Flavio Roberto Siminea Imperador x Airbnb Pagamentos Brasil Ltda. e outros
Número do Processo:
0802796-48.2025.8.20.5004
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
CUMPRIMENTO DE SENTENçA
Grau:
1º Grau
Órgão:
10º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal
Última atualização encontrada em
11 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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17/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 10º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 10º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534, Cidade Alta, Natal/RN, CEP 59025-580. Processo nº.: 0802796-48.2025.8.20.5004 AUTOR: FLAVIO ROBERTO SIMINEA IMPERADOR REU: AIRBNB PAGAMENTOS BRASIL LTDA. SENTENÇA Vistos etc., Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. FLAVIO ROBERTO SIMINEA IMPERADOR ajuizou a presente ação em face de AIRBNB PAGAMENTOS BRASIL LTDA. alegando, em síntese, que efetuou uma reserva de hospedagem na plataforma ré, para o dia 29/12/2024 ao dia 05/01/2025, no total de 7 diárias, para 8 pessoas, na região de Punta del Este, Uruguai, tendo pago a quantia de R$ 32.027,91. Aduz que, no dia 29/12/2024, ao chegar na propriedade com seus amigos e familiares para fazer o check-in, foi surpreendido ao perceber que o imóvel não possui condições de ocupação, com odor forte, como de mofo, levando a crer que o imóvel estava fechado há bastante tempo. Narra que foi verificado que o imóvel estava “inabitável” para o autor e demais hóspedes, visto que foi verificado muito cheiro de mofo, poeira, teias de aranha, abelhas, sujeira no chão, traças em todos os cômodos, falta de itens básicos como papel higiênico nos banheiros, lençois sujos, chuveiros quebrados, jacuzzi na área de lazer com lixo dentro e muita sujeira, dentre outros. Afirma que tentou contato imediato com o proprietário do imóvel informando o estado da casa, mas este refutou, dizendo que a casa estava em ótimas condições. Relata que em contato com a central de apoio ao cliente naquela data do check-in, 29/12/2024, perto das 15h00 ainda, tentou contato tanto pelo chat da plataforma, enviando imediatamente todas as fotos aqui anexadas, a fim de que conseguissem o cancelamento da reserva com reembolso dos valores pagos, visto que foi uma quantia alta, mais de R$ 32.000,00, porém a requerida não forneceu uma solução ao caso, até que uma das ligações, uma atendente, de imediato, deu uma solução para o caso, onde a mesma afirmou que estaria reembolsando as diárias não utilizadas, bem como dando um reembolso de 30% das diárias que tivessem sido utilizadas, e um desconto para futuras reservas. Explana que prontamente aceitou, porém ao confirmar o que foi proposto e saber quais seriam os próximos passos, a ligação ficou “muda” e, posteriormente, a ligação foi encerrada. Afirma que já estavam há 2 dias naquela situação vexatória, em uma hospedagem degradante, suja, com chuveiro quebrado, com abelhas, não tiveram alternativa, e mesmo sem ter a confirmação do cancelamento e reembolso da reserva, efetuaram outra reserva de hospedagem em outra propriedade (também na plataforma AIRBNB), no dia 31/12/2024, tendo saído todos imediatamente da propriedade reservada. Aduz que ao fechar todo o imóvel, fez várias fotos de como entregou o imóvel, e fechou todas portas e janelas, deixando a chave no mesmo local que encontrou e avisou ao promovido e ao proprietário do imóvel. Relata que somente após fazer nova reserva, ficando com duas reservas ativas e pagas, o AIRBNB avisou via chat, em sua plataforma, que a reserva inicial estaria sendo cancelada os dias restantes com o devido reembolso, bem como as duas diárias utilizadas iriam ser reembolsadas 30% do valor pago. Por tais motivos, requer a condenação da parte Ré ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, equivalente a 70% das diárias utilizadas no imóvel. Na questão que envolve o rito processual, considerando os termos da Portaria Conjunta nº 38/2020 do TJRN e Corregedoria de Justiça, que manteve suspenso o expediente presencial nos Juizados Especiais Cíveis, não houve audiência de conciliação para se promover a tentativa de conciliar via autos, a qual restou infrutífera. Em sua contestação, a parte demandada alega ter realizado o reembolso devido e sustenta a inexistência de qualquer dano extrapatrimonial causado ao autor. Além disso, argumenta ser incabível a inversão do ônus da prova, requerendo, ao final, a total improcedência dos pedidos formulados na petição inicial. Sobreveio manifestação autoral que rechaça os fundamentos da defesa, em que relata o autor que somente após ter feito a nova reserva, que o AIRBNB cumpriu o que tinha prometido em uma das ligações, que seria o reembolso de 30% das diárias utilizadas, reembolso de 