Carlos Daniel Manicoba Da Silva e outros x Eduardo Janzon Avallone Nogueira
Número do Processo:
0824563-54.2025.8.20.5001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
Procedimento de Repactuação de Dívidas (Superendividamento)
Grau:
1º Grau
Órgão:
17ª Vara Cível da Comarca de Natal
Última atualização encontrada em
10 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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23/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 17ª Vara Cível da Comarca de Natal | Classe: Procedimento de Repactuação de Dívidas (Superendividamento)PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE JUÍZO DE DIREITO DA 17ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE NATAL Processo nº 0824563-54.2025.8.20.5001 Ação: PROCEDIMENTO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO) (15217) REQUERENTE: ELIONE PEREIRA GARCIA REQUERIDO: BANCO DO BRASIL S/A, NIO MEIOS DE PAGAMENTO LTDA, BANCO INDUSTRIAL DO BRASIL S/A, BANCO DIGIO S.A., BANCO BS2 S.A. DECISÃO I - RELATÓRIO Cuida-se de pedido de concessão de tutela de urgência formulado por Elione Pereira Garcia da Silva, no bojo de ação de repactuação de dívidas por superendividamento, com fulcro nos arts. 54-A e seguintes do Código de Defesa do Consumidor, incluídos pela Lei nº 14.181/2021. Narra a parte autora que aufere renda líquida mensal de R$ 4.473,61, sendo que 55,47% desse montante encontra-se comprometido com o pagamento de dívidas de consumo, totalizando R$ 2.481,63, situação que inviabiliza sua subsistência digna, dada a insuficiência dos valores remanescentes para custeio de despesas básicas. Aduz que se encontra em estado de superendividamento e que, embora deseje cumprir com suas obrigações, necessita de intervenção judicial para reorganizar suas finanças. Juntou, para tanto, parecer técnico e plano de pagamento com valor mensal limitado a R$ 1.565,76 (35% da renda líquida), indicando a intenção de honrar parte significativa de suas dívidas de forma responsável e proporcional à sua capacidade de pagamento. Postula, assim, a concessão de tutela de urgência para limitar os descontos mensais ao percentual indicado, suspender a exigibilidade dos valores excedentes até audiência conciliatória, impedir inscrições em cadastros de inadimplentes, e determinar a juntada dos contratos e evolução das dívidas pelos credores. Ao final, requereu a confirmação da tutela e a revisão de juros remuneratórios para aplicação da taxa média do Bacen ao caso. É o necessário relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO O artigo 300 do Código de Processo Civil prevê como requisitos cumulativos para a concessão da tutela da urgência a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Sobre o fenômeno do superendividamento, a Lei nº 14.181/2021 alterou a Lei de nº 8.071/90 e acrescentou ao Código de Defesa do Consumidor o artigo 104-A que prevê, in verbis: "Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas." Nota-se que o mesmo dispositivo prevê no seu §2º a possibilidade de suspensão da exigibilidade do débito somente nos casos em que, aprazada a audiência, o credor de forma injustificada deixa de comparecer ao ato. Desta forma, não se vislumbra a licença legal para a suspensão do débito ora debatido nos autos em sede de tutela antecipada, sendo necessária a marcação prévia de audiência para que o autor apresente a sua proposta de plano de pagamento. Saliente-se que se trata de dívida contraída pela autora por livre manifestação de vontade e cuja exigibilidade não pode ser suspensa sem um plano de pagamento em conformidade com os requisitos legais do Código de Defesa do Consumidor (artigo 104-A). A previsão de conciliação por superendividamento não constitui meio de eximir-se o devedor do pagamento de suas dívidas. No tocante ao pedido de limitação dos descontos a 35% dos vencimentos da autora, importante destacar que, no intento de disciplinar os descontos de prestações em folha de pagamento, a Lei n.