21,20. Observe-se que não houve concessão deste benefício, mas conversão do benefício em indenização. Assim, não tendo sido o benefício concedido oportunamente, não há que se cogitar em desconto de 6%. Indenizações por dano moral – jornada exaustiva de trabalho, ausência de pagamento de salário Pretende a reclamante no rol de pedidos o pagamento de indenizações por dano moral: jornada exaustiva de trabalho e pela ausência de pagamento de salário . O réu requer a improcedência dos pedidos uma vez que não houve vínculo de emprego. Passo a decidir. Tenho a ressaltar que o dano moral é gênero que envolve diversas espécies de danos extrapatrimoniais, tais como: dano à imagem, dano estético, dano à honra, assédio moral e sexual, dano à intimidade, dano à vida privada, condutas discriminatórias, direitos de personalidade, bem como o dano existencial. Cabe destacar que a Constituição Federal de 1988 estipulou como princípios fundamentais, dentre outros, o da dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º da Constituição Federal). É verdade que a empresa possui ius variandi e, nesse contexto, ela detém o poder de gerir os negócios de forma livre, já que a nossa Carta Magna garante aos empresários, a livre iniciativa. E assim estabelece muitos princípios que favorecem a atividade econômica, a propriedade privada; em síntese, o direito individual (art. 1, inciso IV, e art. 170 da Constituição Federal). Todavia, estabelece também limites ao exercício desses direitos. O art. 1º, no mesmo inciso IV, da Constituição Federal, prevê como um dos fundamentos da República do Brasil, o valor social do trabalho e o “valor social da livre iniciativa”. É preciso ler com muita calma esse dispositivo constitucional, pois essa é a única conclusão que deles se pode tirar. Dispõe a Constituição Federal: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: Inciso IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”. Dessa expressão, interpreto que o legislador quis dizer: valor social do trabalho e valor social da livre iniciativa. E assim, a livre iniciativa deve estar atenta às questões sociais, oferecendo tecnologia, produção e empregos e sempre atenta, também, aos consumidores e aos trabalhadores. Outra não poderia ser interpretação, pois o art. 170 da Constituição Federal, previsto no título que trata da ordem Econômica e Financeira, dispõe no seu caput: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...)”. Estou certa de que está garantida a livre iniciativa, mas desde que atenta às questões sociais e desde que o trabalho humano seja valorizado. No inciso III, o art. 170 supracitado estabelece entre os princípios a “função social da propriedade”. A função social da empresa envolve sua responsabilidade em contribuir positivamente na sociedade, além do lucro. Ela deve criar situações que promovam a igualdade, meio ambiente saudável e seguro, adotando práticas éticas, buscando melhorar o bem-estar da comunidade em que atua (art.170 da Constituição Federal). Portanto, entendo que os princípios da ordem econômica se submetem ao princípio da dignidade do ser humano. Nesse sentido, a empresa tem direito de gerir seus negócios e pretender a lucratividade. Todavia, isso deve ser feito de forma a sempre respeitar os direitos de personalidade. Como afirma VENOSA, “os direitos da personalidade são os que resguardam a dignidade humana” (VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil v.1: parte geral. 3ª edição, Ed. Atlas, São Paulo: 2003. p.152). Por isso mesmo, são direitos inalienáveis, intransferíveis e ínsitos a todo ser humano e quem sofre uma agressão a eles passa a fazer jus a uma reparação. Como decorrência do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, temos como obrigação do empregador a Proteção da Saúde do Trabalhador e, portanto, de manter um meio ambiente de trabalho sadio. O meio ambiente não se limita ao local de trabalho, e de acordo com Raimundo Simão de Melo, em Direito Ambiental do Trabalho e a Saúde do Trabalhador, “abrange o local de trabalho, os instrumentos de trabalho, o modo de execução de tarefas e a maneira como o trabalhador é tratado pelo empregador ou pelo tomador de serviço e pelos próprios colegas de trabalho”. De acordo com o artigo 6º da Constituição Federal, a saúde é um direito social e o meio ambiente de trabalho sadio se insere nisto. O ambiente de trabalho sadio não é apenas aquele em que se observam as condições de segurança e higiene do trabalho, mas também a qualidade das relações interpessoais, que devem se pautar pelo respeito, confiança e colaboração. Conforme dispõe o art. 170, da Constituição Federal, a ordem econômica tem como primado a livre iniciativa, sendo princípio fundamental da nossa Lei Maior. Todavia, a livre iniciativa possui limite constitucional de atuação: devem ser respeitados os princípios da dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, sem os quais, não será possível preservar o princípio da busca do pleno emprego, também de previsão constitucional. A conduta do empregador ao sonegar direitos básicos traz repercussões importantes na vida do trabalhador que perde o acesso a um sistema de proteção. No mesmo sentido, destaco a seguinte ementa de acórdão: “DANO MORAL. