F. M. G. x F. F. P. e outros
Número do Processo:
0804738-18.2025.8.20.5004
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal
Última atualização encontrada em
01 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPoder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0804738-18.2025.8.20.5004 Parte autora: K. M. A. Parte ré: R. D. S. SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. K. M. A. ajuizou a presente demanda contra R. D. S., narrando que: I) precisava realizar um procedimento odontológico e para tanto, não poderia ter qualquer recaída ou conduta que atrapalhasse o desenvolvimento do procedimento, visto que possui quadro de Transtorno Afetivo Bipolar, episódio atual depressivo grave e Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade; II) a Cirurgiã-Dentista Katarina Bessa de Queiroz, CRO/RN 5.472 receitou o medicamento Ritalina de 10 mg para que ele tomasse 2 cápsulas 1 hora antes do tratamento, sendo que foi surpreendido pela negativa do funcionário que o informou que a receita não era válida por ter sido realizada por uma Cirurgiã-Dentista e não um médico; III) a farmácia insistentemente negou a venda do medicamento; IV) posteriormente, resolveu gravar um vídeo de forma amigável para que os funcionários justificassem a negativa, mas a conduta permaneceu inerte e os seguranças do shopping foram chamados para retirá-lo do local, causando um imenso constrangimento, o que acarretou agravamento de seus problemas psicológicos. Com isso, a condenação ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de compensação por danos morais. Instada a se manifestar, a ré, preliminarmente, suscitou conexão processual. No mérito, alegou, em síntese, ausência de ato ilícito pelo cumprimento Inicialmente, no que se refere à preliminar de conexão, verifica-se que o magistrado possui a discricionariedade para reunião dos processos, segundo o entendimento sedimentado no próprio Superior Tribunal de Justiça, à medida em que este Tribunal entende que a reunião dos processos por conexão é uma faculdade atribuída ao julgador, considerando que o artigo 105 do Código de Processo Civil (CPC) concede ao magistrado uma margem de discricionariedade, para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. Portanto, mesmo se reconhecida a conexão entre as ações, a apreciação conjunta é um ato discricionário do julgador. Nesse sentido, no presente caso, em razão de não vislumbrar qualquer possibilidade de decisão conflitante ou prejuízo para o princípio da economia processual, REJEITO tal preliminar. Superada a preliminar, passo ao exame do mérito. Diante da desnecessidade de produção de mais provas em audiência, bem como da existência de requerimento expresso das partes, procedo ao julgamento antecipado da lide, com fulcro no artigo 355, I, do Novo Código de Processo Civil. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de carga probatória técnica e específica. Cinge-se a controvérsia com relação ao descumprimento contratual com a negativa da venda de medicamento previamente prescrito por Cirugião-Dentista. Trata-se de ação de indenização por danos morais movida sob a alegação de que o autor foi surpreendido pela recusa de venda de medicamento em farmácia localizada em shopping center, sob o fundamento de que a prescrição havia sido realizada por cirurgiã-dentista, e não por médico. Afirma ainda que, diante da insistência na compra, foi retirado do estabelecimento com apoio do segurança do shopping, tendo registrado em vídeo o ocorrido. Pleiteia indenização por suposta violação à sua dignidade, alegando abalo moral. Inicialmente, cumpre destacar que a relação travada entre as partes é de consumo, sendo plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90. Não obstante, a aplicação das normas consumeristas não conduz, por si só, ao reconhecimento automático de danos morais diante de qualquer descumprimento contratual ou falha na prestação do serviço. No caso em tela, a negativa de venda, embora possa ter gerado desconforto ou insatisfação ao consumidor, não extrapola os limites dos dissabores da vida cotidiana, não se verificando qualquer humilhação pública, exposição vexatória ou ofensa à honra do autor que justifique a indenização por danos morais. O vídeo anexado pelo autor, embora registre a negativa de atendimento e sua conversa com o funcionário da farmácia, não revela tratamento desrespeitoso, agressões verbais, humilhações públicas ou qualquer conduta que atente contra a dignidade da pessoa humana (ID 145933218), conforme exigido pela jurisprudência consolidada. Conforme estabelece o artigo 6º, inciso VI, do CDC, o consumidor tem direito à efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais. No entanto, esse direito exige a comprovação concreta da lesão a um dos direitos da personalidade, como a imagem, a honra, a intimidade ou o nome, o que não se verificou no presente caso. O simples fato de haver uma negativa de venda por interpretação restritiva do funcionário quanto à validade da prescrição, ainda que eventualmente equivocada, não é suficiente, por si só, para caracterizar violação a direito da personalidade. Ao contrário, trata-se de questão relacionada à interpretação de normas sanitárias e às responsabilidades do estabelecimento quanto à dispensação de medicamentos controlados. Importante ressaltar que, ainda que tenha havido má interpretação da norma por parte da farmácia, o aborrecimento sofrido pelo consumidor deve ser analisado à luz da proporcionalidade, sob pena de banalização do instituto do dano moral, conforme já advertido pela doutrina. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, em sua consagrada obra: “O dano moral só deve ser admitido quando decorrer de uma lesão injusta a direitos da personalidade, tais como a honra, a imagem, o nome, a integridade psíquica, dentre outros. Inúmeros dissabores, mágoas, irritações, enfim, fatos do cotidiano, não são capazes de gerar dano moral, sob pena de sua banalização.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2022. p. 91). Não se pode admitir que todo e qualquer equívoco no cumprimento de uma obrigação legal ou contratual resulte automaticamente em dano moral, especialmente quando não demonstrado nenhum prejuízo relevante à esfera íntima do indivíduo. A jurisprudência dos Tribunais Superiores caminha no sentido de que o mero aborrecimento, sem reflexos relevantes, não é indenizável. Ademais, não se vislumbra qualquer situação de constrangimento público. O acionamento do segurança, no caso concreto, não teve viés de violência ou intimidação, mas sim de mediação em situação de impasse, o que é usual em ambientes comerciais fechados. Não houve qualquer agressão, imposição ou arbitrariedade comprovada. Não restou comprovada, ademais, a existência de dolo ou má-fé por parte da empresa ré, tampouco comportamento reiterado, desidioso ou atentatório à dignidade do consumidor. A conduta isolada, sem demonstração de prejuízo concreto, deve ser enquadrada como falha menor e pontual, resolvida no próprio atendimento ou por vias administrativas. Além disso, o autor não demonstrou ter sofrido prejuízo à sua imagem, honra ou integridade moral, não tendo, inclusive, comprovado que tenha necessitado de apoio psicológico ou qualquer outro tipo de acompanhamento após o ocorrido. Tampouco se depreende, das provas, qualquer discriminação, ridicularização ou abuso de poder. O artigo 927 do Código Civil dispõe que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Contudo, no caso concreto, não há comprovação do dano extrapatrimonial alegado, tampouco demonstração do ato ilícito com potencial de violar os direitos da personalidade do autor. Dessa forma, ausente o elemento essencial da responsabilização civil, qual seja, o dano moral efetivamente comprovado, impõe-se a improcedência do pedido indenizatório. A negativa de venda do medicamento com base na dúvida sobre a validade da receita, embora equivocada, não representou ofensa à dignidade do autor, mas tão somente uma interpretação restritiva do funcionário, que poderia e deveria ter sido resolvida por outros meios Dessa forma, ausente a comprovação do fato constitutivo de seu direito no tocante à caracterização de ato ilícito, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, a total improcedência do pleito é medida que se impõe. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão encartada na inicial. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Ressalto apenas que, apesar de não concordar totalmente com a fundamentação da análise da preliminar de conexão, entendo que, neste caso, não há conexão que obrigue a reunião, eis que é possível chegar a conclusões distintas em relação aos danos morais, sem que represente contradição ou perplexidade. A discordância é apenas em relação à obrigatoriedade da reunião. Havendo conexão ou possibilidade de decisões conflitantes, o juiz é obrigado a reunir, não havendo discricionaridade. Neste caso, porém, é possível que a Autora do outro processo sofra danos morais decorrentes da recusa de atendimento de sua receita e o Autor desse processo não sofra. As causas são diferentes. Ela porque teria se sentido humilhada com a recusa, perante seu paciente, por ser a profissional de saúde que receitou o medicamento, caso concluído que a Ré era obrigada a aceitar a receita. Ainda assim, é possível que não seja reconhecido a configuração do dano moral em decorrência de ser comum a dúvida sobre a possibilidade do dentista receitar remédios controlados, como pode ser observado no seguinte link: https://www.crorn.org.br/noticias/ver/558 No caso do Autor, de fato não vejo a configuração do dano moral pela simples recusa, ainda que seja concluído, no outro processo, que a recusa da venda tenha sido equivocada, como fundamentado no Projeto de sentença, notadamente porque o vídeo gravado e juntado pelo Autor não demonstra que tenha havido qualquer conduta que o tenha constrangido, bem como nenhuma outra prova que instruiu a pretensão. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 30 de junho de 2025. JOSÉ MARIA NASCIMENTO Juiz de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)
