Pamella Mayara De Araujo x Rodrigo Menezes Da Costa Camara e outros
Número do Processo:
0804351-31.2024.8.20.5103
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara da Comarca de Currais Novos
Última atualização encontrada em
24 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara da Comarca de Currais Novos | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara da Comarca de Currais Novos Rua Manoel Lopes Filho, 1210, Walfredo Galvão, CURRAIS NOVOS - RN - CEP: 59380-000 Contato: (84) 36739582 - Email: csssecuni@tjrn.jus.br Processo: 0804351-31.2024.8.20.5103 SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por IAGO MIGUEL ARAÚJO DE ANDRADE, neste ato representado por seu genitor, JOSÉ CRISTIAN DE ANDRADE, em desfavor de UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO e QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A., ambos qualificados nos autos, pelos fatos e fundamentos jurídicos aduzidos na inicial. O requerente narra na inicial que possuía plano de saúde coletivo por adesão junto a empresa demandada desde 2018. Relata que foi notificado sobre o cancelamento unilateral do referido contrato, tendo que aderir a um novo plano excessivamente prejudicial ofertado pela demandada, posto que seu filho necessita de tratamento contínuo e o novo plano de saúde prevê uma cláusula de pagamento de coparticipação. Requer, em razão disso, a abstenção das cobranças de coparticipação relacionadas às terapias do autor, visto que ele necessita de acompanhamento frequente devido ao tratamento da enfermidade de Transtorno do Espectro Autista, bem como a condenação das partes demandadas ao pagamento de indenização no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Recebida a inicial por despacho de ID 131878186 e determinada a citação das partes requeridas para apresentar contestação. Contestação pela Unimed acostada ao ID 133107544, na qual argumenta que o contrato firmado entre as partes segue modelo aprovado pela Agência Nacional de Saúde, de forma que não há que se falar em conduta abusiva perpetrada pela operadora Contestação pela QUALICORP no ID 149737084, na qual sustenta ilegitimidade passiva. No mérito, alega o exercício regular do direito da Unimed, bem como a inexistência de ato ilícito passível de indenização. Réplica às contestações no ID 150927716. Decisão de saneamento proferida no ID 151092703. Intimadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir, as partes se manifestaram no sentido do prosseguimento do feito, indicando não possuírem mais provas a produzir (ID’s 152208371, 152367991 e 153509075). Parecer ministerial opinou pela procedência do feito, com a fixação dos danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) (ID 156039619). É o relatório. Fundamento e decido. Inicialmente, estando presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, e não existindo necessidade de produção de outras provas, passo ao julgamento do mérito. De início, é necessário frisar que a presente demanda tem caráter consumerista. À luz do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, esboçado na Súmula 608, os contratos de plano de saúde de caráter individual têm natureza de consumo, aplicando-se-lhes o Código de Defesa do Consumidor. Ademais, a súmula 469 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) prevê que aplica-se o Código de Defesa do Consumidor (CDC) aos contratos de plano de saúde. Logo, a operadora do plano de saúde e a administradora de benefícios respondem solidariamente pelos danos decorrentes de irregular execução do contrato de saúde firmado entre a parte autora e as empresas rés. A controvérsia processual pode ser limitada, portanto, à abusividade do valor cobrado pela operadora do plano de saúde a título de coparticipação, se foi legítimo o cancelamento do plano de saúde coletivo da parte autora, em virtude do encerramento de vínculo entre a operadora de saúde Unimed Natal e a administradora QUALICORP, bem como se é devida indenização por danos morais. Compulsando os autos, conforme entendimento externado pelo Ministério Público, observo que houve o cancelamento unilateral e imotivado do plano de saúde do qual o autor é beneficiário, pelas