º 10.820/2003, estabeleceu que o poder regulamentar fixará os limites de valores dos empréstimos e das prestações consignáveis (art. 1º, § 2º). Deve-se destacar que a limitação apresentada no dispositivo normativo faz referência tão somente aos empréstimos consignados e não às dívidas contraídas de maneira geral, como empréstimos com pagamento automático por débito em conta. Nesse sentido, importante colacionar Informativo nº 612 do STJ, publicado em 25 de outubro de 2017, que estabelece: Tema: Prestações de mútuo firmado com instituição financeira. Desconto em conta-corrente e desconto em folha. Hipóteses distintas. Aplicação, por analogia, da limitação legal ao empréstimo consignado ao mero desconto em conta-corrente, superveniente ao recebimento da remuneração. Inviabilidade. Dirigismo contratual sem supedâneo legal. Impossibilidade. Sobre o tema, ficou determinado que a limitação de desconto ao empréstimo consignado não se aplica aos contratos de mútuo bancário em que o cliente autoriza o débito das prestações em conta-corrente. É o caso dos autos. Na informação do inteiro teor que abaixo transcrevo ficou decidido: Informações do inteiro teor: A principal questão controvertida consiste em saber se se aplica, por analogia, a limitação de desconto utilizada nas hipóteses de crédito consignado em folha para os contratos de mútuo em que o cliente autoriza o débito das prestações em conta-corrente. Inicialmente, constata-se que a jurisprudência do STJ sobre o tema é dispersa, na medida em que há julgados desta Corte que se valem da analogia para limitar o desconto em conta-corrente da remuneração ou proventos do devedor aos mesmos limites legais impostos às consignações em folha de pagamento.Todavia, não parece razoável e isonômico, a par de não ter nenhum supedâneo legal, aplicar essa limitação, de maneira arbitrária, a contrato específico de mútuo livremente pactuado. Em que pese haver precedentes a perfilhar o entendimento de que a limitação é adotada como medida para solucionar o superendividamento, a bem da verdade, opera no sentido oposto, tendo o condão de eternizar a obrigação, visto que virtualmente leva à denominada amortização negativa do débito, resultando em aumento mês a mês do saldo devedor. É conveniente salientar que a norma que fixa a limitação do desconto em folha é salutar, possibilitando ao consumidor que tome empréstimos, obtendo condições e prazos mais vantajosos, em decorrência da maior segurança propiciada ao financiador – desde que preservado o mínimo existencial – em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.A aplicação dessa limitação aos descontos em conta corrente significa restrição à autonomia privada, pois, com exceção do desconto forçoso em folha, não é recomendável estabelecer limitação percentual às prestações contratuais estendendo indevidamente regra legal que não se subsume ao caso, sob pena de dificultar o tráfego negocial e resultar em imposição de restrição a bens e serviços, justamente em prejuízo dos que têm menor renda. Sem mencionar ainda a possível elevação das taxas para aqueles que não conseguem demonstrar renda compatível com o empréstimo pretendido. Além disso, é desarrazoado que apenas o banco não possa lançar mão de procedimentos legítimos para satisfação de seu crédito e que, eventualmente, em casos de inadimplência, seja privado, em contraposição aos demais credores, do acesso à justiça, para arresto ou penhora de bens do devedor. Todavia, a partir da análise da referida lei, percebe-se que não há qualquer óbice para que as prestações de empréstimo contratado sejam descontadas em folha de pagamento, não podendo ser suprimidas pela vontade unilateral do devedor, notadamente porque os contratos foram celebrados regularmente com a respectiva cláusula de garantia de consignação em folha de pagamento e, ainda, acompanhado da necessária autorização da demandante para o desconto das parcelas em seus rendimentos, que, ressalto, é cláusula válida. Em face de tal garantia, a parte contratante é beneficiada com prazos de pagamento mais elásticos e juros mais baixos. No que tange aos descontos efetuados no contracheque do demandante, insta consignar que o artigo 15 do Decreto Estadual nº 21.860, de 27 de agosto de 2010, alterado pelo Decreto n° 30.352, de 11 de janeiro de 2021 regulamentou no âmbito da Administração Estadual as consignações em folha de pagamento de servidores públicos civis, militares estaduais e pensionistas, estabelecendo em 35% (trinta e cinco por cento) o limite destinado às consignações facultativas no contracheque do servidor público estadual. Vejamos: "Art. 15. As consignações devem ser averbadas mediante solicitação do consignado, dentro do estabelecimento da consignatária credenciada, sendo realizada a efetivação com a assinatura eletrônica do servidor, através de senha pessoal e intransferível. Parágrafo único. A averbação somente deve ser efetuada quando a margem consignável não ultrapassar: § 1º ............................................................................................................. I - 35% (trinta e cinco por cento) das vantagens permanentes inerentes ao cargo exercido pelo servidor, destinadas às consignações facultativas previstas no art. 5º, I, II, III, IV, V, VII, VIII, deste Decreto; II - 10% (dez por cento) das vantagens