Transnacional Transporte Nacional De Passageiros Ltda x Clidenes Oliveira Das Chagas e outros

Número do Processo: 0852098-48.2020.8.15.2001

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJPB
Classe: APELAçãO CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 2ª Câmara Cível
Última atualização encontrada em 16 de julho de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 16/07/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluizio Bezerra ACÓRDÃO AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Des. Aluizio Bezerra Filho Agravante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) Agravados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. INADEQUAÇÃO RECURSAL. ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DA FUNGIBILIDADE. INADMISSIBILIDADE. I. CASO EM EXAME 1. Agravo interno interposto contra acórdão que negou provimento à apelação cível em ação de reparação de danos. A parte agravante questiona a manutenção dos danos morais, o não condicionamento da indenização à devolução do veículo e requer, subsidiariamente, a redução do valor fixado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se é cabível agravo interno contra decisão colegiada (acórdão), à luz do art. 1.021 do CPC e da jurisprudência do STJ. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O agravo interno é recurso cabível apenas contra decisões monocráticas, sendo inadmissível sua interposição contra acórdão. 4. O uso inadequado da via recursal configura erro grosseiro, o que impede a aplicação do princípio da fungibilidade. 5. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido da inadmissibilidade do agravo interno contra decisões colegiadas, sendo cabível a aplicação de multa nos termos do art. 1.021, §4º, do CPC em caso de interposição abusiva. 6. A pretensão recursal viola os limites legais do sistema recursal e não comporta conhecimento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo interno julgado inadmissível. Recurso não conhecido. Tese de julgamento: “1. É inadmissível agravo interno contra decisão colegiada, por ausência de previsão legal. 2. A interposição de recurso inadequado constitui erro grosseiro, insuscetível de correção por fungibilidade recursal.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CPC, art. 1.021, caput e §4º. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 13.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 10.03.2023. RELATÓRIO Trata-se de Agravo Interposto pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda contra o Acórdão (id. 34328072) que negou provimento à Apelação (id. 32087784) interposta pelo agravante em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira nos autos da Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros. O agravante sustenta (id. 34807623), em síntese, que o acórdão contrariou os princípios da boa-fé, da reparação integral e da vedação ao enriquecimento sem causa. Assim, pretende: i) a exclusão dos danos morais, por ausência de prova robusta do abalo moral ou lesões relevantes decorrentes do acidente; ii) o restabelecimento da exigência de devolução do veículo avariado como condição para pagamento da indenização. Subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório e, caso não seja determinada a entrega do veículo, ocorra a dedução do valor residual do veículo da indenização material. Contrarrazões apresentadas (id. 35408179). É o relatório. VOTO: Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Nos termos do art. 1.021 do Código de Processo Civil, o agravo interno é recurso destinado exclusivamente à impugnação de decisões monocráticas proferidas pelo relator, não se prestando à revisão de deliberações colegiadas. A redação do dispositivo é clara ao dispor que “contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado”, sendo essa a sua finalidade precípua, nos limites definidos pelo legislador. A literalidade da norma, portanto, exclui expressamente a utilização desse recurso contra decisões emanadas de órgãos colegiados, o que impede qualquer interpretação extensiva ou analógica que lhe amplie o alcance. Esse entendimento não é apenas doutrinário, mas se encontra sedimentado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A Corte tem reiteradamente afirmado que a interposição de agravo interno contra acórdão configura erro grosseiro, insuscetível de correção com base no princípio da fungibilidade recursal. No julgamento do AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, relatado pelo Ministro Gurgel de Faria, ficou consignado que não há previsão legal para agravo interno contra decisão colegiada, e que tal conduta processual caracteriza erro grave, o que inviabiliza o conhecimento do recurso. No mesmo sentido, o AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, sob relatoria do Ministro Humberto Martins: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. NÃO CABIMENTO . ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. ART . 1.021, § 4º, DO CPC. CABIMENTO. 1 . Não é cabível a interposição de agravo interno contra acórdão, tratando-se de erro grosseiro e sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. 2. É aplicável no caso a multa prevista no art. 1 .021, § 4º, do CPC, que fixo em 1% do valor atualizado da causa, e determino a certificação do trânsito em julgado e a baixa imediata dos autos.Agravo interno não conhecido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 2263480 CE 2022/0386810-2, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024). Nesse ponto, sobreleva destacar que eventual tentativa de sustentar a admissibilidade do recurso com base no princípio da fungibilidade também não se sustentaria. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, a aplicação da fungibilidade pressupõe a existência de dúvida objetiva e plausível quanto ao recurso cabível, o que não se verifica no caso concreto, dada a clareza do regramento aplicável. O precedente firmado no AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti, é taxativo ao concluir que o erro grosseiro impede a conversão do recurso, especialmente quando há evidente incompatibilidade entre o instrumento utilizado e o previsto em lei. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE . INTERPOSIÇÃO CONTRA PROVIMENTO JURISDICIONAL COLEGIADO. INADMISSIBILIDADE. ABUSO DO DIREITO DE RECORRER. MULTA . NÃO CONHECIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à inadmissibilidade de agravo interno contra acórdão, revelando-se, ademais, impossibilitada a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, por constituir erro grosseiro. Precedentes . 2. Abuso de direito de recorrer tendo em vista reiterados recursos não conhecidos e ausência de rebate aos argumentos apresentados para o seu não conhecimento. Precedentes. 3 . Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa. (STJ - AgInt no AgInt no AgInt no AREsp: 1912677 GO 2021/0175524-8, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 06/03/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/03/2023). A pretensão recursal, portanto, não encontra respaldo nem no texto legal, nem na construção jurisprudencial consolidada. Trata-se de tentativa de insurgência que ignora os limites objetivos do agravo interno, desconsidera a técnica processual adequada e afronta os precedentes pacificados pelas Cortes Superiores. A utilização inadequada do recurso compromete a coerência do sistema recursal e gera insegurança jurídica, razão pela qual sua admissibilidade deve ser rigidamente controlada. Diante de todo o exposto, considerando a expressa disposição legal, a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça e a inviabilidade de aplicação do princípio da fungibilidade diante da configuração de erro grosseiro, imperiosa a imposição de inadmissibilidade do presente agravo interno. Ante o exposto, JULGO INADMISSÍVEL O AGRAVO INTERNO E DELE NÃO CONHEÇO. É como voto. Des. Aluizio Bezerra Filho Relator