razões que passo a expor. Extrai-se que a relação contratual existente entre as partes submete-se às regras do Código de Defesa do Consumidor, pois de um lado está o demandante, adquirente de um serviço, na condição de destinatário final, e na outra ponta estão as demandadas, pessoa jurídica operadora de plano de saúde e administradora de benefícios. Ressalto, neste ponto, que deve haver a migração do plano sem a necessidade de novos prazos de carência, ressalvada, porém, a possibilidade de ser aplicado o preço de mercado cobrado aos demais usuários, tendo em vista as peculiaridades de cada regime, que geram preços diferenciados. Neste sentindo é o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. DENÚNCIA DO CONTRATO PELA OPERADORA. RESCISÃO UNILATERAL. LEGALIDADE. MIGRAÇÃO DE USUÁRIO PARA PLANO INDIVIDUAL. MANUTENÇÃO DAS CONDIÇÕES ASSISTENCIAIS. PREÇO DAS MENSALIDADES. ADAPTAÇÃO AOS VALORES DE MERCADO. REGIME E TIPO CONTRATUAIS DIVERSOS. RELEVÂNCIA DA ATUÁRIA E DA MASSA DE BENEFICIÁRIOS. (...) 6. Não há falar em manutenção do mesmo valor das mensalidades aos beneficiários que migram do plano coletivo empresarial para o plano individual, haja vista as peculiaridades de cada regime e tipo contratual (atuária e massa de beneficiários), que geram preços diferenciados. O que deve ser evitado é a abusividade, tomando-se como referência o valor de mercado da modalidade contratual. 7. Nos casos de denúncia unilateral do contrato de plano de saúde coletivo empresarial, é recomendável ao empregador promover a pactuação de nova avença com outra operadora, evitando, assim, prejuízos aos seus empregados, pois não precisarão se socorrer da migração a planos individuais, de custos mais elevados. 8. Recurso especial provido. (REsp 1471569/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/03/2016, DJe 07/03/2016) Na mesma linha de entendimento: DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. RESCISÃO UNILATERAL DE PLANO COLETIVO EMPRESARIAL. MIGRAÇÃO PARA PLANO INDIVIDUAL . NECESSIDADE DE ADAPTAÇÃO AOS VALORES DE MERCADO. MANUTENÇÃO DAS CONDIÇÕES ASSISTENCIAIS SEM CARÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME . 1. Apelação contra sentença que determinou a migração do plano de saúde coletivo empresarial para plano individual/familiar, com atualização do valor para o preço de mercado, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência. 2. A questão em discussão consiste em determinar: (i) a legalidade da rescisão unilateral do plano de saúde coletivo; (ii) a obrigatoriedade de oferta de plano individual/familiar aos beneficiários; (iii) a possibilidade de alteração dos valores das mensalidades na migração do plano . 3. A operadora de plano de saúde deve disponibilizar plano individual ou familiar aos beneficiários de plano coletivo empresarial cancelado, conforme Resolução CONSU nº 19/99. 4. A migração do plano coletivo para individual dispensa o cumprimento de novos prazos de carência, considerando-se o período de permanência no plano anterior . 5. É legítima a atualização do valor das mensalidades para adequação ao preço de mercado praticado na modalidade individual, em razão das peculiaridades de cada regime contratual. 4. Tese de julgamento: "Na migração de plano de saúde coletivo empresarial para plano individual/familiar, é legítima a adequação do valor das mensalidades aos preços de mercado, desde que mantidas as condições assistenciais e dispensado o cumprimento de novos prazos de carência ." 7. Recurso conhecido e não provido. Decisão unânime. (TJ-AL - Apelação Cível: 07322571320178020001 Maceió, Relator.: Des . Carlos Cavalcanti de Albuquerque Filho, Data de Julgamento: 17/12/2024, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 17/12/2024) Apelação cível. Plano de saúde. Ação cominatória movida por beneficiária em face de operadora de plano de saúde coletivo por adesão, sob alegação de cancelamento unilateral abusivo do contrato. Sentença de procedência. Contrato coletivo. Rescisão unilateral admitida. Observância da Resolução 19 CONSU e RN 195 ANS. Desvantagem exagerada ao consumidor . Não ocorrência. Possibilidade de migração para plano individual, sem exigência de novos prazos de carência. Necessário equilibrar a liberdade de contratar da operadora e a expectativa de manutenção cobertura pelo beneficiário. Direito à migração de plano não inclui a manutenção dos mesmos valores de mensalidade praticados no contrato coletivo . Tema 1082 STJ. Distinção. O fato de a autora estar em tratamento para fibromialgia e doenças de coluna não impede o cancelamento, pois a operadora já garantiu a continuidade do tratamento, ao ofertar migração para contrato individual. Autora não é portadora de doença grave, conforme definição prevista no art . 