Andre Santos Silva e outros x Marina Bastos Da Porciuncula Benghi e outros
Número do Processo:
0200907-77.2024.8.06.0043
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJCE
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
1ª Vara Cível da Comarca de Barbalha
Última atualização encontrada em
23 de
abril
de 2025.
Intimações e Editais
-
As atualizações mais recentes estão bloqueadas.
Assine para desbloquear as últimas atualizações deste processo. -
23/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Barbalha | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO-TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BARBALHA Fórum Dr.Rotsenaidil Duarte Fernandes Távora Rua Zuca Sampaio, s/n, Vila Santo Antônio - CEP 63.180-000 Whatsapp (85) 98122-9465 - Telefone fixo (85) 3108-1832 E-mail: barbalha.1civel@tjce.jus.br SENTENÇA Processo nº: 0200907-77.2024.8.06.0043 AUTOR: FRANCISCA XAVIER LIMA REU: BANCO DAYCOVAL S/A RELATÓRIO Vistos, etc. Cuida-se de ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito c/c indenização por danos morais e materiais ajuizada por Francisca Xavier Lima em face do Banco Daycoval S.A. O promovente afirma, em síntese, que notou a existência de descontos em seu benefício previdenciário, oriundo de empréstimo consignado, via cartão de crédito, na modalidade RMC. Afirma que conseguiu realizar o cancelamento da contratação e devolução dos valores recebidos indevidamente. Requereu, ao final, a repetição em dobro dos valores pagos a título de taxas de TED para a devolução dos valores recebidos, além de compensação financeira por danos morais. O Banco apresentou contestação (ID 111651107). Afirmou o cancelamento do contrato. Sustentou a existência e validade da contratação. Nesses termos, pugna pela inexistência de ato ilícito, inaplicabilidade da repetição do indébito e inexistência de dano moral e, ao final, requer que a ação seja julgada improcedente. Réplica (ID 127221662). Decisão saneadora (ID 128110782). Intimando o promovido acerca da realização da perícia grafotécnica, o promovido manifestou desinteresse na prova pericial grafotécnica (ID 150169151). É o relato. Decido. FUNDAMENTAÇÃO De início, estão presentes os pressupostos processuais de existência e de validade da relação jurídica processual, motivo pelo qual enfrentarei o mérito. O caso comporta julgamento antecipado da lide por ser a causa de direito e de fato, sendo dispensável a produção probatória em audiência, na forma do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil. É cediço que a relação travada entre os litigantes é decorrente de uma relação de consumo e, por isso, o julgamento do presente ação será feita sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. No microssistema da lei consumerista, a responsabilidade por danos prescinde de persecução de natureza subjetiva em relação ao causador do dano, caracterizando-se somente pela comprovação do evento danoso, da conduta do agente e do nexo entre o ato praticado e o dano sofrido, ressalvadas as excludentes legais. Para o deslinde da ação, é necessária a análise da seguinte questão controvertida: se o contrato de ID'S 111651115 e 111651121, foi firmado pelo promovente e, em caso negativo, se há responsabilidade civil do promovido. A parte autora afirmou jamais ter contratado o empréstimo consignado com a ré. Assim sendo, por se tratar de prova de fato negativo, a demonstração de que foi celebrado algum negócio jurídico entre as partes é da parte que alega a existência do fato. Incabível exigir a prova de fato negativo à parte autora, isto é, a comprovação de que não firmou o contrato de empréstimo consignado, caberia ao demandado a comprovação de que a demandante efetuou a contratação. Consoante a lição de Nagib Slaibi Filho: "Na ação declaratória negativa, o juiz afirma a inexistência da relação jurídica ou a inaltenticidade do documento. Em face do princípio de que não é cabível a exigência de prova negativa, nas ações declaratórias negativas, cabe ao demandado provar o fato que o Autor diz não ter existido. (SLALIB FILHO, Nagib, Sentença Cível: fundamentos e técnica. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 241). Na espécie, a instituição financeira promovida se eximir da responsabilidade civil, mediante a apresentação de contratação eletrônica, com validação mediante selfie e assinatura eletrônica. Sucede que, tendo em conta o contexto dos autos, não se pode firmar que houve consentimento informado na contratação do empréstimo. Embora os avanços tecnológicos tenham possibilitado novas formas de contratação e aquisição de produtos e serviços, em diversas esferas, garantindo inclusive celeridade nas transações, é importante que não se perca nesse caminho o princípio basilar nas relações de consumo, qual seja, a boa-fé objetiva, que tem como consectários o dever da transparência, da informação e da segurança para com os consumidores. A simples juntada de contrato com assinatura eletrônica não reconhecida pelo autor não é meio hábil para se comprovar a contratação, até porque o banco réu sequer apresentou comprovante do envio e recebimento, pelo consumidor, de cópia do contrato, nem tampouco comprovou ter enviado qualquer tipo de mensagem ao número de telefone de titularidade da parte, dela