  3. 16/07/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluizio Bezerra ACÓRDÃO AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Des. Aluizio Bezerra Filho Agravante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) Agravados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. INADEQUAÇÃO RECURSAL. ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DA FUNGIBILIDADE. INADMISSIBILIDADE. I. CASO EM EXAME 1. Agravo interno interposto contra acórdão que negou provimento à apelação cível em ação de reparação de danos. A parte agravante questiona a manutenção dos danos morais, o não condicionamento da indenização à devolução do veículo e requer, subsidiariamente, a redução do valor fixado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se é cabível agravo interno contra decisão colegiada (acórdão), à luz do art. 1.021 do CPC e da jurisprudência do STJ. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O agravo interno é recurso cabível apenas contra decisões monocráticas, sendo inadmissível sua interposição contra acórdão. 4. O uso inadequado da via recursal configura erro grosseiro, o que impede a aplicação do princípio da fungibilidade. 5. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido da inadmissibilidade do agravo interno contra decisões colegiadas, sendo cabível a aplicação de multa nos termos do art. 1.021, §4º, do CPC em caso de interposição abusiva. 6. A pretensão recursal viola os limites legais do sistema recursal e não comporta conhecimento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo interno julgado inadmissível. Recurso não conhecido. Tese de julgamento: “1. É inadmissível agravo interno contra decisão colegiada, por ausência de previsão legal. 2. A interposição de recurso inadequado constitui erro grosseiro, insuscetível de correção por fungibilidade recursal.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CPC, art. 1.021, caput e §4º. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 13.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 10.03.2023. RELATÓRIO Trata-se de Agravo Interposto pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda contra o Acórdão (id. 34328072) que negou provimento à Apelação (id. 32087784) interposta pelo agravante em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira nos autos da Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros. O agravante sustenta (id. 34807623), em síntese, que o acórdão contrariou os princípios da boa-fé, da reparação integral e da vedação ao enriquecimento sem causa. Assim, pretende: i) a exclusão dos danos morais, por ausência de prova robusta do abalo moral ou lesões relevantes decorrentes do acidente; ii) o restabelecimento da exigência de devolução do veículo avariado como condição para pagamento da indenização. Subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório e, caso não seja determinada a entrega do veículo, ocorra a dedução do valor residual do veículo da indenização material. Contrarrazões apresentadas (id. 35408179). É o relatório. VOTO: Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Nos termos do art. 1.021 do Código de Processo Civil, o agravo interno é recurso destinado exclusivamente à impugnação de decisões monocráticas proferidas pelo relator, não se prestando à revisão de deliberações colegiadas. A redação do dispositivo é clara ao dispor que “contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado”, sendo essa a sua finalidade precípua, nos limites definidos pelo legislador. A literalidade da norma, portanto, exclui expressamente a utilização desse recurso contra decisões emanadas de órgãos colegiados, o que impede qualquer interpretação extensiva ou analógica que lhe amplie o alcance. Esse entendimento não é apenas doutrinário, mas se encontra sedimentado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A Corte tem reiteradamente afirmado que a interposição de agravo interno contra acórdão configura erro grosseiro, insuscetível de correção com base no princípio da fungibilidade recursal. No julgamento do AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, relatado pelo Ministro Gurgel de Faria, ficou consignado que não há previsão legal para agravo interno contra decisão colegiada, e que tal conduta processual caracteriza erro grave, o que inviabiliza o conhecimento do recurso. No mesmo sentido, o AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, sob relatoria do Ministro Humberto Martins: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. NÃO CABIMENTO . ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. ART . 1.021, § 4º, DO CPC. CABIMENTO. 1 . Não é cabível a interposição de agravo interno contra acórdão, tratando-se de erro grosseiro e sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. 2. É aplicável no caso a multa prevista no art. 1 .021, § 4º, do CPC, que fixo em 1% do valor atualizado da causa, e determino a certificação do trânsito em julgado e a baixa imediata dos autos.Agravo interno não conhecido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 2263480 CE 2022/0386810-2, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024). Nesse ponto, sobreleva destacar que eventual tentativa de sustentar a admissibilidade do recurso com base no princípio da fungibilidade também não se sustentaria. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, a aplicação da fungibilidade pressupõe a existência de dúvida objetiva e plausível quanto ao recurso cabível, o que não se verifica no caso concreto, dada a clareza do regramento aplicável. O precedente firmado no AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti, é taxativo ao concluir que o erro grosseiro impede a conversão do recurso, especialmente quando há evidente incompatibilidade entre o instrumento utilizado e o previsto em lei. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE . INTERPOSIÇÃO CONTRA PROVIMENTO JURISDICIONAL COLEGIADO. INADMISSIBILIDADE. ABUSO DO DIREITO DE RECORRER. MULTA . NÃO CONHECIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à inadmissibilidade de agravo interno contra acórdão, revelando-se, ademais, impossibilitada a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, por constituir erro grosseiro. Precedentes . 2. Abuso de direito de recorrer tendo em vista reiterados recursos não conhecidos e ausência de rebate aos argumentos apresentados para o seu não conhecimento. Precedentes. 3 . Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa. (STJ - AgInt no AgInt no AgInt no AREsp: 1912677 GO 2021/0175524-8, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 06/03/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/03/2023). A pretensão recursal, portanto, não encontra respaldo nem no texto legal, nem na construção jurisprudencial consolidada. Trata-se de tentativa de insurgência que ignora os limites objetivos do agravo interno, desconsidera a técnica processual adequada e afronta os precedentes pacificados pelas Cortes Superiores. A utilização inadequada do recurso compromete a coerência do sistema recursal e gera insegurança jurídica, razão pela qual sua admissibilidade deve ser rigidamente controlada. Diante de todo o exposto, considerando a expressa disposição legal, a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça e a inviabilidade de aplicação do princípio da fungibilidade diante da configuração de erro grosseiro, imperiosa a imposição de inadmissibilidade do presente agravo interno. Ante o exposto, JULGO INADMISSÍVEL O AGRAVO INTERNO E DELE NÃO CONHEÇO. É como voto. Des. Aluizio Bezerra Filho Relator