1048 CPC. Inversão dos ônus da sucumbência. Apelação provida. (TJ-SP 1003345-80 .2023.8.26.0541 Santa Fé do Sul, Relator.: Edson Luiz de Queiróz, Data de Julgamento: 10/04/2024, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 10/04/2024) A respeito da previsão da cláusula de coparticipação nos contratos de plano individual, o artigo 16, III da Lei 9.656/1998 autoriza a cobrança de franquia pelos procedimentos realizados pelo beneficiário, desde que esta cobrança esteja expressamente prevista em cláusula contratual clara e regulada, com a definição de limites: Art. 16. Dos contratos, regulamentos ou condições gerais dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei devem constar dispositivos que indiquem com clareza: (…) VIII – a franquia, os limites financeiros ou o percentual de co-participação do consumidor ou beneficiário, contratualmente previstos nas despesas com assistência médica, hospitalar e odontológica; (…) Por sua vez, o artigo 2º, inciso VII, da Resolução 8/1998 do CONSU veda o estabelecimento de coparticipação ou franquia que implique no financiamento integral do tratamento requerido pelo beneficiário, ou que imponha um fator de restrição severa ao acesso à saúde: Art. 2º. Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: (…) VII – estabelecer co-participação ou franquia que caracterize financiamento integral do procedimento por parte do usuário, ou fator restritor severo ao acesso aos serviços; (…) Nesse sentido, a Terceira Turma do c. Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo a abusividade da cobrança de franquia ou coparticipação que supere o valor da mensalidade exercida pelo plano de saúde contratado. Vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. CISÃO PARCIAL DA PESSOA JURÍDICA. ASSUNÇÃO DA POSIÇÃO PROCESSUAL DA PESSOA JURÍDICA CINDIDA. SUCESSÃO PROCESSUAL. PLANO DE SAÚDE DE AUTOGESTÃO. CDC. INAPLICABILIDADE. TRATAMENTO ANTINEOPLÁSICO. MEDICAMENTO NÃO LISTADO NO ROL DA ANS. PRESCRIÇÃO NÃO ENQUADRADA NAS DIRETRIZES DE UTILIZAÇÃO. RECUSA INDEVIDA DE COBERTURA. COPARTICIPAÇÃO. LEGALIDADE. JUÍZO DE RAZOABILIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR ARBITRADO. PROPORCIONALIDADE. (…) 7. Não há falar em ilegalidade na contratação de plano de saúde em regime de coparticipação, seja em percentual sobre o custo do tratamento seja em montante fixo (art. 16, VIII, da Lei nº 9.656/1998), sendo vedada a instituição de fator que limite seriamente o acesso aos serviços de assistência à saúde, a evidenciar comportamento abusivo da operadora (AgInt no AREsp n. 1.695.118/MG, Terceira Turma, julgado em 3/4/2023, DJe de 13/4/2023). 8. Na ausência de indicadores objetivos para o estabelecimento dos mecanismos financeiros de regulação e com o fim de proteger a dignidade do usuário, no que tange à sua exposição financeira, mês a mês, é razoável fixar como parâmetro, para a cobrança da coparticipação, o valor equivalente a uma mensalidade paga, de modo que o desembolso mensal realizado, por força do mecanismo financeiro de regulação, não seja maior que o correspondente à contraprestação paga pelo titular. 9. A recusa indevida de cobertura, pela operadora, capaz de agravar a situação de aflição e angústia a que já estava submetida a beneficiária por força da notória gravidade da própria doença (câncer de mama) e da premente necessidade dos medicamentos que lhe foram prescritos, ultrapassa o mero dissabor provocado pelo descumprimento contratual e, por isso, configura dano moral. 