Processo nº 07073256820238070014
Número do Processo:
0707325-68.2023.8.07.0014
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJDFT
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Vara Cível do Guará
Última atualização encontrada em
22 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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19/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Vara Cível do Guará | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 1VARCIVGUA Vara Cível do Guará Número do processo: 0707325-68.2023.8.07.0014 Classe judicial: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: ROBERTO LUIZ JUVENCIO DE OLIVEIRA REU: FR MULTIMARCAS COMERCIO DE VEICULOS LTDA, FERNANDO DE SOUSA LIMA, CASSIUS IBAE GOMES, ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ajuizada por ROBERTO LUIZ JUVENCIO DE OLIVEIRA em face de FR MULTIMARCAS COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA, FERNANDO DE SOUSA LIMA, CASSIUS IBAÊ GOMES e ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS. O autor narra ter negociado a venda de seu veículo, um FIAT SIENA EL FLEX, placa JIT0F57, ano/modelo 2010/2010, com a primeira requerida, FR MULTIMARCAS, representada por CASSIUS IBAÊ GOMES, que se apresentava como funcionário, e FERNANDO DE SOUSA LIMA, sócio-proprietário. A negociação, ocorrida em 18/11/2022, totalizou R$ 17.500,00, com um sinal de R$ 5.000,00 transferido por Fernando. O autor outorgou a Cassius uma procuração pública em 21/11/2022, concedendo-lhe amplos poderes para dispor do veículo, inclusive para transferência, e recebeu o valor restante de R$ 12.500,00 no mesmo dia. Contudo, passados mais de oito meses, o veículo permaneceu registrado em nome do autor, gerando débitos de R$ 1.067,64, incluindo taxas de transferência e licenciamento, e IPVA de 2023. O autor descobriu uma restrição ativa de alienação fiduciária ao BANCO VOTORANTIM S.A. registrada em nome de ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS, indicando que ela está na posse do veículo desde 21/11/2022. O autor busca a obrigação de fazer para que a propriedade do veículo seja regularizada em nome de Elizabete, retroativamente a 21/11/2022, com a quitação dos débitos acumulados, e a condenação solidária dos requeridos por danos morais no valor de R$ 5.000,00. O requerido CASSIUS IBAÊ GOMES apresentou contestação, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva. Alegou que era apenas um funcionário da FR Multimarcas, com atribuições meramente cartorárias e administrativas, sem autonomia ou ingerência sobre a loja ou o ritmo das transferências de veículos. Sustentou que a procuração em seu nome visava apenas facilitar as atividades burocráticas em nome e em favor da FR Multimarcas, e que o dever de indenizar recairia sobre a empregadora. Afirmou, ademais, a impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer, visto que a procuração outorgada perdeu seus efeitos em 21/02/2023, antes do ajuizamento da ação. Por fim, defendeu a inexistência de dano moral, por considerar os fatos mero dissabor, sem qualquer abalo comprovado à esfera subjetiva do autor, e, subsidiariamente, caso houvesse condenação, pediu que o valor fosse arbitrado em R$ 500,00. O autor apresentou réplica à contestação de Cassius. Intimadas as partes para especificarem as provas que pretendiam produzir, somente o autor se manifestou, requerendo o depoimento pessoal dos requeridos, além dos documentos já anexados. Os réus FR MULTIMARCAS COMERCIO DE VEICULOS LTDA e FERNANDO DE SOUSA LIMA apresentaram manifestação ao ID 209722629. É o relatório. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, cumpre decretar a revelia de FR MULTIMARCAS COMERCIO DE VEICULOS LTDA e FERNANDO DE SOUSA LIMA. Embora tenham comparecido aos autos por meio de procuração, conforme certidão de ID 196664286, transcorreu-se em branco o prazo para apresentação de contestação. A manifestação apresentada ao ID 209722629 em 03/09/2024 é intempestiva, uma vez que o prazo para apresentação de defesa findou em 30/04/2024. Decreto, ainda, a revelia de ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS, uma vez que, devidamente citada conforme documento ID 176583581, não apresentou qualquer manifestação nos autos, conforme também atesta a certidão de ID 196664286. Convém destacar que, embora o artigo 345, inciso I, do CPC estabeleça que a revelia não produz efeitos quando há pluralidade de réus e algum deles contesta a ação, essa regra não se aplica ao presente caso. A contestação apresentada pelo requerido CASSIUS IBAÊ GOMES foi de natureza subjetiva, o que significa que sua defesa não tem a capacidade de descaracterizar a revelia dos demais réus, nem de levar ao desprovimento da ação principal, ou mesmo de abranger a defesa dos outros envolvidos. O simples fato de um dos réus ter contestado não é suficiente para afastar os efeitos da revelia