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01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPoder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0804738-18.2025.8.20.5004 Parte autora: K. M. A. Parte ré: R. D. S. SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. K. M. A. ajuizou a presente demanda contra R. D. S., narrando que: I) precisava realizar um procedimento odontológico e para tanto, não poderia ter qualquer recaída ou conduta que atrapalhasse o desenvolvimento do procedimento, visto que possui quadro de Transtorno Afetivo Bipolar, episódio atual depressivo grave e Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade; II) a Cirurgiã-Dentista Katarina Bessa de Queiroz, CRO/RN 5.472 receitou o medicamento Ritalina de 10 mg para que ele tomasse 2 cápsulas 1 hora antes do tratamento, sendo que foi surpreendido pela negativa do funcionário que o informou que a receita não era válida por ter sido realizada por uma Cirurgiã-Dentista e não um médico; III) a farmácia insistentemente negou a venda do medicamento; IV) posteriormente, resolveu gravar um vídeo de forma amigável para que os funcionários justificassem a negativa, mas a conduta permaneceu inerte e os seguranças do shopping foram chamados para retirá-lo do local, causando um imenso constrangimento, o que acarretou agravamento de seus problemas psicológicos. Com isso, a condenação ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de compensação por danos morais. Instada a se manifestar, a ré, preliminarmente, suscitou conexão processual. No mérito, alegou, em síntese, ausência de ato ilícito pelo cumprimento Inicialmente, no que se refere à preliminar de conexão, verifica-se que o magistrado possui a discricionariedade para reunião dos processos, segundo o entendimento sedimentado no próprio Superior Tribunal de Justiça, à medida em que este Tribunal entende que a reunião dos processos por conexão é uma faculdade atribuída ao julgador, considerando que o artigo 105 do Código de Processo Civil (CPC) concede ao magistrado uma margem de discricionariedade, para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. Portanto, mesmo se reconhecida a conexão entre as ações, a apreciação conjunta é um ato discricionário do julgador. Nesse sentido, no presente caso, em razão de não vislumbrar qualquer possibilidade de decisão conflitante ou prejuízo para o princípio da economia processual, REJEITO tal preliminar. Superada a preliminar, passo ao exame do mérito. Diante da desnecessidade de produção de mais provas em audiência, bem como da existência de requerimento expresso das partes, procedo ao julgamento antecipado da lide, com fulcro no artigo 355, I, do Novo Código de Processo Civil. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de carga probatória técnica e específica. Cinge-se a controvérsia com relação ao descumprimento contratual com a negativa da venda de medicamento previamente prescrito por Cirugião-Dentista. Trata-se de ação de indenização por danos morais movida sob a alegação de que o autor foi surpreendido pela recusa de venda de medicamento em farmácia localizada em shopping center, sob o fundamento de que a prescrição havia sido realizada por cirurgiã-dentista, e não por médico. Afirma ainda que, diante da insistência na compra, foi retirado do estabelecimento com apoio do segurança do shopping, tendo registrado em vídeo o ocorrido. Pleiteia indenização por suposta violação à sua dignidade, alegando abalo moral. Inicialmente, cumpre destacar que a relação travada entre as partes é de consumo, sendo plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90. Não obstante, a aplicação das normas consumeristas não conduz, por si só, ao reconhecimento automático de danos morais diante de qualquer descumprimento contratual ou falha na prestação do serviço. No caso em tela, a negativa de venda, embora possa ter gerado desconforto ou insatisfação ao consumidor, não extrapola os limites dos dissabores da vida cotidiana, não se verificando qualquer humilhação pública, exposição vexatória ou ofensa à honra do autor que justifique a indenização por danos morais. O vídeo anexado pelo autor, embora registre a negativa de atendimento e sua conversa com o funcionário da farmácia, não revela tratamento desrespeitoso, agressões verbais, humilhações públicas ou qualquer conduta que atente contra a dignidade da pessoa humana (ID 145933218), conforme exigido pela jurisprudência consolidada. Conforme estabelece o artigo 6º, inciso VI, do CDC, o consumidor tem direito à efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais. No entanto, esse direito exige a comprovação concreta da lesão a um dos direitos da personalidade, como a imagem, a honra, a intimidade ou o nome, o que não se verificou no presente caso. O simples fato de haver uma negativa de venda por interpretação restritiva do funcionário quanto à validade da prescrição, ainda que eventualmente equivocada, não é suficiente, por si só, para caracterizar violação a direito da personalidade. Ao contrário, trata-se de questão relacionada à interpretação de normas sanitárias e às responsabilidades do estabelecimento quanto à dispensação de medicamentos controlados. Importante ressaltar que, ainda que tenha havido má interpretação da norma por parte da farmácia, o aborrecimento sofrido pelo consumidor deve ser analisado à luz da proporcionalidade, sob pena de banalização do instituto do dano moral, conforme já advertido pela doutrina. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, em sua consagrada obra: “O dano moral só deve ser admitido quando decorrer de uma lesão injusta a direitos da personalidade, tais como a honra, a imagem, o nome, a integridade psíquica, dentre outros. Inúmeros dissabores, mágoas, irritações, enfim, fatos do cotidiano, não são capazes de gerar dano moral, sob pena de sua banalização.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2022. p. 91). Não se pode admitir que todo e qualquer equívoco no cumprimento de uma obrigação legal ou contratual resulte automaticamente em dano moral, especialmente quando não demonstrado nenhum prejuízo relevante à esfera íntima do indivíduo. A jurisprudência dos Tribunais Superiores caminha no sentido de que o mero aborrecimento, sem reflexos relevantes, não é indenizável. Ademais, não se vislumbra qualquer situação de constrangimento público. O acionamento do segurança, no caso concreto, não teve viés de violência ou intimidação, mas sim de mediação em situação de impasse, o que é usual em ambientes comerciais fechados. Não houve qualquer agressão, imposição ou arbitrariedade comprovada. Não restou comprovada, ademais, a existência de dolo ou má-fé por parte da empresa ré, tampouco comportamento reiterado, desidioso ou atentatório à dignidade do consumidor. A conduta isolada, sem demonstração de prejuízo concreto, deve ser enquadrada como falha menor e pontual, resolvida no próprio atendimento ou por vias administrativas. Além disso, o autor não demonstrou ter sofrido prejuízo à sua imagem, honra ou integridade moral, não tendo, inclusive, comprovado que tenha necessitado de apoio psicológico ou qualquer outro tipo de acompanhamento após o ocorrido. Tampouco se depreende, das provas, qualquer discriminação, ridicularização ou abuso de poder. O artigo 927 do Código Civil dispõe que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Contudo, no caso concreto, não há comprovação do dano extrapatrimonial alegado, tampouco demonstração do ato ilícito com potencial de violar os direitos da personalidade do autor. Dessa forma, ausente o elemento essencial da responsabilização civil, qual seja, o dano moral efetivamente comprovado, impõe-se a improcedência do pedido indenizatório. A negativa de venda do medicamento com base na dúvida sobre a validade da receita, embora equivocada, não representou ofensa à dignidade do autor, mas tão somente uma interpretação restritiva do funcionário, que poderia e deveria ter sido resolvida por outros meios Dessa forma, ausente a comprovação do fato constitutivo de seu direito no tocante à caracterização de ato ilícito, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, a total improcedência do pleito é medida que se impõe. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão encartada na inicial. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Ressalto apenas que, apesar de não concordar totalmente com a fundamentação da análise da preliminar de conexão, entendo que, neste caso, não há conexão que obrigue a reunião, eis que é possível chegar a conclusões distintas em relação aos danos morais, sem que represente contradição ou perplexidade. A discordância é apenas em relação à obrigatoriedade da reunião. Havendo conexão ou possibilidade de decisões conflitantes, o juiz é obrigado a reunir, não havendo discricionaridade. Neste caso, porém, é possível que a Autora do outro processo sofra danos morais decorrentes da recusa de atendimento de sua receita e o Autor desse processo não sofra. As causas são diferentes. Ela porque teria se sentido humilhada com a recusa, perante seu paciente, por ser a profissional de saúde que receitou o medicamento, caso concluído que a Ré era obrigada a aceitar a receita. Ainda assim, é possível que não seja reconhecido a configuração do dano moral em decorrência de ser comum a dúvida sobre a possibilidade do dentista receitar remédios controlados, como pode ser observado no seguinte link: https://www.crorn.org.br/noticias/ver/558 No caso do Autor, de fato não vejo a configuração do dano moral pela simples recusa, ainda que seja concluído, no outro processo, que a recusa da venda tenha sido equivocada, como fundamentado no Projeto de sentença, notadamente porque o vídeo gravado e juntado pelo Autor não demonstra que tenha havido qualquer conduta que o tenha constrangido, bem como nenhuma outra prova que instruiu a pretensão. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 30 de junho de 2025. JOSÉ MARIA NASCIMENTO Juiz de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)
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01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPoder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0804738-18.2025.8.20.5004 Parte autora: K. M. A. Parte ré: R. D. S. SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. K. M. A. ajuizou a presente demanda contra R. D. S., narrando que: I) precisava realizar um procedimento odontológico e para tanto, não poderia ter qualquer recaída ou conduta que atrapalhasse o desenvolvimento do procedimento, visto que possui quadro de Transtorno Afetivo Bipolar, episódio atual depressivo grave e Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade; II) a Cirurgiã-Dentista Katarina Bessa de Queiroz, CRO/RN 5.472 receitou o medicamento Ritalina de 10 mg para que ele tomasse 2 cápsulas 1 hora