Processo nº 08147234520238100029
Número do Processo:
0814723-45.2023.8.10.0029
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMA
Classe:
APELAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Primeira Câmara de Direito Privado
Última atualização encontrada em
25 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
25/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Primeira Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL N°0814723-45.2023.8.10.0029 APELANTE: BANCO AGIBANK S.A. Advogados do(a) APELANTE: WILSON BELCHIOR - MA11099-S APELADO(A): ANTONIO ELIES VIEIRA DO NASCIMENTO BANCO AGIBANK S.A. Advogado do(a) APELADO: CHIRLEY FERREIRA DA SILVA - PI10862-A, LENARA ASSUNCAO RIBEIRO DA COSTA - PI12646-A RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DO SOCORRO MENDONÇA CARNEIRO Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO POR MEIO ELETRÔNICO. ASSINATURA DIGITAL POR BIOMETRIA FACIAL. ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE ILICITUDE. LEGALIDADE DOS DESCONTOS. APLICAÇÃO DE TESE FIRMADA EM IRDR. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta pela parte ré contra sentença que julgou procedente em parte a ação declaratória de inexistência de débito cumulada com repetição de indébito e indenização por danos morais. A sentença não reconheceu a validade do contrato de empréstimo consignado, firmado de forma digital com uso de biometria facial. 2. A parte apelada sustenta a invalidade do contrato, ao argumento de que o documento acostado aos autos seria facilmente adulterável. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em verificar: (i) se houve vício na contratação de empréstimo consignado eletrônico, que justifique a declaração de inexistência de débito e a repetição dos valores descontados; e (ii) se há responsabilidade civil da instituição financeira por eventual fraude ou defeito na formalização contratual. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. A instituição financeira apresentou cópia do contrato firmado digitalmente com biometria facial, demonstrando a formalização válida do negócio jurídico. 5. Conforme tese firmada no IRDR nº 53.983/2016, incumbe ao banco demonstrar a autenticidade do contrato quando impugnada sua assinatura, e ao consumidor colaborar com a Justiça mediante a apresentação do extrato bancário, quando alega não ter recebido os valores. 6. A parte apelada, embora alegue fraude, não juntou extrato bancário para comprovar a inexistência do depósito, descumprindo seu dever de cooperação previsto no art. 6º e 378 do CPC. 7. Não restando configurado defeito na contratação ou vício de consentimento, e tendo sido comprovado o repasse dos valores e a formalização do contrato conforme permissivo legal, não há ilicitude a ser reparada. 8. O contrato eletrônico firmado com reconhecimento facial possui validade jurídica, nos termos do art. 107 do CC e das disposições normativas do INSS sobre contratação digital. 9. Ausente falha na prestação do serviço, não se configura responsabilidade civil da instituição financeira, nos termos do art. 14, §3º, I, do CDC. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso provido para reformar integralmente a sentença recorrida. Tese de julgamento: "1. É válida a contratação de empréstimo consignado realizada por meio eletrônico com assinatura digital por biometria facial, desde que demonstrada a autenticidade do contrato e o efetivo repasse dos valores." "2. Cabe ao consumidor cooperar com a instrução processual, mediante apresentação de extratos bancários, quando alega não ter recebido o valor contratado." "3. Não se caracteriza responsabilidade civil da instituição financeira quando comprovada a regularidade da contratação e ausência de vício no negócio jurídico." Legislação relevante citada: CF/1988, art. 5º, XXXII; CC, arts. 107, 138, 145, 151, 156, 157, 158, 170 e 422; CPC, arts. 6º, 378, 373, II, 429, II, 932, IV, “c” e 1.021, § 4º; CDC, arts. 4º, IV, 6º, III e 14, § 3º, I. Jurisprudência relevante citada: TJMA, IRDR nº 53.983/2016, 1ª e 4ª teses; TJMA, ApCiv 0807415-26.2021.8.10.0029, Rel. Des. Raimundo José Barros de Sousa, DJe 28/04/2022. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença do Juízo do 1º grau, que julgou procedente em parte a ação, ao fundamento da inexistência do negócio jurídico. Em suas razões, a parte recorrente pretende a reforma da sentença ao argumento de que o contrato trazido aos autos é válido, na medida em que consta a assinatura digital da parte autora, bem como sua biometria facial. Em contrarrazões, a parte Recorrida defende a irregularidade da contratação e pugna pela manutenção da sentença. A Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e provimento do apelo. É o relatório. Decido. Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do presente recurso e passo a efetuar o seu julgamento de forma monocrática, com base no art. 932 do CPC, em razão da matéria encontrar-se disposta em tese firmada em IRDR. A questão controvertida diz respeito à suposta fraude na contratação de empréstimo consignado. Conforme relatado, o Juízo de primeiro grau julgou procedente a demanda, reconhecendo a invalidade do negócio jurídico firmado entre as partes, nos termos do IRDR nº 53.983/2016. Com efeito, cabe à instituição financeira o ônus de provar que houve a contratação do empréstimo consignado, devendo a apelante colaborar com a Justiça e juntar o seu extrato bancário, quando alegar que não recebeu o valor do empréstimo. Essa foi a tese firmada por esta Egrégia Corte no julgamento do referido IRDR nº 53.983/2016. Confira-se: 1ª TESE: "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a sua autenticidade (CPC, arts. 6º, 368 e 429, II)." (Publicação em 09.12.2021) 4ª TESE (POR MAIORIA, APRESENTADA PELO SENHOR DESEMBARGADOR PAULO SÉRGIO VELTEN PEREIRA COM O ADENDO DO SENHOR DESEMBARGADOR JOSEMAR LOPES DOS SANTOS): "Não estando vedada pelo ordenamento jurídico, é lícita a contratação de quaisquer modalidades de mútuo financeiro, de modo que, havendo