Ministerio Publico Do Estado Do Rio De Janeiro e outros x Leonardo Gonçalves Da Silva e outros

Número do Processo: 0802722-11.2023.8.19.0083

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRJ
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Grau: 1º Grau
Órgão: 2ª Vara da Comarca de Japeri
Última atualização encontrada em 02 de julho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 02/07/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Vara da Comarca de Japeri | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
    Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca de Japeri 2ª Vara da Comarca de Japeri Rua Vereador Francisco Costa Filho, 1900, Engenheiro Pedreira, JAPERI - RJ - CEP: 26453-020 SENTENÇA Processo: 0802722-11.2023.8.19.0083 Classe: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) AUTOR: RIO DE JANEIRO SECRETARIA DE EST. DE SEGURANCA PUBLICA, MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RÉU: LEONARDO GONÇALVES DA SILVA, MAX GONCALVES DE LIMA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO MAX GONCALVES DE LIMA I-Relatório Leonardo Gonçalves da Silva e Max Gonçalves de Lima, qualificados nos autos, foram denunciados como incursos nas penas dos artigos 155, §1º, e §4°, IV, na forma do artigo 69, todos do Código Penal, nos seguintes termos (id. 73775623): “No dia 15 de agosto de 2023, por volta das 23h40min, na Estação Ferroviária de Japeri, nesta Comarca, os DENUNCIADOS, conscientes e voluntariamente, além de perfeita comunhão de ações e desígnios criminosos entre si, com animus rem sibi habendi, subtraíram, para si ou para outrem, coisa alheia móvel, a saber cabos elétricos pertencentes à empresa ferroviária SUPERVIA, conforme Auto de Apreensão de index 72677311, Registro de Ocorrência de index 72677307 e Laudo de Exame de Material a ser oportunamente juntado aos autos. Segundo consta nos autos, no dia dos fatos, o vigilante da empresa SUPERVIA, Vagner Soté da Silva, estava de serviço quando avistou dois indivíduos furtando cabos localizados entre os vagões das locomotivas ferroviárias. Diante disso, policiais militares foram acionados para comparecer à Estação Ferroviária de Japeri, nesta comarca, e, em procedência pelo local, os agentes avistaram os DENUNCIADOS em posse de uma sacola com fios elétricos. Na ocasião, os furtadores tentaram empreender fuga do local, mas, em razão do peso da sacola, não tiveram êxito. Na abordagem, ainda foram apreendidos uma faca de serra e uma chave de boca em posse do DENUNCIADO LEONARDO, instrumentos utilizados para subtrair os cabos elétricos das locomotivas.” Auto de prisão em flagrante no id. 72677306. RO no id. 72677307. Auto de apreensão no id. 72677311. Termos de declaração nos ids. 72677327, 72677321 e 72677310. Audiência de custódia realizada conforme assentada acostada no id. 72960841, ocasião em que foi convertida a prisão em flagrante em prisão preventiva do réu Leonardo e deferida a liberdade provisória ao réu Max. Requerimento de revogação de prisão preventiva no id. 73317166. Manifestação do Ministério Público que opinou contrariamente ao pleito defensivo de revogação da prisão preventiva do réu Leonardo no id. 74290462. Denúncia no id 73775623. Decisão que indeferiu o requerimento de revogação da prisão preventiva no id. 75358475. Resposta à acusação do réu Leonardo no id. 76989257, (ratificada no id. 99000164). Audiência realizada conforme assentada acostada no id. 77173286, ocasião em que foi homologado o ANPP em relação ao indiciado Max e deferido o requerimento de revogação da prisão preventiva do réu Leonardo. Decisão que recebeu a denúncia no id. 78775326. Resposta à acusação do réu Leonardo no id. 80366843. Audiência realizada conforme assentada acostada no id. 113449076, ocasião em que duas testemunhas foram ouvidas, e foi determinada a condução coercitiva da testemunha Vagner Soté da Silva, a vinda dos laudos referentes ao local do fato (id. 72677308), à faca de serra (id. 72677313) e ao pedaço de cabo elétrico (id. 72677317). Laudo de exame de descrição de material (uma chave de boca e uma faca de serra) no id. 113742011. Laudo de exame de descrição de material (pedaços de cabos elétricos) no id. 113742020. Laudo de exame em local de constatação no id. 116905365. Audiência realizada conforme assentada acostada no id. 138788553, ocasião em que uma