Processo nº 08073860920238100060
Número do Processo:
0807386-09.2023.8.10.0060
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMA
Classe:
APELAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Segunda Câmara de Direito Privado
Última atualização encontrada em
26 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
26/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Segunda Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELSEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO GABINETE DO DESEMBARGADOR JOSÉ GONÇALO DE SOUSA FILHO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0807386-09.2023.8.10.0060 – TIMON/MA APELANTE: BANCO BRADESCO S/A. ADVOGADO: ANTÔNIO MORAES DOURADO NETO (OAB/PE Nº 23.255). APELADO: MARIA DE LOURDES DA CONCEIÇÃO. ADVOGADAS: LENARA ASSUNÇÃO RIBEIRO DA COSTA (OAB/MA Nº 21.042-A) E CHIRLEY FERREIRA DA SILVA (OAB/MA Nº 23.556-A). RELATOR: DESEMBARGADOR JOSÉ GONÇALO DE SOUSA FILHO. EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDORA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. O PRESENTE CASO SE ENQUADRA NO IRDR Nº 53.983/2016, QUE FIXOU 4 (QUATRO) TESES JURÍDICAS RELATIVAS ÀS AÇÕES QUE TRATAM DE CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS, ENVOLVENDO PESSOAS IDOSAS, NÃO ALFABETIZADAS E DE BAIXA RENDA. ANUÊNCIA COMPROVADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CARACTERIZADA. SENTENÇA REFORMADA. 1. Histórico do empréstimo: Valor do empréstimo: R$ 3.614,92 (três mil seiscentos e quatorze reais e noventa e dois centavos); Valor das parcelas: R$ 85,90 (oitenta e cinco reais e noventa centavos); Quantidade de parcelas: 84 (oitenta e quatro); Parcelas pagas: 31 (trinta e uma). 2. A instituição financeira se desincumbiu do seu ônus de comprovar que houve a regular contratação do débito questionado pela parte apelada, nos termos do art. 373, II, do CPC, daí por que os descontos se apresentam devidos. 3. Litigância de má-fé caracterizada, uma vez que, alterando a verdade dos fatos, a parte autora ajuizou ação questionando a contratação de débito que tinha ciência de tê-lo contraído. 4. Recurso provido. DECISÃO MONOCRÁTICA Banco Bradesco S/A, em 27/10/2023, interpôs apelação cível visando reformar a sentença, proferida em 05/10/2023 (ID 30792658), pela Juíza de Direito Titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Timon/MA, Dra. Raquel Araújo Castro Teles de Menezes, que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Contratual c/c Repetição do Indébito e Indenização por Danos Morais, ajuizada em 31/07/2023 por Maria de Loures da Conceição, assim decidiu: “(…) Ante o exposto, com fulcro no art. 487 do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL para, em consequência: a) declarar a inexistência de débito pela autora no contrato em referência (n. 339440904-3); b) condenar o demandado no pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de ressarcimento por danos morais sofridos pelo demandante, sobre os quais deverão incidir correção monetária pelo INPC, a partir da data desta sentença (Súmula 362, STJ), e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês da data do evento danoso (Súmula 54, STJ); c) condenar o demandado no pagamento em dobro dos valores descontados indevidamente (repetição de indébito) na aposentadoria do demandante, referente ao(s) contrato(s) em questão, acrescidos de correção monetária, desde a data de cada desembolso indevido, e juros de mora, estes a contar da citação, na forma do art. 397, parágrafo único, do Código Civil, e art. 240, caput, do Código de Processo Civil. d) condenar o demandado no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, sendo estes fixados no percentual de 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 85 do CPC (...)". Em suas razões recursais contidas no ID 30792661 aduz a parte apelante que “a inércia da parte recorrida por longo lapso temporal em relação ao questionamento da operação contratada (averbação do contrato junto ao INSS, em verdade, induz o perfazimento de evidente ANUÊNCIA ou CONCORDÂNCIA TÁCITA, sendo certo que há na postura da parte autora, em somente agora questionar a regularidade da contratação, afronta aos institutos do VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM1, SUPRESSIO/SURRECTIO2 