vício na contratação, sua anulação deve ser discutida à luz das hipóteses legais que versam sobre os defeitos do negócio jurídico (CC, arts. 138, 145, 151, 156, 157 e 158) e dos deveres legais de probidade, boa-fé (CC, art. 422) e de informação adequada e clara sobre os diferentes produtos, especificando corretamente as características do contrato (art. 4º, IV e art. 6º, III, do CDC), observando-se, todavia, a possibilidade de convalidação do negócio anulável, segundo os princípios da conservação dos negócios jurídicos (CC, art. 170)". Nessa linha, o artigo 985, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015 estabelece que, in verbis: Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada: I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região; No caso verifica-se que a Instituição Financeira apelada se desincumbiu do ônus de comprovar que a parte autora, de fato, firmou o contrato de empréstimo em questão, na medida em que trouxe aos autos cópia do pacto devidamente formalizado, através de assinatura digital (biometria facial) (ID's: 44191950/44191949), de modo que os descontos efetuados em seu benefício previdenciário se revestem de legalidade. Destarte, negando a parte recorrente a contratação, deixou de cumprir com o seu dever de cooperação (CPC, art. 6º e 378), pois não apresentou extratos da sua conta bancária, a fim de demonstrar que o valor contestado não fora depositado em sua conta. Deste modo, as provas carreadas aos autos não amparam a pretensão da parte autora, eis que comprovada a regularidade da contratação. Ausente, portanto, o defeito na prestação do serviço por parte do réu, o que constitui causa excludente da responsabilidade civil, nos termos do art. 14, §3º, I, do CDC. Outrossim, é oportuno registrar que o artigo 107 do Código Civil dispõe sobre a liberdade de formas para contratar, não existindo óbice à contratação de empréstimo por via eletrônica validada por meio de biometria facial, sendo que a assinatura eletrônica é expressamente mencionada na Normativa 28/2008 do INSS. Vale ressaltar que a operação contratada advém do desenvolvimento do sistema financeiro e se revela como ferramenta de otimização das operações eletrônicas de crédito, por meio de aplicativo de celular. As operações bancárias consumadas por meio eletrônico não geram contrato físico de adesão aos termos gerais de empréstimo pela instituição financeira, formam apenas as informações da contratação com assinatura através de reconhecimento facial e foto dos documentos pessoais. Acerca da validade deste de tipo de contato tem se posicionado este Egrégio Tribunal de Justiça, vejamos: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO ELETRÔNICO. ASSINATURA DIGITAL. ANALFABETO. LEGALIDADE DOS DESCONTOS. IRDR Nº 53983/2016. APLICAÇÃO. ART. 373, II, DO CPC. PROVA. RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DO DEVER DE REPARAR PELOS DANOS MORAIS. RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. INDEVIDA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. I. O tema central do recurso consiste em examinar se, de fato, o empréstimo questionado pelo autor da demanda, ora apelado, é fraudulento, o que ensejaria a repetição do indébito e, ainda, reparação a título de danos morais. II. Primeiramente, registre-se que, no caso em exame, incidem as regras do Código de Defesa do Consumidor, consoante preceitua a Súmula 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. III. Da análise detida dos autos, verifico que o Banco apelante se desincumbiu de provar a existência de negócio jurídico entabulado entre as partes, visto que comprovou através dos documentos de id. 14208091 (cópia de cédula de crédito bancário devidamente assinado e documentos pessoais), que houve regular contratação do empréstimo consignado, considerando o contrato eletrônico, ocorrendo a assinatura do consumidor na forma digital, através da biometria facial e com o envio de foto dos documentos pessoais. Verifica-se, ainda, que o valor de R$ 1.939,99 (um mil novecentos e trinta e nove reais e noventa e nove centavos) foi efetivamente disponibilizado ao consumidor através de TED anexo (id 14208092), com o número de autenticação, atendendo assim o disposto no art. 373, II do Código de Processo Civil IV. Com efeito, não restando demonstrada a prática de ato ilícito por parte da instituição bancária apelada, tem-se que o negócio jurídico firmado é válido, sendo o numerário depositado na conta do apelado, os descontos das prestações mensais no seu benefício previdenciário se revestem de legalidade, representando o exercício legítimo do direito da instituição bancária de cobrar a contraprestação devida pelo contrato de empréstimo firmado. V. Outrossim, saliente-se que a pessoa analfabeta é plenamente capaz para os atos da vida civil e pode exarar sua manifestação de vontade por quaisquer meios admitidos em direito, não sendo necessária a utilização de procuração pública ou de escritura pública para a contratação de empréstimo consignado, de sorte que eventual vício existente na contratação do empréstimo deve ser discutido à luz das hipóteses legais que autorizam a anulação por defeito do negócio jurídico, o que não se verifica no presente caso. VI. Apelação cível conhecida e provida para julgar improcedentes os pedidos iniciais. (ApCiv 0807415-26.2021.8.10.0029, Rel. Desembargador(a) RAIMUNDO JOSE BARROS DE SOUSA, PRESIDÊNCIA, DJe 28/04/2022) Conclui-se, portanto, que não restou caracterizada a ilegalidade da contratação, de modo que merece reparo a decisão impugnada. Diante do exposto, conheço e dou provimento ao recurso de apelação (art. 932, IV, “c”, do CPC/15), para reformar integralmente a sentença recorrida e julgar improcedente a pretensão autoral. Advirto as partes que a interposição de agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente poderá ensejar a aplicação da multa prevista no §4º do art. 1.021 do CPC. Publique-se. Intimem-se. São Luís, data do sistema. Desembargadora Maria do Socorro Mendonça Carneiro Relatora