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DO VINCULO DE EMPREGO NA CTPS. POSSIBILIDADE. A conduta do empregador ao sonegar direitos básicos de grande repercussão na vida do empregado, como a assinatura de sua CTPS, demonstra intolerável indiferença com as consequências daí advindas, impingindo sofrimento íntimo ao trabalhador, passível, portanto, de indenização por dano moral. (TRT-17 - RO: 00843004820095170011, Relator: DES. CARLOS HENRIQUE BEZERRA LEITE, Data de Publicação: 20/01/2011).” O dano existencial, que é espécie de dano moral, decorre de toda conduta que atinge um projeto de vida do empregado ou sua convivência familiar e social causando-lhe prejuízo pessoal ou ao desenvolvimento profissional. Consiste na violação dos direitos fundamentais das pessoas, garantidos pela Constituição Federal e que dela resulte algum prejuízo no modo de ser ou nas atividades executadas pelo indivíduo. Pode ocorrer quando não há repouso semanal por um longo período, quando não há fruição integral de intervalo intrajornada, quando não são concedidas férias, e pela sobrecarga de horas extras além do limite legal de forma habitual, de modo a causar um prejuízo concreto no modo de vida da pessoa com ou sem prejuízo à saúde psíquica, e/ou a um projeto de vida. Traz uma frustração que decorre da falta de realização pessoal do trabalhador que tem sua qualidade de vida reduzida. Os projetos podem ser profissionais ou pessoais, mesmo que não planejados, trazendo prejuízos na vida social do trabalhador, pois certamente a excessiva carga de trabalho impede que o trabalhador possa inclusive ter tempo para planejar e ter outros planos, além da sobrecarga para sua saúde. Por isso, revendo posicionamento anterior, entendo que a carga excessiva pela sua própria ocorrência não só diminui o tempo de descanso necessário para o trabalhador repor as energias, como prejudica o convívio familiar e tira o espaço para os sonhos e projetos de vida, o que evidentemente traz dissabor e angústia. O trabalho e a satisfação pessoal dignificam o ser humano, e a falta de pagamento da remuneração traz-lhe um prejuízo financeiro que causa consequências à sua alta estima e consideração. No caso dos autos, parte autora tinha jornada exaustiva, não recebia horas extras, não tinha folga semanal, além de ter ficado sem receber pelos seus plantões. Foi uma jornada extenuante em termos de horas de trabalho e também muito exaustiva considerando o caráter do cuidado de uma idosa com limitações físicas e psíquicas, o que demanda sobremaneira fisicamente e emocionalmente a trabalhadora. Além dos plantões diários, trabalhava em folgas, feriados e ainda, alguns dias, ultrapassava os plantões, permanecendo na casa da idosa sem sair para sua residência. Reconheço, portanto, o dano moral sofrido pela parte autora, ressaltando a dificuldade de se reparar o dano imaterial. O STF decidiu para ações diretas de inconstitucionalidade envolvendo a matéria (ADIs 6.050, 6.069 e 6.082), apensadas para fins de apreciação e julgamento conjuntos, que: ADI 6050/DF – “Ações diretas de inconstitucionalidade. 2. Reforma Trabalhista. Artigos 223-A e 223-G, §§ 1º e 2º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467/2017. Parâmetros para a fixação do quantum indenizatório dos danos extrapatrimoniais. 3. Ações conhecidas e julgadas parcialmente procedentes para conferir interpretação conforme a Constituição, de modo a estabelecer que: 3.1. As redações conferidas aos art. 223-A e 223- B, da CLT, não excluem o direito à reparação por dano moral indireto ou dano em ricochete no âmbito das relações de trabalho, a ser apreciado nos termos da legislação civil; 3.2. Os critérios de quantificação de reparação por dano extrapatrimonial previstos no art. 223-G, caput e §1º, da CLT deverão ser observados pelo julgador como critérios orientativos de fundamentação da decisão judicial. É constitucional, porém, o arbitramento judicial do dano em valores superior aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, quando consideradas as circunstâncias do caso concreto e os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade” (Ministro Relator Gilmar Mendes. Julgamento 26.06.2023. Publicação 