M. -. 1. P. M. x F. D. A. D. S.
Número do Processo:
0815913-67.2020.8.20.5106
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró
Última atualização encontrada em
02 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró | Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVAPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró Processo n. 0815913-67.2020.8.20.5106 SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte em face de J. G. D. M., qualificado à exordial, pela suposta prática de ato de improbidade administrativa descrito na inicial. Alega, o demandante, que o servidor não protegeu o patrimônio do setor que chefiava no Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte, contribuindo efetivamente, por ação ou omissão, para que mais de 100 (cem) armas fossem subtraídas do órgão no período de 2010 a 2017. Sustenta, portanto, suposta responsabilidade pelo desaparecimento de armas e munições do interior da COCRIM/ITEP/Mossoró. Aduz, ainda, que o servidor, durante os anos de 2013 a 2017, adquiriu quantidade atípica de bens e movimentou financeiramente exorbitantes quantias em suas contas bancárias, auferindo bens (móveis e de capital) cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte. Nesse sentido, enquadrou tal conduta como aquelas previstas nos arts. 9º, inciso VII; e 11, caput, da Lei nº 8.429/92, pugnando pela condenação do demandado nas sanções previstas no art. 12, incisos I, II e III, do referido diploma legal. Anexou documentos. Regularmente notificado, o demandado apresentou manifestação prévia (Id. nº 63177482). Decisão, em Id. nº 65418631, recebendo a inicial e determinando a citação do réu para apresentar contestação. Manifestação do Ministério Público pugnando pelo compartilhamento das informações constantes no presente processo com a Divisão Especializada em Investigação e Combate ao Crime Organizado (DEICOR) (Id. nº 67636626). Devidamente citado, o demandado apresentou contestação em Id. nº 70646259, alegando, em síntese, ausência de ato ímprobo e de evolução patrimonial para além da normalidade. Petição do parquet pugnando pela suspensão da contagem do prazo prescricional até a apreciação definitiva do Tema 1.199 (Id. nº 82115574). Manifestação da parte ré pugnando pelo indeferimento do pleito (Id. nº 93174450). Decisão determinando o regular fluxo do feito, bem como deferindo o compartilhamento das informações constantes no presente processo com a DEICOR (Id. nº 95607518). Manifestação do parquet pugnando pela juntada dos Inquéritos Policiais de nº 0102068-71.2020.8.20.0106 e 0107042-25.2018.8.20.0106 (Id. nº 97809126), bem como de Boletim de Ocorrência registrado por servidora do ITEP/Mossoró noticiando sobre o desaparecimento de uma arma de fogo do órgão (Id. nº 98491139). Certidão juntando mídias referentes às audiências do Procedimento Investigatório Criminal nº 33.23.2357.0000018/2016-36 (Id. nº 99863726 e Id. nº 99872267). Impugnação à contestação em Id. nº 107183991. Intimadas para se manifestarem acerca da necessidade de novas provas (Id. nº 114830992), as partes pugnaram pela realização de audiência de instrução e julgamento (Id. nº 115617196 e Id. nº 116845230). Despacho designando audiência de instrução e julgamento (Id. nº 124188463 e Id. nº 128251807). Despacho intimando a parte demandada para informar as testemunhas que comparecerão a audiência de instrução, haja vista a necessidade de adequação do número de testemunhas arroladas (Id. nº 128961985). Ata da audiência de instrução hospedada em Id. nº 130990802, designando audiência em continuação. Ata de audiência em continuação hospedada em Id. nº 133685396. Alegações finais em Id. nº 138570592 e Id. nº 142598524. Manifestação do Estado do Rio Grande do Norte informando interesse em ingressar no feito, nos termos do art. 17, § 14, da Lei nº 8.429/92 (Id. nº 152893145). É o relatório. Fundamento e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Mérito Inicialmente, com o intuito de evitar futuros embargos declaratórios, esclareço que o julgador não se encontra obrigado a rebater, um a um, os argumentos alegados pelas partes, uma vez que atende os requisitos do §1º, IV, do artigo 489 do Código de Processo Civil se adotar fundamentação suficiente para decidir integralmente a controvérsia, utilizando-se das provas, legislação, doutrina e jurisprudência que entender pertinentes à espécie. A decisão judicial não constitui um questionário de perguntas e respostas de todas as alegações das partes, nem se equipara a um laudo pericial. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada (STJ. 1ª Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi - Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região, julgado em 8/6/2016 - Info 585). Compulsando os autos, verifico tratar-se de ação de improbidade administrativa na qual o Ministério Público do Rio Grande do Norte atribui ao demandado a prática de ato de improbidade administrativa, consistente na responsabilidade pelo desaparecimento de armas e munições do interior da COCRIM/ITEP/Mossoró no período de 2010 a 2017. Ainda, sustenta que o servidor, durante os anos de 2013 a 2017, adquiriu quantidade atípica de bens e movimentou financeiramente exorbitantes quantias em suas contas bancárias, auferindo bens (móveis e de capital) cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte. Inicialmente, o parquet pugnou pela condenação do demandado pela prática dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, inciso VII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/92. Ocorre que no momento de ajuizamento da ação vigorava a Lei de Improbidade em sua redação original. Contudo, a Lei Federal n° 14.230/2021 alterou os dispositivos da Lei de Improbidade, passando a vigorar em 26 de outubro de 2021. Dentre suas alterações, tem-se a taxatividade do art. 11, uma vez que apenas as condutas descritas especificamente nos incisos é que são atos de improbidade administrativa. Diante disso, a apreciação da presente Ação Civil Pública deve se restringir tão somente ao art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92. Nesse sentido, a Lei n° 8.429/92, na redação dada pela Lei nº 14.230/21, dispõe: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...) VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; Feitas tais considerações, passo à análise do conjunto fático-probatório carreado aos autos. Analisando a documentação acostada, observo que houve representação anônima noticiando supostas irregularidades praticadas pelo Perito Criminal do ITEP, demandado na presente ação. Dentre outras denúncias, consta no documento a afirmação de que o servidor, juntamente da pessoa de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior, também conhecido por “Bob” ou “Júnior”, já falecido e amigo de Joaquim, vem subtraindo armas e munições do órgão onde trabalha para vender