Maxima Regina Santos De Carvalho x Bruno Machado Colela Maciel e outros
Número do Processo:
0802023-50.2023.8.10.0057
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMA
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara de Santa Luzia
Última atualização encontrada em
11 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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13/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Terceira Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELTERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0802023-50.2023.8.10.0057 – SANTA LUZIA APELANTE: Enedina Pereira Santos ADVOGADA: Dra. Máxima Regina Santos de Carvalho Ferreira (OAB/MA 12.705) APELADO: Banco Bradesco Financiamentos S.A. ADVOGADO: Dr. Bruno Machado Colela Maciel (OAB/DF 16.760) RELATOR: Desembargador RICARDO DUAILIBE DECISÃO Trata-se de Apelação Cível interposta por Enedina Pereira Santos contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Santa Luzia/MA que, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade c/c Indenização por Danos Materiais e Morais, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, condenando a Apelante a arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. Em suas razões recursais (Id. nº. 35690870), a Apelante, após breve síntese da demanda, sustenta a nulidade da contratação, visto ter inobservado as formalidades necessárias para sua celebração, previstas no art. 595 do Código Civil, por ausência de assinatura a rogo, considerando ser analfabeta. Defende a necessidade de serem reparados os danos morais sofridos e a restituição, em dobro, dos valores indevidamente descontados. Ao final, pleiteia o conhecimento e provimento do recurso, para reformar a sentença vergastada e julgar procedente a lide. Intimado na forma da lei, o Apelado apresentou contrarrazões no Id. nº. 35690872, ocasião em que refuta as teses aventadas, pleiteando o improvimento do recurso. A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra da Procuradora Dra. Mariléa Campos dos Santos Costa, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do recurso (Id. nº. 45452860). É o relatório. Em sede de análise prévia, verifica-se que estão presentes os requisitos intrínsecos de admissibilidade, atinentes ao cabimento, legitimidade e interesse recursal, assim como os extrínsecos, concernentes à tempestividade e regularidade formal. Por ser a Apelante beneficiária da gratuidade da justiça, esta se encontra dispensado do recolhimento do preparo recursal, nos termos do art. 98 e seguintes do CPC, razão pela qual conheço o recurso. A questão versa sobre tema que se encontra pacificado no âmbito da jurisprudência, razão pela qual, analiso e julgo monocraticamente o recurso interposto, nos termos do art. 932, IV e V, do CPC. Adentrando à matéria de fundo, observa-se, da narrativa empreendida na inicial (Id. n° 29246720), que a Apelante verificou que estão sendo descontados valores de sua conta bancária, referentes a empréstimo que alega não ter conhecimento. Afirmando que desconhece a forma válida da relação contratual de crédito com a instituição financeira, foi deduzida pretensão, objeto dos presentes autos, para que fossem reparados os danos suportados em virtude do negócio questionado. Partindo para a análise das matérias devolvidas no mérito do recurso, importante esclarecer que a apreciação do contexto fático e dos fundamentos jurídicos a cargo deste Tribunal de Justiça devem ser feitos à luz das diretrizes estabelecidas no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 53983/2016, que apreciou e julgou diversas teses que suscitavam julgamentos divergentes no Judiciário Maranhense, de 1º e 2º Graus, relativas à temática em debate. Cumpre transcrever, para melhor enfrentamento do tema, a 1ª Tese firmada pelo Tribunal Pleno deste TJ/MA em sede do aludido IRDR nº 53.983/2016, que convencionou da seguinte forma, in verbis: 1ª TESE: "Independentemente da inversão do ônus da prova - que deve ser decretada apenas nas hipóteses autorizadas pelo art. 6º VIII do CDC, segundo avaliação do magistrado no caso concreto -, cabe à instituição financeira/ré, enquanto fato impeditivo e modificativo do direito do consumidor/autor (CPC, art. 373, II), o ônus de provar que houve a contratação do empréstimo consignado, mediante a juntada do contrato ou de outro documento capaz de revelar a manifestação de vontade do consumidor no sentido de firmar o negócio jurídico, permanecendo com o consumidor/autor, quando alegar que não recebeu o valor do empréstimo, o dever de colaborar com a Justiça (CPC, art. 6º) e fazer a juntada do seu extrato bancário, embora este não deva ser considerado, pelo juiz, como documento essencial para a propositura da ação. Nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante do contrato juntado ao processo, cabe à instituição financeira/ré o ônus de provar essa autenticidade (CPC, art. 429 