antes do tratamento, sendo que foi surpreendido pela negativa do funcionário que o informou que a receita não era válida por ter sido realizada por uma Cirurgiã-Dentista e não um médico; III) a farmácia insistentemente negou a venda do medicamento; IV) posteriormente, resolveu gravar um vídeo de forma amigável para que os funcionários justificassem a negativa, mas a conduta permaneceu inerte e os seguranças do shopping foram chamados para retirá-lo do local, causando um imenso constrangimento, o que acarretou agravamento de seus problemas psicológicos. Com isso, a condenação ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de compensação por danos morais. Instada a se manifestar, a ré, preliminarmente, suscitou conexão processual. No mérito, alegou, em síntese, ausência de ato ilícito pelo cumprimento Inicialmente, no que se refere à preliminar de conexão, verifica-se que o magistrado possui a discricionariedade para reunião dos processos, segundo o entendimento sedimentado no próprio Superior Tribunal de Justiça, à medida em que este Tribunal entende que a reunião dos processos por conexão é uma faculdade atribuída ao julgador, considerando que o artigo 105 do Código de Processo Civil (CPC) concede ao magistrado uma margem de discricionariedade, para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. Portanto, mesmo se reconhecida a conexão entre as ações, a apreciação conjunta é um ato discricionário do julgador. Nesse sentido, no presente caso, em razão de não vislumbrar qualquer possibilidade de decisão conflitante ou prejuízo para o princípio da economia processual, REJEITO tal preliminar. Superada a preliminar, passo ao exame do mérito. Diante da desnecessidade de produção de mais provas em audiência, bem como da existência de requerimento expresso das partes, procedo ao julgamento antecipado da lide, com fulcro no artigo 355, I, do Novo Código de Processo Civil. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de carga probatória técnica e específica. Cinge-se a controvérsia com relação ao descumprimento contratual com a negativa da venda de medicamento previamente prescrito por Cirugião-Dentista. Trata-se de ação de indenização por danos morais movida sob a alegação de que o autor foi surpreendido pela recusa de venda de medicamento em farmácia localizada em shopping center, sob o fundamento de que a prescrição havia sido realizada por cirurgiã-dentista, e não por médico. Afirma ainda que, diante da insistência na compra, foi retirado do estabelecimento com apoio do segurança do shopping, tendo registrado em vídeo o ocorrido. Pleiteia indenização por suposta violação à sua dignidade, alegando abalo moral. Inicialmente, cumpre destacar que a relação travada entre as partes é de consumo, sendo plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90. Não obstante, a aplicação das normas consumeristas não conduz, por si só, ao reconhecimento automático de danos morais diante de qualquer descumprimento contratual ou falha na prestação do serviço. No caso em tela, a negativa de venda, embora possa ter gerado desconforto ou insatisfação ao consumidor, não extrapola os limites dos dissabores da vida cotidiana, não se verificando qualquer humilhação pública, exposição vexatória ou ofensa à honra do autor que justifique a indenização por danos morais. O vídeo anexado pelo autor, embora registre a negativa de atendimento e sua conversa com o funcionário da farmácia, não revela tratamento desrespeitoso, agressões verbais, humilhações públicas ou qualquer conduta que atente contra a dignidade da pessoa humana (ID 145933218), conforme exigido pela jurisprudência consolidada. Conforme estabelece o artigo 6º, inciso VI, do CDC, o consumidor tem direito à efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais. No entanto, esse direito exige a comprovação concreta da lesão a um dos direitos da personalidade, como a imagem, a honra, a intimidade ou o nome, o que não se verificou no presente caso. O simples fato de haver uma negativa de venda por interpretação restritiva do funcionário quanto à validade da prescrição, ainda que eventualmente equivocada, não é suficiente, por si só, para caracterizar violação a direito da personalidade. Ao contrário, trata-se de questão relacionada à interpretação de normas sanitárias e às responsabilidades do estabelecimento quanto à dispensação de medicamentos controlados. Importante ressaltar que, ainda que tenha havido má interpretação da norma por parte da farmácia, o aborrecimento sofrido pelo consumidor deve ser analisado à luz da proporcionalidade, sob pena de banalização do instituto do dano moral, conforme já advertido pela doutrina. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, em sua consagrada obra: “O dano moral só deve ser admitido quando decorrer de uma lesão injusta a direitos da personalidade, tais como a honra, a imagem, o nome, a integridade psíquica, dentre outros. Inúmeros dissabores, mágoas, irritações, enfim, fatos do cotidiano, não são capazes de gerar dano moral, sob pena de sua banalização.