no mercado clandestino (Id. nº 61412450, pág. 06). No que diz respeito ao desaparecimento de armas e munições do ITEP/Mossoró, noto Relatório Final (Id. nº 61413134, pág. 84) produzido pelo órgão em 05 de dezembro de 2018, em que conta a informação de que entraram no instituto de criminalística cerca de 5.451 (cinco mil, quatrocentos e cinquenta e uma) armas de fogo para exames de potencialidade lesiva e comparação balística. Desse número, foram apontadas como desaparecidas e/ou furtadas 149 (cento e quarenta e nove) armas. Ainda no ano de 2011 foi realizada perícia técnica decorrente do arrombamento às dependências do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte/Mossoró, consoante se extrai do Laudo de Vistoria em Imóvel Público acostado em Id. nº 61414821 (pág. 33). Evidentemente, o laudo atesta que o imóvel foi alvo de danos por arrombamento com uso de ferramentas e escalada, causando danificações parciais à grade metálica e à janela da secretaria, bem como à porta do laboratório de balística. Tal fato ensejou a instauração do Inquérito Policial nº 183/2011 (Id. nº 61414800, pág. 19), voltado à apuração das circunstâncias do arrombamento ocorrido naquele ano. Contudo, conforme se depreende do conjunto probatório, os desaparecimentos de armas no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró não se limitaram a esse episódio isolado. Com efeito, foram instaurados outros procedimentos investigatórios com o mesmo objeto, uma vez que as armas e munições continuaram a ser furtadas ao longo dos anos, tais como o Inquérito Policial nº 319/2016 (Id. nº 97812342, pág. 3) e o Inquérito Policial nº 239/2018 (Id. nº 61414800, pág. 09). Além disso, há boletins de ocorrência registrados noticiando o desaparecimento de armas que estavam sob a guarda do instituto de criminalística (Id. nº 61413160, págs. 31 e 32; Id. nº 61413160 - Pág. 32; Id. nº 61416523 - Pág. 23; e Id. nº 98491149). É fato incontroverso, portanto, que os desaparecimentos de armas e munições ocorreram de forma reiterada ao longo dos anos, especialmente no período investigado nos autos, compreendendo os anos de 2010 a 2017. Nesse sentido, a linha argumentativa adotada pelo Ministério Público fundamenta-se no fato de que o demandado J. G. D. M. exercia, à época dos fatos, encontrava-se na chefia da COCRIM, sendo, portanto, o responsável direto pela guarda e controle das armas do setor, sendo, inclusive, o detentor da chave do local onde as armas eram armazenadas. Ainda, sustenta que a pessoa de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior (Bob) mantinha estreita relação com o requerido, o que lhe conferia acesso irrestrito às dependências da COCRIM. Conforme relatos testemunhais, Bob frequentava com habitualidade as instalações do ITEP/Mossoró com a anuência do demandado, inclusive a sala das armas. Paralelamente, afirma que o demandado se enriqueceu ilicitamente, uma vez que auferiu, à época dos fatos, bens cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte, bem como apresentou movimentação financeira atípica e incompatível com a condição de servidor público. Compulsando os autos, observo que o parquet ajuizou Medida Cautelar de Afastamento dos Sigilos Bancário e Fiscal referente ao período de 2013 a 2017 em face de J. G. D. M., Juscivaldo Teixeira Luz Júnior e Joana Dark da Silva Teixeira (mãe de Juscivaldo Teixeira, a qual tinha a conta movimentada por este) (Id. nº 61413131, pág. 4), a qual foi integralmente deferida pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró. Consta nos autos Relatório de Análise LAB-LD, elaborado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), em que houve uma análise das informações bancárias e fiscais dos investigados (Id. nº 61418615). A documentação aponta que, no período investigado, o demandado adquiriu 05 (cinco) lotes e 10 (dez) automóveis, entre veículos e motocicletas. Ainda, evidencia transações entre Joaquim Guimarães e os outros dois investigados, bem como transações envolvendo intermediários, ou seja, entre ele e contas que se relacionam com pelo menos 02 dos investigados. Pois bem. Em juízo (Id. nº 130990802 e Id. nº 133685396) foram colhidos os depoimentos de 13 (treze) testemunhas, bem como de 02 (dois) declarantes. Ao longo dos depoimentos foi possível perceber que, apesar das desconfianças quanto à responsabilidade de Joaquim Guimarães pelos desaparecimentos, nenhuma das pessoas ouvidas foi capaz de afirmar, com segurança, sua participação nos fatos, tampouco a de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior, conhecido como “Bob”. Nesse sentido, tem-se o depoimento do Sr. Sidarque Batista Sales, que afirmou ter trabalhado por 07 (sete) anos com o perito e que nunca chegou a vê-lo furtar qualquer arma do órgão (Id. nº 130990811, 00:05:05-00:05:13). Acrescentou que as suspeitas consistiam em comentários de corredor sem provas concretas, surgidas entre os próprios servidores, diante da inquietação geral para saber quem estaria cometendo os delitos. Segundo o depoente, tais boatos podem ter se originado dos conflitos pessoais que o demandado mantinha com colegas, o que, naturalmente, o tornava alvo preferencial de suspeitas (Id. nº 130990811, 00:12:00-00:13:27). Ainda, tem-se o depoimento do Diretor Geral do ITEP, o Sr. Marcos José Bandão Guimarães, que reconheceu a fragilidade do sistema de guarda das armas à época dos fatos (Id. nº 130990813, 00:07:57-00:08:30). Relatou, ainda, que somente tomou conhecimento sobre “Bob” em 2018, quando surgiu a suspeita de sua participação no incêndio do carro de um servidor. Foi nesse período que José Brandão promoveu a remoção de Joaquim Guimarães, que estava sendo apontado como mandante, para a regional de Natal/RN, no intuito de evitar maiores conflitos (Id. nº 130990813, 00:09:17-00:11:14). No que diz respeito ao sistema débil de armazenamento de armas, ressaltou que visitou o ITEP/Mossoró diversas vezes e evidenciou falhas significativas de segurança. Algumas das armas eram guardadas em uma gaveta de uma mesa, cuja tampa era removível (Id. nº 130990813, 00:13:55-00:14:44). Paralelamente, apontou que a porta da sala não tinha controle adequado, uma vez que a chave de outro setor abria a sala da COCRIM. Por isso, a direção providenciou melhorias, como a substituição da porta, reparo nos móveis e instalação de câmeras de vigilância (Id. nº 130990815, 00:00:48-00:04:44). Tais falhas de segurança foram atestadas por diversas das testemunhas ouvidas em juízo, tais como o Sr. Jader Viana de Souza Júnior (Id. nº 130990813), Sr. Sidarque Batista Sales (Id. nº 130990811), Sr. José Maria Lisboa Sobrinho (Id. nº 133688645) e a Sra. Clautia Sheila Nunes de Carvalho Lopes (Id. nº 133688646). Paralelamente, a Sra. Solange Maria Rodrigues de Almeida Regis (Id. nº 130990815, 00:09:20-00:09:42) afirmou que cerca de 04 (quatro) pessoas tinham