testemunha foi ouvida e o réu optou por permanecer em silencio. Alegações finais do Ministério Público no id. 148022105, nas quais pugnou pela condenação do réu Leonardo, nos termos da denúncia, e a extinção da punibilidade do réu Max Gonçalves de Lima, nos termos do art. 28-A, §13, do CPP. Alegações finais da defesa do réu no id. 148741443, nas quais requereu: a absolvição em razão da atipicidade material da conduta, em atenção ao princípio da insignificância; a fixação da pena-base no mínimo legal; a incidência da atenuante da confissão, nos termos do art. 65, III, “d”, do CP, ou eventual compensação integral com a agravante da reincidência; o reconhecimento do furto privilegiado; a exclusão da qualificadora contida no §1° e inciso IV do §4º do art. 155 do CP; a suspensão condicional da pena; a fixação do regime inicial aberto para o início do cumprimento da pena; a isenção ao pagamento da pena de multa e a dispensa do pagamento das custas processuais. FAC do réu Leonardo no id. 180405702. Certidão de esclarecimento da FAC do réu Leonardo no id. 180413167. É o relatório. Decido. II – Fundamentação A materialidade da conduta foi comprovada por meio do RO no id. 72677307, do auto de apreensão no id. 72677311, do laudo de exame de descrição de material (uma chave de boca e uma faca de serra) no id. 113742011, do laudo de exame de descrição de material (pedaços de cabos elétricos) no id. 113742020, e do laudo de exame em local de constatação no id. 116905365. A autoria, a seu turno, foi provada pela prisão em flagrante no id. 72677306, pelos termos de declaração nos ids. 72677327, 72677321 e 72677310, e pelos depoimentos constantes nos autos, conforme se demonstrará. A testemunha Vagner Soté da Silva disse (depoimento disponível no PJe mídias), em síntese, que: era vigilante da supervia à época dos fatos; trabalhava no dia dos fatos e presenciou o ocorrido; os vigilantes trabalhavam em dupla; fatos semelhantes ocorriam diariamente na estação; os vigilantes eram divididos em duas equipes, alocadas em regiões distintas; sua equipe era responsável por permanecer no armário de vigilância, o qual proporcionava visão do trânsito de pessoas no interior do trem; avistou os réus em posse de um saco, por isso entrou e ligou para a polícia; os policiais faziam rondas na localidade; fazia bastante contato com os policiais à época dos fatos; não possui mais contato com os policiais; as atividades ilícitas dos réus já era de conhecimento; os réus passavam por debaixo do trem e paravam entre as rodas para subtrair cabos de aterramento; os vigilantes tinham ciência de que tal conduta possuía características de um possível furto e, por esse motivo, acionaram a polícia; os réus foram avistados em movimento, sob os trens, em posse de uma sacola; estava cerca de 50 (cinquenta) a 60 (sessenta) metros de distância dos réus; a denúncia foi realizada para que os policiais pudessem averiguar a situação, com a possibilidade de abordagem e eventual flagrante; permaneceu em seu posto e não se deslocou em direção aos suspeitos; não trabalhava armado e tinha a obrigação de ligar para o 190, caso avistasse alguma atividade suspeita; os policiais chegaram e abordaram os réus; conseguiu confirmar que os indivíduos abordados pela polícia eram os mesmos avistados inicialmente; permaneceu em seu posto por conta de seu raio de ação; viu os policiais conduzindo os réus; reconheceu os réus por conta de suas vestimentas; ao comparecer à delegacia, reconheceu os objetos encontrados em poder dos réus como sendo cabos diversos utilizados em composições ferroviárias, especialmente trens antigos e já fora de uso, que, embora não tivessem mais serventia para a Supervia, possuíam valor comercial em ferro-velho; solicitou o sigilo de sua identidade por atuar em local escuro e exposto, com a função específica de fiscalização de furto de cabos; ficou com medo de qualquer represália e por isso permaneceu no anonimato; não conhecia o réu Leonardo e não recorda das roupas que ele usava na data da ocorrência; existem diversas passagens na estação; realizou a ligação para a polícia por volta das 23h40min, sendo que o flagrante ocorreu aproximadamente às 01h30min; não soube informar se a prisão ocorreu no mesmo local da denúncia, pois não tinha autorização para deixar seu posto; a polícia agiu conforme sua atribuição, após o