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2022. p. 91). Não se pode admitir que todo e qualquer equívoco no cumprimento de uma obrigação legal ou contratual resulte automaticamente em dano moral, especialmente quando não demonstrado nenhum prejuízo relevante à esfera íntima do indivíduo. A jurisprudência dos Tribunais Superiores caminha no sentido de que o mero aborrecimento, sem reflexos relevantes, não é indenizável. Ademais, não se vislumbra qualquer situação de constrangimento público. O acionamento do segurança, no caso concreto, não teve viés de violência ou intimidação, mas sim de mediação em situação de impasse, o que é usual em ambientes comerciais fechados. Não houve qualquer agressão, imposição ou arbitrariedade comprovada. Não restou comprovada, ademais, a existência de dolo ou má-fé por parte da empresa ré, tampouco comportamento reiterado, desidioso ou atentatório à dignidade do consumidor. A conduta isolada, sem demonstração de prejuízo concreto, deve ser enquadrada como falha menor e pontual, resolvida no próprio atendimento ou por vias administrativas. Além disso, o autor não demonstrou ter sofrido prejuízo à sua imagem, honra ou integridade moral, não tendo, inclusive, comprovado que tenha necessitado de apoio psicológico ou qualquer outro tipo de acompanhamento após o ocorrido. Tampouco se depreende, das provas, qualquer discriminação, ridicularização ou abuso de poder. O artigo 927 do Código Civil dispõe que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Contudo, no caso concreto, não há comprovação do dano extrapatrimonial alegado, tampouco demonstração do ato ilícito com potencial de violar os direitos da personalidade do autor. Dessa forma, ausente o elemento essencial da responsabilização civil, qual seja, o dano moral efetivamente comprovado, impõe-se a improcedência do pedido indenizatório. A negativa de venda do medicamento com base na dúvida sobre a validade da receita, embora equivocada, não representou ofensa à dignidade do autor, mas tão somente uma interpretação restritiva do funcionário, que poderia e deveria ter sido resolvida por outros meios Dessa forma, ausente a comprovação do fato constitutivo de seu direito no tocante à caracterização de ato ilícito, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, a total improcedência do pleito é medida que se impõe. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão encartada na inicial. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Ressalto apenas que, apesar de não concordar totalmente com a fundamentação da análise da preliminar de conexão, entendo que, neste caso, não há conexão que obrigue a reunião, eis que é possível chegar a conclusões distintas em relação aos danos morais, sem que represente contradição ou perplexidade. A discordância é apenas em relação à obrigatoriedade da reunião. Havendo conexão ou possibilidade de decisões conflitantes, o juiz é obrigado a reunir, não havendo discricionaridade. Neste caso, porém, é possível que a Autora do outro processo sofra danos morais decorrentes da recusa de atendimento de sua receita e o Autor desse processo não sofra. As causas são diferentes. Ela porque teria se sentido humilhada com a recusa, perante seu paciente, por ser a profissional de saúde que receitou o medicamento, caso concluído que a Ré era obrigada a aceitar a receita. Ainda assim, é possível que não seja reconhecido a configuração do dano moral em decorrência de ser comum a dúvida sobre a possibilidade do dentista receitar remédios controlados, como pode ser observado no seguinte link: https://www.crorn.org.br/noticias/ver/558 No caso do Autor, de fato não vejo a configuração do dano moral pela simples recusa, ainda que seja concluído, no outro processo, que a recusa da venda tenha sido equivocada, como fundamentado no Projeto de sentença, notadamente porque o vídeo gravado e juntado pelo Autor não demonstra que tenha havido qualquer conduta que o tenha constrangido, bem como nenhuma outra prova que instruiu a pretensão. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 30 de junho de 2025. JOSÉ MARIA NASCIMENTO Juiz de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)
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01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPoder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte 14º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: atendimento2jec@tjrn.jus.br _________________________________________________________________________________________________________________________________________ Processo: 0804738-18.2025.8.20.5004 Parte autora: K. M. A. Parte ré: R. D. S. SENTENÇA Vistos, etc. Dispensado relatório na forma do art. 38, caput, da Lei n° 9.099/95. Necessário se faz, no entanto, breve síntese da pretensão encartada na inicial. K. M. A. ajuizou a presente demanda contra R. D. S., narrando que: I) precisava realizar um procedimento odontológico e para tanto, não poderia ter qualquer recaída ou conduta que atrapalhasse o desenvolvimento do procedimento, visto que possui quadro de Transtorno Afetivo Bipolar, episódio atual depressivo grave e Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade; II) a Cirurgiã-Dentista Katarina Bessa de Queiroz, CRO/RN 5.472 receitou o medicamento Ritalina de 10 mg para que ele tomasse 2 cápsulas 1 hora antes do tratamento, sendo que foi surpreendido pela negativa do funcionário que o informou que a receita