Lindalva Ferreira De Lima e outros x Roberto Dorea Pessoa

Número do Processo: 0807974-40.2024.8.20.5124

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRN
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 4ª Vara Cível da Comarca de Parnamirim
Última atualização encontrada em 14 de julho de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 29/05/2025 - Intimação
    Órgão: 4ª Vara Cível da Comarca de Parnamirim | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO  RIO GRANDE DO NORTE Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Parnamirim Fórum Tabelião Otávio Gomes de Castro, Rua Suboficial Farias, nº 280, Monte Castelo, Centro, Parnamirim/RN CEP: 59146-200 Processo nº 0807974-40.2024.8.20.5124 Ação: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL Parte autora: LINDALVA FERREIRA DE LIMA Parte ré: Banco Bradesco   SENTENÇA Trata-se de ação denominada "AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO COM INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS" proposta por LINDALVA FERREIRA DE LIMA em desfavor do BANCO BRADESCO, ambos qualificados nos autos, sob alegação da existência de descontos indevidos em seu benefício previdenciário, decorrentes de contrato que afirma não ter celebrado.   Sustentou que tomou conhecimento dos descontos apenas quando, ao procurar o INSS, verificou a existência de empréstimo consignado, registrado sob o contrato nº 325843083-8, cujos descontos se iniciaram em abril de 2019, no valor mensal de R$ 18,20, com previsão de término em março de 2025.   Afirmou que, até maio de 2024, foram descontadas de sua aposentadoria 62 parcelas, totalizando R$ 1.128,40, valor que postula ser restituído de forma dobrada, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.   Aduziu, ainda, que o contrato é inexistente, por não ter anuído com sua celebração, razão pela qual requer a declaração de nulidade do ajuste, a inexigibilidade do débito e o pagamento de indenização por danos morais.   Apresentou documentos para comprovar suas alegações.   Gratuidade judiciária deferida no id. 124380151. Na mesma decisão, determinou-se que a análise da tutela de urgência seria postergada para depois do contraditório.   Designada audiência conciliatória, não houve acordo entre as partes (id. 126579459).   O réu, Banco Bradesco S.A., apresentou contestação no id. 126531415, na qual, inicialmente, impugnou o pedido de gratuidade de justiça, alegando que a parte autora não apresentou prova suficiente de sua hipossuficiência econômica. A seguir, arguiu a ausência de interesse de agir, sob o fundamento de que a autora não buscou, previamente, a solução administrativa da controvérsia, não tendo registrado qualquer reclamação junto aos canais competentes. Sustentou que a ausência de resistência à pretensão, no âmbito administrativo, afasta a necessidade de intervenção judicial, sendo, portanto, caso de extinção do feito sem resolução de mérito. Em seguida, alegou a inépcia da petição inicial, por ausência de apresentação de documentos essenciais à compreensão da controvérsia. Destacou que a autora não apresentou extratos bancários referentes ao período da contratação, tampouco depositou em juízo o valor supostamente creditado, o que comprometeria o exame da verossimilhança de sua alegação de inexistência de relação contratual. Ainda em sede preliminar, defendeu a existência de conexão entre esta demanda e a ação de nº 0807977- 92.2024.8.20.5124, na qual a autora também postula a declaração de inexistência de contrato de empréstimo consignado e a devolução de valores supostamente descontados indevidamente. Paralelamente, arguiu a existência de litispendência, ao asseverar que a presente ação é idêntica à de nº 0807976-10.2024.8.20.5124, tratando-se do mesmo contrato de nº 325843083-8, com idêntico valor de desconto, de modo que seria caso de extinção deste processo, sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inciso V, do CPC. No tocante às prejudiciais de mérito, suscitou, inicialmente, a ocorrência de prescrição trienal, nos termos do art. 206, § 3º, inciso V, do Código Civil, sustentando que a pretensão deduzida se funda em suposto vício do serviço, hipótese para a qual o prazo prescricional seria de três anos, contados a partir do primeiro desconto, ocorrido em abril de 2019. Assim, considerando que a presente ação foi proposta apenas em maio de 2024, entende que a pretensão autoral estaria fulminada pela prescrição. Afirmou ainda a ocorrência de decadência, à luz do art. 178, inciso II, do Código Civil, porquanto se trata de pretensão anulatória de negócio jurídico, cujo prazo decadencial de quatro anos também já teria se consumado, contando-se do momento da celebração do contrato, ou seja, de abril de 2019.   