e DUTY TO MITIGATE THE LOSS”. Aduz, mais, que “o recorrente demonstrou inequivocamente a regularidade da contratação e, por conseguinte, a ausência de ilicitude na cobrança dos valores referentes ao produto contratado, portanto, inexiste dever de devolução dos valores cobrados, sobretudo em dobro”. Com esses argumentos, requer "a) O recebimento do presente Recurso em seu efeito suspensivo; b) Que seja reformada integralmente a Sentença, ante os argumentos acima expostos, alterando-se, em sendo o caso, os ônus sucumbenciais; c) Seja a parte recorrida intimada para apresentar o extrato de sua conta referente ao período no qual o depósito foi realizado, a fim de comprovar a titularidade da conta e a regularidade do depósito, conforme os termos do art. 932, I do CPC e dos enunciados nº 645 e nº 646 do Fórum Permanente de Processualistas Civil – FPPC; d) Que na hipótese de não acolhimento dos pedidos anteriores, haja a reforma parcial da Sentença, no sentido de determinar a devolução simples, a redução do valor da condenação ou a compensação da quantia recebida pela Parte Adversa, devendo, essa, ser realizada de forma atualizada desde a época do depósito (juros e correção); e) Requer a devolução atualizada do valor pago em favor do recorrido ou o abatimento deste valor do montante total da condenação (...)". A parte recorrida apresentou as contrarrazões contidas no ID 30792666 defendendo, em suma, a manutenção da sentença. Manifestação da Douta Procuradoria-Geral de Justiça pelo conhecimento do recurso, deixando de opinar sobre o mérito por entender inexistentes quaisquer hipóteses de intervenção ministerial (ID 33589401). É o relatório. Decido. Verifico que os pressupostos de admissibilidade exigidos para o regular processamento do recurso foram devidamente atendidos pela parte apelante, daí por que o conheço. Na origem, consta da inicial que a parte autora foi cobrada por dívida oriunda de contrato de empréstimo consignado que diz não ter celebrado, pelo que requereu seu cancelamento e indenização por danos morais e materiais. Inicialmente, cabe registrar que, na Sessão do dia 12.09.2018, o Plenário deste egrégio Tribunal de Justiça julgou o mérito do IRDR nº 53.983/2016 para fixar 4 (quatro) teses jurídicas relativas às ações que tratam de contratos de empréstimos consignados envolvendo pessoas idosas, não alfabetizadas e de baixa renda. Conforme relatado, a controvérsia diz respeito à contratação, tida como fraudulenta, do empréstimo consignado alusivo ao contrato nº 339440904-3, no valor de R$ 3.614,92 (três mil seiscentos e quatorze reais e noventa e dois centavos), a ser pago em 84 (oitenta e quatro) parcelas de R$ 85,90 (oitenta e cinco reais e noventa centavos), deduzidas do benefício previdenciário percebido pela parte apelante. A juíza de 1º grau julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial, entendimento que, a meu sentir, merece ser reformado. É que a parte apelante, entendo, se desincumbiu do ônus de comprovar a regular contratação do débito questionado, pois juntou aos autos o documento contido no ID 43259742, que diz respeito ao contrato ora em discussão devidamente assinado pela parte apelada. Além disso, consta do ID 43259741 o comprovante de pagamento da quantia contratada, o que demonstra que os descontos são devidos. Ademais, no caso, entendo que caberia à parte autora comprovar que não recebeu o valor negociado, prova essa que não é draconiana e nem impossível, uma vez que deveria apenas juntar uma cópia do extrato de sua conta bancária alusivo ao período em que ocorreu o depósito, o que é perfeitamente possível, e tudo estaria explicado, tendo em vista que extrato só poderá ser coligida aos autos pela própria parte ou por determinação judicial, em virtude do sigilo bancário. Não há que se falar em desconhecimento, erro, engano ou ignorância da parte autora capaz de eximi-la do pagamento das prestações do contrato, que já se encontrava na parcela 31 (trinta e uma) quando propôs a ação, em 31/07/2023. Com efeito, mostra-se evidente que a parte recorrida assumiu as obrigações decorrentes do contrato de empréstimo consignado com a parte recorrente. Logo, somente poderia eximir-se do débito contraído realizando seu pagamento