Mariana Castro Da Silva x Famiglia Nino Comercio De Alimentos E Bebidas Ltda e outros
Número do Processo:
1000908-14.2024.5.02.0068
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRT2
Classe:
RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Grau:
1º Grau
Órgão:
Vice-Presidência Judicial
Última atualização encontrada em
10 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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26/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 10ª Turma | Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTAPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª TURMA Relator: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES ROT 1000908-14.2024.5.02.0068 RECORRENTE: MARIANA CASTRO DA SILVA RECORRIDO: FAMIGLIA NINO COMERCIO DE ALIMENTOS E BEBIDAS LTDA E OUTROS (1) Ficam as partes INTIMADAS quanto aos termos do v. Acórdão proferido nos presentes autos (#id:ac6bae5): PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª Turma PROCESSO nº 1000908-14.2024.5.02.0068 (ROT) RECORRENTE: MARIANA CASTRO DA SILVA RECORRIDOS: GIULIETTA FOGO & VINO COMERCIO DE ALIMENTOS E BEBIDAS LTDA, PORTO LUNA RESTAURANTE E LANCHONETE LTDA RELATOR: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES JUÍZA PROLATORA DA SENTENÇA: LUANA MADUREIRA DOS ANJOS RELATÓRIO Vistos, etc. A r. sentença (fl. 231 do PDF; ID. 24309c0), cujo relatório adoto, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista para condenar as reclamadas ao pagamento de compensação por dano moral, no importe de R$ 3.000,00, e honorários advocatícios sucumbenciais. Recurso ordinário da reclamante (fl. 242 do PDF; ID. 0fb5051) pleiteando a reforma da r. sentença quanto a nulidade do banco de horas, improcedência do pedido de horas extras, valor da indenização por danos morais, inclusive em razão de imposição de jornada de trabalho abusiva, e honorários advocatícios. Sem contrarrazões. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO V O T O I. Conheço do recurso, uma vez que estão presentes os pressupostos de admissibilidade. II. MÉRITO 1. Nulidade do banco de horas. Horas extras. Com relação às horas extras, domingos e feriados, bem como à nulidade do banco de horas, a r. sentença decidiu: "A petição inicial indica que a autora laborava com horários de entrada e saída variável, apontando, por amostragem, que no mês de novembro de 2023 " laborou com horários de entrada variável entre 08h00min e 10h50min e saiu entre os horários de 16h20min e 00h00min" e não folgou 4 vezes no mês, o que invalida, no seu entender, o acordo de compensação. Além disso, informa que o intervalo intrajornada era de uma hora, em regra, mas que já chegou a ser forçada a cumprir 3 horas de pausa intervalar. Como se nota, a reclamante não aponta qual era a média da jornada laborada ao longo do contrato, mas destaca que "como o controle de jornada da Reclamante era feito através de cartão ponto, o excesso de horas extras ou devidas à Reclamante deverão ser demonstradas pelas Reclamadas e da apresentação de tais documentos confrontando com os holerites, extrair-se-á, a quantidade de horas extras não pagas", o que indica que a jornada laborada era efetivamente consignada nos controles de ponto. Em depoimento pessoal, a autora afirmou que "não registrava corretamente a jornada de trabalho (...) que, na verdade, podia registrar corretamente sua jornada no ponto, mas geralmente estava quebrado e lhe reclamada dada uma folha para registro manual e a depoente não se lembrava mais dos horários efetivamente trabalhados", o que contraria os termos lançados na exordial. Como é a peça portal que estabelece os limites da lide e que, como visto, a autora sequer apontou uma média da jornada praticada e, ainda, que os controles de ponto trazidos pela defesa estão validados pela trabalhadora, reputo válidos tais documentos, entendendo que registram a íntegra a jornada laborada, até porque nada em sentido contrário foi demonstrado, uma vez que a testemunha convidada pela empregada declarou que não trabalhou nos mesmos horários