No mérito, a instituição financeira defendeu a regularidade da contratação, sustentando que o valor de R$ 6.564,35 foi devidamente creditado na conta da autora, que não apresentou qualquer objeção ou devolveu o numerário, tampouco contestou a contratação antes do ajuizamento da presente demanda, mesmo após longo lapso temporal. Alegou, assim, que a conduta da autora evidencia anuência tácita à contratação, sendo aplicáveis ao caso os institutos da supressio e do venire contra factum proprium, decorrentes do princípio da boa-fé objetiva. Sustentou que a ausência de impugnação anterior e o uso do crédito recebido afastam qualquer ilicitude ou falha na prestação do serviço bancário, tornando indevida a pretensão de repetição do indébito e de indenização por danos morais.   Ainda quanto aos pedidos indenizatórios, defendeu que não se verificou qualquer ato ilícito, tampouco comprovação de dano, sendo insuficiente, para tanto, a mera alegação de descontos não reconhecidos, sobretudo diante da ausência de devolução do valor creditado. Por fim, requereu, caso acolhidos os pedidos autorais, a compensação entre o crédito liberado em favor da autora e o valor da condenação, com atualização monetária e juros legais, a fim de evitar enriquecimento sem causa.   Em réplica (id. 127049236), a parte autora impugnou todas as preliminares e prejudiciais suscitadas, reiterando a inexistência de contrato válido e afirmando que a suposta conexão e litispendência não se verificam, porquanto as demandas tratam de contratos distintos, ainda que de valores próximos. Defendeu que o prazo prescricional aplicável é o quinquenal, previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, e que o termo inicial para sua contagem deve ser a data do último desconto indevido, ainda não ocorrido. Rechaçou, também, a tese de anuência tácita, asseverando ser pessoa idosa, analfabeta e sem conhecimento dos meios digitais, realizando apenas saques presenciais, o que lhe teria impedido de detectar os descontos antes da consulta ao INSS. Ao final, reiterou todos os pedidos formulados na exordial, inclusive o benefício da justiça gratuita, sustentando a evidente hipossuficiência econômica.   Tutela de urgência concedida no id. 128164814.   Intimadas para informar sobre a necessidade de se produzir outras provas, as partes quedaram-se inertes.   É o que importa relatar. Passo a decidir.   1 – Das questões processuais pendentes.   1.1 – Impugnação à gratuidade da justiça   Inicialmente, aprecio a questão processual pendente, alusiva à impugnação à gratuidade judiciária requerida pela autora, formulada pelo banco-réu em sua contestação.   O benefício da assistência judiciária gratuita libera a parte que dele dispõe de prover as despesas dos atos que realizam e requerem no processo (artigo 82 do CPC), bem como de responder pelas custas e honorários advocatícios.   A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, ao garantir assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, não revogou o artigo 4º da Lei 1.060/50, o qual estabelece que basta a simples declaração do interessado para que o juiz possa conceder-lhe o benefício, salvo prova em contrário.   In casu, a parte ré, Banco Bradesco S/A, limitou-se a alegar genericamente que a autora possuiria capacidade financeira para suportar as despesas processuais. Contudo, não acostou qualquer prova concreta que demonstrasse a ausência de hipossuficiência econômica da parte autora.   Registre-se que, antes de se deferir a gratuidade judiciária em favor da autora, o juízo empreendeu diligências para que a autora demonstrasse preencher os pressupostos para concessão do benefício, o que foi atendido no id. 122872332.   Assim, competia à parte impugnante demonstrar a capacidade econômica da parte contrária.   Diante disso, rejeito a impugnação apresentada e mantenho os benefícios da gratuidade de justiça concedidos à autora.   