acesso à sala, uma vez que eram as pessoas responsáveis pela inclusão dos relatórios das perícias no sistema. Este fato foi corroborado, também, pela testemunha Sr. José Maria Lisboa Sobrinho, que afirmou que, diante da limitação de espaço físico, as armas ficavam acumuladas, o que permitia o acesso de servidores que sequer atuavam diretamente na guarda desses materiais (Id. nº 133688645, 00:04:12-00:04:24) e pela testemunha Sra. Clautia Sheila Nunes de Carvalho Lopes (Id. nº 133688646), que afirmou que alguns servidores, que trabalhavam no local, tiveram acesso à sala. A partir do depoimento dado pelas testemunhas, observo não ser possível afirmar que J. G. D. M. foi o responsável pelo desaparecimento de armas e munições no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró, diante do fato de que o órgão apresentava sérios problemas de segurança, facilitando o acesso às armas por diversas pessoas e comprometendo a guarda dos armamentos no âmbito do órgão. Ainda, entendo que a alegação de que os furtos cessaram após a remoção de Joaquim Guimarães carece de robustez, tendo em vista que tal fato coincide com a adoção de diversas medidas pela Direção do ITEP, conforme atestado pelo Diretor Geral do órgão (Id. nº 130990815, 00:00:48-00:04:44). É fato que ficou consubstanciado ser Joaquim Guimarães um servidor de personalidade conflituosa e temperamento difícil. Tal afirmação se dá em virtude dos diversos problemas que o demandado teve com colegas de trabalho, podendo citar os conflitos com o servidor público Edward Bezerra de Moura. Notoriamente, o Sr. Edward Bezerra teve seu carro incendiado no estacionamento em frente ao ITEP. Pelas imagens das câmeras de uma residência próxima ao órgão, os indícios apontavam que a pessoa responsável seria “Bob”, pessoa próxima de Joaquim. A partir disso, o servidor passou a desconfiar que Joaquim Guimarães era o suposto mandante de tal fato. Tem-se, também, o fato de que Joaquim Guimarães acusou Edward Bezerra de falsificar diárias de viagens, sendo, inclusive, condenado a pagar indenização por danos morais em favor do declarante (Id. nº 61412450, pág. 44), tais informações foram corroboradas em sede de audiência (Id. nº 130990809, 00:07:50), momento em que Edward Bezerra afirmou que, quando o Sr. Joaquim Guimarães saiu de Mossoró/RN, já não havia qualquer contato entre os dois. Ainda, o servidor foi denunciado anonimamente por constrangimento ilegal em 08 de setembro de 2014 (Id. nº 61414827, pág. 05), sob a acusação de cometer violência psicológica e proferir ameaças, diretas e indiretas, contra os demais servidores, que estavam adoecendo em virtude de tal comportamento. Diante disso, entendo que a imagem negativa construída em torno do demandado no ambiente de trabalho, em virtude de sua personalidade notoriamente difícil e dos diversos conflitos em que estava envolvido, contribuiu para que seu nome fosse prontamente associado aos desaparecimentos registrados no âmbito da COCRIM/Mossoró, especialmente por ser uma das pessoas com acesso à chave da sala secreta. Todavia, não se pode admitir que desconfianças informais, baseadas unicamente em impressões subjetivas e no comportamento social do servidor, sirvam como elemento probatório suficiente para imputar-lhe a prática de ato de improbidade administrativa. Como já destacado, os depoimentos colhidos em sede de audiência revelam apenas especulações e “conversas de corredor”, carentes de qualquer suporte fático que possam comprovar, de forma minimamente segura, a existência de dolo específico ou de vínculo entre a conduta do demandado e o desaparecimento dos armamentos. Ademais, quanto ao suposto enriquecimento ilícito, entendo que não restou devidamente comprovado. Vejamos. O parquet sustenta que o autor, no período investigado, adquiriu 05 (cinco) lotes e 10 (dez) automóveis, entre veículos e motocicletas (Id. nº 61418615), bem como apresentou movimentação financeira atípica e incompatível com a condição de servidor público. No entanto, constam nos autos as seguintes documentações: Distrato de Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda do Loteamento Royal Ville Mossoró (Id. nº 70646268), referente aos Lotes 01 e 02 da Quadra 7 do loteamento denominado “Royal Ville Mossoró”; Distrato de Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda do Loteamento “Royal Ville Mossoró” (Id. nº 70646270), referente ao Lote 03 da Quadra 03 do loteamento denominado “Royal Ville Mossoró”; Termo de Desistência com Pagamento (Id. nº 70646274), referente ao Lote 18 da Quadra 15 do loteamento denominado “Porto do Atlântico”; e Contrato particular de compra e venda com garantia de alienação fiduciária (Id. nº 70646275), referente ao Lote 14 da Quadra 7 do loteamento denominado “Porto do Atlântico”. Tais documentos demonstram que os imóveis não foram efetivamente incorporados ao patrimônio do demandado, uma vez que houve o distrato/desistência, ou, no caso do último imóvel, a transferência para terceiro. No que diz respeito aos automóveis, observo que a maior parte dos bens foi adquirida por meio de consórcio, conforme comprovam os documentos acostados em Id. nº 70646263, Id. nº 70646264 e Id. nº 70646267. Entendo que tal modalidade de aquisição, em virtude de sua natureza parcelada e financeiramente mais acessível, é plenamente compatível com a renda de um servidor público, não se podendo inferir, apenas por esse fato, a existência de patrimônio desproporcional. Paralelamente, consta nos autos que alguns dos veículos foram objeto de venda posterior, enquanto outros foram objeto de furto (Id. nº 70647433), portanto não se pode afirmar que todos esses bens foram incorporados ao patrimônio do demandado, tampouco que compõem, de forma atual ou acumulada, um conjunto patrimonial incompatível com seus rendimentos. No que diz respeito às movimentações bancárias, entendo que os documentos bancários acostados aos autos não demonstram, por si só, a existência de enriquecimento ilícito ou movimentação incompatível com a remuneração percebida pelo demandado enquanto servidor público. Ausente demonstração concreta de que tais valores decorreram de práticas ímprobas, não se pode, com base apenas na quantia movimentada, imputar enriquecimento ilícito ao requerido. Por fim, é válido ressaltar que, ainda que se admitisse a existência de evolução patrimonial desproporcional à renda auferida pelo demandado, não há, nos autos, qualquer elemento de prova que demonstre nexo de causalidade entre esse suposto acréscimo patrimonial e a prática de ato de improbidade administrativa relacionado ao exercício de sua função pública. Conforme já dito anteriormente, não há qualquer comprovação de que Joaquim Guimarães foi o responsável pelo desaparecimento das armas no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró. Especialmente em sede de audiência, restou evidenciado que as afirmações feitas contra o demandado consistiam em suposições e desconfianças por parte de colegas de trabalho, preocupados em identificar o possível autor das subtrações ocorridas na repartição. Desta feita, as imputações contra o demandado consistiram em especulações desprovidas de respaldo probatório concreto que pudesse embasar uma condenação por improbidade administrativa. Colaciono os seguintes precedentes nesse mesmo sentido: EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA PELA IMPROCEDÊNCIA DA INICIAL. PRETENSA CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DE ATO QUE IMPORTA EM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. ART. 9º, VII, DA LIA (LEI Nº 8.429/92). SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.230/2021. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 1.199 DO STF (ARE 843989). APLICAÇÃO DA LEI NOVA QUANTO AOS ASPECTOS SANCIONADORES MAIS BENÉFICOS AO RÉU. ART. 17, § 19, INCISO II, DA LIA. ÔNUS PROBANTE DO AUTOR DA AÇÃO DE IMPROBIDADE QUE NÃO COMPROVOU O NEXO CAUSAL ENTRE A EVOLUÇÃO PATRIMONIAL E A PRÁTICA DE ATO ÍLICITO RELACIONADA À FUNÇÃO PÚBLICA. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 373, I, DO CPC. EXIGÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO - DOLO ESPECÍFICO - PARA A CONFIGURAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE. NÃO COMPROVADO. IMPROBIDADE AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema nº 1.199 da Repercussão Geral, fixou a tese no sentido da retroatividade da Lei nº 14.230/21 em relação às ações em curso e cujos atos foram praticados antes da sua entrada em vigor, assim como pela irretroatividade da referida lei às ações transitadas em julgado e pela irretroatividade das alterações promovidas pela Lei nº 14.230/21 em relação à prescrição. 2. Nos termos do ART. 17, § 19, inciso II, da Lei Nº 8.429/92 não se aplica na ação de improbidade administrativa a imposição de ônus da prova ao réu, na forma dos §§ 1º e 2º do art. 373 do CPC (APELAÇÃO CÍVEL, 0812568-15.2015.8.20.5124, Des. CORNELIO ALVES DE AZEVEDO NETO, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 21/12/2022, PUBLICADO em 21/12/2022) (Grifos acrescidos). APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. APURAÇÃO DE EVENTUAL PRÁTICA DA CONDUTA DESCRITA NO ARTIGO 9º, INCISO VII, DA LEI N. 8.429/1992. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DOS RÉUS. DECISÃO CONDENATÓRIA LASTREADA EM INTERPRETAÇÃO LEGISLATIVA ORIUNDA DA LEITURA DA REDAÇÃO ORIGINÁRIA DO ARTIGO 9º, VII, DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROVIDÊNCIA INADEQUADA. ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS PROMOVIDAS PELA LEI N. 14 .230/2021 APLICÁVEIS AOS PROCESSOS EM CURSO. TEMA N. 1.199/STF. PRECEDENTES DESTE SODALÍCIO. DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE DELIBERAÇÃO QUE SOFREU SIGNIFICATIVAS MUDANÇAS COM O ADVENTO DA NOVEL LEGISLAÇÃO. EXIGÊNCIA, PARA CONFIGURAÇÃO DA CONDUTA, NÃO APENAS DE QUE A AQUISIÇÃO DE BENS SEJA FEITA NO EXERCÍCIO DO MANDATO, CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA, MAS QUE NECESSARIAMENTE TENHA ORIGEM NA PRÁTICA DE UM DOS ATOS DESCRITOS NO CAPUT DO ARTIGO 9º DA LIA, NÃO OBSTANTE O DEVER DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM ILÍCITA DOS RECURSOS. ELEMENTOS NÃO COMPROVADOS NO CASO CONCRETO. PRETENSÃO MINISTERIAL RESTRITA À INDICAÇÃO GENÉRICA DE AQUISIÇÃO DE BENS INCOMPATÍVEIS COM A RENDA DO AGENTE PÚBLICO, DE MODO A ILUSTRAR EVOLUÇÃO PATRIMONIAL DESPROPORCIONAL. PRESUNÇÃO DE ILICITUDE QUE NÃO MAIS SUBSISTE NA ATUAL LEITURA DA LEGISLAÇÃO. DEVER DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM ILÍCITA (LEIA-SE, DA PRÁTICA ANTERIOR DE UM ATO DE IMPROBIDADE QUE IMPORTA ENRIQUECIMENTO ILÍCITO) NÃO SATISFEITO PELO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO MINISTERIAL. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO CONDENATÓRIA QUE SE AFIGURA IMPOSITIVA. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO LIMINAR E SUBSIDIÁRIO PREJUDICADOS. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECURSO PROVIDO (TJ-SC - Apelação: 0900021-59.2018.8.24 .0071, Relator.: André Luiz Dacol, Data de Julgamento: 05/10/2023, Quarta Câmara de Direito Público) (Grifos acrescidos). ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA EXTRA PETITA INOCORRÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. ARTIGO 9º, INCISO VII, DA LEI 8.429/1992. EVOLUÇÃO PATRIMONIAL DESPROPORCIONAL. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA E O ACRÉSCIMO DO PATRIMÔNIO. NÃO COMPROVAÇÃO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. ATO DE IMPROBIDADE QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ARTIGO 11 DA LIA). INFRAÇÕES À LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. DEMISSÃO. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS CIVIL E ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA TIPICIDADE CERRADA. INEXISTÊNCIA DE NORMA SANCIONADORA. ATO ÍIMPROBO NÃO CONFIGURADO. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA (TRF-1 - AC: 00079250720094013803, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MONICA SIFUENTES, Data de Julgamento: 23/03/2022, 3a Turma, Data de Publicação: PJe 31/03/2022 PAG PJe 31/03/2022) (Grifos acrescidos). Portanto há que se reconhecer que J. G. D. M. não praticou ato de improbidade previsto no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.492/1992. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial em desfavor de J. G. D. M. e, consequentemente, declaro o presente processo EXTINTO com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, uma vez que ausente má-fé, nos termos do art. 23-B, § 2º, da Lei n° 8.429/92. Sentença que não está sujeita à remessa necessária, conforme preceitua o art. 17-C, § 3º, da Lei n° 8.429/92. Restam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo artigo 1026, §2º, do Código de Processo Civil. No caso de serem interpostos embargos, intime-se a parte contrária para manifestação no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos do § 2º, do art. 1.023, do CPC, vindo os autos conclusos em seguida. Havendo apelação, nos termos do § 1º, do art. 1.010, do CPC, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, adotando-se igual providência em relação ao apelado no caso de interposição de apelação adesiva (§ 2º, art. 1.010, do CPC), remetendo-se os autos ao E. TJRN, independente de juízo de admissibilidade (§ 3º, art. 1.010, do CPC). Decorrido o prazo de 15 (quinze) dias após o trânsito em julgado sem manifestação da parte interessada, determino o arquivamento dos autos, sem prejuízo de posterior desarquivamento mediante requerimento, ficando a Secretaria autorizada a assim proceder, independente de conclusão dos autos, devendo impulsionar o feito por Ato Ordinatório. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Mossoró/RN, data da assinatura eletrônica. Kátia Cristina Guedes Dias Juíza de Direito
