Processo nº 07013846920258070014

Número do Processo: 0701384-69.2025.8.07.0014

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJDFT
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Juizado Especial Cível do Guará
Última atualização encontrada em 27 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 27/06/2025 - Intimação
    Órgão: Juizado Especial Cível do Guará | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
    Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS JECIVGUA Juizado Especial Cível do Guará Número do processo: 0701384-69.2025.8.07.0014 Classe judicial: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) REQUERENTE: ADELIA BARBOSA DE CARVALHO REQUERIDO: MERCADO PAGO INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA, SAMSUNG SDS LATIN AMERICA TECNOLOGIA E LOGISTICA LTDA. SENTENÇA Trata-se de procedimento regulado pela Lei 9.099/95 proposto por ADELIA BARBOSA DE CARVALHO em desfavor de MERCADO PAGO.COM REPRESENTAÇÕES LTDA e SAMSUNG SDS GLOBAL SCL LATIN tendo por fundamento rescisão contratual, devolução de quantia paga e dano moral experimentado. A autora narrou que, em 24/11/2024, adquiriu da parte requerida uma lava e seca Samsung WD11M 11 KG, pelo preço de R$ 3.271,14, pago por meio de transferência via PIX, em compra realizada na plataforma de venda virtual da primeira requerida. Relatou que, ao receber o produto, constatou que a voltagem estava errada (127V), incompatível com a rede elétrica de sua residência. Entrou em contato com as requeridas, que prometeram recolher o produto errado e encaminhar um novo com a voltagem correta. Contudo, ao receber o segundo produto, verificou que novamente a empresa havia encaminhado o objeto com a mesma voltagem do anterior. Informou que solicitou o cancelamento da compra, tendo a primeira requerida alegado que o estorno seria realizado, o que não ocorreu até a propositura da ação. Alegou ter sofrido dano moral pelo tempo desperdiçado para resolver a questão sem sucesso. Assim, pediu a condenação das requeridas, solidariamente, à rescisão do contrato, com a restituição do valor pago de R$ 3.271,14, devidamente corrigido e atualizado, bem como à indenização por danos morais no valor de R$ 9.813,00. A primeira requerida, MERCADO PAGO.COM REPRESENTAÇÕES LTDA, em sua defesa, suscitou preliminar de ilegitimidade passiva, alegando que a EBAZAR.COM.BR LTDA seria a parte legítima para figurar no polo passivo da demanda. No mérito, argumentou que o produto foi devidamente entregue à autora, inexistindo prejuízo decorrente da transação contestada. Sustentou que a voltagem do produto estava claramente descrita no anúncio, de modo que a autora estava ciente antes mesmo de realizar a compra. Alegou, ainda, ausência de danos materiais e morais. A segunda requerida, SAMSUNG SDS GLOBAL SCL LATIN, em sua contestação, arguiu preliminar de ilegitimidade passiva, sustentando que é responsável apenas pelo transporte dos produtos, não tendo qualquer ingerência sobre a fabricação, embalagem ou comercialização dos mesmos. No mérito, afirmou que o produto foi entregue sem ressalvas, tendo cumprido seu papel no contrato de transporte. Argumentou que não há comprovação de que o produto recebido é divergente daquele adquirido e que a entrega foi realizada conforme as especificações da nota fiscal. Designada e realizada audiência de conciliação, a tentativa de acordo entre as partes presentes restou infrutífera. É o relato do necessário, na forma do art. 38, caput, da Lei 9.099/1995. FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARES ILEGITIMIDADE PASSIVA Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelas demandadas, razão não lhes assiste. Para que se compreenda a legitimidade das partes, é preciso estabelecer-se um vínculo entre o autor da ação, a pretensão trazida a juízo e o réu. Ainda que não se configure a relação jurídica descrita pelo autor, haverá de existir pelo menos uma situação jurídica que permita ao juiz vislumbrar essa relação entre a parte demandante, o objeto e a parte demandada. Desse modo, a legitimidade para ser parte na relação jurídica processual decorre do fato de estar alguém envolvido no conflito de interesses, independentemente da relação jurídica material, e que no desate da lide suportará os efeitos da sentença. No caso dos autos, as requeridas estão diretamente envolvidas no conflito de interesses narrado na exordial. A primeira requerida, por ser a plataforma responsável pela intermediação da compra e venda, e a segunda requerida, por ser identificada na documentação