Processo nº 08030005720238100052
Número do Processo:
0803000-57.2023.8.10.0052
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMA
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
1ª Vara de Pinheiro
Última atualização encontrada em
09 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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13/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara de Pinheiro | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO 1ª VARA DA COMARCA DE PINHEIRO Praça José Sarney, s/nº, Centro, Pinheiro/MA - CEP: 65200-000. e-mail: vara1_pin@tjma.jus.br. tel.: (98) 2055-4192 PROCESSO Nº. 0803000-57.2023.8.10.0052 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: MARIA CANDIDA SILVA ARAUJO Advogado(s) do reclamante: FERNANDO CAMPOS DE SA (OAB 12901-MA), ARTUR FELIPE FERRAZ DE ANDRADE (OAB 20903-PA), NATHALLY DOS ANJOS PEREIRA DE OLIVEIRA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO NATHALLY DOS ANJOS PEREIRA DE OLIVEIRA (OAB 14935-MA) REQUERIDO(A): BANCO DO BRASIL SA Advogado(s) do reclamado: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES (OAB 9348-MA) SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ajuizada por MARIA CANDIDA SILVA ARAUJO em face do BANCO DO BRASIL S.A., ambos devidamente qualificados nos autos. A parte autora narra, em sua petição inicial, ser cliente do banco requerido, possuindo a Conta Bancária de nº 28.937-X, Agência nº 0566-5, por meio da qual recebe seu benefício de Pensão por Morte, sob o NB 100.459.167-62. Relata que, em 07 de fevereiro de 2023, ao procurar o INSS de São Bento, tomou ciência de que criminosos, utilizando documentos falsos, haviam transferido seu benefício para uma agência do Banco CREFISA em São Luís/MA. Diante disso, o INSS providenciou a transferência do benefício para a agência do banco SICOOB de Pinheiro/MA, onde a autora passou a recebê-lo normalmente. Contudo, em 03 de maio de 2023, foi novamente surpreendida com a transferência de seu benefício, desta vez para a agência do Banco do Brasil na cidade de Miranda do Norte/MA. Imediatamente, no mesmo dia, a requerente procurou a agência do reclamado em Pinheiro/MA, informando sobre a transferência indevida e apresentando ao atendente uma cópia da identidade falsa utilizada na fraude, documento este que obteve ao acessar o sistema "Meu INSS". A autora solicitou, então, que o pagamento de seu benefício fosse realizado em sua conta poupança já existente no Banco do Brasil, passando a recebê-lo regularmente. Relata que a situação se agravou em 02 de agosto de 2023, quando a requerente, ao se dirigir à agência do banco em Pinheiro/MA para receber seu benefício, verificou, ao tirar o extrato, que havia apenas o valor de R$ 2.659,26 (dois mil seiscentos e cinquenta e nove reais e vinte e seis centavos), tendo sido retirado de sua conta mais de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) por meio de diversas transações que desconhece e não autorizou. As movimentações indevidas incluíram saques contra recibo, transferências via PIX e TED para terceiros (Andressa Milena De Jesus M, Maria Luiza De Jesus, Wilson Araujo Silva), totalizando R$ 32.130,12 (trinta e dois mil, cento e trinta reais e doze centavos) entre as contas poupança e corrente. Ao retornar à agência após registrar um Boletim de Ocorrência (ID 99957373), a autora constatou que mais R$ 2.000,00 (dois mil reais) haviam sido sacados, restando-lhe apenas R$ 627,29 (seiscentos e vinte e sete reais e vinte e nove centavos) para o mês de agosto de 2023. No atendimento interno, foi-lhe informado que havia assinado uma procuração autorizando a movimentação da conta, sendo que o próprio gerente apresentou a procuração falsa à autora. Ao questionar sobre a divergência entre o RG da falsária e o seu, o gerente teria respondido que "em São Luís o movimento da agência era muito grande e que ninguém ia olhar isso". A autora alega que a situação lhe causou inúmeros transtornos de ordem material e moral, especialmente porque o banco já estava ciente das fraudes anteriores. Diante dos fatos, a parte autora requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita, a condenação do réu à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, totalizando R$ 64.260,24 (sessenta e quatro mil duzentos e sessenta reais e vinte e quatro centavos), e ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Com a inicial acostou documentos de ID 99957361 ao ID 99957991. A gratuidade da justiça foi deferida ao ID 99995336. Contestação ao ID 