Processo nº 08035378020248150601
Número do Processo:
0803537-80.2024.8.15.0601
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPB
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Vara Única de Belém
Última atualização encontrada em
26 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
26/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Vara Única de Belém | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário da Paraíba Vara Única de Belém GABINETE VIRTUAL PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) 0803537-80.2024.8.15.0601 [Capitalização e Previdência Privada] AUTOR: JOSEFA RODRIGUES DE LIRA REU: BRADESCO CAPITALIZACAO S/A SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por JOSEFA RODRIGUES DE LIRA em face do BRADESCO CAPITALIZAÇÃO S/A alegando, em síntese, que sofreu um desconto indevido, referentes à tarifa “TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO”, no valor de R$ 220,00 (Duzentos e vinte reais), que afirma não ter contratado. Pediu a declaração de inexistência do contrato, devolução, em dobro dos valores descontados indevidamente, bem como a condenação do réu no pagamento de danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Devidamente citada, a parte promovida apresentou contestação. Impugnação à defesa apresentada. Intimada as partes para apresentarem interesse na produção de provas, estas requereram o julgamento antecipado da lide. Vieram os autos conclusos. DECIDO. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO O processo, diga-se, comporta o julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é essencialmente de direito, não havendo necessidade da produção de provas em audiência, nem de realização de perícia grafotécnica, de modo que as provas documentais constantes dos autos são suficientes para a solução da lide. DAS PRELIMINARES ALEGAÇÃO DE AÇÕES PREDATÓRIAS No caso dos autos, o promovido alega a existência de inúmeras ações por parte da autora, apresentando prints genéricos e menção a processos diversos, contudo, sem apontar, analiticamente, qual o ponto de convergência que represente o exercício de prática abusiva de ajuizamento dessas ações, notadamente em relação ao presente feito, com o intuito de obtenção de vantagens indevidas. Ademais, a preliminar em deslinde não merece prosperar, tendo em vista que, diante da possibilidade de lesão ou ameaça de lesão a direito do consumidor, in casu, a parte autora, é dever/poder do Judiciário, em razão da sua inafastabilidade, consoante termos do art. 5º, inciso XXXV da Constituição Federal de 1988, in verbis: “XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” fazer a escorreita análise do caso trazido a julgamento. REJEITO a preliminar. DA PRESCRIÇÃO Em se tratando de relação consumerista, o entendimento adotado é de que se aplica o prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Confira-se: "Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria." (grifei) Logo, no caso dos autos, não há falar em prescrição, vez que a pretensão veiculada nestes autos refere-se a descontos ocorridos no ano de 2023 à 2024, ou seja, período que não ultrapassa os cinco anos que antecederam ao ajuizamento do litígio em 08/11/2024. Desta feita, rejeito a preliminar alegada. DA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR Quanto à alegação da ausência de requerimento administrativo, valho-me do princípio da inafastabilidade da jurisdição. Ora, o cidadão não está obrigado a esgotar as vias administrativas para se socorrer do Poder Judiciário na busca de um direito que pretende ver reconhecido, uma vez que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá ser excluída de sua apreciação. Dessa forma, rejeito a preliminar levantada. DA GRATUIDADE DEFERIDA À PARTE AUTORA Quanto a preliminar que impugna a gratuidade deferida, não prospera tal preliminar, uma vez que a contestante se limitou a citar na contestação a sua irresignação. Todavia, a jurisprudência é pacífica no sentido de que o ônus da prova, no caso de impugnação ao pedido de gratuidade, é do impugnante, que não pode se restringir a teorizar a respeito da possibilidade de o impugnado custear as despesas processuais. Deve o Impugnante comprovar a condição financeira favorável do impugnado, para obter a reforma da decisão de deferimento da gratuidade. Neste caso, como a promovida não logrou comprovar a condição econômica satisfatória do Promovente e uma vez não ilidida a presunção de veracidade da alegação de insuficiência, nos termos do § 3o, do art. 98, do CPC, rejeito a presente preliminar, mantendo a gratuidade anteriormente concedida. DO MÉRITO Inicialmente, insta consignar que a relação entre as partes é relação de consumo, regulando-se pelo disposto na Lei 8078/90. Por