Processo nº 08046547820238150751
Número do Processo:
0804654-78.2023.8.15.0751
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPB
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara Mista de Bayeux
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara Mista de Bayeux | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário da Paraíba 2ª Vara Mista de Bayeux PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) 0804654-78.2023.8.15.0751 [Inclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes] AUTOR: LIDIANE FERREIRA DOS SANTOS REU: BOTICARIO PRODUTOS DE BELEZA LTDA SENTENÇA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DÉBITO NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DE CONTRATO OU NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. PEDIDO PROCEDENTE. I. CASO EM EXAME Ação declaratória de inexistência de débito, com pedido de retirada de nome de cadastro de inadimplentes, ajuizada por consumidora em face de empresa de cosméticos, sob o fundamento de que desconhece dívida de R$ 158,98 inscrita em seu nome em 19/06/2023, sem notificação prévia. A parte ré alega que a dívida decorre de inadimplemento de revenda de produtos, mas não apresenta contrato assinado nem comprovante de entrega das mercadorias. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em verificar se a inscrição do nome da autora em cadastro de inadimplentes é válida, diante da ausência de comprovação da relação jurídica que teria originado o débito. III. RAZÕES DE DECIDIR Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes, por se tratar de típica relação de consumo (CDC, art. 3º, § 2º). A autora faz jus à inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, dada a verossimilhança de suas alegações e sua hipossuficiência informacional. O réu não comprova a existência de relação jurídica válida com a autora, uma vez que não apresenta contrato assinado, canhotos de entrega ou outro documento hábil a demonstrar a origem do débito. A simples juntada de notas fiscais desacompanhadas de prova de recebimento não constitui prova suficiente para legitimar a inscrição em cadastro de inadimplentes. A ausência de comprovação da dívida e de notificação prévia à inscrição gera a ilicitude do apontamento negativo, que deve ser removido. IV. DISPOSITIVO E TESE Pedido procedente. Tese de julgamento: Incumbe ao fornecedor o ônus de comprovar a existência da relação jurídica que enseja a inscrição em cadastro de inadimplentes. A ausência de contrato assinado ou de comprovante de entrega das mercadorias impossibilita a demonstração da dívida. A inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, sem prova da relação jurídica subjacente, é ilegítima e deve ser cancelada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV; CDC, arts. 3º, § 2º, 6º, VIII, e 14, § 3º; CPC, arts. 355, I, 373, II, e 487, I. Jurisprudência relevante citada: TJ-MG, Apelação Cível nº 5115597-56.2019.8.13.0024, Rel. Des.ª Eveline Felix, j. 11.06.2024, 18ª Câmara Cível. TJ-GO, Apelação Cível nº 5037819-56.2023.8.09.0064, Rel. Des. Guilherme Gutemberg Isac Pinto, 5ª Câmara Cível. Vistos, etc. LIDIANE FERREIRA DOS SANTOS, devidamente qualificado na inicial, ingressou com AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO pelo rito ORDINÁRIO em face de BOTICARIO PRODUTOS DE BELEZA LTDA, também qualificado, alegando, em resumo, o que segue: Alega a autora que o réu incluiu seu nome indevidamente no cadastro de inadimplentes, em 19/06/2023, referente a dívida no valor de R$ 158,98. Afirma que desconhece o débito e que não houve notificação prévia. Deferida a gratuidade de justiça em favor da autora id 81981212. Em sua peça de defesa, o réu alega que possuía um cadastro de revendedora junta com a autora e a negativação do nome da autora decorreu de inadimplemento por parte desta. Em réplica, narra a autora que o promovido não trouxe aos nenhum contratado assinado pela autora. Foi proferida decisão de organização e saneamento do processo id 93640533. Sem mais provas a produzir, vieram-me os autos conclusos para julgamento. É o relatório. Passo a decidir. Aplicabilidade do CDC Ao caso dos autos, é de se aplicar o disposto no art. 3o, § 2o, do CDC, já que a natureza da relação jurídica entre