Regina Do Nascimento Gomes Xavier x Gama Veículos Ltda. e outros
Número do Processo:
0754225-55.2024.8.02.0001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJAL
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
4ª Vara Cível da Capital
Última atualização encontrada em
29 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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17/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 4ª Vara Cível da Capital | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELADV: MAXWELL SOARES MOREIRA (OAB 11703/AL), ADV: JEFERSON SANTOS DA COSTA (OAB 17503/AL), ADV: THIAGO TONHA CARDOSO (OAB 21419/BA), ADV: JEFERSON SANTOS DA COSTA (OAB 17503/AL) - Processo 0754225-55.2024.8.02.0001 - Procedimento Comum Cível - Indenização por Dano Material - AUTORA: B1Regina do Nascimento Gomes XavierB0 - RÉU: B1Gama Veículos Ltda.B0 - B1PRIMAVIA COMÉRCIO DE AUTOMÓVEIS LTDA,B0 - SENTENÇA Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos materiais e morais e pedido de tutela de urgência - liminar inaudita altera pars proposta por REGINA DO NASCIMENTO GOMES XAVIER, qualificada na inicial, em face de GAMA VEÍCULOS LTDA e PRIMAVIA COMÉRCIO DE AUTOMÓVEIS LTDA, igualmente qualificados. A parte demandante afirma ter adquirido um veículo RENAULT, modelo CAPTUR, no valor de R$ 129.000,00 (cento e vinte e nove mil reais). Afirma que, desde a compra, o veículo teria apresentado uma série de problemas técnicos, levando a autora a buscar assistência técnica em mais de quatro ocasiões, com o primeiro incidente registrado em 15/03/2023, quando o automóvel apagou completamente enquanto estava em uso. A autora relata que, após a primeira assistência, retornou à oficina em 25/04/2024, 27/05/2024, 03/062024 e 19/08/2024, enfrentando dificuldades para dar partida, falhas no funcionamento com gasolina e vazamento de água no compartimento do motor. Em 30/09/2024, o veículo teria sido levado para reparo pela quarta vez, permanecendo na assistência por mais de trinta dias, o que, segundo a autora, contraria o prazo estipulado pelo CDC. Na tentativa de alcançar sua pretensão, a parte autora alega trazer aos autos as seguintes provas: nota fiscal de compra do veículo, datada de 22/12/2021, no valor de R$ 129.000,00; comprovantes de entradas do veículo na assistência técnica em mais de quatro ocasiões; laudo médico que comprova a condição de deficiência da autora (autismo); e-mails enviados à empresa solicitando assistência e relatando problemas com o veículo; testemunho da Sra. Pamella Souza de Santana, que pode corroborar a situação enfrentada pela autora; documentação que demonstra a ausência do veículo na assistência técnica por mais de 30 dias; registro de falhas recorrentes do veículo, incluindo problemas de partida, funcionamento com gasolina e vazamento de água. Na decisão interlocutória de fls. 40/42, este Juízo deferiu o pedido de justiça gratuita, o de tramitação prioritária e o de tutela de urgência. Contestação apresentada pela demandada GAMA VEÍCULOS LTDA, às fls. 51/79. Réplica, às fls. 95/99. Contestação apresentada pela demandada PRIMAVIA COMÉRCIO DE AUTOMÓVEIS LTDA, às fls. 103/146. Réplica, às fls. 175/183. Intimada as partes para se manifestarem acerca do eventual interesse na produção de novas provas, à fl. 184, a parte demandante requereu o cumprimento da tutela de urgência deferida às fls. 40/42, enquanto a demandada GAMA VEÍCULOS LTDA manifestou o seu desinteresse, e a demandada PRIMAVIA COMÉRCIO DE AUTOMÓVEIS pugnou pela produção de prova testemunhal e documental. Vieram-me conclusos os autos para sentença. É o breve relatório. Fundamento e decido. Do julgamento antecipado do mérito. Inicialmente, cumpre destacar que o entendimento dominante no STJ é o de que, quando verificados os pressupostos estabelecidos no art. 355, I, CPC, o magistrado passa a ter um verdadeiro dever - não uma mera faculdade - de julgar antecipadamente a lide. Isso se deve ao fato de que esta regra existe para assegurar a celeridade e eficiência à prestação jurisdicional, vale dizer, serve como meio de distribuição célere de justiça (art. 4º, CPC). Nesse sentido: STJ. [] JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. FEITO SUBSTANCIALMENTE INSTRUÍDO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. [] Consoante o entendimento mais recente deste órgão julgador, não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o Tribunal de origem entender substancialmente instruído o feito, declarando a prescindibilidade de produção de