fiscal como fornecedora do produto e responsável pelo transporte. Ademais, a teoria da aparência e a aplicação do Código de Defesa do Consumidor legitimam a presença de ambas no polo passivo da demanda. Os termos da participação de cada requerida, entretanto, configuram questão de mérito a ser apreciada no momento oportuno. Assim, afasto a questão processual suscitada. MÉRITO Trata-se de nítida relação de consumo entabulada entre as partes, notadamente fornecedoras e consumidora, nos exatos termos dos artigos 2º e 3º da legislação consumerista, devendo o feito ser julgado à luz do Código de Defesa do Consumidor e legislações análogas aplicáveis à espécie. A responsabilidade civil dos fornecedores de serviços, a cujo conceito se amoldam as demandadas, é objetiva, fundada no risco da atividade desenvolvida (CDC, art. 14), não se fazendo necessário perquirir acerca da existência de culpa. Basta a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo consumidor, cuja responsabilidade somente poderá ser afastada nas hipóteses de caso fortuito/força maior (CC, art. 393), inexistência do defeito (CDC, art. 14, § 3º, I) e culpa exclusiva do ofendido e/ou de terceiros (CDC, art. 14, § 3º, II). A questão deduzida nos autos envolve matéria de direito disponível, de modo que cabia à parte autora, nos termos do art. 373, I do CPC, comprovar fato constitutivo de seu direito e, às requeridas, insurgir-se especificamente contra a pretensão da demandante, ou seja, apresentar prova de que não houve qualquer falha na prestação dos serviços indicados (art. 373, II do CPC). No caso em análise, a falha na prestação do serviço restou claramente demonstrada, inclusive por meio das mensagens trocadas entre as partes, nas quais a requerida promete a devolução do valor. Conforme se depreende dos documentos juntados aos autos, foram realizadas duas tentativas de entrega do produto, mas em ambas a voltagem (127V) é incompatível com a necessidade da autora. A troca de mensagens no aplicativo do MERCADO PAGO (documentos de ID's correspondentes às fls. 1-5 do documento 4 e fls. 1-5 do documento 5) evidencia que a primeira requerida prometeu o estorno, o que não foi cumprido. Tal conduta configura inequívoca falha na prestação do serviço, caracterizando inadimplemento contratual. Quanto à alegação da segunda requerida de que seria mera transportadora, sem responsabilidade pela especificação do produto, tal argumento não prospera, pois cuida-se do mesmo grupo. Desse modo, tenho que a autora demonstrou fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I do CPC. Realizadas duas tentativas frustradas de entrega do produto com a voltagem adequada à necessidade da autora e constatada a impossibilidade de cumprimento adequado do contrato, cabível a sua rescisão com a consequente restituição à parte autora do valor que despendeu para aquisição do produto indicado. Frisa-se que cuidando-se de compra à distância, o consumidor tem o direito de arrependimento, o que, no caso foi exercido. Ainda que a autora tenha dado causa ao imbróglio por não observar a incompatibilidade do produto adquirido com a voltagem do domicílio, ela pode sim devolver o produto e solicitar a troca, o que não ocorreu satisfatoriamente, razão do pedido de devolução da quantia paga. As demandadas, portanto, devem restituir à requerente o valor efetivamente pago pelo bem, de R$ 3.271,14, monetariamente atualizado, considerando que a compra foi realizada em 24/11/2024 e até o momento não houve a devolução do valor, apesar das promessas nesse sentido. Resta, por fim, verificar se houve violação aos direitos de personalidade da autora, ou seja, se configurado, de fato, o dano moral. Sem razão a requerente neste ponto. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos relativos a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente a dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação compensatória dessa natureza (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). A falha na prestação do serviço realizada pelas requeridas não resultou em prejuízo de cunho moral, até mesmo porque a autora não demonstrou ter experimentado qualquer constrangimento excepcional decorrente de tal conduta. A ocorrência dos danos morais é exceção e estes somente podem ser reconhecidos nos casos em que o ato ilícito atinja os atributos da personalidade ou causem desequilíbrio psicológico expressivo, segundo o padrão do que revela a experiência comum. Aborrecimentos cotidianos ou fruto das vicissitudes inerentes à complexidade da vida em