  4. 16/07/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluizio Bezerra ACÓRDÃO AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Des. Aluizio Bezerra Filho Agravante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) Agravados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. INADEQUAÇÃO RECURSAL. ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DA FUNGIBILIDADE. INADMISSIBILIDADE. I. CASO EM EXAME 1. Agravo interno interposto contra acórdão que negou provimento à apelação cível em ação de reparação de danos. A parte agravante questiona a manutenção dos danos morais, o não condicionamento da indenização à devolução do veículo e requer, subsidiariamente, a redução do valor fixado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em saber se é cabível agravo interno contra decisão colegiada (acórdão), à luz do art. 1.021 do CPC e da jurisprudência do STJ. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O agravo interno é recurso cabível apenas contra decisões monocráticas, sendo inadmissível sua interposição contra acórdão. 4. O uso inadequado da via recursal configura erro grosseiro, o que impede a aplicação do princípio da fungibilidade. 5. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido da inadmissibilidade do agravo interno contra decisões colegiadas, sendo cabível a aplicação de multa nos termos do art. 1.021, §4º, do CPC em caso de interposição abusiva. 6. A pretensão recursal viola os limites legais do sistema recursal e não comporta conhecimento. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo interno julgado inadmissível. Recurso não conhecido. Tese de julgamento: “1. É inadmissível agravo interno contra decisão colegiada, por ausência de previsão legal. 2. A interposição de recurso inadequado constitui erro grosseiro, insuscetível de correção por fungibilidade recursal.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CPC, art. 1.021, caput e §4º. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 13.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 15.05.2024; STJ, AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe 10.03.2023. RELATÓRIO Trata-se de Agravo Interposto pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda contra o Acórdão (id. 34328072) que negou provimento à Apelação (id. 32087784) interposta pelo agravante em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira nos autos da Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros. O agravante sustenta (id. 34807623), em síntese, que o acórdão contrariou os princípios da boa-fé, da reparação integral e da vedação ao enriquecimento sem causa. Assim, pretende: i) a exclusão dos danos morais, por ausência de prova robusta do abalo moral ou lesões relevantes decorrentes do acidente; ii) o restabelecimento da exigência de devolução do veículo avariado como condição para pagamento da indenização. Subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório e, caso não seja determinada a entrega do veículo, ocorra a dedução do valor residual do veículo da indenização material. Contrarrazões apresentadas (id. 35408179). É o relatório. VOTO: Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Nos termos do art. 1.021 do Código de Processo Civil, o agravo interno é recurso destinado exclusivamente à impugnação de decisões monocráticas proferidas pelo relator, não se prestando à revisão de deliberações colegiadas. A redação do dispositivo é clara ao dispor que “contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado”, sendo essa a sua finalidade precípua, nos limites definidos pelo legislador. A literalidade da norma, portanto, exclui expressamente a utilização desse recurso contra decisões emanadas de órgãos colegiados, o que impede qualquer interpretação extensiva ou analógica que lhe amplie o alcance. Esse entendimento não é apenas doutrinário, mas se encontra sedimentado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A Corte tem reiteradamente afirmado que a interposição de agravo interno contra acórdão configura erro grosseiro, insuscetível de correção com base no princípio da fungibilidade recursal. No julgamento do AgInt nos EDcl no REsp 1891836/SP, relatado pelo Ministro Gurgel de Faria, ficou consignado que não há previsão legal para agravo interno contra decisão colegiada, e que tal conduta processual caracteriza erro grave, o que inviabiliza o conhecimento do recurso. No mesmo sentido, o AgInt no AgInt no AREsp 2263480/CE, sob relatoria do Ministro Humberto Martins: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO INTERPOSTO CONTRA ACÓRDÃO. NÃO CABIMENTO . ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. MULTA. ART . 1.021, § 4º, DO CPC. CABIMENTO. 1 . Não é cabível a interposição de agravo interno contra acórdão, tratando-se de erro grosseiro e sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. 2. É aplicável no caso a multa prevista no art. 1 .021, § 4º, do CPC, que fixo em 1% do valor atualizado da causa, e determino a certificação do trânsito em julgado e a baixa imediata dos autos.Agravo interno não conhecido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 2263480 CE 2022/0386810-2, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024). Nesse ponto, sobreleva destacar que eventual tentativa de sustentar a admissibilidade do recurso com base no princípio da fungibilidade também não se sustentaria. Conforme jurisprudência pacífica do STJ, a aplicação da fungibilidade pressupõe a existência de dúvida objetiva e plausível quanto ao recurso cabível, o que não se verifica no caso concreto, dada a clareza do regramento aplicável. O precedente firmado no AgInt no AgInt no AgInt no AREsp 1912677/GO, relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti, é taxativo ao concluir que o erro grosseiro impede a conversão do recurso, especialmente quando há evidente incompatibilidade entre o instrumento utilizado e o previsto em lei. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE . INTERPOSIÇÃO CONTRA PROVIMENTO JURISDICIONAL COLEGIADO. INADMISSIBILIDADE. ABUSO DO DIREITO DE RECORRER. MULTA . NÃO CONHECIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à inadmissibilidade de agravo interno contra acórdão, revelando-se, ademais, impossibilitada a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, por constituir erro grosseiro. Precedentes . 2. Abuso de direito de recorrer tendo em vista reiterados recursos não conhecidos e ausência de rebate aos argumentos apresentados para o seu não conhecimento. Precedentes. 3 . Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa. (STJ - AgInt no AgInt no AgInt no AREsp: 1912677 GO 2021/0175524-8, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 06/03/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/03/2023). A pretensão recursal, portanto, não encontra respaldo nem no texto legal, nem na construção jurisprudencial consolidada. Trata-se de tentativa de insurgência que ignora os limites objetivos do agravo interno, desconsidera a técnica processual adequada e afronta os precedentes pacificados pelas Cortes Superiores. A utilização inadequada do recurso compromete a coerência do sistema recursal e gera insegurança jurídica, razão pela qual sua admissibilidade deve ser rigidamente controlada. Diante de todo o exposto, considerando a expressa disposição legal, a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça e a inviabilidade de aplicação do princípio da fungibilidade diante da configuração de erro grosseiro, imperiosa a imposição de inadmissibilidade do presente agravo interno. Ante o exposto, JULGO INADMISSÍVEL O AGRAVO INTERNO E DELE NÃO CONHEÇO. É como voto. Des. Aluizio Bezerra Filho Relator
  5. 16/07/2025 - Documento obtido via DJEN
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  6. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  7. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  8. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  9. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  10. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  11. 26/06/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 20º SESSÃO ORDINÁRIA VIRTUAL DA SEGUNDA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL, da 2ª Câmara Cível, a realizar-se de 07 de Julho de 2025, às 14h00 , até 14 de Julho de 2025.
