Edgard Rosario Reis x Banco Bmg Sa e outros

Número do Processo: 0505117-33.2019.8.05.0001

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJBA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 12ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
Última atualização encontrada em 27 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 27/06/2025 - Intimação
    Órgão: 12ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA   12ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR  Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 0505117-33.2019.8.05.0001 Órgão Julgador: 12ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR AUTOR: EDGARD ROSARIO REIS Advogado(s): JORGE OTAVIO DOS SANTOS (OAB:BA16246) REU: BANCO BRADESCO SA e outros (3) Advogado(s): CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS (OAB:BA37489), FÁBIO FRASATO CAIRES (OAB:BA28478-A), LOURENCO GOMES GADELHA DE MOURA (OAB:PE21233), PAULO ANTONIO MULLER (OAB:RS13449) SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ajuizada por EDGARD ROSARIO REIS em face de BANCO BRADESCO S/A, BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A, BANCO BMG S/A e BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A. Em síntese, alega o autor que é operador de máquina e veículo, servidor público municipal de Salvador, e foi surpreendido com descontos indevidos em seu contracheque, decorrentes de empréstimos consignados que afirma desconhecer. Sustenta que não contraiu os empréstimos e não recebeu os valores correspondentes, requerendo a declaração de nulidade dos contratos, a devolução em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00. Deferida a gratuidade da justiça e a prioridade de tramitação em razão da idade do autor (ID 253123356). As partes rés apresentaram contestações sustentando a regularidade das contratações e apresentando os respectivos contratos e comprovantes de liberação dos valores. O BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A alegou em sua contestação (ID 253123730) que o autor já havia reconhecido anteriormente um dos contratos em ação no juizado especial, demonstrando conhecimento da contratação. O BANCO BMG S/A apresentou defesa (ID 253124238) juntando os contratos e comprovantes de transferência dos valores. O BANCO BRADESCO S/A e BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A contestaram (ID 253124321) arguindo preliminares e sustentando a validade das contratações. O autor apresentou réplica (ID 253125163) impugnando os contratos apresentados e reiterando o desconhecimento das contratações. Realizada perícia grafotécnica (ID 452234999), que concluiu parcialmente pela falsidade de algumas assinaturas. O BANCO BMG S/A manifestou-se sobre o laudo pericial (ID 454587922) reconhecendo que um dos contratos teve assinatura considerada inautêntica, mas ressaltando que houve liberação do valor correspondente. O BANCO BRADESCO S/A e BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A apresentaram parecer de assistente técnico (ID 456064221) concordando com as conclusões periciais quanto à autenticidade das assinaturas nos contratos a eles relacionados. Encerrada a instrução (ID 470868608), as partes apresentaram suas alegações finais. O autor reiterou os pedidos iniciais (ID 471838156), enquanto os bancos BRADESCO pugnaram pela improcedência e condenação do autor por litigância de má-fé (ID 475734259 e 475734262). É o relatório. Decido. A controvérsia cinge-se a verificar a existência ou não de relação jurídica entre as partes quanto aos empréstimos consignados questionados e, consequentemente, a legitimidade dos descontos no salário do autor. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor, que prevê a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços. No caso em tela, as partes rés sustentaram a regularidade das contratações, apresentando contratos supostamente assinados pela parte autora. No entanto, o laudo pericial grafotécnico (ID 452234999) concluiu de forma categórica pela falsidade das assinaturas atribuídas ao autor em dois dos contratos apresentados pelas rés:   "1 - As assinaturas constantes das Peças Questionadas 'A' e 'E', supostamente pactuadas com os BANCO BONSUCESSO (Contrato nº 0074951710) e BANCO BMG S/A (Contrato CX:163704 - PS:34 - DC: 242632691), não foram emanadas do punho escritor do Sr. Edgard Rosário Reis. 2 - As demais assinaturas constantes dos contratos celebrados e seus anexos, foram emanadas do punho escritor do Sr. Edgard Rosário Reis." O estudo pericial foi detalhado e criterioso, tendo sido identificadas divergências significativas entre as assinaturas padrão do autor e aquelas constantes nos documentos questionados, incluindo elementos como forma e formação das letras, ataques e remates, calibre, laçadas, valores angulares e curvilíneos, andamento gráfico, ligações laterais, inclinação axial, espaçamentos interliterais e aspecto pictórico. Quanto aos demais contratos, a perícia concluiu pela autenticidade das assinaturas, o que demonstra que o autor efetivamente contratou esses empréstimos com os BANCOS BRADESCO S/A, BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A e um dos contratos com o BANCO BMG S/A. Merece destaque o fato de que o BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A não se manifestou sobre o laudo pericial, conforme certificado (ID 457313107), configurando concordância tácita com suas conclusões. Assim, tendo sido comprovada por meio de prova técnica a falsidade das assinaturas atribuídas ao autor nos documentos apresentados pela ré, e não havendo outros elementos probatórios que possam sustentar a existência de relação jurídica válida entre as partes, conclui-se que não houve contratação