em que a autora, nada podendo comprovar, portanto, acerca da jornada de trabalho daquela. Diante disso, sendo válidos os espelhos de ponto trazidos ao caderno processual, incumbia a reclamante, nos termos do artigo 818, I da CLT, apontar, pelo cotejo de tais documentos com os recibos de pagamento, diferenças de horas extras, intervalo intrajornada, domingos, feriados e adicional noturno, encargo do qual não se desvencilhou a contento. Embora, em razões finais (fls. 226/230), a autora tenha indicado dias em que o intervalo intrajornada de uma hora não foi usufruído e, ainda, outros, em que a pausa intervalar superou o limite de duas horas, deixou de levar em conta, para a apresentação de diferenças, a compensação de jornada através do banco de horas instituído pela ré, autorizado pela norma coletiva da categoria (cláusula 17ª da CCT). Vale pontuar que os espelhos de ponto da reclamante registram créditos, débitos e saldos no banco de horas e os recibos de pagamento indicam a quitação de saldo de banco de horas (fl. 187), o que foi desconsiderado pela trabalhadora em suas razões finais. É bem verdade que a autora, em suas razões finais, impugnou os recibos de pagamento acostados aos autos e não assinados pela empregada, apenas no que tange ao pagamento de horas extras. Contudo, a despeito da previsão do artigo 464 da CLT, não é crível que a reclamante tenha recebido todas as parcelas descritas nos comprovantes de pagamento, mas que apenas as horas extras deles constantes não tenham sido adimplidas. Pontuo, por fim, que o labor extraordinário, ainda que habitual, não descaracteriza o sistema de compensação de jornada, nos termos do artigo 59-B da CLT. Tudo somado, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos de horas extras, domingos e feriados em dobro e adicional noturno. O pedido de indenização por danos morais decorrentes do labor em jornada variável improcede. Isso porque, pelos controles de ponto, observa-se que a reclamante sempre iniciou a sua jornada no período diurno, aproximadamente entre 8h e 10h, inexistindo, assim, a imprevisibilidade capaz de retirar da empregada a possibilidade de se organizar para realizar atividades extralaborais" (fls. 232-234 do PDF; ID. 24309c0). A parte autora se insurge contra a decisão, alegando que o banco de horas é inválido, pois laborou além do limite de 10 horas diárias, bem como que apontou incorreções no pagamento de horas extras. Pois bem. O reconhecimento da validade dos espelhos de ponto pela sentença não foi objeto de recurso. A análise desses documentos demonstra que a autora estava submetida a regime de compensação de jornada (banco de horas), previsto na cláusula 17ª da CCT 2023/2025 (fl. 27 do PDF; ID. 3e0bc36), em conformidade com o art. 59, § 2º, da CLT. Não se nega que tanto a norma coletiva quanto a legislação vedam a extrapolação do limite máximo de dez horas diárias no sistema de banco de horas. A reclamante, em razões finais, apontou corretamente que apenas no dia 24/10/2023 laborou por período superior a dez horas. A alegação de que "no dia 14/10/23 a autora entrou as 09:34, saiu para intervalo as 11:44, retornou as 12:41 e permaneceu até as 22:02, totalizando 11,5 horas de trabalho" (fl. 226 do PDF; ID. 49a17f7) não corresponde aos registros do cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318). Da mesma forma, não procede a afirmação de que "no dia 08/10 entrou as 09:54, saiu para almoço as 15:20, retornou após duas horas, as 17:40 e permaneceu até as 21:28, totalizando 10,5 de trabalho" (fl. 227 do PDF; ID. 49a17f7), pois os horários registrados no cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318) não corroboram tal jornada. Quanto à alegação de que "no dia 03/10, entrou as 09:54, saiu para descanso as 15:20, só retornou após mais de duas horas, as 17:40 e permaneceu até 21:28, o que totalizou jornada de 11 horas" (fl. 227 do PDF; ID. 49a17f7), ainda que tais horários correspondam aos registrados no cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318), a apuração da jornada está