  12. 21/05/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE JUSTIÇA GERÊNCIA JUDICIÁRIA Processo nº 0852098-48.2020.8.15.2001 APELANTE: TRANSNACIONAL TRANSPORTE NACIONAL DE PASSAGEIROS LTDA, CLIDENES OLIVEIRA DAS CHAGAS, GEISE INGRID BATISTA DE MEDEIROS APELADO: CLIDENES OLIVEIRA DAS CHAGAS, GEISE INGRID BATISTA DE MEDEIROS, TRANSNACIONAL TRANSPORTE NACIONAL DE PASSAGEIROS LTDA I N T I M A Ç Ã O Intimação da(s) parte(s) agravada(s), por meio de seu(s) advogado(s), para apresentar contrarrazões ao agravo interno, nos termos do art. 1.021, §2º, CPC. Gerência Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, João Pessoa, 20 de maio de 2025 .
  13. 21/05/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA PARAÍBA TRIBUNAL DE JUSTIÇA GERÊNCIA JUDICIÁRIA Processo nº 0852098-48.2020.8.15.2001 APELANTE: TRANSNACIONAL TRANSPORTE NACIONAL DE PASSAGEIROS LTDA, CLIDENES OLIVEIRA DAS CHAGAS, GEISE INGRID BATISTA DE MEDEIROS APELADO: CLIDENES OLIVEIRA DAS CHAGAS, GEISE INGRID BATISTA DE MEDEIROS, TRANSNACIONAL TRANSPORTE NACIONAL DE PASSAGEIROS LTDA I N T I M A Ç Ã O Intimação da(s) parte(s) agravada(s), por meio de seu(s) advogado(s), para apresentar contrarrazões ao agravo interno, nos termos do art. 1.021, §2º, CPC. Gerência Judiciária do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, João Pessoa, 20 de maio de 2025 .
  14. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  15. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  16. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  17. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  18. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  19. 17/04/2025 - Intimação
    Órgão: 2ª Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Gabinete Des. Aluízio Bezerra Filho ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0852098-48.2020.8.15.2001 Origem: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira Relator: Exmo. Des. Aluízio Bezerra Filho Apelantes/Apelados: Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros Advogados: Ana Karla Alves da Silva (OAB/PB n.º 27.468) e Pedro Igo Paiva Pinheiro (OAB/PB n.º 25.823) Apelado/Apelante: Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda Advogado: Aurinax Júnior Taveira dos Santos (OAB/PB n.º 13.995) EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANOS MORAIS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DEVOLUÇÃO DE VEÍCULO DANIFICADO. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME 1. Dupla apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos materiais, morais e lucros cessantes, decorrentes de acidente de trânsito envolvendo veículo da empresa ré. 2. Os apelantes Clidenes e Geise insurgem-se contra a exigência de devolução do veículo sinistrado, ausência de indenização por danos morais e aplicação de multa por litigância de má-fé. 3. A empresa Transnacional questiona a responsabilidade civil e a negativa de produção de prova pericial, além de alegar carência da ação pela ausência de apuração criminal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. Há cinco questões em discussão: (i) se a negativa de prova pericial configurou cerceamento de defesa; (ii) se há carência de ação pela falta de apuração criminal; (iii) se estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil; (iv) se é devida a indenização por danos morais e a forma de reparação por danos materiais; e, (v) se é cabível a condenação por litigância de má-fé em razão da interposição de embargos de declaração. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o acervo probatório é suficiente para o convencimento do juiz, conforme autoriza o art. 370 do CPC. 6. A responsabilidade civil é independente da esfera penal (art. 935 do CC), não se exigindo apuração criminal para o ajuizamento da ação reparatória. 7. A empresa ré responde objetivamente pelos danos causados por seu preposto (art. 932, III, do CC), comprovando-se nos autos que o acidente decorreu de sua conduta culposa, ao conduzir veículo na contramão. 8. Restou caracterizado o dano moral em razão da colisão, lesões corporais e presença de criança no veículo menor. Arbitrada indenização de R$ 8.000,00 para cada autor, com correção monetária e juros conforme súmulas 362 e 54 do STJ. 9. Inexistindo prova concreta dos lucros cessantes alegados, mantém-se a improcedência quanto a esse pedido. A indenização por danos materiais deve basear-se na Tabela FIPE da época do acidente, afastando-se a exigência de devolução do veículo danificado, por incompatibilidade com a lógica da responsabilidade civil extracontratual. 10. A interposição de embargos de declaração não foi manifestamente protelatória, devendo ser afastada a condenação por litigância de má-fé. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Rejeitam-se as preliminares da empresa apelante. No mérito, nega-se provimento à apelação da Transnacional e dá-se parcial provimento à apelação dos autores para: (i) afastar a exigência de devolução do veículo avariado; (ii) condenar a empresa ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais para cada autor; e (iii) excluir a multa por litigância de má-fé. Tese de julgamento: “1. A negativa de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando os autos permitem o julgamento da causa. 2. A responsabilidade civil independe de apuração criminal. 3. Configura-se o dano moral decorrente de acidente de trânsito com lesões corporais e envolvimento de criança. 4. Na responsabilidade extracontratual, não se pode condicionar a indenização à devolução do bem danificado. 5. A simples interposição de embargos de declaração, sem prova de intuito protelatório, não justifica condenação por litigância de má-fé.” DISPOSITIVOS RELEVANTES CITADOS: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186, 927, 932, III, 935, 944 e 786; CPC/2015, arts. 282, § 1º, 370 e 1.022; CTB, arts. 28, 29 e 34. JURISPRUDÊNCIA RELEVANTE CITADA: STJ, AgInt no AREsp 1897830/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, j. 19/09/2022; STJ, AgInt no AgInt no AREsp 661203/ES, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. 