100% das diárias não utilizadas e um voucher de 20% do valor da reserva inicial. É o que importa mencionar. Passo a decidir. Ab initio, cumpre que se verse acerca da Preliminar ventilada pela parte Requerida na qualidade de instrumento obstativo do prosseguimento meritório da lide. A parte Ré suscitou a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam sob o fundamento de que ‘’(...) a relação contratual relativa à reserva da acomodação foi estabelecida diretamente entre Hóspede e Anfitrião’’. Todavia, rejeito a preliminar arguida, uma vez que a relação dos autos apresenta natureza consumerista, o que atrai a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, haja vista a caracterização das partes como consumidora e fornecedora de produtos ou serviços, na forma preceituada nos artigos 2° e 3º da Lei 8.078/90. O Código de Defesa do Consumidor estabelece como regra a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que integram a cadeia de consumo (artigo 7º, parágrafo único; artigos 18 e 19; artigo 25, § 1º). Vejamos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PLATAFORMA "ONLINE" DESTINADA À BUSCA DE HOSPEDAGENS. AIRBNB. ALTERAÇÃO DO PREÇO DA TARIFA PELO "ANFITRIÃO" APÓS A SOLICITAÇÃO DA RESERVA. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL. PROVA. AUSÊNCIA. MERO ABORRECIMENTO. 1. A relação jurídica estabelecida entre o usuário e a plataforma "online" destinada à busca de hospedagens por temporada encontra acobertada pelas normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, especialmente naquelas contidas no art. 14, que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços. 2. Para a configuração do dano moral é imprescindível que a agressão atinja o sentimento íntimo e pessoal de dignidade do indivíduo. Afinal, à luz da Constituição Federal, o dano moral consubstancia-se justamente na ofensa à dignidade humana. 3. Não é crível que o defeito na prestação do serviço, sem maiores repercussões ou reflexos extravagantes na esfera dos direitos da personalidade, possa causar dor e sofrimento capazes de caracterizar dano moral. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.20.487590-0/001 , Relator(a): Des.(a) Cláudia Maia , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/11/0020, publicação da súmula em 19/11/2020 - g.n.) (Grifos acrescidos) Passo ao mérito. A presente demanda tem por objeto pedido indenizatório decorrente de conduta ilícita atribuída à parte Ré, relacionada ao serviço de intermediação de hospedagem por ela oferecido, pois o imóvel disponibilizado ao Autor apresentava condições significativamente inferiores àquelas anunciadas, agravado pela ausência de suporte administrativo adequado por parte da plataforma Ré, mesmo após devidamente informada sobre os problemas enfrentados durante a hospedagem. Destaco que incidem ao caso as regras insertas no Código de Defesa do Consumidor, na medida em que se trata de relação de consumo o conflito trazido aos autos, como quer a dicção dos arts. 2º e 3º do CDC, sendo, portanto, perfeitamente aplicável o art. 6º, VIII, do referido diploma legal, que estabelece a inversão do ônus probatório, desde que verossímil a alegação ou verificada a hipossuficiência do consumidor, hipótese vertente. No que atine ao pleito indenizatório, a reparação de danos morais e materiais encontra guarida na Constituição Federal, art. 5º, incisos V e X, no Código Civil, art. 186 e 927, e no Código de Defesa do Consumidor, artigo 14, sendo os requisitos para a imposição da responsabilidade civil e a consequente obrigação de indenizar: uma conduta danosa, um dano e o nexo de causalidade entre aquela e este. No caso dos autos, tendo em vista ter se tratado de relação de consumo, a responsabilidade civil independe da culpa aquiliana prevista no Código Civil, pois é objetiva, na forma do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. Afastada a necessidade de comprovar a existência da culpa para a imposição da responsabilidade pela reparação dos danos sofridos, basta verificar a efetivação do dano e o nexo de causalidade entre ele e a conduta do qual se originou. Observo que o Requerente juntou aos autos comprovante de reserva efetuada por meio do serviço de busca oferecido pela parte Ré, as tentativas de resolução direta tanto com terceiro anfitrião quanto com a Requerida, bem como uma série de imagens fotográficas que demonstram de modo suficiente a disparidade entre a hospedagem anunciada e a efetivamente fornecida. Resta, portanto, comprovada a falha na prestação de serviços da parte Ré, em virtude do descumprimento contratual por fornecer hospedagem de características diversas da apresentada em sua plataforma de busca, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Diante disso, a parte Autora pleiteia o ressarcimento