prova pericial, por se tratar de matéria eminentemente de direito ou de fato já provado documentalmente, como na hipótese dos autos. [] (STJ. AgInt no REsp 1252714/PB; 4ª Turma; Rel. Min. Lázaro Guimarães: Des. Conv. do TRF 5ª Região; Dj 21/11/2017; g.n.) Sobre o tema, leciona Daniel Neves (Manual de Direito Processual Civil; 2020; pág. 686) que: [] o julgamento antecipado do mérito será cabível sempre que se mostrar desnecessária a instrução probatória após a apresentação de contestação pelo réu. Seja porque só há questões de direito, seja porque as questões de fato independem de prova, quer porque a provas pré-constituídas (geralmente documentos) que instruam a petição e a contestação são suficientes para a formação do convencimento do juiz. Assim, entendo que o processo comporta o julgamento no estado em que se encontra, conforme o que preceitua o art. 355, I, do CPC, sendo desnecessária a produção de outras provas para formar o convencimento deste Juízo. Esse entendimento encontra sustentáculo, outrossim, no que dispõe o parágrafo único do art. 370 do CPC: O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Ainda sobre o tema, Daniel Neves (Manual de Direito Processual Civil; 2020; pág. 686): [] inexistir violação ao princípio do contraditório o julgamento antecipado do mérito ocorrer sem a prévia intimação das partes, dando a elas notícia de que o processo será decidido por essa espécie de julgamento, inclusive de forma antecipada, sob pena de explicitar-se que todo julgamento demandaria do juiz a informação às partes de que o processo está pronto para ser julgado. A exigência de intimação nesse caso, por conseguinte, seria uma supervalorização do contraditório em detrimento de outros princípios processuais, com o que não se concorda. (g.n.) Ademais, de acordo com o Enunciado nº 27, da I Jornada de Direito Processual Civil, "Não é necessário o anúncio prévio do julgamento do pedido nas situações do art. 355 do CPC". TJAL. APELAÇÃO CÍVEL. [] ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTE. [] 2. A questão em discussão consiste em saber se houve cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, sem a produção de prova oral (depoimento pessoal da autora), considerada essencial pela apelante para comprovar o alegado cancelamento do curso. [] 3. Não há cerceamento de defesa quando o juiz, destinatário final da prova, considera suficientes os elementos documentais constantes dos autos para formar seu convencimento, indeferindo a produção de prova oral desnecessária. Aplicação do princípio da persuasão racional (arts. 370 e 371 do CPC). [] (TJAL. AC 0704898-72.2021.8.02.0058; 4ª Câmara Cível; Rel: Des. Márcio Roberto Tenório de Albuquerque; Dj: 19/03/2025; g.n.) Da desnecessidade de produção de novas provas. Indefiro ambos pedidos de produção de novas provas, pois em nada colaborariam com a elucidação dos pontos controversos da demanda, uma vez que as provas constantes nos autos já são suficientes para formar o convencimento deste Juízo. Nesse sentido, o art. 370 do CPC: o juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Conforme rege o princípio do livre convencimento motivado, deve o juízo indeferir aquelas que se afigurarem desnecessárias - conclusão essa que imbrica com o entendimento desta Egrégia Corte de Justiça: TJAL. [] JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTE. [] Não há cerceamento de defesa quando o juiz, destinatário final da prova, considera suficientes os elementos documentais constantes dos autos para formar seu convencimento, indeferindo a produção de prova oral desnecessária. Aplicação do princípio da persuasão racional (arts. 370 e 371 do CPC). [] (TJAL. AC 0704898-72.2021.8.02.0058; 4ª Câmara Cível; Rel:Des. Márcio Roberto Tenório de Albuquerque; Dj: 19/03/2025; g.N) Da natureza da relação jurídica, da responsabilidade objetiva e da manutenção da decisão que inverteu o ônus da prova. Entendo que a relação jurídica estabelecida entre as partes caracteriza-se como relação de consumo. Nos termos do art. 2º do CDC, o termo consumidor é definido com sendo toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Por seu turno, fornecedor é (art. 3º do CDC) a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, que desenvolve atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou presta serviços. Assim, nota-se que a parte demandada se subsume à definição jurídica de fornecedor, ao passo que a parte demandante se enquadra na definição consumidor. Assim, não resta dúvida quanto à aplicação do