24/04/2023; STJ, REsp 1546163/GO, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, j. 05/05/2016; TJ-PB, AC 0800997-66.2020.8.15.0741, Rel. Des. Aluízio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível. RELATÓRIO Trata-se de dupla Apelação Cível interpostas por Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros e pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda, contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira que julgou parcialmente procedente a Ação de Reparação de Danos Materiais, Morais e Lucro Cessante proposta pelos primeiros apelantes em face da segunda apelante. Após interposição de Embargos de Declaração por ambas as partes (id. 32087763, 32087763 e 32087770), a empresa recorrente foi condenada ao pagamento de danos materiais em favor de Clidenes e Geise, em decorrência de acidente de trânsito envolvendo um de seus prepostos, mediante a entrega, por estes, do veículo avariado (id. 32087768). Os outrora autores, por sua vez, foram condenados a pagar multa por litigância de má-fé, no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, pela interposição de embargos de natureza meramente protelatória (id. 32087780). Em sua apelação Clidenes e Geise (id. 32087781) aduzem, em síntese, que em setembro de 2020 se envolveram em um acidente de trânsito com veículo da Transnacional, do qual lhes resultou prejuízo material, moral e de lucros cessantes. Não obstante, apontam que o juízo a quo, ao determinar a entrega do veículo dos apelantes à Transnacional – após o pagamento do montante fixado a título de danos materiais – deixou de considerar a dívida remanescente de financiamento do veículo sinistrado, de modo que o valor arbitrado se mostra insuficiente ao ressarcimento do prejuízo patrimonial experimentado. Apontam, também, a necessidade de revisão da condenação em litigância de má-fé, sob o argumento de que os Embargos de Declaração opostos tinham o intuito legítimo de sanar omissões relevantes. Ademais, renovaram o pedido de gratuidade judiciária, notadamente para que seja suspensa a condenação ao pagamento da multa arbitrada na sentença. Contrarrazões apresentadas (id. 32087790). A Transnacional (id. 32087784) apresenta duas preliminares: i) de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, pela negativa de prova pericial; e, ii) de carência da ação, haja vista a inexistência de apuração dos fatos na esfera criminal. No mérito, defende que a dinâmica do acidente demonstra que a colisão ocorreu exclusivamente em razão da conduta dos apelados, circunstância que afasta qualquer dever reparatório. Contrarrazões apresentadas (id. 32974458). Ausente intimação do Ministério Público do Estado da Paraíba por não estarem presentes quaisquer das hipóteses do art. 178 do CPC/15. É o relatório. VOTO: Exmo. Des. Aluizio Bezerra Filho (Relator) Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. Antes de adentrar ao mérito, passo à análise das preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., por força do princípio da primazia da apreciação dessas questões processuais. I. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA Sustenta a apelante Transnacional que a negativa de produção de prova pericial pelo juízo a quo configurou cerceamento de defesa, violando os princípios do contraditório e da ampla defesa. Sem razão, todavia. É que ao magistrado, na condição de destinatário final das provas em uma ação judicial, incumbe avaliar, com base nos elementos já constantes dos autos e na controvérsia apresentada, a necessidade e a utilidade da produção probatória requerida. Esse poder discricionário encontra respaldo no art. 370 do CPC/15, que atribui ao juiz o dever de conduzir o processo de forma eficiente e de evitar a realização de diligências desnecessárias. Desse modo, eventual indeferimento de provas não importará, por si só, nulidade da sentença, mormente porque, a nulidade processual por cerceamento de defesa pressupõe a demonstração de prejuízo, conforme preconizado no princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 282, § 1º, do CPC/15. Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a ausência de produção de prova pericial não configura nulidade se o conjunto probatório constante dos autos já se mostrar suficiente para a formação do convencimento do magistrado: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA E DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA. SÚMULA N. 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o julgador, destinatário final da prova, pode, de maneira fundamentada, indeferir a realização de provas e diligências protelatórias, desnecessárias ou impertinentes. (...) 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento firmado no sentido de que não há cerceamento de defesa quando o julgador considera desnecessária a produção de prova, mediante a existência nos autos de elementos suficientes para a formação de seu convencimento. Precedentes.Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AgInt no AREsp: 661203 ES 2015/0028065-9, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/04/2023). Destaquei. No que tange especificamente às perícias, o diploma processual estabelece que a prova técnica poderá ser determinada quando a apuração dos fatos depender de conhecimento técnico ou científico (art. 156, CPC/15). Assim, a negativa da produção de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório já constante dos autos se revela suficiente para a formação do convencimento do magistrado. No caso em análise, conquanto não tenha sido realizada perícia para apurar a dinâmica do abalroamento, verifica-se que o juízo sentenciante fundamentou sua decisão nas provas documentais, testemunhais e fotográficas constantes dos autos, considerando-as suficientes para o julgamento do mérito. Firmou seu convencimento, até mesmo, em mais de uma oportunidade. Veja-se: “[...] Da análise da prova colhida nos autos, tenho que caracterizada a culpa exclusiva do preposto da promovida pelo sinistro. Em que pese não ter sido realizado Boletim de Acidente de Trânsito pela autoridade policial responsável, a testemunha arrolada pela própria demandada atesta a conduta imprudente do motorista do ônibus, que avançou na faixa contrária, supostamente para evitar a batida na traseira de outro veículo: “(…) eu sou o gerente de operação da empresa e quando ocorre um acidente de trânsito ou alguma ocorrência com os meus motoristas, eles entram em contato com a empresa e a gente encaminha uma pessoa pra lá e a gente vai até o local pra dar toda a assistência (…) quando eu cheguei lá tinha o motorista e mais dois envolvidos, na verdade, foi um ônibus e mais dois carros (…) o veículo, uma senhora lá estancou o carro por algum motivo, parou repentinamente e ele, pra evitar uma acidente mais grave, ele tentou livrar e passar por ela, porque ela estava estancada lá, com algum problema mecânico e isso ele vinha em sentido contrário e houve