Jose Pereira Lemos Filho x Banco Bradesco S.A.
Número do Processo:
0707010-05.2025.8.07.0003
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJDFT
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2º Juizado Especial Cível de Ceilândia
Última atualização encontrada em
02 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2º Juizado Especial Cível de Ceilândia | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPoder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 2JECIVCEI 2º Juizado Especial Cível de Ceilândia Número do processo: 0707010-05.2025.8.07.0003 Classe judicial: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) REQUERENTE: JOSE PEREIRA LEMOS FILHO REQUERIDO: BANCO BRADESCO S.A. SENTENÇA Trata-se de ação de conhecimento, submetida ao procedimento da Lei 9.099/95, proposta por JOSE PEREIRA LEMOS FILHO em desfavor de BANCO BRADESCO S.A., partes qualificadas nos autos. Relata o autor que, em 25 de setembro de 2024, recebeu uma oferta de empréstimo de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) da ré, que recusou. Posteriormente, afirma que verificou a contratação fraudulenta de um empréstimo de R$ 3.299,00 (três mil, duzentos e noventa e nove reais). Informa que o montante acima foi acrescido ao saldo existente na conta de R$ 1.165,00 (mil, cento e sessenta e cinco reais) e foi utilizado, sem sua autorização, para pagamento de um boleto de R$ 4.464,00 (quatro mil, quatrocentos e sessenta e quatro reais) em nome de Priscila da Silva Andrade. Alega que entrou em contato com o réu, porém não obteve êxito na resolução do problema. Assevera que a fraude resultou no desconto indevido de parcelas no valor de R$ 823,38 (oitocentos e vinte e três reais e trinta e oito centavos) mensais, totalizando descontos que somam a quantia de R$ 3.293,52 (três mil, duzentos e noventa e três reais e cinquenta e dois centavos). Por essas razões, requer a declaração de inexistência do contrato n. 510964474 e do respectivo débito, exclusão do seu nome dos órgãos de proteção ao crédito, condenação do réu na restituição em dobro dos valores descontados no importe de R$ 6.587,04 (seis mil, quinhentos e oitenta e sete reais e quatro centavos) e indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Em contestação, a ré suscita preliminar de incompetência do Juízo, ausência de interesse de agir, inépcia da inicial e indevida concessão à gratuidade de justiça, pugnando pela extinção do feito sem resolução do mérito. No mérito, o réu alega que o contrato foi celebrado de forma legítima, com o autor ciente e de acordo com todos os detalhes, conforme atesta o Documento Descritivo de Crédito (DDC). O banco afirma que cumpre seu dever de informar os clientes sobre segurança, oferecendo dicas e alertas em seu site e por meio de campanhas publicitárias. Destaca a validade jurídica das contratações realizadas por meios eletrônicos, conforme legislação e jurisprudência. Argumenta que, caso tenha havido fraude, ela ocorreu devido à negligência do próprio autor em proteger suas senhas pessoais. Defende que agiu no exercício regular de um direito ao celebrar o contrato e realizar os descontos, não havendo ato ilícito. Sustenta que não estão presentes os requisitos para a inversão do ônus da prova, como a verossimilhança das alegações do autor e sua hipossuficiência. Requer, ao final, a improcedência dos pedidos iniciais. É o relatório. DECIDO. O feito comporta julgamento antecipado, conforme inteligência do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. Passo ao exame das preliminares. Em relação à preliminar de incompetência do Juízo, faz-se tão somente necessário destacar que a causa de pedir remota não necessita de análise técnica-pericial para sua aferição, tendo sido juntados aos autos elementos probatórios suficientes à apuração do mérito da lide. Não prospera qualquer argumento apto ao indeferimento da petição inicial tendo em vista que a peça de ingresso preenche todos os requisitos listados no art. 319/CPC. Afasto a preliminar de ausência de interesse de agir porquanto tal prefacial consubstancia condição indispensável ao exercício do direito de ação, qualificada pela necessidade e utilidade da tutela judicial, a qual não se confunde com a pertinência do direito em tela, o que deverá ser aferido por ocasião da apreciação do mérito. O art. 98 do CPC milita em favor da parte, pessoa física, requerente do benefício da gratuidade de justiça, incumbindo à parte impugnante comprovar o não preenchimento dos requisitos legais para a sua concessão. Tendo em vista que a parte requerida não se desincumbiu de seu ônus probatório, limitando-se a alegar a impossibilidade de sua concessão, e considerando ainda que a litigância nos Juizados Especiais Cíveis é isenta de custas em primeiro grau de jurisdição, rejeito a presente preliminar. MÉRITO. Ultrapassada a análise das questões prefaciais e presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido do feito, passo ao exame do mérito. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, visto que o banco demandado é fornecedor de serviços e produtos, cujo destinatário final é o requerente, nos termos dos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Tratando-se de relação de consumo, como a hipótese em questão, a responsabilidade dos fornecedores é objetiva, ou seja, independe da demonstração do elemento culpa, a teor do que dispõe o artigo 14 do CDC, bastando a prova do dano e do respectivo nexo de causalidade, pela qual o fornecedor de serviços somente se exime do dever de indenizar se demonstrar a inexistência do defeito, a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, § 3º, do CDC). O ônus da prova de eventual inexistência do defeito ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros é transferido, ope legis (de forma automática), ao réu que alega a excludente de responsabilidade. Delimitados tais marcos, da análise das provas produzidas nos autos em confronto com as alegações apresentadas pelas partes, tem-se que o autor foi vítima de golpe na contratação de empréstimo e pagamento de boleto em favor de terceiro. A ocorrência de fraudes constitui um risco inerente ao exercício da atividade desempenhada pela instituição bancária requerida, consistindo típico caso de fortuito interno que não se mostra suficiente, por si só, para afastar o nexo causal e, em consequência, o dever de indenizar, competindo ao fornecedor a adoção das cautelas necessárias para evitar lesão aos seus clientes, sob pena de responder objetivamente pelos danos causados. Compete à instituição financeira estabelecer mecanismos eficazes de controle e segurança que impeçam as operações fraudulentas. Apesar de o banco alegar que o uso de senha consubstancia dispositivo eficaz para impedir a ocorrência de fraude na utilização do internet banking, tal sistemática não é absoluta. Malgrado a reconhecida segurança do sistema, aliada à utilização de senha, sabe-se que tal tecnologia não impede a perpetração de fraudes, que, ao contrário, mostram-se frequentes. Portanto, estabelecido que a atividade exercida pela instituição bancária está norteada pela teoria do risco negocial (Lei n. 8.078/90, art. 14 e Código Civil, art. 927, parágrafo único), impõe-se que a parte suplicada arque com as consequências advindas desse risco. Nesse contexto, em caso de alegação de transações não reconhecidas pelo cliente, cabe à instituição financeira, que possui os recursos adequados, provar que a responsabilidade pela transação contestada é do usuário. No caso em análise, a ré não se desincumbiu do ônus de prova que lhe cabia (art. 373, II, CPC), tendo em vista que não conseguiu provar que as transações financeiras contestadas foram realizadas pessoalmente com sua senha pessoal. Os documentos acostados aos autos não são suficientes para comprovar a legitimidade das operações financeiras. Assim, como o réu não logrou êxito em apresentar evidências que contestassem o direito do autor ao ressarcimento, resta configurada a falha na prestação de serviço do banco, uma vez que ficou evidenciada a falha no dever de segurança, deixando que fraudadores realizassem as referidas transações contestadas. Logo, a declaração de inexigibilidade do contrato de n. 510964474 e do respectivo débito no valor de R$ 3.299,00 (três mil, duzentos e noventa e nove reais) são medidas que se impõem. Como consequência, deve a ré ser condenada a se abster de realizar os descontos na conta bancária do autor, referente ao contrato impugnado nestes autos. Considerando a nulidade da transação impugnada, referente ao pagamento do boleto no valor de R$ 4.464,00 (quatro mil, quatrocentos e sessenta e quatro reais) em nome de Priscila da Silva Andrade, deve a ré ser condenada a restituir, na forma simples, a quantia de R$ 1.165,20 (mil, cento e sessenta e cinco reais e vinte centavos), referente ao saldo existente na conta bancária do autor no dia 25/09/2024. Noutro giro, ficou demonstrado que, quanto ao contrato de empréstimo impugnado, foi debitado da conta do autor no dia 30/09/2024, sob a rubrica “Parcela Credito Pessoal”, a quantia de R$ 114,33 (cento e quatorze reais e trinta e três centavos) (ID 233573073 – pág. 73). Em seguida, foram lançadas os seguintes débitos: a) R$ 182,00 (cento e oitenta e dois reais), no dia 01/10/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; b) R$ 777,17 (setecentos e setenta e sete reais e dezessete centavos), no dia 07/10/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; c) R$ 164,29 (cento e sessenta e quatro reais e vinte e nove centavos), no dia 07/11/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; d) R$ 264,01 (duzentos e sessenta e quatro reais e um centavo), no dia 07/11/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; e) R$ 348,87 (trezentos e quarenta e oito reais e oitenta e sete centavos), no dia 07/11/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; f) R$ 777,17 (setecentos e setenta e sete reais e dezessete centavos), no dia 06/12/2024, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; g) R$ 64,54 (sessenta e quatro reais e cinquenta e quatro centavos), no dia 08/01/2025, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; h) R$ 431,22 (quatrocentos e trinta e um reais e vinte e dois centavos), no dia 08/01/2025, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal” e i) R$ 281,41 (duzentos e oitenta e um reais e quarenta e um centavos), no dia 08/01/2025, sob a rubrica “Mora Credito Pessoal”; totalizando R$ 3.290,68 (três mil, duzentos e noventa reais e sessenta e oito centavos) (ID 233573073 – pág. 73). Quanto aos descontos efetuados pela ré