105111442, na qual o réu arguiu, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que não teria relação com o estelionatário e que a prevenção de crimes seria incumbência das autoridades policiais, configurando fato exclusivo de terceiro. Impugnou, ainda, o pedido de gratuidade judiciária. No mérito, reiterou a tese de fato exclusivo de terceiro e fortuito externo, alegando inexistência de nexo causal e de ato ilícito por parte do banco, bem como a ausência de preenchimento dos requisitos para a responsabilização civil. Sustentou a inexistência de dano moral ou, subsidiariamente, a necessidade de fixação em valor modesto, e a impossibilidade de repetição do indébito em dobro, por ausência de má-fé. Por fim, pugnou pela não inversão do ônus da prova e pela improcedência total dos pedidos. Réplica ao ID 106348884. Em decisão de saneamento (ID 122010238), este Juízo rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva do Banco do Brasil. Delimitou as questões de fato e de direito relevantes para a decisão de mérito, mantendo a distribuição do ônus da prova conforme o art. 373 do CPC, mas reconhecendo a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação. Determinou a juntada de extratos do PREVJUD em nome da autora, o que foi cumprido (ID 121074582, 121074584, 121074585, 121074587, 121074589, 121074590). A parte autora manifestou interesse na produção de prova oral, requerendo o depoimento do preposto do réu (ID 122744791). Foi designada audiência de instrução e julgamento, realizada conforme ata ao ID 138958684. Na ocasião, a autora e seus advogados estiveram presentes, assim como o preposto do Banco do Brasil e sua advogada. Foi ouvida a informante da autora, Sra. GILSLLENE SILVA CORREA, filha da requerente. O preposto do banco foi inquirido pelo advogado da parte autora. Os depoimentos foram gravados em mídia audiovisual. As partes foram intimadas para apresentar alegações finais em memoriais. A parte autora apresentou suas alegações finais (ID 140720114), reiterando os argumentos da inicial e da réplica, destacando a negligência do banco na verificação dos documentos falsos e a falha na segurança. A parte requerida, por sua vez, deixou transcorrer o prazo sem apresentar suas alegações finais, conforme certidão (ID 144272811). Vieram os autos conclusos para sentença. Era o que cabia relatar. Decido. Encontrando-se o processo pronto para julgamento, é de se aplicar no caso o disposto no art. 355, I, do CPC. As circunstâncias fáticas estão provadas nos documentos trazidos aos autos, não exigindo a produção de outras provas, permitindo a sua análise sob o enfoque jurídico. Inicialmente, cumpre ratificar a decisão de saneamento (ID 122010238) que, de forma acertada, rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Banco do Brasil S.A. A controvérsia central da presente demanda reside na suposta movimentação fraudulenta da conta bancária da autora, vinculada à instituição financeira ré. A responsabilidade pela guarda e segurança dos valores depositados em contas bancárias é inerente à atividade bancária, configurando, portanto, a legitimidade do Banco do Brasil para figurar no polo passivo da lide. A alegação de que a prevenção de crimes seria incumbência exclusiva das autoridades policiais não exime a instituição financeira de sua responsabilidade objetiva na prestação de serviços, especialmente quando a fraude se insere no âmbito dos riscos inerentes à sua atividade. Ademais, quanto à impugnação à gratuidade judiciária, também arguida pelo réu, esta não merece prosperar. O benefício da gratuidade de justiça foi concedido com base nos documentos juntados com a inicial, que demonstram a hipossuficiência da parte autora, uma idosa que sobrevive de benefício previdenciário. A presunção de veracidade da declaração de insuficiência de recursos, para pessoa natural, é estabelecida pelo § 3º do art. 99 do Código de Processo Civil, e o réu não trouxe aos autos qualquer elemento concreto capaz de elidir tal presunção. A mera alegação de que a parte poderia arcar com as custas ou parcelá-las não é suficiente para revogar o benefício, especialmente diante da documentação apresentada e da natureza do benefício previdenciário que constitui a principal fonte de renda da autora. Superadas as preliminares, passo ao exame de mérito. Da Responsabilidade do Banco Réu A relação jurídica estabelecida entre as partes é, indubitavelmente, de consumo, nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. O Banco do Brasil S.A. atua como fornecedor de serviços