o choque (…) o ônibus ficou entre as faixas (…)” - Testemunha ALISSON RICARTTE SIMÕES DE SOUZA (IDs 72279348/72280107). Tal situação é corroborada com as fotografias acostadas no ID 35842896, em que se observa o ônibus com sua frente em parte da via contrária, ou seja, na contramão. Observa-se que o ônibus entrou abruptamente na contramão, sem observar a vinda do carro da parte autora, violando a norma do art. 34 do Código de Trânsito Brasileiro, que é bem clara: (...) Ressalte-se que a dinâmica do acidente pode ser aferida pela prova testemunhal, (...) Essas são as principais razões que formam o convencimento de que o promovido, em desrespeito às normas básicas de prudência, invadiu a via que transitava o veículo dos demandantes, dando cabo ao evento danoso.” Destaquei. Portanto, como a Transnacional não demonstrou de forma clara e objetiva como a ausência da prova pericial impediu o adequado exame dos fatos, entendo que a preliminar não merece prosperar, sobretudo por inexistir demonstração de prejuízo processual relevante. II. DA PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA AUSÊNCIA DE APURAÇÃO CRIMINAL A apelante Transnacional sustenta, ainda, que a ausência de apuração criminal sobre os fatos que ensejaram a presente demanda configuraria carência da ação, por falta de interesse de agir. A presente alegação não merece acolhida. Ora, conforme disciplina o art. 935 do Código Civil e o art. 66 do Código de Processo Penal, a responsabilidade civil é independente da criminal, salvo nos casos de absolvição criminal fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria. Ou seja, a falta de apuração criminal da conduta do causador de um dano no âmbito cível não implica a exclusão de sua responsabilidade nessa esfera. Ademais, não se pode desconsiderar que a responsabilidade civil da Transnacional - empregadora do motorista envolvido no acidente - tem natureza objetiva (art. 932, inciso III, do CC/02), prescinde-se a apuração criminal para a verificação do dever reparatório, bastando a demonstração do nexo entre a conduta do agente e os danos sofridos. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ART. 935 DO CC. INDEPENDÊNCIA RELATIVA ENTRE AS INSTÂNCIAS. SENTENÇA PENAL. NÃO VINCULAÇÃO DO JUÍZO CÍVEL. PRECEDENTES. SÚMULA 568 DO STJ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NO ACÓRDÃO RECORRIDO QUANTO À CULPA DO MOTORISTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a responsabilidade civil é independente da criminal, não interferindo no andamento da ação de reparação de danos que tramita no juízo cível eventual absolvição por sentença criminal que não ilide a autoria ou a existência do fato. (...) (STJ - AgInt no REsp: 1897830 RS 2020/0252267-0, Data de Julgamento: 19/09/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/09/2022). Destaquei. Este é igualmente o entendimento desta Corte.: REMESSA NECESSÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. TRANSPORTE ESCOLAR. PRELIMINARES. SOBRESTAMENTO DA AÇÃO CÍVEL ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DE AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE. REJEIÇÃO - A responsabilidade civil independe da criminal, conforme preceitua o artigo 935 do Código Civil - No caso em concreto, vislumbra-se que, para efeitos civis, as provas produzidas nos autos são suficientes para apreciar a responsabilidade da parte promovida, não subsistindo motivos para atender o pleito de sobrestamento do feito. (TJ-PB 00022882420128150351 PB, Relator: DES. OSWALDO TRIGUEIRO DO VALLE FILHO, Data de Julgamento: 14/05/2019, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. Não bastasse isso, a responsabilidade da Transnacional, na qualidade de concessionária de serviço público de transporte, encontra fundamento no art. 37, § 6º da Constituição Federal, que consagra a teoria do risco administrativo, de acordo com a qual dispensa-se a análise de culpa, exigindo apenas a demonstração do dano e do nexo causal entre este e a conduta do agente público. Dessa forma, não há que se falar em carência da ação, uma vez que a ausência de apuração criminal dos fatos não inviabiliza o exercício da jurisdição cível. III. MÉRITO Superadas essas premissas, passa-se ao deslinde do objeto litigioso, cujo exame gira em torno, essencialmente, do reconhecimento dos pressupostos da responsabilidade civil no caso concreto e, em consequência, do dever de indenizar. In casu, não obstante as razões apresentadas pela empresa apelante/apelada, o conjunto probatório é robusto em demonstrar que a colisão decorreu de conduta imprudente do preposto da ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção ao tentar uma ultrapassagem, em clara violação ao art. 186 do Código Civil e aos arts. 28 e 29 do Código de Trânsito Brasileiro. As provas documentais, notadamente o boletim de ocorrência, e fotográficas, corroboradas pelos depoimentos testemunhais colhidos sob o crivo do contraditório, não deixam margem para dúvidas quanto à dinâmica do acidente. Desse modo, incontroversa a responsabilidade da empresa recorrida pelo evento danoso, impõe-se a análise individualizada dos danos alegados e da extensão da reparação cabível, em consonância com o disposto no art. 944 do Código Civil. No presente caso, os recorrentes Clidenes e Geise pugnam pela condenação da Transnacional ao pagamento de indenização por danos morais, materiais e lucros cessantes. Quanto aos danos morais, divirjo respeitosamente do entendimento exarado pelo juízo de primeiro grau. Isso porque, embora o mero envolvimento em acidente de trânsito, por si só, não enseje automaticamente reparação por danos morais, como bem apontado pelo juízo a quo, o caso concreto apresenta circunstâncias particulares que justificam a procedência desse pedido. Em primeiro lugar, ressalte-se que as provas dos autos demonstram que o acidente ocorreu por conduta culposa do preposto da empresa ré, que conduzia o ônibus na contramão de direção durante uma ultrapassagem, violando regras básicas de segurança previstas no Código de Trânsito Brasileiro, conforme se infere nas fotos da colisão (id. 32087414). Outrossim, as fotografias acostadas aos autos (id. 32087412) evidenciam que o impacto causou lesões corporais aos ocupantes do veículo dos autores, incluindo uma criança com ferimento na região da boca e escoriações nas pernas. Ainda que não haja laudos médicos formais, o entendimento jurisprudencial dominante é no sentido de que as lesões corporais decorrentes de acidente de trânsito, ainda que de natureza