equivocada. Considerando-se a extrapolação de 20 minutos no limite do intervalo intrajornada, o tempo total de labor naquele dia foi de 9h34min, sem ultrapassar o limite máximo de dez horas diárias no sistema de banco de horas. Assim, reputo que o fato de em apenas um dia a reclamante ter laborado mais de dez horas não é suficiente para tornar nulo o banco de horas instituído, mormente considerando que os extratos de lançamentos de banco de horas indicam que a autora efetivamente gozava dos benefícios do sistema de compensação, durante toda a vigência do contrato. Tampouco há de se admitir a descaracterização do acordo de compensação pela habitual prestação de horas extras. Primeiro, porque, rememore-se que o item III da Súmula 85 do TST, não a beneficia, na medida em que tal item (III) diz respeito à compensação de jornada semanal, e não ao banco de horas, o qual tem previsão no item V da citada Súmula, que assim dispõe: "as disposições nesta súmula não se aplicam ao regime compensatório na modalidade "banco de horas" que somente pode ser instituído por negociação coletiva". Segundo, porque a questão foi sedimentada com a vigência do artigo 59- B, parágrafo único da CLT, que prevê que a prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesse passo, reputa-se válido o sistema de compensação mediante "banco de horas" e, à míngua de qualquer demonstrativo de diferenças de horas extras, que entendia devidas, considerando-se a validade do banco de horas - ônus que incumbia à autora, pois constitutivo do direito vindicado - conclui-se que compensadas ou devidamente remuneradas as horas extras. Mantenho. 2. Indenização por danos morais A respeito da indenização por danos morais e assédio, o MM. Juízo a quo decidiu: "O reclamante relata, na petição inicial, que sofreu abalos de ordem imaterial, sob o fundamento de ter sido alvo de assédio moral, pelas condutas do Chefe de Cozinha, Sr, Marcelo, pessoa que tinha comportamento agressivo e "utilizava-se se palavrões com excesso constrangedor, além de deixar explícito que o que a Reclamada esperava dos empregados era uma submissão quase que escrava". A reclamada, em contestação, negou os fatos narrados na inicial. Pois bem. São fundamentos da República Federativa do Brasil, como Estado Democrático de Direito que é, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (artigo 1o, III e IV, da CF/88), tendo como objetivo a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e marginalização social, bem como a promoção do bem de todos, sem qualquer forma de discriminação (art. 3o, I, III e IV). Nesse sentido, o artigo o artigo 170, "caput", da Constituição Federal de 1988, prevê que a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, devendo ser observado o princípio da função social da propriedade e a redução das desigualdades sociais e regionais (incisos III e VII), em consonância com o artigo 5o, XXII e XXXIII, que garante o direito fundamental de propriedade desde que atenda à sua função social. Diante disso, conclusão lógica é de que no Estado Democrático de Direito em que vivemos, centrado na dignidade da pessoa humana, não existe direito absoluto, de modo que a empresa, no exercício do seu poder de propriedade, tem o dever de efetivar direitos fundamentais em seu complexo, garantindo a dignidade dos seus empregados e prestadores de serviço e coibindo qualquer forma de discriminação ou desrespeito à intimidade, imagem e honra desses. Portanto, o jus variandi do empregador, como qualquer outro poder inserido no Estado Democrático de Direito, não é absoluto, apenas tendo razão de ser se exercido em prol da efetivação dos direitos fundamentais dentro da comunidade empresarial. O assédio moral no ambiente de trabalho constitui-se em abuso de direito do empregador do exercício de seu poder diretivo ou disciplinar, configurando-se na conduta reiterada no tempo capaz de fragilizar a condição emocional do empregado, como a exposição repetida do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, ou a adoção de determinada política empresarial que representa