se a defesa não impugnar um fato comum a todos. Diante da revelia de FR MULTIMARCAS COMERCIO DE VEICULOS LTDA, FERNANDO DE SOUSA LIMA e ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pelo autor em relação a esses réus, conforme o disposto no artigo 344 do Código de Processo Civil. No tocante à preliminar de ilegitimidade passiva arguida por CASSIUS IBAÊ GOMES, esta não merece prosperar. A legitimidade para a causa, nos termos do art. 17 do Código de Processo Civil, pressupõe a titularidade dos interesses em conflito. No caso em tela, o autor, por instrumento público de procuração lavrado em 21/11/2022, com poderes amplos e especiais, constituiu CASSIUS seu bastante procurador, conferindo-lhe a prerrogativa de dispor do veículo, inclusive para assinar e entregar o Documento Único de Transferência (DUT) em favor do novo comprador. A própria procuração, documento probatório, estabelece que "O outorgante declara que o Outorgado, a partir desta data assume toda e qualquer responsabilidade civil, criminal e administrativa sobre o veículo acima descrito" (ID 168952759). Não se trata de uma mera função burocrática, mas de uma outorga de poderes que implica responsabilidade. A alegação de Cassius de que agia como mero funcionário da FR Multimarcas e sem autonomia administrativa não o exime da responsabilidade direta que lhe foi conferida pela procuração. O Código Civil, em seu Art. 663, dispõe que o mandatário ficará pessoalmente obrigado se agir em seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do mandante. Ao ser constituído procurador com poderes específicos para a transferência do veículo, Cassius assumiu diretamente a obrigação de providenciá-la, independentemente de sua relação empregatícia com a FR Multimarcas. Assim, rejeito a preliminar. Quanto à argumentação de impossibilidade de cumprimento da obrigação de fazer devido ao vencimento da procuração em 21/02/2023, tal tese também não se sustenta. O vencimento do mandato impede a prática de novos atos, mas não elide a responsabilidade pelos atos que deveriam ter sido praticados durante sua vigência e que, por negligência do procurador, não o foram. A inação de Cassius no período em que a procuração estava válida e lhe conferia plenos poderes para a transferência do veículo gerou o prejuízo ao autor, mantendo-o vinculado a débitos de um bem do qual já havia se desfeito. A responsabilidade do procurador persiste em relação aos danos ou prejuízos resultantes de sua conduta no exercício do mandato, mesmo após sua extinção, caso a obrigação não tenha sido devidamente cumprida. No mais, indefiro o pedido de produção de provas formulado pelo autor, notadamente o depoimento pessoal dos requeridos. O processo encontra-se suficientemente instruído com as provas documentais apresentadas, as quais são robustas e aptas a formar o convencimento deste Juízo. Os documentos, como a procuração de venda, os comprovantes de recebimento de valores pelo autor, os dados do veículo e os extratos bancários, além dos registros de débitos do DETRAN/DF, fornecem os elementos necessários para o deslinde da controvérsia. A revelia de alguns réus e a natureza da controvérsia tornam desnecessária a produção de prova oral adicional, já que os fatos essenciais à demanda encontram-se devidamente comprovados por documentos. No mérito, os pedidos do autor são procedentes. A efetiva alienação do veículo, caracterizada pela tradição do bem em 21/11/2022, quando o autor entregou o veículo e o DUT após receber o valor total da venda, transferiu a propriedade, ainda que o registro formal não tenha sido atualizado. Conforme o Art. 1.226 do Código Civil, os direitos reais sobre coisas móveis adquirem-se com a tradição, e o Art. 1.267 complementa que a propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da tradição. Para ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS, a obrigação de providenciar a expedição do novo Certificado de Registro de Veículo (CRV) é inequívoca. O fato de haver uma restrição ativa de alienação fiduciária do veículo ao BANCO VOTORANTIM S.A. registrada em seu nome na mesma data da alienação à FR MULTIMARCAS demonstra que ela se tornou a legítima proprietária e possuidora do veículo desde 21/11/2022. O Art. 123, § 1º, do Código de Trânsito Brasileiro é claro ao dispor que, em caso de transferência de propriedade, o prazo para o novo proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição do novo CRV é de trinta dias. Consequentemente, Elizabete é responsável por todos os encargos futuros decorrentes do uso do bem. A tutela específica da obrigação de fazer, prevista no Art. 497 do Código de Processo Civil, visa a obtenção do resultado prático equivalente ao cumprimento espontâneo da obrigação. Assim, é cabível a condenação de Elizabete à obrigação de providenciar a transferência do veículo para o seu nome e, em caso de inércia, a expedição