exigindo o aceite e a conclusão da operação. Nem mesmo se interessou em demonstrar onde se encontram instalados os terminais de computadores objeto dos IPs expressamente individualizados no contrato. Não há nos autos certificação digital idônea e hábil a demonstrar que a contratação foi, de fato, formalizado com o autor e que não se trata de fraude, tão comum nos dias atuais. Nesse contexto, negando o requerente a sua manifestação de vontade no contrato descrito na exordial e levando-se em conta que era ônus do banco réu a prova de que, de fato, houve a expressa solicitação pelo autor do contrato de empréstimo consignado, a simples exibição de cópia do contrato, com biometria facial colhida na celebração do suposto ajuste, não é providência suficiente e bastante a comprovar a anuência do cliente, até porque o fornecimento da imagem pode ter sido feito para outras distintas finalidades. Ressalte-se, ademais, que a ré sequer requereu prova pericial para atestar a regularidade da contratação digital, com a assinatura eletrônica - biometria facial, apesar de intimada para tal finalidade, na forma do artigo 429, II, do CPC. Nesse viés, conforme recente decisão do STJ, proferida em sede de recursos repetitivos, "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)." (STJ - REsp: 1846649 MA 2019/0329419-2, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 24/11/2021, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 09/12/2021). Portanto, incumbia à instituição financeira comprovar por outros meios que o demandante consentiu com a contratação e que tinha plena ciência dos termos dos empréstimos, o que não ocorreu, evidenciando, assim, a inobservância do dever de informação (art. 6º, III, Código de Defesa do Consumidor) e a existência de vício de consentimento. Nesse sentido, EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E DANOS MORAIS - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA APELANTE - BIOMETRIA FACIAL - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - INEXISTÊNCIA DE PROVA DA RELAÇÃO CONTRATUAL - DEVER DE INDENIZAR - RESPONSABILIDADE OBJETIVA. A contratação realizada por meio eletrônico, formalizada por biometria facial, no entanto, não demonstrada a veracidade e expressa regularização do ato de vontade, demonstra inexistência de negócio jurídico e a indevida cobrança, não demonstrando o réu culpa do autor. Configurado o dano moral indenizável, devendo ser mantida a sentença. Em razão de negativa ao provimento do recurso da parte ré, majorados os honorários recursais. (TJ-MG - AC: 10000221105307001 MG, Relator: Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado), Data de Julgamento: 21/07/2022, Câmaras Cíveis / 13ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 22/07/2022) Nessa ordem de ideias, não há provas suficientes a demonstrar que o titular do benefício de fato firmou o contrato. De outra banda ainda que demonstrada a ação de um falsário, tal fato não exclui a negligência do requerido na correta conferência dos dados para a realização de transações comerciais. A empresa deveria se cercar de maior cautela evitando prejuízos a terceiros. Poderia diligenciar no sentido de encaminhar contrato escrito, exigir documentação comprobatória de dados ou a presença da parte contrária, bem como ter liberado o valor mediante transferência eletrônica, não simplesmente por ordem de pagamento. Assim não agindo, deixou vulnerável todos aqueles inseridos no mercado consumidor que, por infortúnio, fossem alvos de fraudadores. O nexo causal entre a conduta do promovido e o dano suportado pelo promovente permanece intacto, ainda que com a intervenção de terceiro de má-fé. Se a parte ré tivesse agido cumprindo o dever de cuidado ditado pela legislação em vigor, o fato não teria ocorrido como ocorreu. Nesse sentido, a jurisprudência: Ação de INDENIZAÇÃO por DANOS MORAIS - Utilização, perante a concessionária de serviço público de telefonia celular, de DOCUMENTOS FALSOS - Utilização da linha telefônica e não-pagamento das contas - Inscrição indevida do nome do devedor nos órgão de proteção ao crédito - Cabimento de INDENIZAÇÃO por DANOS MORAIS - Minoração do quantum fixado na sentença. - Restando demonstrado que terceira pessoa se utilizou de DOCUMENTOS FALSOS para a aquisição de linha de telefonia celular, deve-se concluir que a concessionária do serviço público agiu com negligência ao disponibilizar a linha. - Havendo inclusão, por parte da concessionária, do nome do suposto devedor no SERASA, devida se mostra a INDENIZAÇÃO por DANOS MORAIS. - O dano moral decorre da própria inclusão nos cadastros de proteção ao crédito, sendo desnecessária a comprovação do efetivo prejuízo sofrido pela parte. - Sendo o valor fixado na sentença, a título de INDENIZAÇÃO, exorbitante, deve-se proceder à sua minoração. Apelação Cível nº 385.472-6, da Comarca de VAZANTE, sendo Apelante(s): TELEGOIÁS CELULAR S.A. e Apelado(a)(os)(as): GERALDO COSTA DA SILVA, Presidiu o julgamento o Juiz MOREIRA DINIZ (Revisor, vencido) e dele participaram os Juízes PEDRO BERNARDES (Relator) e NEPOMUCENO SILVA (Vogal). Nessa ordem de ideias, reconheço a irregularidade na contratação. No que diz respeito ao pedido de danos materiais, considerando a nova orientação do STJ firmada no RESP Nº 