permanentes inerentes ao cargo exercido pelo servidor, destinada exclusivamente às consignações facultativas previstas no art. 5º, IX, deste Decreto; III - 35 % (trinta e cinco por cento) da remuneração permanente inerente ao cargo exercido pelo servidor, destinadas exclusivamente às consignações facultativas previstas no art. 5º, VI, deste Decreto. Ademais, o parâmetro correto a ser utilizado é a remuneração líquida disponível, ou seja, o valor bruto da remuneração menos os descontos obrigatórios, como previdência social e imposto de renda retido na fonte (IRRF). Nesse sentido é a jurisprudência do TJRN, cita-se: EMENTA: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COM PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. MÚTUO BANCÁRIO. DESCONTO EM CONTA CORRENTE. PEDIDO DE LIMITAÇÃO EM 30% (TRINTA POR CENTO) O DESCONTO NOS RENDIMENTOS. DECRETO Nº 30.352/2021. INAPLICABILIDADE. RESTRIÇÃO ADOTADA SOMENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS, COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. RESP. 1.863.973/SP, 1.872.441/SP E 1.877.113/SP, JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. TEMA 1085. ALEGAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE PLANO DE PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 104-A DO CDC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0807449-41.2023.8.20.0000, Des. Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 20/10/2023, PUBLICADO em 23/10/2023) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA POR SUPERENDIVIDAMENTO. ARTIGOS 104-A E 104-B DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. FASE CONCILIATÓRIA NECESSÁRIA A VIABILIZAR A REPACTUAÇÃO. DESCONTOS FACULTATIVOS CONSIGNADOS INFERIORES A 35% DAS VANTAGENS PERMANENTES. RESPEITADO O LIMITE ESTABELECIDO NO ART. 15, PARÁGRAFO ÚNICO DO DECRETO ESTADUAL N° 21.860/2010, ALTERADO PELO DECRETO ESTADUAL N° 30.352/2021. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0804274-39.2023.8.20.0000, Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 28/06/2023, PUBLICADO em 03/07/2023) Na hipótese caso dos autos, por considerar que a regra de limitação do diploma normativo em comento se limita apenas às prestações consignadas, nota-se através do contracheque da autora (ID n° 148935703), que o somatório de descontos por empréstimos consignados e cartão de crédito consignado perfaz R$ 1.227,77 (mil duzentos e vinte e sete reais e setenta e sete centavos), ao passo que o parâmetro de rendimento da autora (valor dos proventos menos descontos obrigatórios) corresponde a R$ 4.514,02 (quatro mil quinhentos e catorze reais e dois centavos). O valor dos descontos consignados corresponde aproximadamente a 27% da remuneração líquida disponível da autora (remuneração bruta menos Imposto de Renda Retido na Fonte e desconto do fundo previdenciário). Assim, conclui-se que, que se admitem os descontos em folha que respeitam as diretrizes do Decreto Estadual nº 21.860, de 27 de agosto de 2010 no limite de 35% por cento, em conformidade com o caso em tela. Ausente, portanto, a probabilidade de direito em elementos que a evidencie. Por fim, em uma análise detida da inicial, observa-se que os pedidos “h” e “i” são incompatíveis, pois possuem finalidades jurídicas distintas e procedimentos materialmente obstantes. A repactuação das dívidas no âmbito do superendividamento (arts. 104-A e 104-B do CDC) pressupõe tratamento coletivo, paritário e conciliatório entre os credores, com objetivo de reorganização global da situação financeira da devedora. Por sua vez, o pedido de revisão de cláusulas contratuais com base na taxa média de mercado (alínea “i”) configura pretensão de natureza revisional típica, voltada à readequação individualizada das obrigações, segundo critérios de razoabilidade econômica e equilíbrio contratual. Se o juízo acolher o rito do superendividamento, o ideal é que a revisão de cláusulas contratuais ocorra dentro do processo coletivo, e não por análise isolada como nos moldes da alínea "i". Afinal, não haveria interesse de repactuar as dívidas para depois revisar os juros de contratos repactuados. III - DISPOSITIVO Diante do exposto, indefiro o pedido de antecipação da tutela formulado na inicial. Intime-se a parte autora a, no prazo de 15 (quinze) dias, emendar a inicial para (I) apresentar pedido certo e adequado quando procedimento de repactuação das dívidas, (II) adequar a cumulação de pedidos realizadas, sem prejuízo à manutenção da audiência conciliatória aprazada para o mês de junho e (III) indicar quais contratos não possui para eventual análise do pedido de inversão do ônus da prova. Decorrido o prazo para emenda, retornem os autos conclusos para decisão de urgência. Natal/RN, 22 de abril de 2025. Daniella Simonetti Meira Pires de Araújo Juíza de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)