autor e réu se trata de uma verdadeira relação de consumo. Partindo dessa premissa, vez que a parte promovente comprovou a relação contratual existente entre as partes, ante a apresentação dos documentos que acompanham a inicial, há a inversão do ônus da prova (art. 6o, VIII, CDC), cabendo ao promovido a produção de provas contrárias ao direito autoral. A verossimilhança dos argumentos vertidos na inicial diz respeito a um juízo de presunção realizado pelo Juiz, uma vez que ele é quem fará o exame da verossimilhança, fundado nas regras ordinárias de experiência, resultantes de circunstâncias que apontam certo fato, ou certa coisa, como possível, ou como real, mesmo que não se tenham deles provas diretas. Deve, portanto, ser deixada ao prudente arbítrio do Juiz, que a resolverá segundo as circunstâncias que cercam cada caso, diante do exame das relações existentes entre as provas feitas e os fatos que se pretendem provar. Já a hipossuficiência está relacionada ao desconhecimento técnico e informativo, ou na dificuldade probatória pertinente ao vínculo obrigacional. Antes de mais nada, tendo em vista a desnecessidade de produção de outras provas, julgo o mérito antecipadamente na forma do art. 355, I do CPC. Passo a analisar as preliminares. a) DA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR POR AUSÊNCIA DE TENTATIVA DE SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL Rejeito a preliminar, entendo que por força do princípio da inafastabilidade da jurisdição não é imprescindível a tentativa extrajudicial de solução do conflito para que a parte possa a vim recorrer ao Poder Judiciário. b) DA AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR POR NÃO HAVER PEDIDO DETERMINADO Rejeito a preliminar, tendo em vista que a autora não busca com a presente ação obter indenização por danos morais. O pedido da presente demanda cinge-se em declarar a inexistência do débito e, consequentemente, retirar o nome da autora do cadastro de inadimplentes. c) DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA Rejeito a preliminar, uma vez que há elementos nos autos que evidenciam os pressupostos legais para a concessão do benefício, portanto, aptos a autorizar a presunção relativa da alegação de insuficiência de recursos (art. 99, §§ 2o e 3o, NCPC). Passo a analisar o mérito. Narra a autora que o promovido inscreveu se nome de forma indevida junto aos órgãos de proteção ao crédito. Pretende com a presente ação que seu nome seja retirado do cadastro de inadimplentes. O promovido, por sua vez, narra que a dívida originária da autora foi contraída com o BOTICÁRIO PRODUTOS DE BELEZA LTDA, fruto da compra de mercadorias (id 89565100 e 89565099). Contudo, não juntou comprovante de notificação prévia a autora acerca da inscrição de seu nome no SERASA. Além disso, não trouxe aos autos nenhum contrato firmado com a parte autora, tampouco notas fiscais acompanhadas dos canhotos de assinatura. Pois bem, analisando o conjunto probatório se constata que não há prova suficiente de que a inscrição do nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito é fruto de compras de mercadoria adquiridas junto ao promovido. Em que pese ter o réu, em sua contestação, juntado Notas Fiscais, estas não estão acompanhadas dos canhotos de assinatura e, por essa razão, não são documentos capazes de comprovar a existência de relação jurídica. Repisa-se: em momento algum, o réu fez prova em contrário das alegações de inexistência do débito, ainda que com diversas oportunidades de se manifestar nos autos. Nesse sentido tem entendido os Tribunais Pátrios: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES - NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO - NOTAS FISCAIS DESACOMPANHADAS DE COMPROVANTE DE ENTREGA DA MERCADORIA - AUSÊNCIA DE ASSINATURA - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - DANO MORAL IN RE IPSA- QUANTUM INDENIZATÓRIO - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE - RECURSO PROVIDO. 1. A responsabilidade do fornecedor de serviços é objetiva, sendo direito básico do consumidor a ampla reparação por danos patrimoniais e morais, somente afastada nas hipóteses de comprovação de inexistência do defeito e culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3º, do CDC) . 