acionamento, e o depoente saiu de sua posição apenas para prestar esclarecimentos na delegacia; a estação onde os fatos ocorreram possuía um “estacionamento de trens”, com cerca de dez a quinze composições ferroviárias antigas, que já não estavam em operação; não sabe o que a supervia faz com os trens inutilizados; trabalhou na supervia por cerca de 7 (sete) meses; não sabe informar se a Supervia ou seus representantes utilizavam os trens desativados como fonte de peças para manutenção de composições ativas. O policial militar Weverton Dias Brum Lopes disse (depoimento disponível no PJe mídias), em síntese, que: os fatos narrados na denúncia são verdadeiros; os policiais estavam em patrulhamento quando foram avisados sobre um “roubo” na supervia; durante o trajeto, avistou os dois réus, que são irmãos, sendo que um deles portava uma sacola nas costas e o outro o acompanhava; realizou a abordagem e encontrou os cabos do trem, uma faca e uma chave de boca; os réus foram conduzidos à delegacia; os cabos e as ferramentas estavam em posse do réu presente na audiência; não se recorda do horário exato da abordagem, apenas que foi em horário noturno; os réus foram abordados em via pública; o local em que os fatos ocorreram fica no bairro da Chacrinha, em Japeri; não presenciou o momento em que os réus teriam cortado os cabos, apenas os viu transportando os materiais. O policial militar Murilo Lima Mazzalla disse (depoimento disponível no PJe mídias), em síntese, que: os fatos narrados na denúncia são verdadeiros; a localidade dos fatos era conhecida por furtos semelhantes; os policiais foram informados pelo vigilante sobre o ocorrido; os policiais estacionaram a viatura próxima à estação ferroviária, momento em que visualizaram os réus saírem do local dos fatos; foi dada ordem de parada, sendo que o primeiro réu, que não portava a sacola, empreendeu fuga, retornando posteriormente; os indivíduos abordados eram irmãos; o réu presente na audiência era quem transportava a sacola; foram localizados, em posse dos réus, grande quantidade de cabos, de considerável peso, além de ferramentas; os fatos ocorreram por volta das 23:00hrs; os réus foram abordados quando saíam da estação, de dentro de um muro, em local próximo à via pública; os muros da estação são abertos e de fácil acesso; não presenciou o momento em que os cabos foram cortados pelos réus. O réu Leonardo optou por permanecer em silêncio. Os depoimentos prestados pelos policiais militares, responsáveis pela prisão em flagrante, não deixam dúvidas de que o réu Leonardo, em comunhão de ações e desígnios com o indiciado Max, que aceitou o ANPP, subtraíram para si ou para outrem, pedaços de cabos elétricos, bem como ferramentas utilizadas para extração, conforme auto de apreensão acostado ao Id. 72677311. No que se refere à tese de atipicidade da conduta, em razão da insignificância do bem subtraído, não assiste razão à defesa. Isso porque a subtração de cabos elétricos da supervia tem o potencial de interromper a prestação do relevantíssimo serviço de transporte público, o que afeta milhares de pessoas. Nesse sentido, a 5ª Turma do STJ assentou nos autos do AREsp 1.814.453 que, ainda que o objeto furtado seja de pequeno valor, é inviável a aplicação do princípio da insignificância para casos de furto de cabos telefônicos, na medida em que o crime causa considerável prejuízo à coletividade – entendimento que pode ser estendido, com maior razão, ao caso dos autos, que trata de furto de cabos de rede elétrica. Ademais, o crime foi praticado durante o repouso noturno, conforme narrado tanto em sede policial quanto em juízo pelas testemunhas. Contudo, tratando-se de furto qualificado, não deve incidir a causa de aumento de pena do furto praticado durante o repouso noturno, a qual se aplica apenas no caso de furto simples, haja vista sua posição topográfica e a desproporcionalidade em sua aplicação no caso do furto qualificado, que já é mais severamente punido, nos termos do que foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento de Recurso Especial Repetitivo (Tema 1087), o que não impede a aplicação de circunstância judicial negativa na primeira fase dadosimetria da pena, nos termos do artigo 59 do CP. Já com relação ao requerimento de desclassificação para o crime de furto simples, não assiste razão à defesa. Isso porque, restou