do valor desembolsado pela contratação da mencionada hospedagem. Contudo, ao analisar os documentos anexados à contestação, constata-se que a Requerida já efetuou a devolução parcial do valor correspondente às duas diárias efetivamente utilizadas pelo Autor, além de ter restituído integralmente o montante relativo às diárias não usufruídas, conforme reconhecido pelo requerente em réplica. Com efeito, verifico que a empresa Ré, além de restituir os valores pagos em razão do cancelamento da reserva, disponibilizou ao Demandante crédito no montante de R$ 6.200,00, destinado a compensar parte dos custos suportados pelo Autor em decorrência do descumprimento contratual e da necessidade de contratação de nova hospedagem. Dessa forma, embora reste caracterizada a falha na prestação do serviço, entendo que, no que se refere ao ressarcimento material requerido, a pretensão autoral já foi integralmente satisfeita. Conceder o ressarcimento integral, inclusive das diárias efetivamente utilizadas pela parte autora, equivaleria a proporcionar ao requerente a gratuidade da hospedagem, o que contraria a natureza onerosa do contrato firmado entre as partes. Ademais, tal medida resultaria em evidente enriquecimento ilícito por parte do autor, uma vez que, ainda que o serviço não tenha sido prestado de forma satisfatória, foi, de fato, usufruído pelo requerente. Por conseguinte, impõe-se o indeferimento do pedido de indenização por danos materiais. Quanto ao pedido para condenação da parte Ré ao pagamento de indenização por dano moral, em análise aos fatos narrados, vejo que restou demonstrada a configuração de uma atuação indevida por parte da Demandada, visto que impôs ao Autor a necessidade de buscar nova hospedagem enquanto este já se encontrava no local de destino e com justificável expectativa de poder usufruir do apartamento previamente alugado, em violação aos direitos básicos do consumidor previstos no art. 6º do Código de Defesa do Consumidor. O nexo de causalidade é evidente, tendo em vista que o autor foi submetido a verdadeiro abuso de direito perpetrado solidariamente pela Ré, diante dos fatos ocorridos. Assim, fica caracterizado o preenchimento de todos os requisitos configuradores da responsabilidade civil, nos moldes do art. 927 do Código Civil: comprovação de um ato ilícito praticado pela demandada; de um dano extrapatrimonial suportado pelo autor; e de um nexo causal entre a conduta e o dano. Fixado o dever de indenizar, faz-se necessária a estipulação do valor pecuniário para a reparação dos danos morais pelo caráter subjetivo que possui. Vários critérios são adotados, dentre os quais destacam-se a posição social do ofendido, a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela e a extensão do dano. Entende-se que todos esses fatores devem ser considerados quando existem dados sobre eles nos autos, mas o que deve preponderar para o arbitramento do valor há de ser o último critério acima, ou seja, a proporcionalidade em relação à extensão do dano. E, sobretudo deve haver prudência e equilíbrio, de modo que o valor a ser arbitrado não represente enriquecimento da vítima do dano e nem seja tão insignificante a ponto de não desestimular o ofensor na reiteração da conduta, dado o caráter punitivo-pedagógico do instituto. Considerando todas estas ponderações, arbitra-se o valor da indenização pelos danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). DISPOSITIVO Em face do exposto, JULGO PROCEDENTE em parte a pretensão encartada na inicial para CONDENAR a parte Ré, AIRBNB PAGAMENTOS BRASIL LTDA., a pagar a parte Autora, FLAVIO ROBERTO SIMINEA IMPERADOR, a importância de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, no prazo máximo de 15 (quinze) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do Art. 523, §1º do CPC. Sobre o valor da indenização por danos morais deverão incidir juros (1% a.m.) e correção monetária (Tabela JFRN) a contar da publicação da sentença, conforme Súmula 362 do STJ. Sem custas e honorários advocatícios, em conformidade com os arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. À consideração da magistrada titular deste Juizado Especial. Intimem-se. A parte autora fica ciente que, decorrido o prazo do cumprimento voluntário e não havendo o pagamento, deverá requerer a execução do julgado. Após o trânsito em julgado determino o arquivamento dos autos. Natália Maria Evangelista Fernandes Aragão Juíza Leiga HOMOLOGAÇÃO Com arrimo no art. 40 da Lei nº 9.099/95, bem como por nada ter a acrescentar ao entendimento acima exposto, HOMOLOGO na íntegra o projeto de sentença para que surta seus efeitos jurídicos e legais. Natal/RN, 16 de junho de 2025 (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06) ANA CLÁUDIA FLORÊNCIO WAICK Juíza de Direito