Canal Automoveis Ltda - Me e outros x Marcos Aurelio Pinto Sousa e outros

Número do Processo: 0808896-09.2022.8.20.5106

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRN
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de Mossoró
Última atualização encontrada em 27 de maio de 2025.

Intimações e Editais

  1. As atualizações mais recentes estão bloqueadas.
    Assine para desbloquear as últimas atualizações deste processo.
  2. 30/04/2025 - Intimação
    Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de Mossoró | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 3ª Vara Cível da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ - RN - CEP: 59625-410 Contato: ( ) - Email: MS3VCIV@TJRN.JUS.BR Processo n. 0808896-09.2022.8.20.5106 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Demandante: PEDRO VICTOR FERNANDES DIOGENES e outros Advogado(s) do reclamante: FAGNA LEILIANE DA ROCHA, DENYS TAVARES DE FREITAS Demandado: MARCOS AURELIO PINTO SOUSA SENTENÇA Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer c/c Tutela de Urgência e Danos Morais ajuizada por CANAL AUTOMÓVEIS LTDA. e PEDRO VICTOR FERNANDES DIÓGENES em face de MARCOS AURÉLIO PINTO SOUSA. Narram os autores que, em 19 de outubro de 2021, o réu adquiriu da primeira autora um veículo novo tipo FORD RANGER XLT CD 4A32C, DIESEL, ano/modelo 2021/2022, placas RGL0I17, pelo valor de R$ 255.000,00. Para tanto, o réu entregou seu veículo usado, tipo RANGER XLT 3.2, DIESEL, ano/modelo 2016/2017, placas QGL0E59, avaliado em R$ 155.000,00, sendo a diferença de R$ 100.000,00 paga mediante financiamento bancário. Informam que, posteriormente, em 07 de dezembro de 2021, a empresa autora negociou com o segundo autor o veículo usado recebido do réu, pelo valor de R$ 154.000,00. Alegam que, quando procurado para assinar o recibo de transferência do veículo usado, o réu se recusou a fazê-lo, condicionando a assinatura à devolução do engate de reboque existente no referido veículo, sob a alegação de que o acessório não estaria incluído na negociação. Os autores argumentam que a avaliação do veículo usado considerou todos os acessórios instalados, inclusive o engate de reboque. Além disso, sustentam que o réu também não colaborou com a transferência da nova Ford Ranger (placa RGL0I17) para seu nome, continuando esta registrada em nome do Sr. Porcino Fernandes da Costa Neto, bem como não se responsabilizou pelas infrações de trânsito cometidas antes da tradição do veículo usado. Em sede de tutela de urgência, requereram que o réu fosse compelido a: a) assinar o documento de transferência do veículo usado; b) colaborar com a transferência da propriedade do veículo novo; e c) arcar com as infrações de trânsito anteriores à tradição do veículo usado. A tutela antecipada foi deferida em 07/05/2022 (ID 81917457) para determinar que o réu, no prazo de 15 dias, assinasse o documento de transferência da propriedade do veículo usado e colaborasse com a disponibilização da Ford Ranger para fins de vistoria junto ao DETRAN/RN. Em contestação c/c reconvenção (ID 84766254), o réu alega que cumpriu a tutela de urgência antes mesmo de sua citação. Sustenta que o veículo usado possuía acessórios adicionados por ele que não foram explicitamente incluídos na avaliação, e que o engate de reboque possui natureza jurídica de pertença, não seguindo o princípio da gravitação jurídica. Afirma também que a transferência do veículo novo constava como cortesia da loja, mas que teve de arcar com o valor de R$ 374,00 referente ao custo da transferência. Requer a descaracterização do dano moral e, em sede de reconvenção, o ressarcimento do valor pago pela transferência. Em impugnação à contestação e manifestação à reconvenção (ID 84766254), os autores reafirmam que a empresa sempre agiu em conformidade com a boa-fé contratual. Argumentam que a avaliação do veículo usado considerou sua integralidade, incluindo os acessórios, e que a negativa do réu em assinar o recibo de transferência resultou em um atraso de sete meses entre a negociação (19.10.21) e a efetiva assinatura (25.05.22). Rejeitam o pedido reconvencional, alegando que o recibo apresentado pelo réu não indica a que despesas se refere a quantia paga. É o relatório. Decido. O caso em tela demanda a análise de quatro questões principais: i) a análise das obrigações de fazer relativas à transferência dos veículos, ainda que já cumpridas; ii) a obrigação de devolução do engate de reboque do veículo usado; iii) a existência de dano moral; e iv) o ressarcimento do valor da transferência solicitado em reconvenção. 1. DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER RELATIVAS À TRANSFERÊNCIA DOS VEÍCULOS No concernente à obrigação de assinar o documento de transferência do veículo usado (FORD RANGER XLT 3.2, ano/modelo 2016/2017, placas QGL0E59), consiste em consequência natural do negócio jurídico entabulado entre as partes. Com a dação de veículo usado para a primeira autora, como parte de pagamento do veículo novo, o réu assumiu a obrigação de colaborar com todos os atos necessários à formalização da transferência de propriedade, nos termos do art. 422 do Código Civil, que impõe aos contratantes o dever de agirem conforme os princípios de probidade e boa-fé. Da mesma forma, a obrigação do réu de colaborar com a transferência do veículo novo (FORD RANGER, placa RGL0I17) ao seu nome encontra fundamento no mesmo princípio da boa-fé objetiva e nos deveres anexos de cooperação, além de ser uma imposição legal para regularização do veículo perante os órgãos de trânsito, na forma do Código de Trânsito Brasileiro em seu art. 123, §1º. Quanto à responsabilidade pelas infrações de trânsito anteriores à tradição do veículo usado, decorre da aplicação do princípio tempus regit actum, sendo certo que o réu deve responder pelas infrações cometidas ao tempos em que detinha a posse e propriedade, conforme orientação do art. 257 do Código de Trânsito Brasileiro. No caso, houve o cumprimento da tutela de urgência conforme documentado nos autos, tendo o réu assinado o documento de transferência do veículo usado e colaborado com a transferência do veículo novo. Além disto, foram quitadas as multas informadas na exordial. Portanto, ainda que já cumpridas, as obrigações pleiteadas pelos autores encontram respaldo legal, sendo de rigor o reconhecimento da procedência dessas pretensões para todos os fins jurídicos. 2. DA NATUREZA JURÍDICA DOS ACESSÓRIOS DO VEÍCULO E DEVER DE DEVOLUÇÃO A controvérsia reside na classificação jurídica do engate de reboque e seu regime de transmissão na alienação do veículo. O Código Civil estabelece, em seu art. 92, que: Art. 92. Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal. Referido dispositivo consagra o princípio de que o acessório segue o principal. Por outro lado, o art. 93 define pertenças como: Art. 93. São pertenças os bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro. Diferente do acessório, as pertenças não acompanham o bem principal, por expressa exclusão do art. 94 do Código Civl, salvo se o negócio jurídico dispuser de forma expressa em contrário. No particular, não houve, por ocasião da negociação, qualquer ressalva quanto à exclusão desse item da avaliação ou previsão expressa de sua devolução ao réu. Ainda que se considerasse o engate de reboque como pertença (o que é discutível, pois sua destinação é permanentemente ligada ao uso do veículo), deveria haver manifestação expressa das partes quanto à sua não inclusão na alienação, o que não ocorreu. Neste sentido: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – DETERMINAÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE BENS ADICIONADOS AO VEÍCULO OBJETO DO CONTRATO – APARELHO DE SOM – DESCABIMENTO – BEM ACESSÓRIO QUE SEGUE O PRINCIPAL APELAÇÃO PROVIDA (TJSP; Apelação Cível 1001421-93.2017.8.26.0169; Relator (a): Andrade Neto; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro de Duartina - Vara Única; Data do Julgamento: 26/06/2019; Data de Registro: 02/07/2019) Portanto, com base nos princípios da boa-fé objetiva e da gravitação jurídica, bem como nas disposições dos arts. 92 a 94 e 233 do Código Civil, concluo pela inexistência do dever de devolução do engate de reboque ao réu, partindo-se da premissa de ter sido considerado na avaliação do veículo usado, sem ressalva contratual em sentido contrário. 