microssistema consumerista ao presente caso, o que faz incidir a Teoria da Responsabilidade do Serviço, ou Teoria do Risco da Atividade, ou ainda Teoria do Risco do Negócio. Em consonância com essa Teoria, a responsabilidade do fornecedor de serviços é objetiva (independe da demonstração de culpa) e só será afastada se for demonstrado que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste ou que o defeito é de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, (art. 14, § 3º, do CDC): O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste. II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Desse modo, tratando-se de responsabilidade objetiva, cabe ao consumidor apenas demonstrar a existência da conduta ilícita, do dano e do nexo causal, sendo prescindível a demonstração de dolo ou culpa, por parte do fornecedor. Igualmente importante é mencionar que o CDC, em seu art. 6º, VIII, assegura como direito básico do consumidor a facilitação da defesa de seus direitos com possibilidade de inversão do ônus da prova a seu favor: a) quando forem verossímeis as suas alegações; ou b) quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência. Busca-se, assim, assegurar a igualdade material. Nesse diapasão, realizando o cotejo do referido dispositivo legal com o caso sub judice, concluo estar presente (em relação à parte demandada) um estado de vulnerabilidade da parte demandante (hipossuficiente econômica, técnica, jurídica, informacional e faticamente), no caso concreto, que precisa ser reequilibrado, sobretudo em homenagem ao direito fundamental da igualdade material (caput do art. 5º da CF): o que justifica a manutenção da decisão que inverteu o ônus da prova. Do não acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva da demandada GAMA VEÍCULO LTDA. Deixo de acolher a presente preliminar, porquanto, diante do reconhecimento da relação de consumo, aplica-se ao caso a teoria da cadeia de fornecimento, o que me faz entender que a demandada GAMA VEÍCULOS LTDA compôs essa cadeia de fornecimento, no caso concreto, deve ser afastada a presente preliminar. Do não acolhimento do pedido de intervenção de terceiros. Conforme já destacado, a responsabilidade dos fornecedores é solidária, nos termos do artigo 7º do CDC. Desse modo, a parte autora não está obrigada a acionar todos os elos da cadeia de consumo, podendo escolher aquele que melhor lhe convie para a reparação dos danos sofridos. Assim, todos osfornecedoresde produtos e serviços respondem solidariamente peranteo consumidor,a quem é facultadoodireito deescolhercontra quemiráreclamar. Do não acolhimento da preliminar de impugnação ao pedido de justiça gratuita. Sabe-se que a alegação, por pessoa natural, de insuficiência financeira possui presunção legal de veracidade (art. 99, § 3º, CPC). O entendimento dominante caminha no sentido de que, para desconstituir essa presunção, é necessário que a parte impugnante apresente elementos suficientes e robustos que demonstrem a capacidade financeira da parte requerente. Por ser de meridiana clareza, transcrevo esse excerto doutrinário: O que se exige é que o requerente afirme, por seu procurador, a condição de carente. Desnecessário qualquer atestado ou declaração escrita de próprio punho - desnecessário, mas não proibido, obviamente. A simples afirmação da pessoa natural se presume verdadeira. Trata-se de presunção legal juris tantum (presunção relativa). Quer isso dizer que, em linha de princípio, não precisa a pessoa natural produzir prova do conteúdo da sua afirmação. Se ela goza de boa saúde financeira, que o prove a parte contrária. (DIDIER, Fredie; ALEXANDRIA, Rafael; Benefício da Justiça Gratuita; 6ª ed.; Juspodivm; pág. 67, g.n.) Entendo que a parte demandada não logrou comprovar (ônus que lhe cabia) a suficiência econômico-financeira da parte autora capaz de derruir a presunção de veracidade que lhe assiste. Também não encontrei nos autos fundadas razões (conditio sine qua non) para a denegação da gratuidade. Demais disso, não se exige estado de miserabilidade absoluta para a concessão do benefício. Eis os precedentes do TJAL aos quais me alinho: TJAL. [] AGRAVO DE INSTRUMENTO. [] PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DA DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA FORMULADA POR PESSOA FÍSICA. POSSIBILIDADE DE INDEFERIMENTO APENAS SE EXISTIREM NOS AUTOS ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM A FALTA DE PRESSUPOSTOS LEGAIS. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. [] (TJAL; AI 0808060-29.2022.8.02.0000; 2ª Câmara Cível; Rel. Des. Carlos Cavalcanti de Albuquerque Filho; Dj. 22/04/2024; g.n.) TJAL. [] AGRAVO DE INSTRUMENTO. [] 5. Não se exige estado de miserabilidade absoluta para a concessão do benefício da justiça gratuita, bastando a comprovação da impossibilidade de litigar sem prejuízo do próprio sustento ou da família. [] (TJAL; AI 08052423620248020000; 2ª Câmara Cível; Rel. Des. Carlos Cavalcanti de Albuquerque Filho; Dj. 24/10/2024; g.n.) Diante das razões expostas, mantenho a assistência judiciária gratuita à parte autora. Do mérito. Ao compulsar os autos com a devida parcimônia, pude perceber que, de fato, a parte autora entregou o veículo, pela última vez, em 30/09/2024. Por seu turno, a própria demandada (fl. 193) PRIMAVIA COMERCIO DE AUTOMOVEIS LTDA consigna que o veículo restara disponível para a autora somente em 07/11/2024. Nesse trilhar, levando-se em consideração que o § 1º do art. 18 do CDC dispõe que o consumidor pode requerer imediatamente a restituição da quantia paga, acaso o vício não seja sanado no prazo de 30 (trinta) dias. Diante de tais fatos, cheguei à forçosa conclusão que está configurado no presente caso o direito subjetivo da consumidora/demandante ao recebimento do valor de R$ 129.000,00, nos termos do que dispõe o art. 18, § 1º, I, do CDC, ipsis litteris: Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. § 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: () II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; () (Grifos aditados) Até 29/08/2024 (antes da Lei nº 14.905/2024), o valor dos danos materiais deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC, com juros de mora de 1% ao mês (arts. 406 do CC e 161, § 1º, do CTN), ambos desde 30/09/2024 (Súmula 43 do STJ e art. 397 do CC). A partir de 30/08/2024 (após a Lei nº 14.905/2024), a correção monetária deve ocorrer pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, CC) e os juros moratórios apurados pela fórmula Selic - IPCA apurada mensalmente; com a ressalva de que, caso o resultado da diminuição seja negativo, os juros moratórios serão considerados igual a 0 (zero), art. 406, § 1º e § 3º, do CC. Importante alertar que o cálculo relativo à transição (a de até 29/08/2024 para a de após 30/08/2024) não poderá implicar capitalização/anatocismo. Como mencionado anteriormente, é ponto fora de dúvida a incidência das normas do CDC ao caso. Tratando-se de relação de consumo, tem aplicação a ideia de cadeia de fornecimento, a tornar responsáveis solidários todos os envolvidos de forma direta na atividade de venda do produto ou serviço. Dos danos morais. De mais a mais, no tocante ao pedido de condenação em danos morais, cumpre destacar que é pacífico o entendimento, tanto na doutrina como na jurisprudência, de que o dano moral deve ser reparado, principalmente com a expressa previsão legislativa. Com efeito, dispõe o artigo 5º, inc. V, da Constituição Federal de 1988: Art. 5º todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: () V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (...) Nos termos do Código Civil, quem pratica conduta antijurídica e causa prejuízo direto a outrem, tem a responsabilidade civil de indenizar o lesado, pelos danos morais e materiais sofridos. Essa conclusão advém da leitura dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, que assim dispõem: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. A Legislação, contudo, não fornece o conceito de dano moral, nem como este se configura. Dessa forma, cumpre à doutrina esboçar uma definição para o agravo imaterial. Nesse contexto, segundo o entendimento dos insignes doutrinadores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, o dano moral: [] é aquele que lesiona a esfera personalíssima da pessoa (seus direitos da personalidade), violando bens jurídicos tutelados constitucionalmente. Yussef Said Cahali assim leciona: Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral. Importante repetir que a responsabilidade civil, no sistema jurídico brasileiro tem como pressupostos: a) o dano à vítima (entendido como a lesão ao bem jurídico - material ou imaterial); b) a existência de conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente; e c) o nexo causal entre o dano e a conduta do agente. Contudo, o art. 14, caput, do CDC, consagra a responsabilidade civil objetiva do fornecedor, lastreada na teoria do risco do empreendimento, dispensando o consumidor da demonstração de culpa, bastando comprovar o defeito do serviço, o nexo de