pressão psicológica no indivíduo obreiro, ocasionando lesão em sua honra, liberdade, integridade, vida e em seus sentimentos afetivos. Não é, todavia, qualquer ofensa ou dissabor ocorrido no ambiente laboral que se constitui em assédio moral e enseja direito à indenização por dano à esfera extrapatrimonial do empregado. A caracterização do assédio - sob pena de se banalizar essa espécie de indenização - pressupõe prova robusta de que o ambiente imposto ao obreiro, em abuso do poder empregatício, por tratamento reiteradamente diferenciado, extremamente rigoroso, ou em exposição constante à situação vexatória, seja tal, capaz de gerar verdadeiro abalo emocional ao empregado. Por outro lado, quando verificado que a empresa não cumpre o dever constitucional de efetivar direitos fundamentais de seus empregados e garantir-lhes a segurança e incolumidade física e mental, gerando-lhe dano à sua honra, liberdade, integridade, imagem e vida privada, terá o dever de indenizar. Nessa esteira, o artigo 5º, incisos V, X e XLI da Constituição Federal de 1988, assegura a inviolabilidade à intimidade, vida privada, honra, imagem e aos direitos e liberdades fundamentais de toda pessoa, garantindo a indenização por dano moral ou material decorrente dessa violação. Com tais bases, prevê o artigo 186 do CC/2002, que comete ato ilícito aquele que violar direito e causar dano, ainda que exclusivamente moral, sendo vaticinado pelo artigo 187 desse mesmo Código que o exercício abusivo de um direito, isto é, que excede os limites econômicos, sociais e da boa-fé, também configura ato ilícito, o qual deverá ser indenizado por quem o comete ou pelo seu responsável, nos termos dos artigos 927 e 933 desse mesmo codex. No presente caso, cabia à reclamante, nos termos do artigo 818, I, da CLT e artigo 373, I do CPC/2015, comprovar os fatos relatados na peça portal que poderiam vir a ensejar indenização por danos morais e desse encargo a obreira se desvencilhou satisfatoriamente. Os áudios juntados pelas mídias digitais, às fls. 11/3 e 64, com as degravações acostadas pela trabalhadora, às fls. 215/216, já revelam comportamento inadequado de Marcelo no ambiente laboral. O próprio preposto reconheceu que havia problemas na reclamada em relação às condutas de Marcelo, inclusive queixa da reclamante nesse sentido. Disse o representante legal da reclamada que "... o chefe da reclamante era Marcelo; que o Marcelo tinha personalidade forte, porém a reclamada estava "tratando disso"; que Marcelo era bruto e não sabia se expressar; que a reclamada advertiu Marcelo pela forma dele tratar as pessoas; que muitos funcionários não gostavam da forma como Marcelo os tratava; que Marcelo permanece empregado na reclamada; que a reclamante reclamou do tratamento de Marcelo para com ela e a reclamada o advertiu; que, depois disso, Marcelo mudou o trato com os funcionários; que não acontecia de Marcelo ameaçar funcionários de demissão ou utilizar palavras de baixo calão; que reconhece a voz de Marcelo nos áudio juntados com a inicial...". Além disso, a testemunha convidada pela reclamante assegurou em seu depoimento que "... o tratamento de Marcelo com os funcionários era abusivo; que Marcelo xingava a equipe toda com palavrões, abusos, chamada de filhos da puta, imbecis, inúteis; que Marcelo ameaçava os funcionários de demissão; que presenciou Marcelo chamar a reclamante de imbecil, inútil e ameaçá-la de demissão; que Marcelo foi trabalhar alcoolizado várias vezes; que Marcelo oferecia bebida alcoólica para a equipe da cozinha; que alguns funcionários aceitavam, mas não eram advertidos posteriormente; que a gerência do restaurante tinha conhecimento de como o Marcelo agia, mas nada foi feito...". Comprovadas as ofensas reiteradas à obreira, verifico que restou provado o ato ilícito e culposo da ré, bem como o dano à esfera moral da autora, pelo que JULGO PROCEDENTE o pedido, para, considerando o caráter pedagógico da punição, a capacidade econômica da reclamada, a extensão do dano e a vedação do ordenamento jurídico brasileiro ao