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23/04/2025 - IntimaçãoÓrgão: 17ª Vara Cível da Comarca de Natal | Classe: Procedimento de Repactuação de Dívidas (Superendividamento)PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE JUÍZO DE DIREITO DA 17ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE NATAL Processo nº 0824563-54.2025.8.20.5001 Ação: PROCEDIMENTO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO) (15217) REQUERENTE: ELIONE PEREIRA GARCIA REQUERIDO: BANCO DO BRASIL S/A, NIO MEIOS DE PAGAMENTO LTDA, BANCO INDUSTRIAL DO BRASIL S/A, BANCO DIGIO S.A., BANCO BS2 S.A. DECISÃO I - RELATÓRIO Cuida-se de pedido de concessão de tutela de urgência formulado por Elione Pereira Garcia da Silva, no bojo de ação de repactuação de dívidas por superendividamento, com fulcro nos arts. 54-A e seguintes do Código de Defesa do Consumidor, incluídos pela Lei nº 14.181/2021. Narra a parte autora que aufere renda líquida mensal de R$ 4.473,61, sendo que 55,47% desse montante encontra-se comprometido com o pagamento de dívidas de consumo, totalizando R$ 2.481,63, situação que inviabiliza sua subsistência digna, dada a insuficiência dos valores remanescentes para custeio de despesas básicas. Aduz que se encontra em estado de superendividamento e que, embora deseje cumprir com suas obrigações, necessita de intervenção judicial para reorganizar suas finanças. Juntou, para tanto, parecer técnico e plano de pagamento com valor mensal limitado a R$ 1.565,76 (35% da renda líquida), indicando a intenção de honrar parte significativa de suas dívidas de forma responsável e proporcional à sua capacidade de pagamento. Postula, assim, a concessão de tutela de urgência para limitar os descontos mensais ao percentual indicado, suspender a exigibilidade dos valores excedentes até audiência conciliatória, impedir inscrições em cadastros de inadimplentes, e determinar a juntada dos contratos e evolução das dívidas pelos credores. Ao final, requereu a confirmação da tutela e a revisão de juros remuneratórios para aplicação da taxa média do Bacen ao caso. É o necessário relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO O artigo 300 do Código de Processo Civil prevê como requisitos cumulativos para a concessão da tutela da urgência a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Sobre o fenômeno do superendividamento, a Lei nº 14.181/2021 alterou a Lei de nº 8.071/90 e acrescentou ao Código de Defesa do Consumidor o artigo 104-A que prevê, in verbis: "Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas." Nota-se que o mesmo dispositivo prevê no seu §2º a possibilidade de suspensão da exigibilidade do débito somente nos casos em que, aprazada a audiência, o credor de forma injustificada deixa de comparecer ao ato. Desta forma, não se vislumbra a licença legal para a suspensão do débito ora debatido nos autos em sede de tutela antecipada, sendo necessária a marcação prévia de audiência para que o autor apresente a sua proposta de plano de pagamento. Saliente-se que se trata de dívida contraída pela autora por livre manifestação de vontade e cuja exigibilidade não pode ser suspensa sem um plano de pagamento em conformidade com os requisitos legais do Código de Defesa do Consumidor (artigo 104-A). A previsão de conciliação por superendividamento não constitui meio de eximir-se o devedor do pagamento de suas dívidas. No tocante ao pedido de limitação dos descontos a 35% dos vencimentos da autora, importante destacar que, no intento de disciplinar os descontos de prestações em folha de pagamento, a Lei n.º 10.820/2003, estabeleceu que o poder regulamentar fixará os limites de valores dos empréstimos e das prestações consignáveis (art. 1º, § 2º). Deve-se destacar que a limitação apresentada no dispositivo normativo faz referência tão somente aos empréstimos consignados e não às dívidas contraídas de maneira geral, como empréstimos com pagamento automático por débito em conta. Nesse sentido, importante colacionar Informativo nº 612 do STJ, publicado em 25 de outubro de 2017, que estabelece: Tema: Prestações de mútuo firmado com instituição financeira. Desconto em conta-corrente e desconto em folha. Hipóteses distintas. Aplicação, por analogia, da limitação legal ao empréstimo consignado ao mero desconto em conta-corrente, superveniente ao recebimento da remuneração. Inviabilidade. Dirigismo contratual sem supedâneo legal. Impossibilidade. Sobre o tema, ficou determinado que a limitação de