II), por meio de perícia grafotécnica ou mediante os meios de prova legais ou moralmente legítimos (CPC, art. 369)." Durante a instrução processual o Apelado trouxe aos autos o instrumento contratual discutido (Id. nº. 35690864), que não observa os requisitos do art. 595 do Código Civil, por ausência de assinatura de terceiro a rogo, considerando se tratar de consumidora analfabeta. Nesse contexto, a sentença deve ser reformada, na medida os instrumentos apresentados pela instituição bancária são incapazes de comprovar a regularidade da contratação. Verifica-se, nesse particular, que o Decisum de 1º Grau encontra-se em desconformidade com as disposições contidas na 1ª Tese do IRDR em comento, na medida em que esta estabeleceu que compete à instituição financeira, enquanto fato impeditivo e modificativo do direito alegado na inicial (CPC, art. 373, II), o ônus de provar que houve a contratação do empréstimo, mediante a juntada do contrato ou de outro documento capaz de revelar a manifestação de vontade do consumidor no sentido de firmar o negócio jurídico, o que não se vislumbra nos autos. Cabe, portanto, declarar a nulidade do contrato discutido, com a consequente determinação para cessarem eventuais descontos que porventura ainda estejam sendo realizados. Dessa forma, deve incidir na hipótese vertente a responsabilidade do Apelado pelos prejuízos patrimoniais e morais experimentados pelo consumidor. Conforme o disposto no art. 14 do CDC, a responsabilidade das instituições bancárias por danos causados aos clientes é objetiva, sendo irrelevante que tenha agido com ou sem culpa. Nessa esteira, é possível concluir que a responsabilidade do Banco decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se as fraudes como fortuito interno, conforme já sufragado na edição da Súmula n° 479 do Superior Tribunal de Justiça que dispõe: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Ainda a esse respeito, confira-se o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES OU DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DANO IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. No julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.197.929/PR (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 12/9/2011), processado nos moldes do art. 543-C do CPC, foi firmado o entendimento de que "as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno". […] 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp nº 722.226/MG, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. em 17/03/2016, in DJe de 12/04/2016) Além disso, pode-se afirmar que o Apelado agiu com culpa ao realizar descontos sem a comprovação efetiva da legalidade da existência do vínculo contratual, tendo o Juízo a quo amparado sua fundamentação nas determinações contidas na 1ª Tese firmada pelo Tribunal Pleno deste TJ/MA em sede do IRDR nº 53.983/2016. Desse modo, não se cogita da ocorrência de um exercício regular de um direito (art. 188, I do Código Civil), reputando-se reunidos os elementos necessários à configuração da responsabilidade civil no presente caso. Destarte, impõe-se a restituição em dobro dos valores cobrados de modo indevido, conforme previsto no art. 42, parágrafo único do CDC. Desta forma, entende-se que o mero argumento de que não é qualquer cobrança indevida que gera o direito à restituição em dobro, não deve ser acolhido no caso em tela para afastar o pagamento na forma dobrada, pois caberia ao Recorrido evitar a ocorrência destas condutas praticadas por terceiros. Tal conclusão, encontra-se em consonância com a 3ª Tese firmada pelo Pleno desta Corte de Justiça no julgamento do IRDR nº 53983/2016, segunda a qual “É cabível a repetição do indébito em dobro nos casos de empréstimos consignados quando a instituição financeira não conseguir comprovar a validade do contrato celebrado com a parte autora, restando configurada má-fé da instituição, resguardadas as hipóteses de enganos justificáveis”. Deve, portanto, ser reformada a sentença, para condenar a instituição financeira a restituir em dobro os valores cobrados indevidamente referente aos contratos discutido, cujo montante deverá ser apurado em sede de liquidação de sentença, sendo indevida qualquer compensação, visto que não há prova robusta da transferência da quantia à consumidora. Do mesmo modo, assiste razão ao argumento do Recorrente quanto à existência de provas concretas sobre a ocorrência de dano moral. Na espécie, presume-se a lesão ao patrimônio imaterial do consumidor em razão dos descontos indevidos de prestações relativas a empréstimo inexistente, que diminuíram valor destinado à sua subsistência – lesão esta, aliás, que pode ser experimentada por qualquer homem médio a vivenciar a mesma situação. Considerando-se a natureza do dano sofrido pelo Recorrente, tem-se que a indenização a título de danos morais deve ser fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que se mostra suficiente para indenizar o dano moral neste caso, além de refletir os parâmetros prescritos no art. 944 do Código Civil. Em casos semelhantes, esse E. Tribunal de Justiça entende que este montante afigura-se razoável para a reparação de danos dessa espécie. Veja-se: APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO NÃO FORNECIDO. INEXISTÊNCIA DO CONTRATO. DEVER DO BANCO DE RESTITUIR EM DOBRO AS PARCELAS DESCONTADAS DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO. PRECEDENTES PERSUASIVOS DO STJ. DESPROVIMENTO DO RECURSO DO BANCO. PROVIDO O RECURSO DA PARTE AUTORA. 