Ultrapassada tal questão processual pendente, impende anotar que a lide em apreço comporta julgamento antecipado, por força do art. 355, I, do Código de Processo Civil, tendo em vista que somente há questões de direito a serem dirimidas, além do que os fatos já se encontram demonstrados pela documentação anexada aos autos, tudo à luz do princípio da persuasão racional (art. 371 do CPC).   Passo ao exame das preliminares suscitadas na contestação.   2 – Das preliminares   2.1 – Conexão com o processo nº 0807977-92.2024.8.20.5124 e litispendência com o processo nº 0807976-10.2024.8.20.5124   Tais preliminares já foram rechaçadas na decisão de id. 128164814, haja vista que houve patente erro material na peça inaugural, esclarecido por ocasião da réplica, uma vez que o contrato vinculado à parcela impugnada, no importe de R$ 18,20, em 72 prestações fixas, é o de nº 825812854-9, e não o contrato sob o nº 325843083-8, igualmente impugnado nos autos sob o nº 0807976-10.2024.8.20.5124, já havendo, inclusive, tutela de urgência concedida em favor da autora.   Ademais, quanto ao processo de nº 0807977-92.2024.8.20.5124, este envolve contratação indevida vinculado ao contrato de empréstimo nº 326338508-4, totalmente diverso do contrato discutido nestes autos, além do que a ação já se encontra julgada, não havendo o que se falar em conexão de processos findos.   Desse modo, não há que se cogitar conexão, prevenção ou litispendência entre os feitos por não serem idênticos.   2.2 – Inépcia da inicial   Alegou a parte ré que a autora não apresentou a documentação necessária ao processamento da inicial, a exemplo do extrato da conta ou depósito judicial do valor recebido a título de empréstimo.   Inicialmente, ressalta-se que a petição inicial deve atender aos requisitos previstos no art. 319 do Código de Processo Civil, contendo os elementos essenciais para a propositura da ação, notadamente a exposição dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido, a indicação do objeto da demanda e o requerimento da respectiva tutela jurisdicional.   No caso em análise, observa-se que a inicial preenche os requisitos legais, descrevendo, de forma clara e coerente, os fatos relacionados à suposta fraude na contratação do empréstimo, os fundamentos jurídicos que embasam o pedido e a tutela pretendida pela autora.   A alegação de que a inicial seria inepta por ausência dos documentos mencionados não procede.   O extrato bancário perseguido pela parte ré não constitui requisito para o recebimento da inicial, devendo a sua ausência ser analisada à luz do conjunto probatório, podendo repercutir, eventualmente, na procedência ou improcedência do pedido, mas não na extinção do feito sem julgamento de mérito.   Ademais, como a parte autora alegou um fato negativo — ausência de contratação — caberia à ré trazer aos autos o comprovante do TED ou indícios de que teria transferido o valor para a conta da autora, o que não fez.   Isso posto, REJEITO a preliminar aventada.   2.3 – Da ausência de interesse de agir   Igualmente não assiste razão ao requerido quanto à ausência de pretensão resistida, pois, segundo o princípio constitucional da garantia de acesso à Justiça, o esgotamento da via administrativa não é requisito para o ajuizamento deste tipo de demanda consumerista, envolvendo repetição de indébito e indenização fundada em falha na prestação de serviço, sendo descabida a exigência da prévia utilização da via administrativa.   Ademais, o próprio réu contestou a ação e impugnou os pedidos deduzidos na inicial, defendendo a regularidade da contratação.   Por fim, sabe-se que o princípio da inafastabilidade da jurisdição, assegurado pelo art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, autoriza aqueles que se sentirem lesados em seus direitos a buscarem a solução do conflito diretamente junto ao Poder Judiciário, sem necessidade de esgotamento da via administrativa neste tipo de demanda.   Isso posto, REJEITO a preliminar.   Enfrentadas as preliminares, procedo com a análise das prejudiciais de mérito.   3 – Prejudiciais de mérito   3.1 – Da prescrição   Defendeu o réu, em sua contestação, que o prazo prescricional seria o trienal, à luz do disposto no artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil.   Sem razão ao Demandado.   A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC.   O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido, o que ainda persistia.   