causalidade e o dano sofrido, podendo, este último, ser dispensado conforme o caso. Nesse contexto, tenho que a responsabilidade civil a ser aplicada ao caso em testilha é a objetiva, por ser a regra estabelecida pela Lei nº 8.078 de 1990, que, como visto, é a norma de regência a ser aplicada no presente feito. Visando confirmar a incidência da responsabilidade objetiva ao caso em exame, trago à baila dispositivo do CDC que trata do tema: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Como é cediço, por se tratar de responsabilidade objetiva, caberia à postulante, apenas demonstrar a ocorrência da conduta ilícita e do nexo de causalidade, sendo desnecessária a prova do dolo ou da culpa. Consequentemente, o fornecedor de serviços somente não será responsabilizado civilmente quando comprovar que, prestado o serviço, não existe defeito ou que o fato é exclusivo da vítima ou de terceiro, o que não restou caracterizado no caso em exame. Assim, o ato ilícito das demandada consistiu na desídia em sanar os vícios do produto em tempo razoável. Há nexo causal, outrossim, entre a desídia das demandadas e os danos experimentados pela demandante, uma vez que se as demandadas tivessem sanado o vício em tempo razoável não teriam ocorridos os danos. Ao expor sobre os elementos que configuram o dano moral, Yussef Said Cahali (in Dano Moral, São Paulo, RT, 1998, p. 20), citando Orlando Gomes o define como: () a privação ou a diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra, e os demais sagrados afetos; classificando-se, desse modo, em dano que afeta a - parte social do patrimônio moral - (honra, reputação etc.) e dano que afeta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade etc.); dano moral que afeta direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.). Configurado, pois, o ato ilícito da ré, que atingiu direitos integrantes da personalidade e ao sentimento de autoestima da pessoa, verifica-se, pois, o dever de indenizar. À luz de todos os fundamentos expostos acima, entende o Juízo que, na hipótese, tem razão a parte promovente em sua pretensão, vez que se encontram presentes todos os pressupostos da responsabilidade civil, visto que o dano impetrado, portanto, não pode ser considerado mero aborrecimento cotidiano, de modo que a demandante faz jus à reparação que pleiteia, a título de dano moral. Adentrado-se à etapa do arbitramento do quantum indenizatório, é entendimento uníssono que deve ser estabelecido sob os auspícios dos postulados (ou metanormas) da razoabilidade e da proporcionalidade, devendo o valor servir tanto de atenuação aos prejuízos extrapatrimoniais vivenciados pelo ofendido quanto de caráter pedagógico ao ofensor. Acresça-se a isso o entendimento reiterado do STJ de que Não obstante o grau de subjetivismo que envolve o tema da fixação da indenização, uma vez que não existem critérios determinados e fixos para a quantificação do dano moral, esta Corte tem reiteradamente se pronunciado no sentido de que a reparação do dano deve ser fixada em montante que desestimule o ofensor a repetir a falta, sem constituir, de outro lado, enriquecimento indevido. (STJ. AgInt no AREsp n. 2.002.680/SP; 4ª Turma; Rel. Min. Marco Buzzi; DJe 15/08/2022) Analisando, outrossim, as particularidades do caso concreto (gravidade do dano; comportamento do ofensor e do ofendido; a posição social e econômica das partes; etc.), entendo que a indenização deve ser arbitrada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para satisfazer a todos esses critérios que devem guiar o Estado-juiz nesse mister, com o condão para dissuadir a parte demandada à reiteração da conduta, combatendo o denominado ilícito lucrativo, sem gerar, por outro lado, enriquecimento sem causa à parte ofendida. O valor dos danos morais deverá ser corrigido monetariamente, desde a data da sentença (Súmula 362 do STJ), pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC). Os juros moratórios deverão incidir a partir da data da citação (art. 405 do CC), sendo que, até 29/08/2024, eles serão de 1% ao mês (art. 406 do CC e 161, § 1º, do CTN), e, a partir de 30/08/2024 (após a Lei nº 14.905/2024), eles serão apurados pela fórmula Selic - IPCA apurada mensalmente, com a ressalva de que, caso o resultado da diminuição seja negativo, os juros moratórios serão considerados igual a 0 (zero), art. 406, § 1º e § 3º, do CC. Importante alertar que o cálculo relativo à transição (a de até 29/08/2024 para a de após 30/08/2024) não poderá implicar capitalização/anatocismo. Dispositivo. Em