de ofício ao DETRAN/DF para a regularização retroativa, com a devida anotação do gravame de alienação fiduciária. A responsabilidade solidária dos requeridos FR MULTIMARCAS, FERNANDO DE SOUSA LIMA e CASSIUS IBAÊ GOMES também se impõe. A negociação inicial do veículo foi realizada pelo autor com Fernando e Cassius dentro do estabelecimento da FR Multimarcas, cuja atividade principal é justamente o comércio de veículos usados, conforme o CNPJ da empresa. Fernando, como sócio-proprietário, participou ativamente da aquisição, transferindo valores para a conta do autor. Cassius, na qualidade de procurador do autor com amplos poderes sobre o veículo, tinha a incumbência de providenciar o cumprimento de todo o trâmite burocrático da alienação. A decisão de revender o veículo sem antes regularizar sua propriedade com a primeira adquirente, a FR Multimarcas, concorreu diretamente para a situação de constrangimento do autor. Há responsabilidade solidária em casos de intermediação na compra e venda de veículos quando há prejuízos decorrentes da ausência de transferência de propriedade, conforme o artigo 663 do Código Civil. Embora a responsabilidade imediata pela transferência recaia sobre a atual possuidora, Elizabete, os demais requeridos contribuíram para o dano e devem responder solidariamente pelos débitos gerados indevidamente em nome do autor. No que tange aos danos morais, a inércia dos requeridos em regularizar a situação do veículo, culminando na vinculação do nome do autor a débitos de um bem que não mais lhe pertence, ultrapassa o mero aborrecimento e configura ofensa à sua imagem e reputação. O autor, como aposentado, teve seu nome maculado perante instituições públicas, figurando como devedor. A condenação por danos morais possui tríplice função: compensatória, punitiva e preventiva. A compensatória visa mitigar os danos sofridos pelo autor; a punitiva, condenar o ofensor pela prática do ato ilícito; e a preventiva, dissuadir a reiteração de atos semelhantes. A fixação do valor deve observar a proporcionalidade entre a extensão do dano, o grau de culpabilidade e a capacidade financeira dos ofensores, sem ensejar enriquecimento sem causa do ofendido, mas também sem ser inexpressiva a ponto de gerar impunidade. O valor sugerido de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mostra-se adequado aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade da situação e a concorrência de todos os requeridos para o dano causado. III – DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial para: 1. CONDENAR a requerida ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS à obrigação de providenciar a expedição, em seu nome, de novo Certificado de Registro do Veículo Marca/Modelo: FIAT SIENA EL FLEX, Placa: JIT0F57, Renavam: 00224218662, Chassi: 8AP17202LA2126126, Ano/Modelo: 2010/2010, retroativamente à data de 21/11/2022, no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa diária a ser arbitrada em caso de descumprimento; 2. DETERMINAR, após o transcurso in albis do prazo acima previsto, a expedição de ofício ao DETRAN/DF, a fim de que se registre a propriedade do veículo em epígrafe em nome da requerida ELIZABETE ALVES CORREIA DOS SANTOS, retroativamente à data de 21/11/2022, inclusive com a anotação do gravame de alienação fiduciária ao BANCO VOTORANTIM S.A.; 3. CONDENAR todos os requeridos, solidariamente, à obrigação de pagar, perante os órgãos credores, os débitos gerados indevidamente em nome do autor, no montante de R$ 1.067,64 (um mil e sessenta e sete reais e sessenta e quatro centavos), referente à taxa de transferência de propriedade de R$ 219,00, taxa de licenciamento do ano corrente de R$ 108,80 e ao IPVA de R$ 739,84, sob pena de multa diária, ou, caso não o façam perante os órgãos credores, ao pagamento do montante acima previsto em favor do autor, a título de perdas e danos; 4. CONDENAR todos os requeridos, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais em favor do autor, na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser corrigida monetariamente pelo INPC a partir da data desta sentença e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação; e 5. CONDENAR todos os requeridos ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes últimos a serem revertidos ao PRODEF, conforme o art. 3º, inciso I, da Lei Complementar Distrital nº 744 de 04/12/2007, e recolhidos junto ao Banco de Brasília - BRB, Código do Banco 070, Agência 100, Conta 013251. Intime-se a parte FR MULTIMARCAS COMERCIO DE VEICULOS LTDA, pessoalmente, para que regularize sua representação processual, ante a noticiada renúncia de poderes. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Documento datado e assinado pelo(a) magistrado(a) conforme certificação digital.
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19/06/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)