Vejamos o seguinte julgado do STJ:   AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. FATO DO SERVIÇO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TERMO INICIAL APLICÁVEL À PRETENSÃO RESSARCITÓRIA ORIUNDA DE FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ÚLTIMO DESCONTO INDEVIDO. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes. 3. O entendimento adotado pelo acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 1720909 MS 2020/0159727-2, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 26/10/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/11/2020)   Assim, REJEITO a prejudicial de mérito alusiva à prescrição.   3.2 – Decadência   Rejeito, por fim, a alegação de decadência, uma vez que a parte autora não pretende a anulação do contrato com fundamento em vício de consentimento (erro, dolo, coação, lesão etc), a fim de atrair o prazo decadencial de 4 anos, mas sim desconstituir um débito que alega nunca ter contraído.   Não havendo outras questões processuais, preliminares ou prejudiciais de mérito, passo a apreciar o mérito propriamente dito.   4 – Do mérito:   A relação jurídica estabelecida é de consumo, pois se amoldam aos requisitos qualificadores de tal relação, aplicável ao caso a Lei nº 8.078/90, dispostos nos arts. 2º e 3º e 29 da legislação mencionada.   E ainda, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) é aplicável às instituições financeiras (Súmula n. 297/STJ), as quais devem prestar serviços de qualidade no mercado de consumo.   Assim sendo, o Código de Defesa do Consumidor consagra a responsabilização objetiva do fornecedor de serviço, ex vi do art. 14, caput, do CDC, não interessando investigar a sua conduta.   Prescreve o art. 14, caput, da Lei nº 8.078/90, verbis:   “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”   Por sua vez, o § 3º, e seus incisos, do aludido dispositivo legal, prevê as causas de não-responsabilização do fornecedor, quais sejam: a) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; b) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.   Mais uma vez, valendo-me da lição de Zelmo Denari, válido salientar que “a investigação da conduta culposa do consumidor ou de terceiro somente é admissível para demonstrar a exclusividade da culpa. Em decorrência do princípio da inversão do ônus da prova cabe ao fornecedor demonstrar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, 6ª edição, p. 166).    Aqui, relevante também afirmar a verossimilhança da alegação invocada pela autora, consumidora bystander (por equiparação), no que diz respeito à alegada deficiência nos serviços da ré, acarretando, nesse aspecto, a inversão do ônus probatório, a teor do que dispõe o art. 6º, inciso VIII, do CDC:   “Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.”   No caso em tela, embora a parte autora tenha comprovado os descontos em sua aposentadoria das parcelas impugnadas (id. 121923371), vinculadas ao contrato nº 825812854-9, a parte ré não trouxe aos autos qualquer prova da relação jurídica existente entre as partes, mormente quanto ao contrato acima identificado, ônus que lhe incumbia, por ser a parte autora a mais vulnerável da relação e por encontrar-se impossibilitada de comprovar um fato negativo, ou seja, que não contratou.   Também não foi acostado qualquer comprovante de TED para a conta da autora, a fim de demonstrar que o valor foi para ela disponibilizado.   Assim, diante da inexistência de prova do pacto firmado entre as partes, donde teria exsurgido a dívida em exame, a outro entendimento não posso chegar senão de que esta deve ser desconstituída, devendo os valores pagos indevidamente serem restituídos em dobro à parte autora, no termos do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.   Outrossim, a ausência de comprovação pela instituição financeira de que o crédito foi efetivamente disponibilizado à autora ou que ela tenha dele se beneficiado, caracteriza falha na prestação do serviço e atrai a responsabilidade objetiva do fornecedor.   