1. Ao julgar o IRDR nº 53.983/2016, o Plenário do TJMA fixou a tese de que, nos contratos de empréstimo consignado, firmado com pessoas de baixa renda, pensionistas ou aposentadas pelo INSS, “[…] cabe à instituição financeira/ré, enquanto fato impeditivo e modificativo do direito do consumidor/autor (CPC, art. 373, II), o ônus de provar que houve a contratação do empréstimo consignado, mediante a juntada do contrato ou de outro documento capaz de revelar a manifestação de vontade do consumidor no sentido de firmar o negócio jurídico […]”. 2. Logo, não comprovada a existência do contrato, ou seja, a causa jurídica dos descontos, por meio da juntada do instrumento particular aos autos, o contrato deve ser considerado inexistente, desfazendo-se todos os efeitos jurídicos dele decorrentes, o que inclui a devolução, em dobro, de todos os descontos indevidos ocorridos no benefício previdenciário da parte autora. 3. Quanto aos danos morais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça considera que fatos como o relatado nos autos geram o dever de indenizar, no valor razoável e proporcional de R$ 10.000,00, suficientes à reparação do dano, sem levar ao enriquecimento sem causa do aposentado/pensionista. 4. Apelo do banco desprovido; recurso da parte autora, provido, com majoração dos danos morais para R$ 10.000,00. (ApCiv 0801171-95.2023.8.10.0034, Rel. Desembargador(a) RAIMUNDO MORAES BOGEA, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, DJe 21/11/2023) PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. NÃO COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ILICITUDE. DESCONTOS INDEVIDOS SOBRE PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ÔNUS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INCIDÊNCIA DO CDC. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DAS PARCELAS DESCONTADAS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DANOS MORAIS. RECONHECIMENTO. NECESSIDADE DE MAJORAÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APELO CONHECIDO E DOU PROVIMENTO MAJORAR DANOS MORAIS PARA R$10.000,00 EM DESACORDO COM PARECER MINISTERIAL ACÓRDÃO UNANIMEMENTE, A PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO CONHECEU E DEU PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DA DESEMBARGADORA RELATORA. (ApCiv 0803557-15.2020.8.10.0031, Rel. Desembargador(a) NELMA CELESTE SOUZA SILVA SARNEY COSTA, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, DJe 16/11/2023) (Destaquei) No cálculo do dano moral, a correção monetária conta-se pelo INPC, desde a data do arbitramento definitivo da indenização, de acordo com a Súmula nº 362 do STJ e os juros moratórios a partir do evento danoso. Quanto aos danos materiais, a correção monetária e os juros contam-se a partir do efetivo prejuízo, conforme disposto na Súmula nº 43 do STJ. Acrescente-se que nos danos morais e materiais, os juros devem ser contados no percentual de 1% a.m. (um por cento ao mês), nos termos do art. 406 do Código Civil, c/c o art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. Por derradeiro, deixo de determinar a compensação mencionada pelo Apelado, tendo em vista a ausência de comprovante de transferência válido, que demonstre a disponibilização do montante à consumidora, na medida em que a instituição financeira, nesse particular, limitou-se a apresentar a tela do seu sistema interno, sem a devida autenticação, e o extrato bancário da consumidora sem a indicação efetiva do recebimento do valor contratado. Em decorrência da modificação do julgado, inverte-se os ônus sucumbenciais, cabendo ao Apelado arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, estes no importe de 20% (vinte por cento) do valor da condenação, em consonância com o disposto no art. 85, §2º, do CPC. Ante o exposto, na forma do art. 932, V, do CPC, e de acordo com o parecer Ministerial, conheço e dou provimento ao Apelo, para reformar a sentença e julgar procedente a lide, para declarar a nulidade do contrato celebrado, com a consequente ordem para cessarem os descontos provenientes, e para condenar o Apelado a restituir, em dobro, o montante indevidamente descontado e a pagar o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais, nos termos da fundamentação supra. Publique-se. Intimem-se. São Luís (MA), data do sistema. Desembargador RICARDO DUAILIBE Relator (A14)