não era válida por ter sido realizada por uma Cirurgiã-Dentista e não um médico; III) a farmácia insistentemente negou a venda do medicamento; IV) posteriormente, resolveu gravar um vídeo de forma amigável para que os funcionários justificassem a negativa, mas a conduta permaneceu inerte e os seguranças do shopping foram chamados para retirá-lo do local, causando um imenso constrangimento, o que acarretou agravamento de seus problemas psicológicos. Com isso, a condenação ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de compensação por danos morais. Instada a se manifestar, a ré, preliminarmente, suscitou conexão processual. No mérito, alegou, em síntese, ausência de ato ilícito pelo cumprimento Inicialmente, no que se refere à preliminar de conexão, verifica-se que o magistrado possui a discricionariedade para reunião dos processos, segundo o entendimento sedimentado no próprio Superior Tribunal de Justiça, à medida em que este Tribunal entende que a reunião dos processos por conexão é uma faculdade atribuída ao julgador, considerando que o artigo 105 do Código de Processo Civil (CPC) concede ao magistrado uma margem de discricionariedade, para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias. Portanto, mesmo se reconhecida a conexão entre as ações, a apreciação conjunta é um ato discricionário do julgador. Nesse sentido, no presente caso, em razão de não vislumbrar qualquer possibilidade de decisão conflitante ou prejuízo para o princípio da economia processual, REJEITO tal preliminar. Superada a preliminar, passo ao exame do mérito. Diante da desnecessidade de produção de mais provas em audiência, bem como da existência de requerimento expresso das partes, procedo ao julgamento antecipado da lide, com fulcro no artigo 355, I, do Novo Código de Processo Civil. Pois bem. Antes de adentrar no estudo do caso, ressalto que a relação jurídica existente entre as partes, por obediência à Constituição de 1988 e ao Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n.º 8.078/90), caracteriza-se como uma relação de consumo, disciplinada por normas de ordem pública e interesse social, justificadas pelo reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado. Assim, considerando-se a natureza negativa da prova imposta ao autor, e, considerando-se a sua hipossuficiência técnica, bem como a verossimilhança da narrativa autoral, com fulcro no art. 6°, VIII, CDC, INVERTO o ônus da prova em desfavor da ré. Como é notório, trata-se de medida prevista no art. 6º, VIII, do CDC, consoante já exposto, com arrimo, ainda, na hipervulnerabilidade técnica do consumidor para demonstração de carga probatória técnica e específica. Cinge-se a controvérsia com relação ao descumprimento contratual com a negativa da venda de medicamento previamente prescrito por Cirugião-Dentista. Trata-se de ação de indenização por danos morais movida sob a alegação de que o autor foi surpreendido pela recusa de venda de medicamento em farmácia localizada em shopping center, sob o fundamento de que a prescrição havia sido realizada por cirurgiã-dentista, e não por médico. Afirma ainda que, diante da insistência na compra, foi retirado do estabelecimento com apoio do segurança do shopping, tendo registrado em vídeo o ocorrido. Pleiteia indenização por suposta violação à sua dignidade, alegando abalo moral. Inicialmente, cumpre destacar que a relação travada entre as partes é de consumo, sendo plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90. Não obstante, a aplicação das normas consumeristas não conduz, por si só, ao reconhecimento automático de danos morais diante de qualquer descumprimento contratual ou falha na prestação do serviço. No caso em tela, a negativa de venda, embora possa ter gerado desconforto ou insatisfação ao consumidor, não extrapola os limites dos dissabores da vida cotidiana, não se verificando qualquer humilhação pública, exposição vexatória ou ofensa à honra do autor que justifique a indenização por danos morais. O vídeo anexado pelo autor, embora registre a negativa de atendimento e sua conversa com o funcionário da farmácia, não revela tratamento desrespeitoso, agressões verbais, humilhações públicas ou qualquer conduta que atente contra a dignidade da pessoa humana (ID 145933218), conforme exigido pela jurisprudência consolidada. Conforme estabelece o artigo 6º, inciso VI, do CDC, o consumidor tem direito à efetiva prevenção e reparação de danos morais e patrimoniais. No entanto, esse direito exige a comprovação concreta da lesão a um dos direitos da personalidade, como a imagem, a honra, a intimidade ou o nome, o que não se verificou no presente caso. O simples fato de haver uma negativa de venda por interpretação restritiva do funcionário quanto à validade da prescrição, ainda que eventualmente equivocada, não é suficiente, por si só, para caracterizar violação a direito da personalidade. Ao contrário, trata-se de questão relacionada à interpretação de normas sanitárias e às responsabilidades do estabelecimento quanto à dispensação de medicamentos controlados. Importante ressaltar que, ainda que tenha havido má interpretação da norma por parte da farmácia, o aborrecimento sofrido pelo consumidor deve ser analisado à luz da proporcionalidade, sob pena de banalização do instituto do dano moral, conforme já advertido pela doutrina. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, em sua consagrada obra: “O dano moral só deve ser admitido quando decorrer de uma lesão injusta a direitos da personalidade, tais como a honra, a imagem, o nome, a integridade psíquica, dentre outros. Inúmeros dissabores, mágoas, irritações, enfim, fatos do cotidiano, não são capazes de gerar dano moral, sob pena de sua banalização.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2022. p. 91). Não se pode admitir que todo e qualquer equívoco no cumprimento de uma obrigação legal ou contratual resulte automaticamente em dano moral, especialmente quando não demonstrado nenhum prejuízo relevante à esfera íntima do indivíduo. A jurisprudência dos Tribunais Superiores caminha no sentido de que o mero aborrecimento, sem reflexos relevantes, não é indenizável. Ademais, não se vislumbra qualquer situação de constrangimento público. O acionamento do segurança, no caso concreto, não teve viés de violência ou intimidação, mas sim de mediação em situação de impasse, o que é usual em ambientes comerciais fechados. Não houve qualquer agressão, imposição ou arbitrariedade comprovada. Não restou comprovada, ademais, a existência de dolo ou má-fé por parte da empresa ré, tampouco comportamento reiterado, desidioso ou atentatório à dignidade do consumidor. A conduta isolada, sem demonstração de prejuízo concreto, deve ser enquadrada como falha menor e pontual, resolvida no próprio atendimento ou por vias administrativas. Além disso, o autor não demonstrou ter sofrido prejuízo à sua imagem, honra ou integridade moral, não tendo, inclusive, comprovado que tenha necessitado de apoio psicológico ou qualquer outro tipo de acompanhamento após o ocorrido. Tampouco se depreende, das provas, qualquer discriminação, ridicularização ou abuso de poder. O artigo 927 do Código Civil dispõe que “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Contudo, no caso concreto, não há comprovação do dano extrapatrimonial alegado, tampouco demonstração do ato ilícito com potencial de violar os direitos da personalidade do autor. Dessa forma, ausente o elemento essencial da responsabilização civil, qual seja, o dano moral efetivamente comprovado, impõe-se a improcedência do pedido indenizatório. A negativa de venda do medicamento com base na dúvida sobre a validade da receita, embora equivocada, não representou ofensa à dignidade do autor, mas tão somente uma interpretação restritiva do funcionário, que poderia e deveria ter sido resolvida por outros meios Dessa forma, ausente a comprovação do fato constitutivo de seu direito no tocante à caracterização de ato ilícito, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, a total improcedência do pleito é medida que se impõe. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão encartada na inicial. Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Submeto, nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo de Direito. PEDRO ROBERTO PINTO DE CARVALHO Juiz Leigo SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA Trata-se de projeto de sentença ofertado por juiz leigo, nos moldes previstos no art. 98, I, da CF, Leis nº 9.099/1995 e 12.153/2009, e Resoluções nº 174/2013, do CNJ, e 036/2014, do TJRN. Verifico que o projeto está em consonância com o entendimento deste juiz, razão pela qual merece homologação. Ressalto apenas que, apesar de não concordar totalmente com a fundamentação da análise da preliminar de conexão, entendo que, neste caso, não há conexão que obrigue a reunião, eis que é possível chegar a conclusões distintas em relação aos danos morais, sem que represente contradição ou perplexidade. A discordância é apenas em relação à obrigatoriedade da reunião. Havendo conexão ou possibilidade de decisões conflitantes, o juiz é obrigado a reunir, não havendo discricionaridade. Neste caso, porém, é possível que a Autora do outro processo sofra danos morais decorrentes da recusa de atendimento de sua receita e o Autor desse processo não sofra. As causas são diferentes. Ela porque teria se sentido humilhada com a recusa, perante seu paciente, por ser a profissional de saúde que receitou o medicamento, caso concluído que a Ré era obrigada a aceitar a receita. Ainda assim, é possível que não seja reconhecido a configuração do dano moral em decorrência de ser comum a dúvida sobre a possibilidade do dentista receitar remédios controlados, como pode ser observado no seguinte link: https://www.crorn.org.br/noticias/ver/558 No caso do Autor, de fato não vejo a configuração do dano moral pela simples recusa, ainda que seja concluído, no outro processo, que a recusa da venda tenha sido equivocada, como fundamentado no Projeto de sentença, notadamente porque o vídeo gravado e juntado pelo Autor não demonstra que tenha havido qualquer conduta que o tenha constrangido, bem como nenhuma outra prova que instruiu a pretensão. Isto posto, com fulcro no art. 40, da Lei nº 9.099/1995, HOMOLOGO, por sentença o projeto acima em seu inteiro teor, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Natal/RN, 30 de junho de 2025. JOSÉ MARIA NASCIMENTO Juiz de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)