3. DO DANO MORAL Os autores pleiteiam indenização por danos morais em razão do atraso e resistência do réu em colaborar nas transferências dos veículos junto ao Detran. O dano moral se caracteriza mediante lesão a direitos da personalidade, causando sofrimento, vexame ou humilhação que fogem à normalidade e interferem intensamente no comportamento psicológico do indivíduo. Sua configuração exige a comprovação de que o fato ultrapassou o mero aborrecimento cotidiano. No caso em tela, é incontroverso que houve demora de aproximadamente 7 meses entre a negociação (19.10.2021) e a efetiva assinatura do recibo pelo réu (25.05.2022), o que certamente causou transtornos aos autores, especialmente ao segundo autor, que permaneceu impedido de registrar o veículo em seu nome durante esse período. A conduta do réu, condicionando a assinatura do recibo à devolução do engate de reboque, mostra-se contrária ao princípio da boa-fé objetiva, previsto no art. 422 do Código Civil, que impõe às partes o dever de colaboração e lealdade na execução do contrato. A despeito disto, a conduta do réu não atingiu a intensidade necessária para configurar efetivo dano moral. Trata-se de descumprimento contratual que, por si só, não gera automaticamente dever de indenizar por danos extrapatrimoniais, conforme entendimento jurisprudencial consolidado. É necessário distinguir o mero dissabor das relações comerciais do efetivo dano moral. E, na hipótese, inexiste prova de que o atraso na transferência tenha resultado em inscrição em cadastro de inadimplentes, aplicação de multas, apreensão do veículo ou outras consequências graves capazes de atingir a honra, imagem ou dignidade dos autores. 4. DO PEDIDO RECONVENCIONAL - RESSARCIMENTO DOS CUSTOS DE TRANSFERÊNCIA Em sede de reconvenção, o réu pleiteia o ressarcimento da quantia de R$ 374,00, valor pago para a transferência do veículo novo, quando tal obrigação seria da loja autora. Da proposta de compra (ID 81271548) consta expressamente, como "informação adicional", que a "TRANSFERÊNCIA CORTESIA POR CONTA DA LOJA", despontando-se, pois, como obrigação contratual assumida pela empresa autora. O réu apresentou recibo (ID 84766261) demonstrando o pagamento da quantia de R$ 374,00 a um despachante. Embora o recibo não especifique detalhadamente a natureza da despesa, o valor guarda compatibilidade com os custos habituais para transferência de veículos. Posto isso, julgo parcialmente procedente a pretensão autoral para: a) Declarar a inexistência do dever de devolução do engate de reboque do veículo tipo FORD RANGER XLT 3.2, ano/modelo 2016/2017, placas QGL0E59, RENAVAM 1105483778; b) Declarar a responsabilidade do réu quanto às infrações de trânsito e eventuais multas cujo fato gerador seja anterior à entrega do automóvel usado à loja autora (19.10.2021), obrigação devidamente cumprida; c) Confirmar a tutela antecipada anteriormente concedida, tornando definitiva a obrigação do réu de colaborar com a transferência dos veículos, obrigação já cumprida; Em face da sucumbência recíproca na ação principal, condeno ambas as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC) desde a data do ajuizamento da ação (Súmula 14 do STJ), na proporção de 60% para os autores; e 40%, para o réu, nos termos do art. 86 do CPC. Quanto à reconvenção apresentada pelo réu, julgo-a PROCEDENTE para condenar a autora CANAL AUTOMÓVEIS LTDA a ressarcir ao réu/reconvinte o valor de R$ 374,00, com correção monetária pelo IPCA a partir do desembolso (art. 389, parágrafo único, do CC, e Súmula 43 do STJ), sendo substituída pela taxa SELIC (que já contempla juros e correção monetária) juros a contar da citação, por se tratar de relação contratual e não ser o caso de mora "ex re", forte no art. 240 do CPC e no art. 405 do CC. Em relação à reconvenção, tendo em vista sua procedência integral, condeno exclusivamente a primeira autora/reconvinda (CANAL AUTOMÓVEIS LTDA.) ao pagamento das custas processuais relativas à reconvenção e honorários advocatícios em favor do patrono do réu/reconvinte, estes fixados em 10% sobre o valor da causa reconvencional, atualizado pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC) desde a data do ajuizamento da ação (Súmula 14 do STJ), conforme art. 85, §2º do CPC. P.R.I. Mossoró/RN, data registrada no sistema. FLÁVIO CÉSAR BARBALHO DE MELLO Juiz de Direito
Entre na sua conta ou crie uma para continuar usando o site
Faça login para continuar navegando gratuitamente.
Google Entrar com Google

ou