integral, o que ainda não fez. No caso, entendo que a parte apelada deve ser condenada por litigância de má-fé, pois ao ajuizar ação questionando a contratação de empréstimo que tinha ciência de tê-lo realizado, não há dúvidas de que assim agiu, e por isso deve ser penalizada, pois alterou a verdade dos fatos para conseguir seus objetivos, a teor do que dispõe o art. 80, II, do CPC, in verbis: “Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - (…) II - Alterar a verdade dos fatos;” Pertinente ao montante da multa, entendo que o correspondente a 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa se apresenta razoável e proporcional, pois não tem sido raro o ajuizamento de ações em que a parte almeja auferir vantagem sem qualquer fundamento, o que entendo ser o caso. Sobre o tema, a jurisprudência a seguir: “APELAÇÃO CÍVEL – JULGAMENTO MONOCRÁTICO PELO RELATOR – POSSIBILIDADE. I) O art. 932 da Lei n.º 13.105/15 permite o julgamento do recurso na forma monocrática. A técnica de julgamento monocrático pelo relator, que continua sendo aplicada no STJ por força da Súmula 568 daquele Colendo Tribunal, há de ser aqui também empregada, a despeito da redução de poderes contidas no referido artigo 932,IV, do CPC/15, por contrariar regra maior, contida na Constituição Federal, de realização da razoável duração do processo, da efetividade dele, constituindo-se em meio que garante a celeridade da tramitação recursal, tendo em vista o que consta do artigo 5º, LXXVIII, da Magna Carta. II) Outrossim, o controle do julgamento monocrático pode se dar por via do agravo interno, que a parte tem à sua disposição, fato que assegura a possibilidade de ser mantida a orientação do Código de Processo Civil de 2015, de ser o novo diploma um Código constitucionalizado, com vistas a concretizar os ideais do Estado Democrático Constitucional, mediante decisão de mérito justa, tempestiva e efetiva, nos termos do disposto nos artigos 1º, 4º, 5ºe 6º, do CPC/15. MÉRITO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL – AUTOR QUE NÃO RECONHECE O CONTRATO QUE MOTIVOU DESCONTOS DE PARCELAS NO SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL DIANTE DA PROVA DA TRANSFERÊNCIA DO DINHEIRO EM FAVOR DO AUTOR – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA– RECURSO IMPROVIDO. I) A alteração da verdade dos fatos com o objetivo de enriquecer-se ilicitamente configura conduta expressamente condenada pelo Código de Processo Civil nos incisos II e III do art. 81, dando azo à condenação da parte ao pagamento de multa por litigância de má-fé. II) Recurso conhecido, mas improvido, nos termos do artigo 932 do CPC. (TJ-MS - APL: 08056385420188120029 MS 0805638-54.2018.8.12.0029, Relator: Des. Dorival Renato Pavan, Data de Julgamento: 30/05/2019, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 31/05/2019)”. Diante de todas essas ponderações, fica claro que a pretensão de reformar a sentença de 1º grau merece guarida. Nesse passo, ante o exposto, em desacordo com a manifestação ministerial, fundado no art. 932, V, “c”, do CPC c/c Súmula 568 do STJ, monocraticamente, dou provimento ao recurso para, reformando integralmente a sentença, julgar improcedentes os pedidos contidos na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, ressaltando que o valor da multa por litigância de má-fé poderá ser cobrado desde logo, forte no §4º do art. 98 do CPC. Tendo em vista o princípio da causalidade, inverto o ônus da sucumbência, ficando sob condição suspensiva em relação à parte apelada, considerando sua litigância sob o pálio de justiça gratuita (art. 98, §3º, do CPC). De já, advirto as partes que a oposição de embargos de declaração com caráter meramente protelatório será apenada com multa, ex vi do art. 1.026, §2º, do CPC. Intimem-se as partes e notifique-se a Douta Procuradoria-Geral de Justiça. Cumpra-se por atos ordinatórios. Cópia da presente, se necessário, servirá como mandado de intimação, de notificação, de ofício e para as demais comunicações de estilo. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os presentes autos, dando-se baixa nos cadastros e registros pertinentes. Publique-se. Cumpra-se. São Luís/MA, data do sistema. Desembargador José Gonçalo de Sousa Filho Relator AJ05