18.08.2023) (grifado) Desse modo, tomando-se por base que, na esfera do empregador, a indenização tem caráter punitivo, com o objetivo de conscientizar o infrator, desestimulando-o a praticar novamente qualquer ato lesivo à dignidade dos seus empregados, deve ser fixado valor pelo magistrado levando em consideração os seguintes parâmetros: 1 - as condições pessoais (econômica/social) dos envolvidos (especialmente a condição econômica do ofensor); 2 – o tempo e a condição que perdurou a relação entre as partes; 3 – a gravidade e os reflexos pessoais e sociais da ofensa; 4 – a intensidade da dor da vítima; 5 - os meios utilizados para a ofensa; 6 – o caráter didático da medida. Considerando, ainda, o julgamento do STF que declarou constitucional o arbitramento judicial do dano em valores superior aos limites máximos dispostos nos incisos I a IV do § 1º do art. 223-G, julgo procedente o pedido de pagamento da indenização por danos morais que ora fixo no total de R$7.000,00 , diante do caso concreto, e observados os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade. Liquidação das parcelas A presente sentença é líquida, conforme planilha em anexo. Os valores históricos devidos à parte autora não ficam limitados àqueles postulados na inicial. Isso porque a determinação contida no §1º do artigo 840 da CLT quanto à indicação do valor dos pedidos deve ser entendida como mera estimativa da quantia pretendida pelo reclamante, e não a liquidação propriamente dita. Destaca-se, como já explicitado acima, que a parte autora ao ingressar com a ação não detém o conhecimento amplo daquilo que entende lhe ser devido, o que somente é adquirido mediante a análise da documentação que se encontra em poder do empregador. FGTS - depósito O Tribunal Superior do Trabalho editou 21 novas teses de recursos repetitivos (IRR), em reafirmação da jurisprudência da Corte, conforme julgamento que ocorreu no dia 24/2/25 no Tribunal Pleno, dentre eles a impossibilidade de pagamento de FGTS direto ao empregado: “Nas reclamações trabalhistas, os valores relativos aos recolhimentos do FGTS e da respectiva indenização de 40% devem ser depositados na conta vinculada, e não pagos diretamente ao trabalhador”. Processo: RRAg-0000003-65.2023.5.05.0201 Desse modo, os valores deverão ser depositados na conta vinculada do trabalhador para liberação posterior por alvará. Dedução e Compensação Deduzam–se as parcelas pagas sob idêntico título, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa. Imposto de renda Dispõe o art. 44 da Lei n° 12.350, de 20 de dezembro de 2010: “Art. 44 A Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 12-A: art. 12-A. Os rendimentos do trabalho e os provenientes de aposentadoria, pensão, transferência para a reserva remunerada ou reforma, pagos pela Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, quando correspondentes a anos-calendários anteriores ao do recebimento, serão tributados exclusivamente na fonte, no mês do recebimento ou crédito, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês. § 1o O imposto será retido pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento ou pela instituição financeira depositária do crédito e calculado sobre o montante dos rendimentos pagos, mediante a utilização de tabela progressiva resultante da multiplicação da quantidade de meses a que se refiram os rendimentos pelos valores constantes da tabela progressiva mensal correspondente ao mês do recebimento ou crédito. § 2o Poderão ser excluídas as despesas, relativas ao montante dos rendimentos tributáveis, com ação judicial necessárias ao seu recebimento, inclusive de advogados, se tiverem sido pagas pelo contribuinte, sem indenização. (...)” Desta forma, embora não seja adotado o valor pago mês a mês, a nova legislação estabeleceu um novo critério que alcança o mesmo resultado se a ré tivesse efetuado o pagamento das parcelas trabalhistas corretamente. Por isso, o cálculo do imposto de renda deverá observar a metodologia ora fixada na decisão. Destaco, ainda, que o FGTS é rendimento isento e não tributável, não estando, portanto, sujeito a recolhimento de imposto de renda, conforme art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988: “Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas: (...) V - a indenização e o aviso prévio pagos por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, até o limite garantido por lei, bem como o montante recebido pelos empregados e diretores, ou respectivos beneficiários, referente aos depósitos, juros e correção monetária creditados em contas vinculadas, nos termos da legislação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço; (...)” (grifado) Não é possível determinar que a parte