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró | Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVAPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mossoró Processo n. 0815913-67.2020.8.20.5106 SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte em face de J. G. D. M., qualificado à exordial, pela suposta prática de ato de improbidade administrativa descrito na inicial. Alega, o demandante, que o servidor não protegeu o patrimônio do setor que chefiava no Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte, contribuindo efetivamente, por ação ou omissão, para que mais de 100 (cem) armas fossem subtraídas do órgão no período de 2010 a 2017. Sustenta, portanto, suposta responsabilidade pelo desaparecimento de armas e munições do interior da COCRIM/ITEP/Mossoró. Aduz, ainda, que o servidor, durante os anos de 2013 a 2017, adquiriu quantidade atípica de bens e movimentou financeiramente exorbitantes quantias em suas contas bancárias, auferindo bens (móveis e de capital) cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte. Nesse sentido, enquadrou tal conduta como aquelas previstas nos arts. 9º, inciso VII; e 11, caput, da Lei nº 8.429/92, pugnando pela condenação do demandado nas sanções previstas no art. 12, incisos I, II e III, do referido diploma legal. Anexou documentos. Regularmente notificado, o demandado apresentou manifestação prévia (Id. nº 63177482). Decisão, em Id. nº 65418631, recebendo a inicial e determinando a citação do réu para apresentar contestação. Manifestação do Ministério Público pugnando pelo compartilhamento das informações constantes no presente processo com a Divisão Especializada em Investigação e Combate ao Crime Organizado (DEICOR) (Id. nº 67636626). Devidamente citado, o demandado apresentou contestação em Id. nº 70646259, alegando, em síntese, ausência de ato ímprobo e de evolução patrimonial para além da normalidade. Petição do parquet pugnando pela suspensão da contagem do prazo prescricional até a apreciação definitiva do Tema 1.199 (Id. nº 82115574). Manifestação da parte ré pugnando pelo indeferimento do pleito (Id. nº 93174450). Decisão determinando o regular fluxo do feito, bem como deferindo o compartilhamento das informações constantes no presente processo com a DEICOR (Id. nº 95607518). Manifestação do parquet pugnando pela juntada dos Inquéritos Policiais de nº 0102068-71.2020.8.20.0106 e 0107042-25.2018.8.20.0106 (Id. nº 97809126), bem como de Boletim de Ocorrência registrado por servidora do ITEP/Mossoró noticiando sobre o desaparecimento de uma arma de fogo do órgão (Id. nº 98491139). Certidão juntando mídias referentes às audiências do Procedimento Investigatório Criminal nº 33.23.2357.0000018/2016-36 (Id. nº 99863726 e Id. nº 99872267). Impugnação à contestação em Id. nº 107183991. Intimadas para se manifestarem acerca da necessidade de novas provas (Id. nº 114830992), as partes pugnaram pela realização de audiência de instrução e julgamento (Id. nº 115617196 e Id. nº 116845230). Despacho designando audiência de instrução e julgamento (Id. nº 124188463 e Id. nº 128251807). Despacho intimando a parte demandada para informar as testemunhas que comparecerão a audiência de instrução, haja vista a necessidade de adequação do número de testemunhas arroladas (Id. nº 128961985). Ata da audiência de instrução hospedada em Id. nº 130990802, designando audiência em continuação. Ata de audiência em continuação hospedada em Id. nº 133685396. Alegações finais em Id. nº 138570592 e Id. nº 142598524. Manifestação do Estado do Rio Grande do Norte informando interesse em ingressar no feito, nos termos do art. 17, § 14, da Lei nº 8.429/92 (Id. nº 152893145). É o relatório. Fundamento e decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Mérito Inicialmente, com o intuito de evitar futuros embargos declaratórios, esclareço que o julgador não se encontra obrigado a rebater, um a um, os argumentos alegados pelas partes, uma vez que atende os requisitos do §1º, IV, do artigo 489 do Código de Processo Civil se adotar fundamentação suficiente para decidir integralmente a controvérsia, utilizando-se das provas, legislação, doutrina e jurisprudência que entender pertinentes à espécie. A decisão judicial não constitui um questionário de perguntas e respostas de todas as alegações das partes, nem se equipara a um laudo pericial. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada (STJ. 1ª Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi - Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região, julgado em 8/6/2016 - Info 585). Compulsando os autos, verifico tratar-se de ação de improbidade administrativa na qual o Ministério Público do Rio Grande do Norte atribui ao demandado a prática de ato de improbidade administrativa, consistente na responsabilidade pelo desaparecimento de armas e munições do interior da COCRIM/ITEP/Mossoró no período de 2010 a 2017. Ainda, sustenta que o servidor, durante os anos de 2013 a 2017, adquiriu quantidade atípica de bens e movimentou financeiramente exorbitantes quantias em suas contas bancárias, auferindo bens (móveis e de capital) cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte. Inicialmente, o parquet pugnou pela condenação do demandado pela prática dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, inciso VII, e 11, caput, da Lei nº 8.429/92. Ocorre que no momento de ajuizamento da ação vigorava a Lei de Improbidade em sua redação original. Contudo, a Lei Federal n° 14.230/2021 alterou os dispositivos da Lei de Improbidade, passando a vigorar em 26 de outubro de 2021. Dentre suas alterações, tem-se a taxatividade do art. 11, uma vez que apenas as condutas descritas especificamente nos incisos é que são atos de improbidade administrativa. Diante disso, a apreciação da presente Ação Civil Pública deve se restringir tão somente ao art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92. Nesse sentido, a Lei n° 8.429/92, na redação dada pela Lei nº 14.230/21, dispõe: Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...) VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; Feitas tais considerações, passo à análise do conjunto fático-probatório carreado aos autos. Analisando a documentação acostada, observo que houve representação anônima noticiando supostas irregularidades praticadas pelo Perito Criminal do ITEP, demandado na presente ação. Dentre outras denúncias, consta no documento a afirmação de que o servidor, juntamente da pessoa de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior, também conhecido por “Bob” ou “Júnior”, já falecido e amigo de Joaquim, vem subtraindo armas e munições do órgão onde trabalha para vender no mercado clandestino (Id. nº 61412450, pág. 06). No que diz respeito ao desaparecimento de armas e