Quanto aos danos morais, percebe-se que, no caso dos autos, houve violação ao princípio da boa-fé objetiva, que impõe uma regra de conduta, tratando-se de um verdadeiro controle das cláusulas e práticas abusivas em nossa sociedade. A boa-fé assume feição de uma regra ética de conduta e tem algumas funções como: fonte de novos deveres de conduta anexos à relação contratual; limitadora dos direitos subjetivos advindos da autonomia da vontade, bem como norma de interpretação (observar a real intenção do contraente) e integração do contrato. Com efeito, verifica-se que a parte autora, na condição de consumidora por equiparação, foi diretamente afetada pela indevida contratação em seu nome, culminando na realização de descontos mensais e automáticos em seu benefício previdenciário, sem que tenha anuído ou sequer solicitado qualquer operação de crédito junto ao réu. Nesse contexto, além de ter sua renda comprometida com empréstimo, viu-se diante de uma situação de impotência pelo engodo perpetrado e teve seu sossego e sua paz cotidiana severamente abalados. No mais, a jurisprudência já firmou entendimento de que, em tais hipóteses de indevido lançamento de encargos ou débitos inexistentes, sobretudo quando incidentes sobre verbas alimentares, como benefícios previdenciários, o dano moral é presumido (in re ipsa), dispensando-se a demonstração de efetivo prejuízo concreto, pois tal situação viola direitos da personalidade e a dignidade do consumidor. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.292.141, de relatoria da Min. Fátima Nancy Andrighi, julgado em 4.12.2012, recebeu destaque da doutrina, pois consolidou jurisprudência no sentido há dano moral in re ipsa sempre que demonstrada a ofensa injusta à dignidade humana, dispensando-se prova de dor ou sofrimento do ofendido. Basta que um dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal tenha sido violado. No mesmo sentido, trago ao presente julgado a ementa do TJDFT: Ementa: CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CONTRATO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO . APOSENTADA. HIPERVULNERÁVEL. FRAUDE. RESCISÃO CONTRATUAL . DANO MORAL. PRESUNÇÃO. 1. É considerada hipervulnerável em relação à instituição financeira, a consumidora idosa aposentada, com baixa instrução e reduzido poder financeiro . 2. Comprovados o vício de consentimento e a fraude em desfavor da consumidora, deve-se anular o contrato de empréstimo consignado. 3. Ainda que a fraude decorra de conduta de terceiros, a instituição financeira responsabiliza-se, em regra, pelos danos causados, em virtude da responsabilidade objetiva e do fortuito interno que permeiam a sua atividade, conforme enunciado de Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça . 4. É presumido (in re ipsa), em regra, o dano moral decorrente de fraude bancária. 5. Recurso conhecido e desprovido . (TJ- DF 0706511-05.2022.8.07 .0010 1821536, Relator.: MARIA DE LOURDES ABREU, Data de Julgamento: 22/02/2024, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 06/03/2024) Outrossim, tal conduta ilícita do fornecedor afronta de modo flagrante o princípio da boa-fé objetiva, o qual impõe deveres anexos de proteção e lealdade nas relações jurídicas, inclusive quanto ao zelo e segurança na formalização de contratos, bem como na guarda e utilização de dados pessoais do consumidor. Ressalte-se, ainda, que a falha na prestação do serviço, consubstanciada na autorização e realização de descontos indevidos na aposentadoria da parte autora, gerou situação de evidente vulnerabilidade econômica, expondo-a à supressão injustificada de parcela de seu sustento, o que revela, por si só, violação a direito da personalidade, ensejando o dever de indenizar. Portanto, à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil) e da proteção do consumidor (art. 6 do CDC), é indiscutível a obrigação do réu de compensar a autora pelos danos morais sofridos. Resta agora ao órgão judicante, em face da configuração da responsabilidade civil, enfrentar a questão da estipulação do valor pecuniário para a reparação dos danos morais. Para tanto, vários critérios são adotados, dentre os quais destaca-se a posição social do ofendido, a capacidade econômica do ofensor e seu maior dever de cautela e a extensão do dano.   Logo, levando-se em consideração os postulados da razoabilidade e proporcionalidade, atento às peculiaridades do caso concreto, às condições das partes e ao grau de culpa, tenho por razoável a fixação da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de compensação pelos danos morais sofridos pela parte requerente.   Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pleito autoral para DECLARAR a inexistência do débito referente ao contrato nº 825812854-9, determinando, em confirmação à decisão que concedeu a tutela de urgência, a cessação definitiva dos descontos das parcelas advindas deste contrato da aposentadoria da parte autora.   