1.413.542 - RS (2013/0355826-9), no sentido de que "a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo.", os valores pagos a título de taxas de TED devem ser devolvidos em dobro. Passo à análise do pedido de indenização por danos morais. A parte autora pretende a condenação do réu em danos morais, em virtude de o banco ter depositado indevidamente em sua conta valores referentes a um empréstimo consignado que alega não ter contratado. Afirma que há dano moral porque os valores depositados, posteriormente seriam cobrados no benefício da promovente. Além disso, alega que necessitou se deslocar até a agência bancária para conseguir devolver os valores. Em que pese a situação descrita, entendo que não há suporte fático capaz de gerar dano moral, seja porque não foi efetivado qualquer desconto, seja porque não se observou, na hipótese, ofensa a direitos da personalidade, capaz de causar intenso sofrimento anímico ou imposição de situação extremamente vexatória, a desbordar da normalidade. Na hipótese, o direito tutela o dano efetivamente ocorrido, e não dados meramente hipotéticos. Caracterizou-se, em verdade, mero aborrecimento, tribulação comumente experimentada no dia a dia da vida moderna, fato que, à toda evidência, não provoca dano psicológico ou traumatiza particularmente a pessoa. Nesse sentido: Apelação. Ação declaratória de inexistência de contrato de empréstimo consignado c.c. indenização por dano moral. Sentença de procedência. Recurso da parte ré. 1. Pretensão resistida. Caracterização. Embora tivesse reconhecido a inexistência do contrato em contestação, o réu só deixou de efetuar os descontos na aposentadoria da autora por força de liminar, contra a qual, inclusive, interpôs agravo de instrumento. 2. Dano moral não caracterizado. Embora comprovada a não contratação, houve, na hipótese, mero dissabor sem consequência de abalo da honra objetiva da autora, considerando que nenhum desconto foi efetivado. 3. Sentença reformada, para julgar o pedido parcialmente procedente. Sucumbência recíproca. Recurso parcialmente provido(TJSP; Apelação Cível: 1000884-28.2020.8.26.0352; Relator: Elói Estevão Troly Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 08/06/21) APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZATÓRIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. NÃO REALIZAÇÃO DE DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO, NO CASO.\n1. O reconhecimento do dano extrapatrimonial possui um caráter fragmentário, ou seja, não é todo transtorno cotidiano que pode ser considerado como causador do dano em comento, mas sim, apenas aquelas situações de extensa lesividade, reputadas pelo senso comum como graves e aviltantes e, portanto, completamente fora da normalidade das relações sociais é que podem ser consideradas aptas a caracterizar o dano extrapatrimonial.\n2. Logo, no caso, andou bem o Juízo 'a quo' em julgar improcedente o pedido de reparação moral, pois sequer houve o desconto de qualquer parcela do empréstimo não contratado pela autora em seu benefício previdenciário, não tendo sido comprovada, ademais, a ocorrência de qualquer outra situação passível de configurar dano moral.\n2. Honorários advocatícios mantidos no patamar arbitrado em primeiro grau, por se tratar de demanda de baixa complexidade e repetitiva.\nAPELAÇÃO DESPROVIDA, DE PLANO. (TJ-RS - AC: 50005297420218210021 RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Data de Julgamento: 09/11/2021, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: 09/11/2021) Portanto, por não vislumbrar a existência de dano moral a ser compensado, o pedido é improcedente DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, assim o faço com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: a) condenar o requerido a restituir ao autor, de forma dobrada, os valores pagos a título de taxas de TED, acrescido de juros de mora contados do evento danoso (Súmula 54 do STJ) na ordem de 1% ao mês, e correção monetária pelo INPC contada do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ); Observando a modulações dos efeitos contida no ERESP 1.4135.42/RS, destaco que a restituição dos valores pagos indevidamente, deve se dar em dobro relativamente aos valores descontados indevidamente a partir de 30/03/2021, data da publicação do respectivo acórdão. Consequentemente, com relação aos débitos anteriores a referida data, a devolução deverá ocorrer na forma simples. A sucumbência foi recíproca. Condeno a parte demandada na metade das custas processuais, além de honorários de advogado em 10% do valor atualizado da condenação. Condeno a parte promovente na metade do custo financeiro do processo; honorário de sucumbência em 10% do pedido atualizado de danos morais. Suspensa a exigibilidade por força da gratuidade da justiça, relativamente à parte autora. Após o início da produção de efeitos da Lei 14.905/2024, em 60 dias de sua publicação em 1º/07/2024, a correção monetária será pelo índice IPCA; os juros de mora serão pela Taxa Selic (deduzido o índice de atualização monetária - IPCA) Com o trânsito em julgado, arquivem-se. Expedientes necessários. Barbalha/CE, data da assinatura. Marcelino Emídio Maciel Filho Juiz de Direito yam
-
23/04/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)