munições do ITEP/Mossoró, noto Relatório Final (Id. nº 61413134, pág. 84) produzido pelo órgão em 05 de dezembro de 2018, em que conta a informação de que entraram no instituto de criminalística cerca de 5.451 (cinco mil, quatrocentos e cinquenta e uma) armas de fogo para exames de potencialidade lesiva e comparação balística. Desse número, foram apontadas como desaparecidas e/ou furtadas 149 (cento e quarenta e nove) armas. Ainda no ano de 2011 foi realizada perícia técnica decorrente do arrombamento às dependências do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte/Mossoró, consoante se extrai do Laudo de Vistoria em Imóvel Público acostado em Id. nº 61414821 (pág. 33). Evidentemente, o laudo atesta que o imóvel foi alvo de danos por arrombamento com uso de ferramentas e escalada, causando danificações parciais à grade metálica e à janela da secretaria, bem como à porta do laboratório de balística. Tal fato ensejou a instauração do Inquérito Policial nº 183/2011 (Id. nº 61414800, pág. 19), voltado à apuração das circunstâncias do arrombamento ocorrido naquele ano. Contudo, conforme se depreende do conjunto probatório, os desaparecimentos de armas no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró não se limitaram a esse episódio isolado. Com efeito, foram instaurados outros procedimentos investigatórios com o mesmo objeto, uma vez que as armas e munições continuaram a ser furtadas ao longo dos anos, tais como o Inquérito Policial nº 319/2016 (Id. nº 97812342, pág. 3) e o Inquérito Policial nº 239/2018 (Id. nº 61414800, pág. 09). Além disso, há boletins de ocorrência registrados noticiando o desaparecimento de armas que estavam sob a guarda do instituto de criminalística (Id. nº 61413160, págs. 31 e 32; Id. nº 61413160 - Pág. 32; Id. nº 61416523 - Pág. 23; e Id. nº 98491149). É fato incontroverso, portanto, que os desaparecimentos de armas e munições ocorreram de forma reiterada ao longo dos anos, especialmente no período investigado nos autos, compreendendo os anos de 2010 a 2017. Nesse sentido, a linha argumentativa adotada pelo Ministério Público fundamenta-se no fato de que o demandado J. G. D. M. exercia, à época dos fatos, encontrava-se na chefia da COCRIM, sendo, portanto, o responsável direto pela guarda e controle das armas do setor, sendo, inclusive, o detentor da chave do local onde as armas eram armazenadas. Ainda, sustenta que a pessoa de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior (Bob) mantinha estreita relação com o requerido, o que lhe conferia acesso irrestrito às dependências da COCRIM. Conforme relatos testemunhais, Bob frequentava com habitualidade as instalações do ITEP/Mossoró com a anuência do demandado, inclusive a sala das armas. Paralelamente, afirma que o demandado se enriqueceu ilicitamente, uma vez que auferiu, à época dos fatos, bens cujos valores são desproporcionais a sua renda enquanto Perito Criminal do Instituto Técnico de Perícia do Estado do Rio Grande do Norte, bem como apresentou movimentação financeira atípica e incompatível com a condição de servidor público. Compulsando os autos, observo que o parquet ajuizou Medida Cautelar de Afastamento dos Sigilos Bancário e Fiscal referente ao período de 2013 a 2017 em face de J. G. D. M., Juscivaldo Teixeira Luz Júnior e Joana Dark da Silva Teixeira (mãe de Juscivaldo Teixeira, a qual tinha a conta movimentada por este) (Id. nº 61413131, pág. 4), a qual foi integralmente deferida pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Mossoró. Consta nos autos Relatório de Análise LAB-LD, elaborado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), em que houve uma análise das informações bancárias e fiscais dos investigados (Id. nº 61418615). A documentação aponta que, no período investigado, o demandado adquiriu 05 (cinco) lotes e 10 (dez) automóveis, entre veículos e motocicletas. Ainda, evidencia transações entre Joaquim Guimarães e os outros dois investigados, bem como transações envolvendo intermediários, ou seja, entre ele e contas que se relacionam com pelo menos 02 dos investigados. Pois bem. Em juízo (Id. nº 130990802 e Id. nº 133685396) foram colhidos os depoimentos de 13 (treze) testemunhas, bem como de 02 (dois) declarantes. Ao longo dos depoimentos foi possível perceber que, apesar das desconfianças quanto à responsabilidade de Joaquim Guimarães pelos desaparecimentos, nenhuma das pessoas ouvidas foi capaz de afirmar, com segurança, sua participação nos fatos, tampouco a de Juscivaldo Teixeira Luz Júnior, conhecido como “Bob”. Nesse sentido, tem-se o depoimento do Sr. Sidarque Batista Sales, que afirmou ter trabalhado por 07 (sete) anos com o perito e que nunca chegou a vê-lo furtar qualquer arma do órgão (Id. nº 130990811, 00:05:05-00:05:13). Acrescentou que as suspeitas consistiam em comentários de corredor sem provas concretas, surgidas entre os próprios servidores, diante da inquietação geral para saber quem estaria cometendo os delitos. Segundo o depoente, tais boatos podem ter se originado dos conflitos pessoais que o demandado mantinha com colegas, o que, naturalmente, o tornava alvo preferencial de suspeitas (Id. nº 130990811, 00:12:00-00:13:27). Ainda, tem-se o depoimento do Diretor Geral do ITEP, o Sr. Marcos José Bandão Guimarães, que reconheceu a fragilidade do sistema de guarda das armas à época dos fatos (Id. nº 130990813, 00:07:57-00:08:30). Relatou, ainda, que somente tomou conhecimento sobre “Bob” em 2018, quando surgiu a suspeita de sua participação no incêndio do carro de um servidor. Foi nesse período que José Brandão promoveu a remoção de Joaquim Guimarães, que estava sendo apontado como mandante, para a regional de Natal/RN, no intuito de evitar maiores conflitos (Id. nº 130990813, 00:09:17-00:11:14). No que diz respeito ao sistema débil de armazenamento de armas, ressaltou que visitou o ITEP/Mossoró diversas vezes e evidenciou falhas significativas de segurança. Algumas das armas eram guardadas em uma gaveta de uma mesa, cuja tampa era removível (Id. nº 130990813, 00:13:55-00:14:44). Paralelamente, apontou que a porta da sala não tinha controle adequado, uma vez que a chave de outro setor abria a sala da COCRIM. Por isso, a direção providenciou melhorias, como a substituição da porta, reparo nos móveis e instalação de câmeras de vigilância (Id. nº 130990815, 00:00:48-00:04:44). Tais falhas de segurança foram atestadas por diversas das testemunhas ouvidas em juízo, tais como o Sr. Jader Viana de Souza Júnior (Id. nº 130990813), Sr. Sidarque Batista Sales (Id. nº 130990811), Sr. José Maria Lisboa Sobrinho (Id. nº 133688645) e a Sra. Clautia Sheila Nunes de Carvalho Lopes (Id. nº 133688646). Paralelamente, a Sra. Solange Maria Rodrigues de Almeida Regis (Id. nº 130990815, 00:09:20-00:09:42) afirmou que cerca de 04 (quatro) pessoas tinham acesso à sala, uma vez que eram as pessoas