leve, extrapolam a esfera dos meros aborrecimentos, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da vítima. Deve-se considerar, também, que o acidente objeto deste apelo envolveu um veículo de passeio e um ônibus, situação que, pela desproporção dos veículos, além de ter provocado lesão à integridade física dos envolvidos - como se comprovou no conjunto probatório carreado aos autos -, naturalmente causa intenso temor e abalo psicológico aos ocupantes do automóvel menor, especialmente quando havia uma criança no veículo. Destarte, presentes os requisitos necessários ao reconhecimento da existência do dano moral indenizável, sobrevém a tarefa de sua quantificação. Nesse ponto, destaco que não há no ordenamento jurídico brasileiro uma “régua” ou fórmula matemática que oriente essa valoração, o que decorre da própria natureza extrapatrimonial desse tipo de dano. Não obstante, a quantificação deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando: a gravidade do fato; a intensidade do sofrimento da vítima; a culpabilidade do agente; eventual culpa concorrente; e as condições econômicas de ambas as partes. No caso vertente, considerando a gravidade da conduta do preposto da ré, que dirigia na contramão durante uma ultrapassagem; o abalo psicológico sofrido pelas vítimas em razão do acidente com um veículo de porte significativamente superior; as lesões físicas evidenciadas pelas fotografias constantes nos autos; a presença de uma criança no interior do veículo; bem como os parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, reputo adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada um dos autores (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08009976620208150741, Relator.: Des. Aluizio Bezerra Filho, 2ª Câmara Cível; TJ-PB - APL: 00033017920108150011 0003301-79.2010.815 .0011, Relator.: Des. João Alves da Silva, Data de Julgamento: 02/08/2016, 4ª Câmara Cível). O montante ora estabelecido afigura-se proporcional à extensão do dano, suficiente para compensar o sofrimento experimentado, sem caracterizar enriquecimento indevido, além de atender satisfatoriamente à função pedagógica da reparação civil, desestimulando a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor. No que tange aos lucros cessantes, também não há comprovação de que o veículo acidentado fosse utilizado pelos apelantes, Clidenes e Geise, como instrumento essencial ou indispensável para suas atividades profissionais, como ocorreria, por exemplo, se exercessem ofícios notoriamente dependentes de automóvel, tais como taxistas, motoristas de aplicativos, entregadores, fretistas ou representantes comerciais. As fotografias juntadas à inicial (id. 32087413) podem, quando muito, sugerir que os autores eventualmente utilizavam o veículo em algumas situações pontuais relacionadas ao trabalho, como em entregas esporádicas de equipamentos de som aos clientes, mas não demonstram que tal uso constituía a fonte principal ou significativa de sua renda, nem que a indisponibilidade temporária do automóvel tenha efetivamente comprometido sua subsistência ou acarretado prejuízo econômico mensurável. Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1952675 SP) e deste sodalício é pacífica no sentido de que a configuração dos lucros cessantes exige prova robusta do que o credor razoavelmente deixou de lucrar, in verbis: APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES INOCORRENTE. PROVA INSUFICIENTE PARA APURAR O VALOR LÍQUIDO QUE OS AUTORES DEIXARAM DE AUFERIR. LUCRO CESSANTE QUE NÃO PODE SER PRESUMIDO, MAS, SIM, COMPROVADO. AUSÊNCIA DE PROVA DE FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INOBSERVÂNCIA AO ARTIGO 373, DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO - Para que ocorra a fixação de lucros cessantes deve existir a comprovação nos autos de forma contundente, devendo o autor provar fato constitutivo do seu direito, em obediência ao artigo 373, do CPC (...) (TJ-PB 0000949-56.2007.8.15.0011, Relator: DES. JOÃO ALVES DA SILVA, Data de Julgamento: 13/03/2018, 4ª Câmara Especializada Cível). Destaquei. No caso em exame, não obstante as alegações dos autores quanto aos prejuízos experimentados, os autos carecem de elementos probatórios concretos que permitam aferir, com segurança, a extensão das perdas financeiras decorrentes da privação do uso do veículo. A demonstração dos lucros cessantes demandaria, por exemplo, comprovação documental do faturamento médio anterior ao sinistro, contratos de prestação de serviço prejudicados pela impossibilidade de deslocamento, ou outros elementos que evidenciassem, de forma objetiva, o prejuízo alegado. Destarte, ante a ausência de prova concreta do quantum debeatur, impõe-se a manutenção da sentença, neste ponto, quanto à improcedência do pedido de lucros cessantes, em observância ao princípio da vedação ao enriquecimento sem causa. Por outro lado, o prejuízo material efetivamente experimentado é manifesto (id. 32087412 a 32087415), de modo que escorreito o decisum objurgado quanto a isso. Também é pertinente a quantificação dos danos materiais com base na Tabela FIPE vigente à época do sinistro, por refletir o valor médio de mercado do veículo no momento do evento danoso, constituindo parâmetro objetivo e equânime para a fixação da indenização. Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que aponta que na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização deve observar a tabela vigente na data do sinistro e não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) (STJ - REsp: 1546163 GO 2014/0270914-7, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/05/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/05/2016). Assim, em respeito ao princípio indenitário que rege a matéria, o valor a ser considerado para fins de indenização deve ser aquele correspondente à época do acidente, evitando-se, com isso, a depreciação natural do bem que ocorreria com o passar do tempo até a efetiva liquidação. No entanto, merece reforma a sentença no que tange à determinação de devolução do veículo sinistrado à empresa ré. Com efeito, o regime jurídico da responsabilidade civil comum, disciplinado pelos arts. 927 e 944 do Código Civil, orienta-se pelo princípio da reparação integral do dano (restitutio in integrum). Esse princípio impõe que a indenização seja medida pela extensão do dano, visando restabelecer o equilíbrio rompido pelo ato ilícito mediante a recomposição do patrimônio da vítima ao estado anterior. Nesse contexto, a determinação de