Processo nº 08007037020228100098
Número do Processo:
0800703-70.2022.8.10.0098
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMA
Classe:
APELAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Terceira Câmara de Direito Privado
Última atualização encontrada em
10 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
10/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Terceira Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELTERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Gabinete Desembargador Luiz de França Belchior Silva EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800703-70.2022.8.10.0098 – MATÕES EMBARGANTE: BANCO PAN S/A ADVOGADA: ENY BITTENCOURT - OAB/MA 19.736-A EMBARGADO(A): ANTONIO LUIS DOS SANTOS ADVOGADAS: LENARA ASSUNÇÃO RIBEIRO DA COSTA OAB/MA 21.042-A E CHIRLEY FERREIRA DA SILVA OAB/ 23.556-A RELATOR: DESEMBARGADOR LUIZ DE FRANÇA BELCHIOR SILVA DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Embargos de Declaração interpostos por BANCO PAN S/A em face da decisão de id 37613509, que deu provimento ao Apelo interposto pelo Autor, ANTONIO LUIS DOS SANTOS, para reformar a sentença de primeiro grau. A decisão embargada reconheceu a nulidade da contratação firmada com pessoa analfabeta, ante a ausência de assinatura a rogo no contrato apresentado pela instituição financeira, tendo descumprido os requisitos exigidos para a formalização do negócio jurídico, nos termos do art. 595 do Código Civil. Em razão disso, condenou o Embargante na restituição em dobro dos valores descontados indevidamente do benefício previdenciário do Embargado, assim como ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além das custas judiciais e honorários sucumbenciais no percentual de 20% sobre o valor da condenação. Em suas razões, o Embargante sustenta a existência de omissão na decisão embargada quanto à modulação dos efeitos da repetição em dobro do indébito, sustentando que, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no EAREsp 676.608/RS, tal condenação somente deve atingir valores pagos após a publicação do acórdão em 30/03/2021. Defende ainda a necessidade de compensação dos valores efetivamente disponibilizados à parte autora, conforme comprovante de transferência anexado aos autos, como consequência da declaração de nulidade do contrato, com fundamento no art. 182 do Código Civil, sob pena de enriquecimento ilícito. Alega, por fim, a ocorrência de omissão na decisão recorrida quanto à fixação juros moratórios incidentes sobre os danos materiais e morais de acordo com a Súmula 54 do STJ, quando, segundo o Embargante, deveriam incidir desde a citação, por se tratar de responsabilidade contratual, nos termos do art. 405 do Código Civil. Requer, assim, o acolhimento dos presentes aclaratórios, a fim de sanar os vícios apontados. Sem contrarrazões. É o relatório. Decido. ADMISSIBILIDADE RECURSAL Preenchidos os requisitos intrínsecos de admissibilidade concernentes ao cabimento, legitimidade e interesse recursais, assim como os extrínsecos relativos à tempestividade e regularidade formal, o recurso de Embargos de Declaração deve ser conhecido. MÉRITO De início, cumpre destacar que os Embargos de Declaração, nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, destinam-se exclusivamente a suprir omissão, esclarecer obscuridade ou eliminar contradição no julgado, não sendo meio processual apto à rediscussão do mérito da causa. O Embargante sustenta a existência de omissões em decisão proferida por esta relatoria, ao argumento de que não observou a modulação dos efeitos da repetição em dobro do indébito, nos termos da tese fixada pelo STJ no EAREsp 676.608/RS, segundo a qual tal condenação somente deve atingir valores pagos após a publicação do acórdão, em 30/03/2021. Além disso, defende a necessidade de compensação dos valores efetivamente disponibilizados à parte autora e se insurge quanto à fixação juros moratórios incidentes sobre os danos materiais e morais de acordo com a Súmula 54 do STJ. No que tange à suposta omissão na fixação dos juros moratórios sobre a indenização por danos materiais e morais, esta não se verifica. A decisão embargada aplicou corretamente a orientação da Súmula 54 do STJ, segundo a qual, em casos de responsabilidade extracontratual, os juros fluem a partir do evento danoso. Assim, a alegação de que o julgado incorreu em omissão ao fixar tal termo inicial não prospera, pois decorre de juízo deliberado e fundamentado, que adotou tese consolidada pelos tribunais superiores. Eventual inconformismo com essa orientação deve ser manifestado pela via recursal própria, não por meio de embargos de declaração. No que concerne à compensação dos valores eventualmente recebidos pela parte autora, verifica-se que assiste razão ao Embargante. Isso porque, ainda que reconhecida a nulidade do pacto, observa-se que houve efetiva transferência de valor à parte autora, restando demonstrado nos autos que o Embargado recebeu o crédito de R$ 8.258,53 (oito mil, duzentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e três centavos), em 04/03/2020, de acordo com o recibo de transferência (TED) de ID 30002586. À luz do art. 6º do Código de Processo Civil, cabia ao Embargado, quando alegar que não recebeu o valor contratado, apresentar os extratos da conta na qual o seu benefício é creditado, mormente porque não se desincumbiu do ônus de demonstrar que não usufruiu de tal quantia, conforme dispõe a 1ª Tese do IRDR nº 53.983/2016 TJMA. 1ª TESE: “[...], permanecendo com o consumidor/autor, quando alegar que não recebeu o valor do empréstimo, o dever de colaborar com a Justiça (CPC, art. 6º) e fazer a juntada do seu extrato bancário, embora este não deva ser considerado, pelo juiz, como documento essencial para a propositura da ação.” (grifou-se) Ressalta-se que a compensação não afasta o reconhecimento da nulidade do contrato, tampouco desonera o Embargante das demais consequências da declaração de nulidade da relação jurídica. Trata-se, aqui, de mera adequação do quantum condenatório, a fim de evitar enriquecimento indevido da parte autora, diante do recebimento de valores cuja devolução ou dedução deve ser expressamente determinada. Por tais razões, deve-se proceder à dedução/compensação desse montante até o limite do que será recebido pelo Embargado, nos termos do art. 368, art. 876 e art. 884 do Código Civil. A devolução/compensação ao Autor será corrigida pelo INPC a partir da data em foi disponibilizado o crédito. A propósito, cite-se o seguinte julgado desta E. Corte: EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. APLICAÇÃO DE TESE FIRMADA EM IRDR. NÃO COMPROVAÇÃO DA CONTRATAÇÃO. IRREGULAR. DEVER DO BANCO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO CABÍVEL. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM ARBITRADO DE ACORDO COM OS PARÂMETROS JURISPRUDENCIAIS. COMPENSAÇÃO. (...) V. Objetivando evitar enriquecimento sem causa, a indenização devida pela instituição financeira deverá ser compensada por valor transferido a título do contrato questionado Id. 33587876, sobre o qual deverá incidir apenas correção monetária (IPCA), a contar da data da disponibilização da quantia à consumidora, sendo ônus desta (consumidora/apelada) a juntada dos extratos bancários, nos termos da 1ª Tese do IRDR nº 53.983/2016, sob pena de considerar válidas as informações apresentadas pelo Apelante. VI. Apelo conhecido e desprovido. (ApCiv 0803845-61.2023.8.10.0029, Rel. Desembargador(a) LUIZ GONZAGA ALMEIDA FILHO, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, DJe 12/05/2024) Por conseguinte, quanto à repetição do indébito, importa ressaltar que, a Corte Especial do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência, EAREsp 676.608/RS fixou tese, de que "A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva." Desse modo, para que haja a devolução em dobro não mais se exige a demonstração da culpa ou má-fé do fornecedor, sendo, portanto, irrelevante o elemento volitivo que deu causa à cobrança indevida. Cabe destacar, no entanto, que houve modulação dos efeitos do julgado, para somente ser aplicada aos indébitos posteriores à publicação do acórdão, em 30 de março de 2021, conforme se extrai de modo expresso da 3ª tese definida e do EREsp 1.413.542/RS, e, por não se presumir a má-fé, a falta de provas de sua existência impede a repetição em dobro do tempo anterior à publicação do acórdão antes referido. A propósito, cite-se o seguinte precedente: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DISSÍDIO. COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA. VÍCIO SUBSTANCIAL INSANÁVEL. ACÓRDÃO PARADIGMA. INTEIRO TEOR. JUNTADA. AUSÊNCIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. MÁ-FÉ DO CREDOR. COBRANÇA INDEVIDA. RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES. MODULAÇÃO. DANOS MORAIS. SÚMULA Nº 420/STJ. RECURSO ESPECIAL. REJULGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que para se comprovar a existência de dissídio em embargos de divergência, devem ser cumpridas as seguintes diligências: a) juntada de certidões; b) apresentação de cópias do inteiro teor dos acórdãos apontados como paradigmas; c) citação do repositório oficial autorizado ou credenciado no qual eles se encontrem publicados, inclusive, em mídia eletrônica, e (d) reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores com a indicação da respectiva fonte. 2. É pacífico o entendimento desta Corte de que o não cumprimentos dos requisitos para a demonstração da divergência jurisprudencial se trata de vício substancial, sendo incabível a concessão do prazo previsto no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do CPC, que somente é aplicado aos casos em que a parte deve sanar vício estritamente formal. Precedentes. 3. No caso, o embargante não colacionou aos autos o inteiro teor dos julgados paradigmas. 4. A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo. Precedente: EAREsp nº 676.608/RS, Relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021.5. Esse entendimento, todavia, por modulação de efeitos também aprovada na mesma ocasião, somente é aplicável as cobranças não decorrentes de prestação de serviço público realizadas após a data da publicação do acórdão em que fixado o precedente - o que não é o caso dos autos.6. Nos termos da Súmula nº 420/STJ, é "Incabível, em embargos de divergência, discutir o valor de indenização por danos morais".7. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt nos EREsp: 1951717 RJ 2021/0216092-4, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 25/06/2024, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 01/07/2024) Desse modo, assiste igualmente razão ao Embargante nesse ponto, a fim de modular os efeitos da condenação, para que, os descontos decorrentes da tarifa impugnada nos autos, realizados até 30/03/2021, serem restituídos de forma simples, ao passo que os descontos efetuados após essa data deverão ser restituídos de forma dobrada, valores que serão apurados em sede de liquidação de sentença. DISPOSITIVO Ante o exposto, o caso é de conhecimento e PARCIAL ACOLHIMENTO dos Embargos de Declaração, reformando a decisão monocrática, para determinar que a restituição dos valores descontados indevidamente a título do contrato impugnado nos autos se dê na forma simples, até o dia 30/03/2021, enquanto os demais deverão ser restituídos em dobro (EAREsp 676.608/RS), compensando-se o valor de R$ 8.258,53 (oito mil, duzentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e três centavos) creditado à conta do Embargado, tudo a ser apurado em liquidação de sentença. (fundamentada de acordo com o artigo 93, inciso IX, da CF/88 e artigo 11, do CPC/2015). Publique-se. Cumpra-se. São Luís, data registrada no sistema. Desembargador Luiz de França BELCHIOR SILVA Relator AJ05