evidenciado que a conduta delitiva ocorreu em concurso de agentes, uma vez que dois indivíduos, que são irmãos, foram presos em flagrante, conforme atestado nos autos do processo e nas declarações testemunhais já mencionadas. A respeito da validade dos depoimentos dos aludidos policiais militares, merece registro o disposto no verbete sumular nº 70 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, segundo o qual “o fato de a prova oral se restringir a depoimento de autoridades policiais e seus agentes autoriza condenação quando coerentes com as provas dos autos e devidamente fundamentada na sentença”. Assim, ausentes causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade, a condenação do réu Leonardo é medida que se impõe. No que tange ao indiciado Max Gonçalves, verifica-se que foi celebrado e devidamente homologado o Acordo de Não Persecução Penal - ANPP, conforme assentada acostada no id. 77173286 e, conforme certificado nos ids. 144410320 e 144408565, o indiciado Max cumpriu integralmente a condição imposta, consistente na prestação de serviços à comunidade, sem qualquer registro de descumprimento ou revogação das medidas fixadas. Ademais, a defesa de Max peticionou (id. 169621500), ocasião em que esclareceu ter ocorrido o adimplemento total do acordo e postulou expressamente a extinção da punibilidade, nos termos do art. 28-a, §13, do CPP, tal requerimento foi acolhido pelo ministério público, que também se manifestou, nas alegações finais (id. 148022105), pela extinção da punibilidade, ao considerar o fiel cumprimento das obrigações assumidas. Diante do cumprimento integral das condições impostas, a extinção da punibilidade do indiciado Max Gonçalves de Lima é medida que se impõe. III – Dispositivo Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTEa pretensão punitiva estatal e, consequentemente, CONDENOo réu LEONARDO GONÇALVES DA SILVA, qualificado nos autos, pela prática do delito tipificado no artigo 155, §4°, IV, do Código Penal, e JULGO EXTINTA A PUNIBILIDADE do réu MAX GONÇALVES DE LIMA, com fundamento no artigo 28-A, §13 do Código de Processo Penal. Atento às diretrizes dos artigos 68 c/c 59 do Código Penal, passo ao cálculo da pena. PRIMEIRA FASE A culpabilidade do réu é normal para o tipo. Não há notícias acerca de maus antecedentes, bem como não há elementos que permitam a análise da conduta social e da personalidade. Os motivos, as circunstâncias e as consequências são inerentes ao tipo. O comportamento da vítima não influenciou na ação criminosa. Diante disso, fixo a pena-base, no mínimo legal, em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à razão do mínimo legal. SEGUNDA FASE O réu é reincidente, nos termos do artigo 61, I do Código Penal, conforme se extrai da anotação 01 de sua FAC (id. 180405702), esclarecida no id. 180413167, razão por que agravo em 04 (quatro) meses de reclusão e 01 (um) dias-multa, a pena, que fixo, nesta etapa, em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, e 11 (onze) dias-multa, à razão do mínimo legal. TERCEIRA FASE Não incidem causas de aumento ou diminuição de pena. Assim, torno definitiva a pena em 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa, à razão unitária mínima. Fixo o regime semiabertopara início de cumprimento de pena, nos termos do artigo 33, §2º, “b” e “c”, do Código Penal, uma vez que o réu é reincidente. O réu não preenche os requisitos previstos no inciso II do artigo 44 do Código Penal. Logo, não faz jus a substituição da pena. O réu não faz jus à suspensão condicional da pena (sursis), porquanto a pena ora aplicada supera o limite de 2 (dois) anos previsto no art. 77 do Código Penal. Além disso, o réu é reincidente em crime doloso, o que, por si só, impede a concessão do benefício. Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. Deixo de estipular a reparação de danos prevista no artigo 387, IV, porquanto o tema não foi analisado sob o crivo do contraditório. Condeno o réu ao pagamento das custas, na forma do artigo 804 do CPP. Ressalto que eventual isenção deve ser requerida ao Juízo de execução, nos termos do verbete sumular nº 74 do Egrégio TJRJ. Após o trânsito em julgado, promovam-se as anotações, comunicações e diligências de praxe. Publique-se, registre-se, intimem-se. JAPERI, 1 de julho de 2025. LEOPOLDO HEITOR DE ANDRADE MENDES JUNIOR Juiz Titular