CONDENO a ré a restituir, em dobro, todos os valores descontados do benefício previdenciário da autora, corrigidos monetariamente a partir de cada desembolso e acrescido de juros de mora, desde o evento danoso.   CONDENO a ré a pagar à parte autora a indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devendo o valor ser corrigido monetariamente, desde a data de publicação desta sentença, nos termos da Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça, e acrescido de juros moratórios, desde o evento danoso. Em consequência, declaro resolvido o mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC.   Para o cálculo da correção monetária deverá ser aplicado o IPCA; Quanto aos juros de mora, deverá ser aplicada a taxa legal, correspondente à diferença entre a taxa SELIC e o IPCA, calculada mensalmente pelo Banco Central (artigo 389, parágrafo único, e artigo406, §1°, do Código Civil, com as alterações promovidas pela Lei nº.14.905, de 28 de junho de 2024).   Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários de sucumbências, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.    Publique-se. Registre-se na forma determinada pelo Código de Normas da CGJ/RN. Intimações necessárias. No caso de serem interpostos embargos, intime-se a parte contrária para manifestação no prazo de 5 (cinco) dias, caso seu eventual acolhimento implique a modificação da decisão embargada, nos termos do § 2º, do art. 1.023, do CPC, vindo os autos conclusos em seguida.   Em caso de embargos manifestamente protelatórios, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1.026, §2º, do CPC.     Havendo apelação, nos termos do § 1º, do art. 1.010, do CPC, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, adotando-se igual providência em relação ao apelante, no caso de interposição de apelação adesiva (§ 2º, art. 1.010, do CPC), remetendo-se os autos ao TJRN, independente de juízo de admissibilidade (§ 3º, art. 1.010, do CPC).    Havendo pedido de cumprimento de sentença, deverá o autor acostar aos autos memorial com a metodologia utilizada, incluindo o índice de correção monetária adotado; os juros aplicados e as respectivas taxas; o termo inicial e o termo final dos juros e da correção monetária utilizados; a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso; e a especificação dos eventuais descontos obrigatórios realizados.    Registro que a parte deverá utilizar, preferencialmente, a Calculadora Automática disponível no site do TJRN.    Transitada em julgado:    a) Havendo cumprimento espontâneo da sentença, através de depósito judicial instruído com a memória discriminada dos cálculos:     a.1) expeçam-se alvarás em favor da parte vencedora e de seu advogado, autorizando o pagamento das quantias (condenação e honorários advocatícios) a que fazem jus;   a.2) intime-se a parte vencedora para, no prazo de 5 (cinco) dias, querendo, impugnar o valor depositado;  a.3) não havendo oposição, sejam os autos conclusos para declaração de satisfação da obrigação e extinção do processo (art. 526, § 3º do CPC);  a.4) se houver impugnação, após liberada a quantia incontroversa, tornem os autos conclusos para decisão;   b) Inexistindo pagamento espontâneo: b.1) nada sendo requerido, arquivem-se os autos com as devidas cautelas, ressalvando-se a possibilidade de reativação; b.2) Caso haja requerimento de cumprimento de sentença até 01 (um) ano da certidão de trânsito em julgado e, desde que acompanhado de memória discriminativa do débito, intime-se a parte devedora, por seu advogado, para, no prazo de 15 (quinze) dias, pagar voluntariamente o crédito em que se especifica a condenação, conforme a planilha juntada, acrescido de custas, se houver, advertindo-a que: a) transcorrido o lapso sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação; e, b) não ocorrendo pagamento voluntário, o débito será acrescido de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da dívida e, também, de honorários de advogado, no mesmo patamar.   Observe-se que o processo somente deverá ser concluso se houver algum requerimento de alguma das partes que demande decisão do Juízo de 1º grau.   Parnamirim/RN, na data do sistema. Ana Karina de Carvalho Costa Carlos da Silva Juíza de Direito  (documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)
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