diretamente na conta bancária do autor, discriminados acima, a devolução deve ocorrer na forma dobrada, tendo em vista que estão presentes os requisitos do parágrafo único do art. 42 do CDC, pois restou comprovada a cobrança indevida, o pagamento e ausência de engano justificável. Quanto a esse último requisito, cumpre a instituição financeira apresentar justificativa plausível para a cobrança realizada, especialmente quando o consumidor adota todas as providências ao seu alcance. A instituição financeira requerida não comprovou a justificativa apresentada, de modo que a restituição deve ocorrer na forma dobrada. No que tange ao pedido de danos morais, os inevitáveis aborrecimentos e incômodos vivenciados pela parte autora não ingressaram no campo da angústia, descontentamento e sofrimento, a ponto de afetar a sua tranquilidade e paz de espírito. Portanto, não tendo sido demonstrada a efetiva inscrição do nome do autor nos cadastros de inadimplentes, incabível a reparação moral pretendida, bem assim o pedido de retirada do nome do autor dos órgãos de proteção ao crédito. DISPOSITIVO. Posto isso, resolvo o mérito da lide, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC/15, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: a) DECLARAR a inexigibilidade do contrato de n. 510964474 e do respectivo débito no valor de R$ 3.299,00 (três mil, duzentos e noventa e nove reais); b) CONDENAR a ré a dar baixa no referido débito em todos os cadastros e sistemas e a se abster de realizar os descontos na conta bancária do autor, referente ao contrato impugnado nestes autos, sob pena de devolver em dobro os valores comprovadamente descontados; c) CONDENAR a ré a devolver ao autor, na forma simples, a quantia de R$ 1.165,20 (mil, cento e sessenta e cinco reais e vinte centavos), referente ao saldo existente na conta bancária do autor no dia 25/09/2024. Sobre o valor deverá ser acrescida correção monetária pelo IPCA desde a data da transação impugnada (25/09/2024) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. A partir de 30/08/2024, correção exclusivamente pela taxa SELIC; e d) CONDENAR a ré a devolver ao autor a quantia de R$ 6.581,36 (seis mil, quinhentos e oitenta e um reais e trinta e seis centavos), já em dobro, acrescidos de correção monetária pelo IPCA desde a data de cada desconto e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. A partir de 30/08/2024, correção exclusivamente pela taxa SELIC. Sem condenação em custas nem honorários de sucumbência. Havendo interposição de recurso por qualquer das partes, representada por advogado, com pedido de justiça gratuita, fica a recorrente intimada a demonstrar sua hipossuficiência econômica, mediante anexação de: 1 - Identidade e CPF; 2 - Comprovante de renda dos últimos 3 meses (se não tiver contracheque, cópia da carteira de trabalho da primeira página até a última anotação de emprego); 3 - Extratos bancários dos 3 últimos meses; 4 - Extratos de cartão de crédito dos 3 últimos meses; 5 - Declaração de imposto de renda do último exercício; e 6 - Comprovante de despesas (tais como aluguel, contas de água e luz, etc.), porquanto a mera declaração não será suficiente para a concessão. Destaca-se que, não havendo mais de se falar em duplo juízo de admissibilidade do recurso (art. 1.010, §3º do CPC/2015), os pressupostos recursais e eventuais pedidos de gratuidade serão analisados pelo órgão ad quem. Assim, intime-se a recorrida para que formule as contrarrazões, querendo, através de advogado, no prazo de 10 (dez) dias. Em seguida, encaminhem-se os autos à Turma Recursal. Transitada em julgado, em havendo pedido de cumprimento de sentença, proceda-se imediatamente à alteração da classe no sistema PJe e, em seguida, INTIME-SE a parte requerida para, no prazo de 15 (quinze) dias, cumprir a obrigação de pagar que lhe foi determinada, sob pena de aplicação da multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação prevista no § 1º do artigo 523 do CPC. Destarte, INTIME-SE PESSOALMENTE a parte requerida para, no prazo de 15 (quinze) dias, cumprir a obrigação de fazer que lhe foi determinada, sob pena de cominação de multa diária, sem prejuízo de sua conversão em perdas e danos. Na mesma oportunidade, a parte requerida deverá ser cientificada que, transcorrido o prazo para pagamento voluntário, independente de nova intimação e penhora, poderá apresentar, nos próprios autos, sua impugnação (artigo 525 do CPC). Não sendo realizado o pagamento voluntário, fica, desde já, deferida a realização das medidas constritivas cabíveis para a garantia do crédito, em especial a diligência SisbaJud, em sendo requerida pelo credor. Em caso de pagamento voluntário da obrigação de pagar fixada, fica desde já o depósito judicial convertido em pagamento e, informados os dados bancários, fica também autorizada a expedição de alvará eletrônico de transferência em favor da parte requerente, com a consequente baixa e arquivamento do feito. Ocorrido o trânsito em julgado, não sendo realizado o pedido de cumprimento de sentença no prazo de 05 (cinco) dias, e inexistindo outras providências a serem adotadas, dê-se baixa e arquive-se. Sentença registrada eletronicamente nesta data. Publique-se. Intimem-se. Datado e assinado eletronicamente. CYNTHIA SILVEIRA CARVALHO Juíza de Direito