desconto ao empréstimo consignado não se aplica aos contratos de mútuo bancário em que o cliente autoriza o débito das prestações em conta-corrente. É o caso dos autos. Na informação do inteiro teor que abaixo transcrevo ficou decidido: Informações do inteiro teor: A principal questão controvertida consiste em saber se se aplica, por analogia, a limitação de desconto utilizada nas hipóteses de crédito consignado em folha para os contratos de mútuo em que o cliente autoriza o débito das prestações em conta-corrente. Inicialmente, constata-se que a jurisprudência do STJ sobre o tema é dispersa, na medida em que há julgados desta Corte que se valem da analogia para limitar o desconto em conta-corrente da remuneração ou proventos do devedor aos mesmos limites legais impostos às consignações em folha de pagamento.Todavia, não parece razoável e isonômico, a par de não ter nenhum supedâneo legal, aplicar essa limitação, de maneira arbitrária, a contrato específico de mútuo livremente pactuado. Em que pese haver precedentes a perfilhar o entendimento de que a limitação é adotada como medida para solucionar o superendividamento, a bem da verdade, opera no sentido oposto, tendo o condão de eternizar a obrigação, visto que virtualmente leva à denominada amortização negativa do débito, resultando em aumento mês a mês do saldo devedor. É conveniente salientar que a norma que fixa a limitação do desconto em folha é salutar, possibilitando ao consumidor que tome empréstimos, obtendo condições e prazos mais vantajosos, em decorrência da maior segurança propiciada ao financiador – desde que preservado o mínimo existencial – em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.A aplicação dessa limitação aos descontos em conta corrente significa restrição à autonomia privada, pois, com exceção do desconto forçoso em folha, não é recomendável estabelecer limitação percentual às prestações contratuais estendendo indevidamente regra legal que não se subsume ao caso, sob pena de dificultar o tráfego negocial e resultar em imposição de restrição a bens e serviços, justamente em prejuízo dos que têm menor renda. Sem mencionar ainda a possível elevação das taxas para aqueles que não conseguem demonstrar renda compatível com o empréstimo pretendido. Além disso, é desarrazoado que apenas o banco não possa lançar mão de procedimentos legítimos para satisfação de seu crédito e que, eventualmente, em casos de inadimplência, seja privado, em contraposição aos demais credores, do acesso à justiça, para arresto ou penhora de bens do devedor. Todavia, a partir da análise da referida lei, percebe-se que não há qualquer óbice para que as prestações de empréstimo contratado sejam descontadas em folha de pagamento, não podendo ser suprimidas pela vontade unilateral do devedor, notadamente porque os contratos foram celebrados regularmente com a respectiva cláusula de garantia de consignação em folha de pagamento e, ainda, acompanhado da necessária autorização da demandante para o desconto das parcelas em seus rendimentos, que, ressalto, é cláusula válida. Em face de tal garantia, a parte contratante é beneficiada com prazos de pagamento mais elásticos e juros mais baixos. No que tange aos descontos efetuados no contracheque do demandante, insta consignar que o artigo 15 do Decreto Estadual nº 21.860, de 27 de agosto de 2010, alterado pelo Decreto n° 30.352, de 11 de janeiro de 2021 regulamentou no âmbito da Administração Estadual as consignações em folha de pagamento de servidores públicos civis, militares estaduais e pensionistas, estabelecendo em 35% (trinta e cinco por cento) o limite destinado às consignações facultativas no contracheque do servidor público estadual. Vejamos: "Art. 15. As consignações devem ser averbadas mediante solicitação do consignado, dentro do estabelecimento da consignatária credenciada, sendo realizada a efetivação com a assinatura eletrônica do servidor, através de senha pessoal e intransferível. Parágrafo único. A averbação somente deve ser efetuada quando a margem consignável não ultrapassar: § 1º ............................................................................................................. I - 35% (trinta e cinco por cento) das vantagens permanentes inerentes ao cargo exercido pelo servidor, destinadas às consignações facultativas previstas no art. 5º, I, II, III, IV, V, VII, VIII, deste Decreto; II - 10% (dez por cento) das vantagens permanentes inerentes ao cargo exercido pelo servidor, destinada exclusivamente às consignações facultativas previstas no art. 5º, IX, deste Decreto; III - 35 % (trinta e cinco por cento) da remuneração permanente inerente ao