razão do que foi exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos da exordial, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para: a)condenar as partes demandadas, solidariamente, em indenização por danos materiais, referente à devolução integral do valor pago pelo automóvel, no valor de R$ 129.000,00 (cento e vinte e nove mil reais), com correção monetária e juros moratórios na forma acima estabelecida; e b) condenar as partes demandadas, solidariamente, em indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção monetária e juros na forma acima estabelecida. Por fim, condeno, solidariamente, as partes demandadas na obrigação de pagar as custas processuais e os honorários advocatícios sucumbenciais, arbitrando-os em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. A incidência das multas astreintes deverão ser apuradas e liquidadas por meio de incidente de cumprimento de sentença, com a observação de que elas serão devidas após o trânsito em julgado. Publique-se. Intimem-se. Maceió, 16 de julho de 2025. José Cícero Alves da Silva Juiz de Direito
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22/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 4ª Vara Cível da Capital | Classe: CUMPRIMENTO PROVISóRIO DE SENTENçAADV: Fábio Roberto Silva de Moura (OAB 16849/AL), Jeferson Santos da Costa (OAB 17503/AL) Processo 0754225-55.2024.8.02.0001 - Cumprimento Provisório de Sentença - Autora: Regina do Nascimento Gomes Xavier - DECISÃO Trata-se de cumprimento provisório de sentença formulado pela autora, na qual requer que a parte ré cumpra a obrigação de fazer, fornecendo um veículo de mesma qualidade técnica do automóvel adquirido. Pleiteia, ainda, a execução da multa diária, no valor total de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Inicialmente, em relação a execução da multa diária, o art. 537, § 3º, do CPC/2015 prevê a exequibilidade da multa desde o descumprimento da decisão. Entretanto, o entendimento deste dispositivo foi alterado pelo STJ, através do julgamento do EAREsp n. 1.883.876/RS. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ASTREINTES. TUTELA DE URGÊNCIA CONFIRMADA EM SENTENÇA POSTERIORMENTE ANULADA. CUMPRIMENTO PROVISÓRIO. NECESSIDADE DE CONFIRMAÇÃO DA MULTA COMINATÓRIA POR SENTENÇA DEFINITIVA DE MÉRITO. TRAMITAÇÃO INADEQUADA DA EXECUÇÃO PROVISÓRIA. INEXISTÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO. 1. A Corte Especial, em âmbito de recurso repetitivo - REsp n. 1.200.856/RS, Relator Ministro Sidnei Beneti -, entendeu que a "multa diária prevista no § 4º do art. 461 do CPC [1973], devida desde o dia em que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderá ser objeto de execução provisória após a sua confirmação pela sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo". 2. Não houve modificação desse entendimento com o advento do novo Código de Processo Civil. 3. Com efeito, a eficácia e a exigibilidade da multa não se confundem, sendo imediata a produção de efeitos das astreintes, devidas desde a fixação pelo juízo, porém com a exigibilidade postergada para após o trânsito em julgado da sentença de mérito que confirmar a medida. 4. Ademais, o novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015) não dispensou a confirmação da multa (obrigação condicional) pelo provimento final (art. 515, I). 5. Assim, no caso, é inviável o cumprimento provisório das astreintes, pois estas não foram ainda confirmadas pela sentença final de mérito. 6. Embargos de divergência conhecidos e não providos. (EAREsp n. 1.883.876/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, relator para acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 23/11/2023, DJe de 7/8/2024.) Desta forma, diante do entendimento jurisprudencial, no qual fixou a tese de que a multa diária fixada em antecipação de tutela só pode ser provisoriamente executada após a confirmação da medida em sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo, deve o pedido ser apreciado no momento oportuno, por considerar o objeto da demanda inexequível, ante a ausência da Sentença de mérito nos autos principais. No tocante ao fornecimento de veículo, em análise aos autos principais, verifica-se que o veículo da autora foi entregue em 07/11/2024, conforme confissão na manifestação de fls.195/197. Diante do acima exposto, indefiro o prosseguimento do presente cumprimento provisório de sentença. Arquive-se os presentes autos dependentes. Maceió , 21 de maio de 2025. José Cícero Alves da Silva Juiz de Direito