responsáveis pela inclusão dos relatórios das perícias no sistema. Este fato foi corroborado, também, pela testemunha Sr. José Maria Lisboa Sobrinho, que afirmou que, diante da limitação de espaço físico, as armas ficavam acumuladas, o que permitia o acesso de servidores que sequer atuavam diretamente na guarda desses materiais (Id. nº 133688645, 00:04:12-00:04:24) e pela testemunha Sra. Clautia Sheila Nunes de Carvalho Lopes (Id. nº 133688646), que afirmou que alguns servidores, que trabalhavam no local, tiveram acesso à sala. A partir do depoimento dado pelas testemunhas, observo não ser possível afirmar que J. G. D. M. foi o responsável pelo desaparecimento de armas e munições no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró, diante do fato de que o órgão apresentava sérios problemas de segurança, facilitando o acesso às armas por diversas pessoas e comprometendo a guarda dos armamentos no âmbito do órgão. Ainda, entendo que a alegação de que os furtos cessaram após a remoção de Joaquim Guimarães carece de robustez, tendo em vista que tal fato coincide com a adoção de diversas medidas pela Direção do ITEP, conforme atestado pelo Diretor Geral do órgão (Id. nº 130990815, 00:00:48-00:04:44). É fato que ficou consubstanciado ser Joaquim Guimarães um servidor de personalidade conflituosa e temperamento difícil. Tal afirmação se dá em virtude dos diversos problemas que o demandado teve com colegas de trabalho, podendo citar os conflitos com o servidor público Edward Bezerra de Moura. Notoriamente, o Sr. Edward Bezerra teve seu carro incendiado no estacionamento em frente ao ITEP. Pelas imagens das câmeras de uma residência próxima ao órgão, os indícios apontavam que a pessoa responsável seria “Bob”, pessoa próxima de Joaquim. A partir disso, o servidor passou a desconfiar que Joaquim Guimarães era o suposto mandante de tal fato. Tem-se, também, o fato de que Joaquim Guimarães acusou Edward Bezerra de falsificar diárias de viagens, sendo, inclusive, condenado a pagar indenização por danos morais em favor do declarante (Id. nº 61412450, pág. 44), tais informações foram corroboradas em sede de audiência (Id. nº 130990809, 00:07:50), momento em que Edward Bezerra afirmou que, quando o Sr. Joaquim Guimarães saiu de Mossoró/RN, já não havia qualquer contato entre os dois. Ainda, o servidor foi denunciado anonimamente por constrangimento ilegal em 08 de setembro de 2014 (Id. nº 61414827, pág. 05), sob a acusação de cometer violência psicológica e proferir ameaças, diretas e indiretas, contra os demais servidores, que estavam adoecendo em virtude de tal comportamento. Diante disso, entendo que a imagem negativa construída em torno do demandado no ambiente de trabalho, em virtude de sua personalidade notoriamente difícil e dos diversos conflitos em que estava envolvido, contribuiu para que seu nome fosse prontamente associado aos desaparecimentos registrados no âmbito da COCRIM/Mossoró, especialmente por ser uma das pessoas com acesso à chave da sala secreta. Todavia, não se pode admitir que desconfianças informais, baseadas unicamente em impressões subjetivas e no comportamento social do servidor, sirvam como elemento probatório suficiente para imputar-lhe a prática de ato de improbidade administrativa. Como já destacado, os depoimentos colhidos em sede de audiência revelam apenas especulações e “conversas de corredor”, carentes de qualquer suporte fático que possam comprovar, de forma minimamente segura, a existência de dolo específico ou de vínculo entre a conduta do demandado e o desaparecimento dos armamentos. Ademais, quanto ao suposto enriquecimento ilícito, entendo que não restou devidamente comprovado. Vejamos. O parquet sustenta que o autor, no período investigado, adquiriu 05 (cinco) lotes e 10 (dez) automóveis, entre veículos e motocicletas (Id. nº 61418615), bem como apresentou movimentação financeira atípica e incompatível com a condição de servidor público. No entanto, constam nos autos as seguintes documentações: Distrato de Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda do Loteamento Royal Ville Mossoró (Id. nº 70646268), referente aos Lotes 01 e 02 da Quadra 7 do loteamento denominado “Royal Ville Mossoró”; Distrato de Instrumento Particular de Promessa de Compra e Venda do Loteamento “Royal Ville Mossoró” (Id. nº 70646270), referente ao Lote 03 da Quadra 03 do loteamento denominado “Royal Ville Mossoró”; Termo de Desistência com Pagamento (Id. nº 70646274), referente ao Lote 18 da Quadra 15 do loteamento denominado “Porto do Atlântico”; e Contrato particular de compra e venda com garantia de alienação fiduciária (Id. nº 70646275), referente ao Lote 14 da Quadra 7 do loteamento denominado “Porto do Atlântico”. Tais documentos demonstram que os imóveis não foram efetivamente incorporados ao patrimônio do demandado, uma vez que houve o distrato/desistência, ou, no caso do último imóvel, a transferência para terceiro. No que diz respeito aos automóveis, observo que a maior parte dos bens foi adquirida por meio de consórcio, conforme comprovam os documentos acostados em Id. nº 70646263, Id. nº 70646264 e Id. nº 70646267. Entendo que tal modalidade de aquisição, em virtude de sua natureza parcelada e financeiramente mais acessível, é plenamente compatível com a renda de um servidor público, não se podendo inferir, apenas por esse fato, a existência de patrimônio desproporcional. Paralelamente, consta nos autos que alguns dos veículos foram objeto de venda posterior, enquanto outros foram objeto de furto (Id. nº 70647433), portanto não se pode afirmar que todos esses bens foram incorporados ao patrimônio do demandado, tampouco que compõem, de forma atual ou acumulada, um conjunto patrimonial incompatível com seus rendimentos. No que diz respeito às movimentações bancárias, entendo que os documentos bancários acostados aos autos não demonstram, por si só, a existência de enriquecimento ilícito ou movimentação incompatível com a remuneração percebida pelo demandado enquanto servidor público. Ausente demonstração concreta de que tais valores decorreram de práticas ímprobas, não se pode, com base apenas na quantia movimentada, imputar enriquecimento ilícito ao requerido. Por fim, é válido ressaltar que, ainda que se admitisse a existência de evolução patrimonial desproporcional à renda auferida pelo demandado, não há, nos autos, qualquer elemento de prova que demonstre nexo de causalidade entre esse suposto acréscimo patrimonial e a prática de ato de improbidade administrativa relacionado ao exercício de sua função pública. Conforme já dito anteriormente, não há qualquer comprovação de que Joaquim Guimarães foi o responsável pelo desaparecimento das armas no âmbito da COCRIM/ITEP/Mossoró. Especialmente em sede de audiência, restou evidenciado que as afirmações feitas contra o demandado consistiam em suposições e desconfianças por parte de colegas de trabalho, preocupados em identificar o possível autor das subtrações ocorridas na repartição. Desta feita, as imputações contra o demandado consistiram em especulações desprovidas de respaldo probatório concreto que pudesse embasar uma condenação por improbidade administrativa. Colaciono os seguintes precedentes nesse mesmo sentido: EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA PELA IMPROCEDÊNCIA DA INICIAL. PRETENSA CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DE ATO QUE IMPORTA EM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. ART. 9º, VII, DA LIA (LEI Nº 8.429/92). SUPERVENIÊNCIA DA LEI Nº 14.230/2021. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 1.199 DO STF (ARE 843989). APLICAÇÃO DA LEI NOVA QUANTO AOS ASPECTOS SANCIONADORES MAIS BENÉFICOS AO RÉU. ART. 17, § 19, INCISO II, DA LIA. ÔNUS PROBANTE DO AUTOR DA AÇÃO DE IMPROBIDADE QUE NÃO COMPROVOU O NEXO CAUSAL ENTRE A EVOLUÇÃO PATRIMONIAL E A PRÁTICA DE ATO ÍLICITO RELACIONADA À FUNÇÃO PÚBLICA. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 373, I, DO CPC. EXIGÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO - DOLO ESPECÍFICO - PARA A CONFIGURAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE. NÃO COMPROVADO. IMPROBIDADE AFASTADA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema nº 1.199 da Repercussão Geral, fixou a tese no sentido da retroatividade da Lei nº 14.230/21 em relação às ações em curso e cujos atos foram praticados antes da sua entrada em vigor, assim como pela irretroatividade da referida lei às ações transitadas em julgado e pela irretroatividade das alterações promovidas pela Lei nº 14.230/21 em relação à prescrição. 2. Nos termos do ART. 17, § 19, inciso II, da Lei Nº 8.429/92 não se aplica na ação de improbidade administrativa a imposição de ônus da prova ao réu, na forma dos §§ 1º e 2º do art. 373 do CPC (APELAÇÃO CÍVEL, 0812568-15.2015.8.20.5124, Des. CORNELIO ALVES DE AZEVEDO NETO, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 21/12/2022, PUBLICADO em 21/12/2022) (Grifos acrescidos). APELAÇÃO CÍVEL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. APURAÇÃO DE EVENTUAL PRÁTICA DA CONDUTA DESCRITA NO ARTIGO 9º, INCISO VII, DA LEI N. 8.429/1992. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DOS RÉUS. DECISÃO CONDENATÓRIA LASTREADA EM INTERPRETAÇÃO LEGISLATIVA ORIUNDA DA LEITURA DA REDAÇÃO ORIGINÁRIA DO ARTIGO 9º, VII, DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROVIDÊNCIA INADEQUADA. ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS PROMOVIDAS PELA LEI N. 14 .230/2021 APLICÁVEIS AOS PROCESSOS EM CURSO. TEMA N. 1.199/STF. PRECEDENTES DESTE SODALÍCIO. DISPOSITIVO LEGAL OBJETO DE DELIBERAÇÃO QUE SOFREU SIGNIFICATIVAS MUDANÇAS COM O ADVENTO DA NOVEL LEGISLAÇÃO. EXIGÊNCIA, PARA CONFIGURAÇÃO DA CONDUTA, NÃO APENAS DE QUE A AQUISIÇÃO DE BENS SEJA FEITA NO EXERCÍCIO DO MANDATO, CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA, MAS QUE NECESSARIAMENTE TENHA ORIGEM NA PRÁTICA DE UM DOS ATOS DESCRITOS NO CAPUT DO ARTIGO 9º DA LIA, NÃO OBSTANTE O DEVER DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM ILÍCITA DOS RECURSOS. ELEMENTOS NÃO COMPROVADOS NO CASO CONCRETO. PRETENSÃO MINISTERIAL RESTRITA À INDICAÇÃO GENÉRICA DE AQUISIÇÃO DE BENS INCOMPATÍVEIS COM A RENDA DO AGENTE PÚBLICO, DE MODO A ILUSTRAR EVOLUÇÃO PATRIMONIAL DESPROPORCIONAL. PRESUNÇÃO DE ILICITUDE QUE NÃO MAIS SUBSISTE NA ATUAL LEITURA DA LEGISLAÇÃO. DEVER DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM ILÍCITA (LEIA-SE, DA PRÁTICA ANTERIOR DE UM ATO DE IMPROBIDADE QUE IMPORTA ENRIQUECIMENTO ILÍCITO) NÃO SATISFEITO PELO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO MINISTERIAL. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO CONDENATÓRIA QUE SE AFIGURA IMPOSITIVA. SENTENÇA REFORMADA. PEDIDO LIMINAR E SUBSIDIÁRIO PREJUDICADOS. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. RECURSO PROVIDO (TJ-SC - Apelação: 0900021-59.2018.8.24 .0071, Relator.: André Luiz Dacol, Data de Julgamento: 05/10/2023, Quarta Câmara de Direito Público) (Grifos acrescidos). ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA EXTRA PETITA INOCORRÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. ARTIGO 9º, INCISO VII, DA LEI 8.429/1992. EVOLUÇÃO PATRIMONIAL DESPROPORCIONAL. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. NEXO CAUSAL ENTRE A CONDUTA E O ACRÉSCIMO DO PATRIMÔNIO. NÃO COMPROVAÇÃO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. ATO DE IMPROBIDADE QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ARTIGO 11 DA LIA). INFRAÇÕES À LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA. DEMISSÃO. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS CIVIL E ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA TIPICIDADE CERRADA. INEXISTÊNCIA DE NORMA SANCIONADORA. ATO ÍIMPROBO NÃO CONFIGURADO. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA (TRF-1 - AC: 00079250720094013803, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MONICA SIFUENTES, Data de Julgamento: 23/03/2022, 3a Turma, Data de Publicação: PJe 31/03/2022 PAG PJe 31/03/2022) (Grifos acrescidos). Portanto há que se reconhecer que J. G. D. M. não praticou ato de improbidade previsto no art. 9º, inciso VII, da Lei nº 8.492/1992. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado na inicial em desfavor de J. G. D. M. e, consequentemente, declaro o presente processo EXTINTO com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, uma vez que ausente má-fé, nos termos do art. 23-B, § 2º, da Lei n° 8.429/92. Sentença que não está sujeita à remessa necessária, conforme preceitua o art. 17-C, § 3º, da Lei n° 8.429/92. Restam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará à imposição da multa prevista pelo artigo 1026, §2º, do Código de Processo Civil. No caso de serem interpostos embargos, intime-se a parte contrária para manifestação no prazo de 5 (cinco) dias, nos termos do § 2º, do art. 1.023, do CPC, vindo os autos conclusos em seguida. Havendo apelação, nos termos do § 1º, do art. 1.010, do CPC, intime-se o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, adotando-se igual providência em relação ao apelado no caso de interposição de apelação adesiva (§ 2º, art. 1.010, do CPC), remetendo-se os autos ao E. TJRN, independente de juízo de admissibilidade (§ 3º, art. 1.010, do CPC). Decorrido o prazo de 15 (quinze) dias após o trânsito em julgado sem manifestação da parte interessada, determino o arquivamento dos autos, sem prejuízo de posterior desarquivamento mediante requerimento, ficando a Secretaria autorizada a assim proceder, independente de conclusão dos autos, devendo impulsionar o feito por Ato Ordinatório. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Mossoró/RN, data da assinatura eletrônica. Kátia Cristina Guedes Dias Juíza de Direito