ré venha a assumir integralmente o valor, pois mesmo que o empregador tivesse agido corretamente isso não aconteceria. Contribuição Previdenciária Declara-se que são indenizatórias e, portanto, não estão sujeitas ao recolhimento previdenciário, as parcelas: aviso prévio; férias indenizadas com acréscimo de 1/3; FGTS, indenização compensatória de 40%; multa do art. 467 da CLT, multa do artigo 477 da CLT, vale transporte, indenização por danos morais. Para fins de apuração de juros, correção monetária e multa sobre a contribuição previdenciária, devem ser observados os seguintes parâmetros para o cálculo da contribuição previdenciária: 1) para o período que a prestação se deu antes da nova redação do artigo 43 da Lei nº 8.212, de 1991, ou seja, antes de 05 de março de 2009: aplicação do regime de caixa - considera-se como fato gerador das contribuições previdenciárias decorrentes de créditos trabalhistas reconhecidos em juízo o efetivo pagamento das verbas trabalhistas, configurando-se a mora a partir do dia dois do mês seguinte ao da liquidação. Pelo que, para cálculo dos acréscimos legais (juros de mora e multa), aplica-se o disposto no artigo 276 do Decreto nº 3.048, de 1999, ou seja, para aquelas hipóteses em que a prestação do serviço se deu até o dia 4.3.2009, observar-se-á o regime de caixa (no qual o lançamento é feito na data do recebimento do crédito ou do pagamento que gera o crédito decorrente). 2) após a vigência da nova redação do artigo 43 da Lei nº 8.212, de 1991, ou seja, após 05 de março de 2009: o fato gerador da contribuição previdenciária passou a ser a prestação do serviço, conforme o artigo 43, §2º, da Lei nº 8.212, de 1991; e no §3º da referida lei instituiu-se o regime de competência para aplicação dos acréscimos legais moratórios, pois se passou a considerar o mês de competência em que o crédito é devido. Determino a incidência dos juros da mora sobre as contribuições previdenciárias não recolhidas, a partir da prestação de serviços, bem como a aplicação de multa a partir do exaurimento do prazo de citação para o pagamento, uma vez apurados os créditos previdenciários, se descumprida a obrigação, observado o limite legal de 20% (art.61, §2º, da Lei nº 9.430, de 1996). A competência da Justiça do trabalho para executar a parcela previdenciária está limitada aos valores incidentes sobre as parcelas reconhecidas como devidas na sentença ou no acordo. Assim, aquelas parcelas que foram pagas ao empregado durante o contrato de trabalho não devem ser incluídas no cálculo da parcela previdenciária. Esse é o entendimento consubstanciado na Súmula 368 do C. TST que dispõe: “A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário-de-contribuição.” Ressalto que a Súmula 53 do STF dispõe que: “A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança a execução de ofício das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir e acordos por ela homologados.” Cabe, ainda, destacar que a Justiça do Trabalho é incompetente para executar as contribuições do empregador destinadas a terceiros. Nesse sentido, destaco o Enunciado 74 aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho: “74. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS A TERCEIROS. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. A competência da Justiça do Trabalho para a execução de contribuições à Seguridade Social (CF, art. 114, § 3º) nas ações declaratórias, condenatórias ou homologatórias de acordo cinge-se às contribuições previstas no art. 195, inciso I, alínea a e inciso II, da Constituição, e seus acréscimos moratórios. Não se insere, pois, em tal competência, a cobrança de “contribuições para terceiros”, como as destinadas ao “sistema S” e “salário- educação”, por não se constituírem em contribuições vertidas para o sistema de Seguridade Social.” Por fim, friso que não é possível determinar que a parte ré venha a assumir integralmente o valor, pois mesmo que o empregador tivesse agido corretamente isso não aconteceria, motivo pelo qual a parte reclamada não é responsável pelo recolhimento da parcela previdenciária do empregado. Correção monetária e Juros Aplica-se a tese vinculante fixada nos julgamentos das ADI's 5867 e 6021 e ADC's 58 e 59, devendo ser adotado, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral, ou seja, o IPCA-E na fase pré-judicial e a taxa SELIC a partir do ajuizamento (art. 883 da CLT). A fase pré-judicial se dá a partir do vencimento das verbas (Súmula 381 do C.TST) até o ajuizamento da reclamação trabalhista. No mais, ressalta-se que, como fixado pela Suprema Corte, a Taxa SELIC não se acumula com nenhum outro índice, pois já engloba juros e correção monetária. Nos termos da Decisão do STF nos autos