legítima pelo autor do empréstimo consignado em questão. Consequentemente, os débitos atribuídos ao autor são inexigíveis. Destaque-se que a empresa ré, ao apresentar defesa, não comprovou a legitimidade da contratação por outros meios além do documento cuja falsidade restou demonstrada, ônus que lhe incumbia nos termos do art. 373, II, do CPC e do art. 14, § 3º, do CDC. Além disso, a ré não demonstrou ter adotado as cautelas necessárias à verificação da identidade do contratante, evidenciando falha na prestação do serviço que, no contexto da responsabilidade objetiva aplicável às relações de consumo, impõe o dever de indenizar. Assim, tendo sido comprovada por meio de prova técnica a falsidade das assinaturas atribuídas ao autor nos contratos do BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A (nº 0074951710) e do BANCO BMG S/A (CX:163704 - PS:34 - DC: 242632691), conclui-se que não houve contratação legítima pelo autor desses específicos empréstimos consignados. Quanto aos demais contratos, cuja autenticidade das assinaturas foi atestada pela perícia, os pedidos são improcedentes, devendo ser mantidos os descontos correspondentes. No tocante à indenização por danos morais, o STJ consignou que "a fraude bancária, ensejadora da contratação de empréstimo, por si só, não é suficiente para configurar o dano moral, havendo necessidade de estar aliada a circunstâncias agravantes. Precedentes" (AgInt no AREsp 2.149.415/MG, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe de 1º/6/2023).  Não se observa violação a direito da personalidade, de modo que os fatos narrados na inicial configuram-se como mero dissabor e aborrecimento cotidianos não indenizáveis.  Quanto à restituição em dobro, conforme o entendimento do STJ, "a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EREsp nº 1.413.542/RS). Contudo, a aplicabilidade da referida orientação foi modulada para que incida apenas nas cobranças indevidas realizadas após 30/3/2021. Ausente prova inequívoca de má-fé da requerida, a devolução em dobro somente incidirá a partir desta data, uma vez que cabe à instituição financeira o dever de cuidado nas operações bancárias, de modo a assegurar a anuência do devedor na contratação dos serviços. No que pertine à correção monetária, a Lei 14.905, embora formalmente válida, revela-se materialmente inconstitucional quando analisada à luz do artigo 5º, XXXII da Constituição Federal, que estabelece como dever do Estado a proteção do consumidor, princípio este reafirmado no artigo 170, V, que eleva a defesa do consumidor à condição de princípio da ordem econômica. Conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal nas ADIs 4357 e 4425, que declararam a inconstitucionalidade da utilização da TR (Taxa Referencial) como índice de correção monetária por não refletir a perda do poder aquisitivo da moeda, verifica-se que a Lei 14.905/24 incorre em semelhante vício ao adotar mecanismo que prejudica o consumidor em desacordo com a proteção constitucional que lhe é garantida. O STF, ao julgar as referidas ADIs, estabeleceu que índices de atualização que não preservam o valor real das obrigações violam o direito de propriedade e o princípio da segurança jurídica, raciocínio este plenamente aplicável ao caso em tela. Deste modo, declaro incidentalmente a inconstitucionalidade da Lei 14.905/24, afastando sua aplicação ao caso concreto, sem prejuízo de sua validade formal no ordenamento jurídico, até pronunciamento definitivo da Suprema Corte em sede de controle concentrado. Por conseguinte, deverá ser aplicado o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) como índice de correção monetária no presente caso, por melhor refletir a desvalorização da moeda e preservar o poder de compra do consumidor. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: 1. DECLARAR a inexistência dos contratos de empréstimo consignado do BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A (nº 0074951710) e do BANCO BMG S/A (CX:163704 - PS:34 - DC: 242632691); 2. CONDENAR o BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A e o BANCO BMG S/A à devolução em dobro dos descontos posteriores a 30/03/2021, e na forma simples em relação aos anteriores a esta data, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir de cada desconto e acrescidos de juros legais de 1% ao mês a partir da citação; 3. JULGAR IMPROCEDENTES os pedidos em relação aos demais contratos cuja autenticidade das assinaturas foi comprovada pela perícia. 4. INDEFERIR o pedido de danos morais, nos termos já fixados. Considerando que o autor decaiu parcialmente de seus pedidos e que dois dos quatro réus foram condenados, condeno o BANCO BONSUCESSO CONSIGNADO S/A e o BANCO BMG S/A ao pagamento, em partes iguais, de 50% das custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre os valores das respectivas condenações, nos termos do art. 85, §2º, do CPC. Igualmente, condeno o autor ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários advocatícios em favor do BANCO BRADESCO S/A, BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A e BANCO BMG, fixados em 10% sobre o valor atribuído aos pedidos julgados improcedentes, observada a suspensão da exigibilidade por ser beneficiário da gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, §3º, do CPC. Para apuração do quantum debeatur, DETERMINO a liquidação por cálculos aritméticos, devendo a parte interessada apresentar demonstrativo discriminado dos valores descontados, por contrato e por mês. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, não havendo requerimentos, arquivem-se os autos com baixa.   SALVADOR - REGIÃO METROPOLITANA/BA, 10 de junho de 2025. Elke Figueiredo Schuster Juíza de Direito