cargo exercido pelo servidor, destinadas exclusivamente às consignações facultativas previstas no art. 5º, VI, deste Decreto. Ademais, o parâmetro correto a ser utilizado é a remuneração líquida disponível, ou seja, o valor bruto da remuneração menos os descontos obrigatórios, como previdência social e imposto de renda retido na fonte (IRRF). Nesse sentido é a jurisprudência do TJRN, cita-se: EMENTA: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COM PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. MÚTUO BANCÁRIO. DESCONTO EM CONTA CORRENTE. PEDIDO DE LIMITAÇÃO EM 30% (TRINTA POR CENTO) O DESCONTO NOS RENDIMENTOS. DECRETO Nº 30.352/2021. INAPLICABILIDADE. RESTRIÇÃO ADOTADA SOMENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS, COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. RESP. 1.863.973/SP, 1.872.441/SP E 1.877.113/SP, JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. TEMA 1085. ALEGAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE PLANO DE PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 104-A DO CDC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0807449-41.2023.8.20.0000, Des. Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 20/10/2023, PUBLICADO em 23/10/2023) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA POR SUPERENDIVIDAMENTO. ARTIGOS 104-A E 104-B DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. FASE CONCILIATÓRIA NECESSÁRIA A VIABILIZAR A REPACTUAÇÃO. DESCONTOS FACULTATIVOS CONSIGNADOS INFERIORES A 35% DAS VANTAGENS PERMANENTES. RESPEITADO O LIMITE ESTABELECIDO NO ART. 15, PARÁGRAFO ÚNICO DO DECRETO ESTADUAL N° 21.860/2010, ALTERADO PELO DECRETO ESTADUAL N° 30.352/2021. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0804274-39.2023.8.20.0000, Des. Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 28/06/2023, PUBLICADO em 03/07/2023) Na hipótese caso dos autos, por considerar que a regra de limitação do diploma normativo em comento se limita apenas às prestações consignadas, nota-se através do contracheque da autora (ID n° 148935703), que o somatório de descontos por empréstimos consignados e cartão de crédito consignado perfaz R$ 1.227,77 (mil duzentos e vinte e sete reais e setenta e sete centavos), ao passo que o parâmetro de rendimento da autora (valor dos proventos menos descontos obrigatórios) corresponde a R$ 4.514,02 (quatro mil quinhentos e catorze reais e dois centavos). O valor dos descontos consignados corresponde aproximadamente a 27% da remuneração líquida disponível da autora (remuneração bruta menos Imposto de Renda Retido na Fonte e desconto do fundo previdenciário). Assim, conclui-se que, que se admitem os descontos em folha que respeitam as diretrizes do Decreto Estadual nº 21.860, de 27 de agosto de 2010 no limite de 35% por cento, em conformidade com o caso em tela. Ausente, portanto, a probabilidade de direito em elementos que a evidencie. Por fim, em uma análise detida da inicial, observa-se que os pedidos “h” e “i” são incompatíveis, pois possuem finalidades jurídicas distintas e procedimentos materialmente obstantes. A repactuação das dívidas no âmbito do superendividamento (arts. 104-A e 104-B do CDC) pressupõe tratamento coletivo, paritário e conciliatório entre os credores, com objetivo de reorganização global da situação financeira da devedora. Por sua vez, o pedido de revisão de cláusulas contratuais com base na taxa média de mercado (alínea “i”) configura pretensão de natureza revisional típica, voltada à readequação individualizada das obrigações, segundo critérios de razoabilidade econômica e equilíbrio contratual. Se o juízo acolher o rito do superendividamento, o ideal é que a revisão de cláusulas contratuais ocorra dentro do processo coletivo, e não por análise isolada como nos moldes da alínea "i". Afinal, não haveria interesse de repactuar as dívidas para depois revisar os juros de contratos repactuados. III - DISPOSITIVO Diante do exposto, indefiro o pedido de antecipação da tutela formulado na inicial. Intime-se a parte autora a, no prazo de 15 (quinze) dias, emendar a inicial para (I) apresentar pedido certo e adequado quando procedimento de repactuação das dívidas, (II) adequar a cumulação de pedidos realizadas, sem prejuízo à manutenção da audiência conciliatória aprazada para o mês de junho e (III) indicar quais contratos não possui para eventual análise do pedido de inversão do ônus da prova. Decorrido o prazo para emenda, retornem os autos conclusos para decisão de urgência. Natal/RN, 22 de abril de 2025. Daniella Simonetti Meira Pires de Araújo Juíza de Direito em substituição legal (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06)