da ADC 58, aos créditos decorrentes da presente decisão serão aplicados correção monetária e juros nos seguintes termos: IPCAE e juros (TRD) na fase pré-judicial e SELIC após o ajuizamento. Honorários advocatícios Com o advento da Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, a Justiça do Trabalho passou a admitir os honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 791-A da CLT. Considerando que a presente ação foi ajuizada após 13.11.2017, data da entrada em vigor da Lei nº 13.467, de 2017, conclui-se que a nova redação do art. 791-A da CLT se aplica ao caso concreto, devendo ser interpretada de modo que seja preservado o direito fundamental de acesso à Justiça. Prevê o art. 791-A da CLT, com a redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017, que são devidos honorários de sucumbência, fixados entre 5% e 15% sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, devendo o juiz atentar, na fixação do percentual, para o grau de zelo do profissional; o lugar de prestação do serviço; a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. O art. 791-A, § 3º, da CLT estabelece que o juiz arbitrará os honorários quando for a hipótese de sucumbência recíproca, autorizando, portanto, nessa hipótese, certo grau de subjetividade. Diante da falta de disposição legal para a hipótese de sucumbência do trabalhador em parte ínfima do pedido, nos termos do art. 8º, caput e §1º, da CLT, aplico a norma prevista no art. 86 e parágrafo único do CPC de 2015, que trata de forma específica sobre a questão e dispõe nos seguintes termos: “Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas. Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários. “ Saliento que nas parcelas em que a questão meritória não é analisada, não há vencido, nem vencedor e, sendo assim, não há proveito econômico para nenhuma das partes. Desta forma, não são devidos honorários de sucumbência nos pedidos em que o mérito não foi analisado. Assim, considerando que a parte autora é sucumbente em parte ínfima do pedido, condeno a ré ao pagamento dos honorários sucumbenciais do advogado da parte autora em 10% do valor liquidado, e afasto qualquer condenação da parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais à parte ré. Aplica-se a Orientação Jurisprudencial nº 348 da SDI-1, de modo que os honorários advocatícios devem ser calculados sobre o valor bruto da execução, excluindo-se a cota-parte previdenciária patronal, se houver, verba destinada a terceiro (INSS). Dispositivo Posto isso, decide esse juízo julgar, em face de LUIZ HENRIQUE PICCAGLIA PEREIRA CARDOSO, PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados por KATIA MARIA POMBINHO , na forma da fundamentação supra, que a este decisum integra para todos os efeitos. Custas de R$ 910,17, pela ré, calculadas sobre o valor de R$ 36.406,74 da condenação. Há obrigação de fazer. A sentença é líquida, conforme planilha de cálculos em anexo. Dê-se ciência ao INSS, D.R.T. e Receita Federal, com a cópia da presente. Observem-se os períodos de suspensão e interrupção do contrato de trabalho. Deverá a parte reclamada recolher os valores devidos a título de INSS e Imposto de Renda, deduzindo-se as parcelas devidas pela parte autora, na forma da Súmula 368 do TST, no que couber, observando-se o disposto no art. 44 da Lei n° 12.350, de 20 de dezembro de 2010. Ficam indeferidos requerimentos de notificação a/c de um advogado específico, ressaltando que todos os habilitados poderão receber a notificação. Se a parte ainda pretender a intimação a/c de um advogado e existirem mais advogados habilitados, deverá requerer expressamente a exclusão da habilitação daqueles que não deverão ser notificados. Ficam as partes também cientes que: 1- devem diligenciar no sentido de que os advogados habilitados estejam devidamente autorizados a atuar nos autos, conforme art. 104 do CPC de 2015 e art. 16 da Instrução Normativa 39 de 2016 do TST, especialmente porque as notificações e/ou intimações serão dirigidas aos credenciados no sistema. 2- os advogados constituídos deverão se habilitar diretamente via sistema, utilizando a funcionalidade específica, ficando indeferidos requerimentos de habilitação pela Secretaria, bem como de notificação a advogados não habilitados via sistema. Com a intimação automática da presente, as partes tomam ciência dessa sentença. Oficie-se ao INSS para ciência a fim de que possa fiscalizar eventuais incorreções acerca do recolhimento previdenciário. E, para constar, editou-se a presente ata, que vai assinada na forma da lei. Cissa de Almeida Biasoli Juíza do Trabalho CISSA DE ALMEIDA BIASOLI Juíza do Trabalho Titular
Intimado(s) / Citado(s)
- LUIZ HENRIQUE PICCAGLIA PEREIRA CARDOSO