10. Em âmbito de recurso especial, os valores fixados a título de indenização por danos morais, porque arbitrados com fundamento nas peculiaridades fáticas de cada caso concreto, só podem ser alterados em hipóteses excepcionais, quando constatada nítida ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (REsp n. 1.885.384/RJ, Terceira Turma, julgado em 18/5/2021, DJe de 24/5/2021), excepcionalidade essa, todavia, que não está presente na hipótese. 10. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp n. 2.098.930/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/8/2024, DJe de 22/8/2024) (grifos acrescidos). Assim, torna-se indevida a rescisão, na forma perfectibilizada pelas rés, sem que efetivamente tenha sido oferecido um plano de saúde individual ou familiar em condições semelhantes ao que foi contratado anteriormente, pelo que a manutenção da contratação deverá ocorrer até que haja a possibilidade de migração, nos moldes acima delineados. Ressalte-se que não é o contrato original que deve ser preservado, mas sim a vinculação do autor com o plano de saúde, sobretudo considerando a aplicabilidade do Tema 1.082 do STJ ao caso, ou seja, vedado o efetivo cancelamento e a interrupção do tratamento até que haja alteração do agente financeiro responsável pela parte administrativa dos pagamentos. Dessa forma, porquanto se verifique a legalidade da modalidade contratada, inclusive com a previsão da cláusula de coparticipação, há de se reconhecer o direito da parte autora à limitação do preço cobrado a título de coparticipação, restringindo-o ao valor da mensalidade paga pelo plano de saúde. Assim, as empresas rés ao procederem o cancelamento do plano de assistência médica à parte autora, de maneira unilateral e abrupta, sem observância aos termos regulamentares, violaram os princípios da lealdade e boa-fé, que devem orientar as relações contratuais. Portanto, a conduta das empresas rés, além de inúmeros constrangimentos, causou prejuízos à parte autora, uma vez que trata-se de criança com transtorno de espectro autista, com necessidade tratamento contínuo, transcendendo o mero aborrecimento e adentrando em lesão à esfera personalíssima da parte autora. Para a quantificação da indenização, é necessário levar em consideração a razoabilidade e proporcionalidade, para que não se fixe o quantum indenizatório de maneira exorbitante, favorecendo o enriquecimento sem causa do ofendido, ou de maneira irrisória a ponto de não compensar o abalo sofrido pela vítima. Assim, sem olvidar do caráter pedagógico e compensatório da indenização e vislumbrando a capacidade econômica da demandante e das partes demandadas, fixo o montante da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). DISPOSITIVO Isto Posto, fiel aos delineamentos traçados na motivação, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral para: a) Permitir a cobrança da coparticipação prevista no contrato no plano individual, desde que limitada, a cada mês, ao valor equivalente a uma mensalidade; b) Condenar as partes demandadas solidariamente ao pagamento de indenização por danos morais em favor da parte demandante, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sobre o qual incidirá correção monetária pelo IPCA, a contar da data do arbitramento do valor na sentença, nos termos da Súmula 362 do STJ e artigo 389, § 1º, do Código Civil, acrescido de juros de mora pela taxa SELIC, deduzido o índice de atualização monetária, desde a citação do último litisconsorte, nos termos dos artigos 405 e 406, §1º, ambos do Código Civil, e artigo 240 do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência recíproca, fixo honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do § 2º do artigo 85 do CPC, a serem distribuídos em 50% (cinquenta por cento) para cada parte. As custas e despesas processuais também deverão ser distribuídas em 50% (cinquenta por cento) para cada parte (artigo 86 do CPC). Contudo, por causa da gratuidade judiciária concedida, fica suspensa a exigibilidade das verbas honorárias e custas para o autor, no prazo e forma do art. 98, §3º, do CPC. Certificado o trânsito em julgado e efetuada a cobrança das custas, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. CURRAIS NOVOS/RN, data da assinatura no PJe. RICARDO ANTONIO MENEZES CABRAL FAGUNDES Juiz(a) de Direito