bancários, e a parte autora, como consumidora, enquadra-se na definição legal. A responsabilidade das instituições financeiras por danos gerados por falha relativa a serviços bancários, inclusive por fraudes ou delitos praticados por terceiros, é objetiva, conforme pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça na Súmula 479. A controvérsia fática central reside em saber se houve falha na prestação de serviços por parte do banco réu que permitiu as movimentações indevidas na conta da autora, e se tais movimentações foram de fato fraudulentas e não autorizadas. A parte autora logrou êxito em demonstrar a ocorrência das movimentações financeiras indevidas em sua conta bancária, conforme os extratos anexados à inicial (ID 99957367). Estes extratos revelam uma série de saques, transferências via PIX e TED para terceiros, em valores e para destinatários que a autora afirma desconhecer e não ter autorizado. A narrativa da inicial, corroborada pelo Boletim de Ocorrência apresentado, aponta para a utilização de uma procuração falsa, baseada em um RG também falso, para a realização dessas transações. Neste ponto, cumpre salientar o uso de documento de identificação evidentemente distinto daquele pertencente à autora, de modo a sustentar as alegações da requerente. No mais, ainda se verifica distinções nas grafias nas assinaturas, de forma a corroborar, ainda que em análise simples, a alegação de uso de documentação falsa. Há ainda que se destacar a distinção entre os dados apresentados nos documentos: a parte autora anexou aos autos sua carteira de identidade original (ID 99957364), com o número de registro geral 041981342011-4, expedida pela SESP/MA em 17/07/2017. Em contrapartida, a procuração falsa (ID 99957982) indica que a "outorgante" (supostamente a autora) era portadora da Cédula de Identidade nº 000001627999-0, expedida pela SSP-MA em 09/03/2022. O documento de identidade dos falsários (ID 99957983, página 1) confirma a utilização deste RG falso. A simples comparação visual entre a fotografia da autora em seu documento original e a fotografia presente no documento falso, bem como a divergência nos números de registro geral, nos dados do documento de origem e nas datas de expedição, é suficiente para evidenciar a notória falsidade do documento utilizado. A negligência do banco réu é patente. A instituição financeira, ao permitir a movimentação de valores significativos da conta da autora com base em uma procuração e um documento de identidade visivelmente falsos, falhou em seu dever de segurança e diligência. O fato de a autora já ter alertado o banco, em 03 de maio de 2023, sobre a existência de terceiros utilizando documentos falsos para transferir seu benefício (primeiro para o Banco CREFISA, depois para a agência do próprio Banco do Brasil em Miranda do Norte/MA), agrava ainda mais a responsabilidade da instituição. Este alerta prévio deveria ter imposto ao banco um dever de cautela ainda maior na verificação de qualquer transação ou documento apresentado em nome da autora. A oitiva do preposto do Banco do Brasil em audiência de instrução e julgamento (ID 138958684) reforça a falha na prestação do serviço. O preposto, embora não soubesse informar se o procedimento de comparação da documentação foi realizada em agência na cidade de São Luís, confirmou que o procedimento "tem que ser com um RG que reconheça o cliente". No mais, do relato da informante, filha da autora, é possível notar um forte indício da falta de rigor na verificação de documentos em agências de grande volume, o que se traduz em uma falha de segurança interna e previsível para a atividade bancária. Nesse contexto, a tese de "fato de terceiro" ou "fortuito externo" arguida pelo réu não se sustenta. As fraudes praticadas por terceiros, quando se inserem no risco inerente à atividade bancária, são consideradas fortuito interno e não excluem a responsabilidade da instituição financeira. A falha na verificação da autenticidade dos documentos e na segurança das transações, especialmente diante de um histórico de fraudes já conhecido pelo banco, configura um defeito na prestação do serviço, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor. A Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça é clara ao dispor que: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por falha relativa a serviços bancários, inclusive por fraudes ou delitos praticados por terceiros." A fraude perpetrada por terceiros, utilizando documentos falsos e uma procuração forjada, representa