sociedade, como a questão em tela, não comportam indenização. Ademais, o mero inadimplemento contratual ou a má prestação dos serviços contratados, não ocasiona, por si só, violação a direitos da personalidade e, por conseguinte, não gera direito à indenização por danos morais, exigindo-se, para acolhimento do pedido compensatório, comprovação de que o descumprimento contratual ou o serviço de má qualidade gerou mais do que aborrecimentos inerentes às negociações de rotina, o que não restou demonstrado na hipótese dos autos. Na mesma senda, não merece guarida a tese de indenização por perda de tempo útil. Em relação à indenização pela perda do tempo útil, considera-se desvio produtivo todo tempo desperdiçado pelo consumidor para a solução de problemas gerados por maus fornecedores constitui dano indenizável. Especialmente no Brasil, "onde é notório que incontáveis profissionais, empresas e o próprio Estado, em vez de atender o cidadão - consumidor em observância a sua missão, acabam-lhe fornecendo cotidianamente produtos e serviços defeituosos, ou exercendo práticas abusivas no mercado, contrariando a lei", nas palavras do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Dr. Marco Aurélio Bellizze. Nesse ínterim, as decisões que têm reconhecido a indenização pela chamada Teoria do Desvio Produtivo referem-se a situações muito mais gravosas que a da requerente, onde os consumidores vivenciam verdadeiro calvário para solucionarem seus problemas e onde comprovam, verbi gratia, real perda de tempo, dinheiro, ausências ao trabalho, perda de horário e dias de folga, férias etc, o que não ocorreu no caso ora sob julgamento. Veja-se, nem todo tempo desperdiçado na resolução de problemas de consumo é passível de indenização. Vale dizer, ainda prevalece a máxima de que somente o dano certo e efetivo é passível de reparação. Tanto a doutrina como a jurisprudência há anos refutam a reparação do chamado dano moral hipotético, sob pena de banalização desse instituto. Não basta, portanto, menção à Teoria do Desvio Produto. Há que se analisar o caso concreto para saber se o consumidor tem ou não tem direito à reparação moral, e a requerente deixou de demonstrar qualquer das situações acima descritas para configurar a violação a direito da personalidade. Assim, não há que se falar em reparação por dano moral. Por outro lado, tendo em vista que a empresa não providenciou o recolhimento do produto defeituoso, conforme havia se comprometido, e considerando que a autora não tem interesse em permanecer com o bem que não atende às suas necessidades, determino que a requerida providencie a retirada do produto da residência da requerente, no prazo de 30 dias, sob pena de perdimento do bem em favor da autora. Diante de tais fundamentos, rejeitada a preliminar suscitada, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: 1. Rescindir o contrato firmado entre as partes; 2. CONDENAR solidariamente as requeridas a pagar à parte autora a importância de R$ 3.271,14 (três mil, duzentos e setenta e um reais e quatorze centavos) a título de dano material, monetariamente corrigida pelo IPCA desde o desembolso (24/11/2024), acrescida de juros de mora à taxa legal (SELIC, deduzido o IPCA), a partir da citação; 3. DETERMINAR que as requeridas providenciem a retirada do produto da residência da autora, no prazo de 30 dias, sob pena de perdimento do bem em favor da autora; 4. JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de condenação em dano moral. Por conseguinte, resolvo o mérito da lide com base no art. 487, inc. I, do Novo Código de Processo Civil. Sem custas e sem honorários (art. 55 da Lei n. 9.099/95). Após o trânsito em julgado, intime-se a parte autora para que informe se tem interesse no cumprimento da sentença e requeira o que entender de direito, no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de arquivamento. Em caso de pagamento voluntário, intime-se a parte autora a dizer se o débito foi satisfeito e a indicar conta de sua titularidade para a transferência respectiva, bem como chave PIX/CPF, se houver. Interposto eventual recurso, dê-se vista à parte contrária, para contrarrazões e, após, encaminhem-se os autos à instância recursal, independentemente de nova conclusão. Transitada em julgado, não havendo novos requerimentos, dê-se baixa e arquivem-se, observadas as normas do Provimento Geral da douta Corregedoria. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se. BRASÍLIA - DF, data e horário conforme assinatura eletrônica. WANNESSA DUTRA CARLOS Juíza de Direito