2. Negada a existência do negócio jurídico pelo consumidor, incumbe ao prestador de serviços o ônus da prova de demonstrar a legitimidade da contratação (art. 373, inciso II, do CPC), sob pena de se exigir do autor a produção de prova de caráter negativo. 3 . A apresentação de notas fiscais desacompanhadas dos respectivos comprovantes de entrega da mercadoria, devidamente assinados, é insuficiente à comprovação da existência da relação jurídica quando se tratar de prova isolada no contexto probatório. 4. Inexistindo provas sobre a regularidade da constituição da dívida, o reconhecimento da ilegalidade das inscrições lançadas nos órgãos de proteção ao crédito se impõe. 5 . A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes é fato gerador de dano moral, sendo dispensável a comprovação de prova do abalo à honra e reputação do consumidor (dano in re ipsa). 6. No arbitramento do valor indenizatório devem ser observados os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, de modo que a reparação pecuniária não pode servir como fonte de enriquecimento do ofendido, nem consubstanciar incentivo à reincidência do responsável pela prática do ilícito. (TJ-MG - Apelação Cível: 5115597-56 .2019.8.13.0024 1 .0000.24.157758-4/001, Relator.: Des.(a) Eveline Felix, Data de Julgamento: 11/06/2024, 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/06/2024) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE IMPUGNAÇÃO À CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. CESSÃO DE CRÉDITO . NOTAS FISCAIS. AUSÊNCIA DE ACEITE. INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO IN RE IPSA . INDENIZAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. PROVIMENTO DO RECURSO. 1 . Na impugnação ao benefício da gratuidade da justiça compete ao impugnante provar a inexistência dos requisitos que autorizaram a concessão da benesse, ônus do qual não desincumbiu, razão pela qual o benefício deve ser mantido. 2. A cessão de crédito celebrada em inobservância à regra do artigo 288 do Código Civil é ineficaz somente em relação a terceiros, sendo que o devedor não se enquadra nessa hipótese. 3 . As notas fiscais de venda de mercadoria desacompanhadas dos comprovantes de entrega devidamente assinados não constituem documentos hábeis para comprovação dos débitos nelas representados. 4. A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dano moral in re ipsa, prescindindo de demonstração. 5 . A fixação do quantum a título de reparação moral, deve buscar uma sanção de modo a compensar o sofrimento suportado pelo consumidor, que não seja excessivo a ponto de provocar o seu enriquecimento sem causa, tampouco que seja ínfimo a ponto de não inibir o ofensor a voltar a cometer o ato danoso. 6. Impossível a majoração, em grau recursal, da verba honorária quando o recurso for provido. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PROVIDA, SENTENÇA REFORMADA . (TJ-GO - Apelação Cível: 5037819-56.2023.8.09 .0064 GOIANIRA, Relator.: Des(a). DESEMBARGADOR GUILHERME GUTEMBERG ISAC PINTO, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ) Por esta razão, não logrou o réu em comprovar a existência de relação jurídica entre as partes, em sendo assim, por não haver relação jurídica que justificasse a inscrição do nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito, frente a um possível inadimplemento, a referida inscrição se deu de forma indevida, cabendo ao promovido retirar o nome do autor do cadastro de inadimplentes. Isto posto, levando em consideração a prova dos autos e demais princípios de direito aplicáveis à espécie, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: a) DECLARAR A INEXISTÊNCIA DO DÉBITO que ensejou a inscrição do nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito. b) DETERMINAR que a parte ré retire o nome da autora do cadastro de inadimplentes, diante da inexistência de relação jurídica entre as partes. Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios da parte autora, que fixo em 10 % (dez por cento) sobre o valor da condenação, o que faço com fundamento no artigo 85, § 2°, do CPC. P.R.I Com o trânsito em julgado, pagas as custas finais, arquive-se. BAYEUX, 10 de junho de 2025. Juiz(a) de Direito