essa razão, impõe-se a inteira aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor - que positiva um núcleo de regras e princípios protetores dos direitos dos consumidores enquanto tais - inclusive no que se refere à possibilidade de inversão do ônus da prova em favor da parte autora e à natureza da responsabilidade civil da parte ré. Outrossim, a Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça aduz que “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. In casu, a parte autora insurge-se quanto aos valores descontados em sua conta corrente a título de tarifa “TITULO DE CAPITALIZAÇÃO”, no valor de R$ 220,00 (Duzentos e vinte reais), pois alega que não realizou tal contratação. O banco réu, por sua vez, afirma que a contratação se deu de forma regular sem, contudo, apresentar o instrumento contratual. Para que ocorra débito de tarifa bancária da conta corrente de consumidores, é imprescindível a contratação específica. Todavia, o demandado se resume a dizer que a relação jurídica foi firmada de forma legal, não tendo sido juntada sequer prova da contratação, como mencionei acima. Considerando que todos estes documentos, acaso existentes, são de pleno acesso da ré, caberia a ela juntá-los, contudo resumiu sua defesa apenas a alegações. Salienta-se que a parte demandada já tinha posse/acesso de tais documentos no momento de sua contestação, sendo o momento oportuno para apresentá-los, já que não se tratam de documentos novos, conforme dispõem os artigos 434 a 438 do CPC, que tratam da produção de prova documental, contudo quedou-se inerte. Com efeito, é compulsório pelos regramentos processuais a incumbência do réu formular, de uma só vez, na contestação todas as defesas de que dispõe manifestando-se especificamente sobre cada questão suscitada pela parte autora. O encargo processual do(a) Promovido(a) tem a incumbência de impugnar a pretensão vindicada na exordial, conforme prescreve o art. 336 do Código de Processo Civil, assim redigido: Art. 336. Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir. O Código de Processo Civil ao dispor sobre os requisitos da peça contestatória estatui: Art. 341. Incumbe também ao réu manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas […]. A inércia do(a) da parte demandada não gera prejuízo à sua defesa, mas se a inicial estiver apoiada em elementos de provas suficientes e capazes de conduzir a conclusão positivada do direito reclamado, deve prevalecer para alicerçar o pedido do(a) autor(a). Sendo assim, não havendo comprovação da contratação do serviço, objeto desta ação, vislumbro o desrespeito ao procedimento acima determinado. Conclui-se, dessa forma, que o negócio não foi celebrado pelo autor. A ré deve ser responsabilizada pelos riscos inerentes à atividade praticada, na forma do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Na medida em que a requerida exerce atividade econômica, deve responder pelos riscos e pela segurança das contratações. Sendo assim, diante da ausência de comprovação inequívoca de contratação pela parte autora, os valores cobrados a título de tarifa “TITULO DE CAPITALIZAÇÃO”, devem lhe ser devolvidos, por se tratar de cobrança indevida. Quanto à repetição de indébito, vejamos o que diz o art. 42 do CDC: “Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” (g.n.). Na esteira do entendimento consagrado no Superior Tribunal de Justiça, "a aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor somente é justificável quando ficarem configuradas tanto a cobrança indevida quanto a má-fé do credor fornecedor do serviço. (AgRg no REsp 1200821/RJ, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/02/2015, DJe 13/02/2015.) No caso em comento, se trata de descontos relativas a tarifas bancárias, pelo que não se pode atestar a existência de má-fé do demandado. Assim a devolução simples é medida que se impõe. Esse também é o entendimento do Tribunal de Justiça da Paraíba. Vejamos: ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL: nº: 0803796-78.2020.8.15.0031 RELATOR: Desembargador LEANDRO DOS SANTOS APELANTE: Banco Bradesco S.A APELADA: Maria Nazaré Avelino de Araújo ORIGEM : Juízo da Vara Única de Alagoa Grande APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TARIFA DE MANUTENÇÃO DA CONTA “CESTA B. EXPRESSO 1”. IMPOSSIBILIDADE. VEDAÇÃO LEGAL. COBRANÇA INDEVIDA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DANO MORAL. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. IRRESIGNAÇÃO. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. REPETIÇÃO SIMPLES. REFORMA DA SENTENÇA. PROVIMENTO PARCIAL AO APELO. A mera cobrança indevida de valores não materializa dano à personalidade a justificar a condenação postulada. Trata-se de mero aborrecimento decorrente da vida em sociedade, incapaz de causar abalo psicológico, pelo que não há que se falar em indenização por danos morais. No caso, por inexistir prova da má-fé do Promovido é devida a devolução dos valores considerados abusivos de modo simples, sob pena de enriquecimento injustificado do credor.(0803796-78.2020.8.15.0031, Rel. Des. Leandro dos Santos, APELAÇÃO CÍVEL, 1ª Câmara Cível, juntado em 25/10/2021). No que pertine ao dano moral, verifico que não há se cogitar a fixação de indenização a este título na medida em que não houve a vulneração de qualquer direito ínsito à personalidade ou mácula à honra da parte autora. Vislumbro que tal situação, embora desagradável, não é capaz de configurar abalo à direito da personalidade da parte autora. É sabido que para se admitir uma condenação à indenização por danos morais, faz-se mister que a conduta censurada manifeste conteúdo prejudicial. Assim, para reparação, não basta a comprovação dos fatos que contrariaram a parte autora, sendo necessário que deles decorram prejuízos a sua honorabilidade, pois não se permite indenizar o mero dissabor ou aborrecimento. Nesse sentido, o dano moral há de refletir no psiquismo do ofendido com intensidade tal que provoque repercussão na vida social, vergonha, humilhação, tristeza, angústias, o que neste caso, não ocorreu. Dessa maneira, os fatos elencados pela parte autora, por si só, não rendem ensejo à indenização pretendida. Nesse sentido, aduz a jurisprudência pátria: 1. Falha na prestação do serviço incontroversa. A matéria efetivamente impugnada pelo apelante diz respeito apenas à ocorrência de danos morais no caso concreto. 2. Embora a parte autora comprove a indevida cobrança referente ao seguro não contratado, não demonstrou ter experimentado os danos extrapatrimoniais alegados. 3. Inexistência de negativação do nome do consumidor, cobranças vexatórias ou qualquer outra violação a direito da personalidade do autor. Dano moral não caracterizado. 4. Cobrança indevida que, por si, só não gera o dever de indenizar. Mero aborrecimento não indenizável. (TJ-RJ – APL: 00192299020188190007, Relator: Des(a). SÉRGIO SEABRA VARELLA, Data de Julgamento: 04/12/2019, VIGÉSIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL) Portanto, a simples cobrança indevida não gera, de maneira automática, a caracterização do dano moral, devendo a parte autora demonstrar os danos extrapatrimoniais alegados, o que não ocorreu no caso em tela. Assim, considerando a ausência de comprovação inequívoca de contratação da tarifa em comento, os valores cobrados a este título devem ser devolvidos de forma simples, por se tratar de cobrança indevida. Todavia, no que tange aos danos morais, vislumbro que a simples cobrança indevida caracteriza mero aborrecimento não indenizável. DO DISPOSITIVO Ante o exposto, resolvo o mérito da demanda e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, nos termos do art. 487, I, do CPC, para DECLARAR A NULIDADE DA COBRANÇA DA RUBRICA "TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO” declinada na inicial, excluindo-se aquelas atingidas pela prescrição, determinando a devolução dos valores cobrados em relação a essa(s) operação(ões) de maneira simples, a serem corrigidos monetariamente desde a data de cada desconto e juros de mora a partir da citação. A correção monetária deve se dar através do IPCA (art. 389, § único do CC). Após a citação, incidirá apenas a taxa SELIC para continuação da atualização monetária e início da contagem dos juros moratórios (art. 406 do CC). Considerando que ambas as partes sucumbiram em parte do pedido, as condeno ao pagamento de metade das custas processuais, ficando a condenação da parte autora sob condição suspensiva de exigibilidade em razão da gratuidade da justiça. Também em razão da sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de honorários sucumbenciais ao advogado da parte ré, no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor dos danos morais pleiteados (proveito econômico obtido pelo réu), porém fica a cobrança sujeita ao disposto no art. 98, § 3.º, do CPC, pois o promovente é beneficiário da justiça gratuita. Por fim, condeno a ré ao pagamento de honorários sucumbenciais ao advogado da parte autora, que arbitro, com arrimo, no art. 85, caput e §2º, do CPC, em 10% do valor da condenação. Intimem-se. Havendo recurso, intime-se a parte recorrida para apresentar suas contrarrazões; caso seja interposta apelação adesiva, intime-se o recorrente para se pronunciar em quinze dias (§ 2º, art. 1.010 CPC/2015); após, com ou sem resposta, subam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça. Após o trânsito em julgado, em nada sendo requerido, arquive-se. BELÉM, 23 de junho de 2025. Juiz(a) de Direito