devolução do veículo sinistrado à Transnacional revela uma impropriedade jurídica que se distancia do princípio da reparação integral. Tal determinação representa, na verdade, uma indevida importação da lógica própria dos contratos de seguro, na qual a sub-rogação nos salvados está expressamente prevista no art. 786 do Código Civil. No âmbito da responsabilidade civil aquiliana, entretanto, não há previsão legal que ampare a exigência de que a vítima entregue o bem danificado ao causador do dano como condição para a reparação. Essa incongruência é mais evidente quando analisamos os fundamentos que norteiam a responsabilidade extracontratual. Enquanto no regime securitário a relação jurídica decorre de um contrato que estipula obrigações mútuas entre as partes, na responsabilidade extracontratual o vínculo jurídico nasce de um ato ilícito, cuja reparação visa exclusivamente corrigir os efeitos do dano causado, sem impor à vítima qualquer ônus adicional. A exigência de devolução do bem danificado, nessa hipótese, desvirtua completamente a natureza reparatória da indenização. Além disso, a imposição dessa medida à vítima acarreta sérias consequências jurídicas. Ao condicionar a reparação à devolução do bem danificado, transfere-se à vítima uma obrigação que não é compatível com o regime da responsabilidade civil extracontratual, mormente porque o primado da reparação integral exige que a vítima seja plenamente ressarcida, e não que suporte encargos adicionais. Outrossim, ao exigir a devolução do bem, inviabiliza-se a recomposição completa do patrimônio da vítima, especialmente quando o bem ainda guarda algum valor residual ou quando a vítima possui, por exemplo, expectativa legítima de aproveitar os componentes restantes do bem. Por derradeiro, essa medida também perpetua o desequilíbrio causado pelo ato ilícito, mantendo a vítima privada da propriedade do bem ou impondo-lhe a entrega forçada de algo que deveria compor seu patrimônio. Explico. Se o custo do reparo do veículo fosse inferior ao seu valor de mercado, calculado com base na tabela FIPE, a reparação deveria se limitar ao valor necessário para consertar o bem, sendo o veículo mantido na posse das vítimas do acidente. Essa solução seria compatível com o princípio da reparação integral, já que a indenização abrangeria apenas o montante necessário para restaurar o patrimônio da vítima sem desconsiderar o valor residual do bem. Contudo, ao condicionar a reparação à entrega do veículo avariado à Transnacional, a sentença não apenas contraria esse princípio, mas também impõe uma condição que subverte a lógica da responsabilidade civil extracontratual. Essa exigência desconsidera a autonomia patrimonial da vítima e perpetua os efeitos do ato ilícito, já que a reparação integral deve visar a recomposição total do patrimônio, e não a transferência de bens ao causador do dano. Por esses motivos, a determinação de devolução do veículo sinistrado à ré é incompatível com os fundamentos da responsabilidade civil comum e com o princípio da reparação integral. A indenização, nesse caso, deve ser exclusivamente pecuniária, contemplando o valor integral do dano material, sem condicionar ou subordinar a reparação à entrega do bem danificado. Esse entendimento alinha-se à lógica do art. 944 do Código Civil, que determina que a indenização seja proporcional à extensão do dano e direcionada à efetiva reparação do prejuízo suportado pela vítima. IV. DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Os apelantes Clidenes e Geise também recorreram contra a condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo de origem no percentual de 2% sobre o valor atualizado da causa, em razão da interposição de embargos de declaração que, segundo a sentença, teriam natureza meramente protelatória. Com efeito, a litigância de má-fé, conforme estabelecido na norma processual, configura-se, entre outros casos, quando a parte altera a verdade dos fatos, utiliza o processo para fins manifestamente ilegais ou se vale de recurso com intuito meramente protelatório. Contudo, a aplicação das penalidades decorrentes exige demonstração clara e objetiva de que a conduta processual da parte se enquadra em uma das hipóteses taxativamente previstas. In casu, a análise dos embargos de declaração apresentados pelos apelantes revela que, embora tenham sido rejeitados pelo juízo de primeiro grau, eles buscavam, em tese, esclarecer pontos que, no entendimento das partes, apresentavam omissão na sentença. Ainda que os fundamentos apresentados nos embargos não tenham sido acolhidos, não se pode concluir, com a segurança necessária, que foram manejados com intuito doloso ou exclusivamente protelatório. Portanto, inexistindo nos autos elementos que demonstrem de forma inequívoca que os embargos de declaração opostos pelos apelantes configuraram má-fé processual, impõe-se a exclusão da penalidade aplicada. Ante o exposto: a) REJEITO as preliminares arguidas pela Transnacional Transporte Nacional de Passageiros Ltda., e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à Apelação da empresa; b) DOU PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de Clidenes Oliveira das Chagas e Geise Ingrid Batista de Medeiros para: i) afastar a exigência de entrega do veículo avariado como condição ao recebimento da indenização pecuniária imposta na sentença em desfavor da empresa apelada; ii) condenar a empresa apelada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) a título de indenização por danos morais, a cada um dos autores, com correção monetária a partir da data deste julgamento (Súmula n.º 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a contar da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), com incidência da taxa SELIC (REsp n.º 1.795.982/SP); e, iii) excluir a multa por litigância de má-fé; c) MANTENHO os honorários sucumbenciais nos termos fixados pela sentença, tendo em vista que já foram estabelecidos no patamar máximo de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. No entanto, em razão da parcial reforma da sentença, redistribuo os ônus sucumbenciais para condenar a empresa ré ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas processuais e honorários advocatícios, cabendo aos autores o pagamento dos 20% (vinte por cento) restantes, ressalvada a gratuidade de justiça concedida aos apelantes Clidenes e Geise. É como voto. Des. Aluízio Bezerra Filho Relator
  20. 17/04/2025 - Documento obtido via DJEN
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