um risco inerente à atividade bancária, que lida diariamente com a movimentação de valores e a identificação de clientes. A falha do banco em identificar a falsidade dos documentos e em impedir as transações não autorizadas configura uma falha na segurança de seus serviços, atraindo a responsabilidade objetiva da instituição. Portanto, restou comprovada a falha na prestação de serviços do Banco do Brasil, que, por negligência na verificação da autenticidade dos documentos e na segurança das transações, permitiu que terceiros fraudadores subtraíssem valores da conta da autora. Tal conduta ilícita gerou danos materiais e morais à requerente. Dos Danos Materiais e da Repetição do Indébito em Dobro Os danos materiais são evidentes e foram devidamente comprovados pelos extratos bancários (ID 99957367), que demonstram a retirada indevida de R$ 32.130,12 (trinta e dois mil, cento e trinta reais e doze centavos) da conta da autora. A parte autora pleiteia a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados. O artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, estabelece que: "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável." No caso em tela, a conduta do banco não se enquadra como "engano justificável". A instituição foi alertada previamente sobre fraudes envolvendo a conta da autora e, mesmo assim, permitiu que transações fossem realizadas com base em documentos visivelmente falsos. Assim, o valor de R$ 32.130,12 (trinta e dois mil, cento e trinta reais e doze centavos) deve ser restituído em dobro, totalizando R$ 64.260,24 (sessenta e quatro mil duzentos e sessenta reais e vinte e quatro centavos). Dos Danos Morais A situação vivenciada pela autora, uma idosa que teve suas economias e seu benefício previdenciário subtraídos por fraude, ultrapassa o mero dissabor cotidiano. A privação de valores essenciais para sua subsistência, somada à sensação de vulnerabilidade e à frustração diante da inércia e do descaso da instituição financeira, configura um abalo psicológico significativo. A autora, que dependia de seu benefício para o dia a dia e poupava em sua conta, foi privada de seus provimentos de forma abrupta e injusta, o que, por si só, gera angústia e sofrimento. A responsabilidade civil por danos morais, conforme os artigos 186 e 927 do Código Civil, exige a comprovação de uma conduta ilícita, um dano e o nexo de causalidade entre eles. No presente caso, a conduta negligente do banco, que falhou em seu dever de segurança, é o ato ilícito. O dano moral decorre da violação da tranquilidade, da segurança e da dignidade da autora, que teve sua vida financeira desorganizada por uma fraude que poderia ter sido evitada pela diligência da instituição. O nexo causal é direto, pois a falha do banco em verificar a autenticidade dos documentos foi determinante para a consumação da fraude e a consequente lesão à autora. A indenização por danos morais deve ser fixada em montante que, ao mesmo tempo, sirva de reprimenda pedagógica ao ofensor, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes, e compense a vítima pelo sofrimento experimentado, sem, contudo, configurar enriquecimento ilícito. Considerando a gravidade da conduta do réu, que demonstrou negligência e descaso, a condição de idosa da autora, a natureza essencial dos valores subtraídos (benefício previdenciário), e o impacto em sua vida, entendo que o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) é razoável e proporcional para a reparação dos danos morais sofridos. Diante do exposto, e por tudo o mais que dos autos consta, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial para: CONDENAR o réu, BANCO DO BRASIL S.A., à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados da conta bancária da autora, MARIA CANDIDA SILVA ARAUJO, totalizando a quantia de R$ 64.260,24 (sessenta e quatro mil duzentos e sessenta reais e vinte e quatro centavos). Sobre este valor, deverá incidir correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir da data de cada desconto indevido e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação. CONDENAR o réu, BANCO DO BRASIL S.A., ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais). Sobre este valor, deverá incidir correção monetária pelo INPC, a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (Súmula 54 do STJ). Em razão da sucumbência, CONDENO o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com as cautelas de praxe. Pinheiro/MA, data do sistema. ARIANNA RODRIGUES DE CARVALHO SARAIVA Juíza de Direito Titular