enriquecimento sem causa, condenar a reclamada ao pagamento de indenização no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de danos morais" (fls. 234-237 do PDF; ID. 24309c0). A parte autora requer a majoração da indenização por danos morais, sustentando que o valor de R$ 3.000,00 é incompatível com as ofensas e humilhações sofridas. Alega ainda que a r. sentença não apreciou seu pedido de indenização por danos morais em razão da jornada de trabalho móvel e variável, que teria prejudicado sua vida pessoal. Registre-se, primeiramente, que, conforme já foi visto, não é verdade que a r. sentença omitiu-se quanto ao pedido de indenização por danos morais em razão da imposição de jornada variável, tendo constado expressamente na r. sentença o seguinte: "O pedido de indenização por danos morais decorrentes do labor em jornada variável improcede. Isso porque, pelos controles de ponto, observa-se que a reclamante sempre iniciou a sua jornada no período diurno, aproximadamente entre 8h e 10h, inexistindo, assim, a imprevisibilidade capaz de retirar da empregada a possibilidade de se organizar para realizar atividades extralaborais" (fl. 234 do PDF; ID. 24309c0). O deferimento do pedido de indenização por dano moral requer a reunião dos pressupostos elementares da responsabilidade civil do empregador: a) o dano; b) o ato ilícito (decorrente de conduta culposa ou dolosa) e c) o nexo causal. O ato ilícito patronal pode revelar-se através do abuso de direito (art. 187 do CC), ou seja, quando o comportamento do empregador extrapole seu poder diretivo e vulnere os direitos de personalidade dos indivíduos. Tratando-se de fato constitutivo do direito, cabia à recorrente comprovar que a jornada praticada limitava suas atividades cotidianas, de lazer ou tempo em família, bem como seu direito à desconexão, ônus do qual não se desincumbiu a contento, haja vista a ausência de produção de provas nessa matéria. Salienta-se que não se pode simplesmente presumir que uma vez constatada a prestação habitual de horas extras estaremos diante da degradação da vida social e, consequentemente, de uma lesão à ordem moral da parte obreira, não se tratando de indenização in re ipsa. É fato que existem categorias de lesões extrapatrimoniais que prescindem da efetiva demonstração do dano, cuja ocorrência resta presumível de lesão; todavia esse não é o caso do "dano existencial". Correta, portanto, a r. sentença que rejeitou o pedido de dano moral com fundamento em jornada variável e abusiva. Com relação ao assédio moral nas relações laborais, este pode ser qualificado como o comportamento abusivo do empregador ou seus prepostos, manifestando-se, sobretudo, através de gestos, palavras e escritos que ameaçam, por sua repetição, a integridade física ou psíquica do empregado, degradando o ambiente de trabalho. O trabalhador sofre violência psicológica extrema, de forma habitual, por um período prolongado e com a finalidade de desestabilizá-lo emocionalmente. Caracteriza-se pela ação reiterada no tempo e pela atitude insistente. São ataques repetidos que expõem a vítima a situações vexatórias, discriminatórias e constrangedoras. No caso dos autos, a reclamante alegou na petição inicial que era subordinada a superior hierárquico que tratava os empregados de forma desrespeitosa, utilizando palavrões e exigindo submissão extrema, não podendo sequer deixar o posto de trabalho durante o horário de expediente, sob pena de ser punida com assédio agressivo por Marcelo (fl. 08 do PDF; ID. c41b31c). A prova oral evidencia os maus tratos praticados por superior hierárquico. A testemunha convidada pela parte autora declarou: "Que trabalhou na 1ª reclamada como ajudante de cozinha, de maio a dezembro de 2023; (...) que trabalhou com a reclamante, mas não nos mesmos horários; que quando o depoente chegava, a reclamante já estava; que via a reclamante sair, (...) que o depoente era subordinado ao mesmo chefe da reclamante, Marcelo; que o tratamento de Marcelo com os funcionários era abusivo; que Marcelo xingava a equipe toda com palavrões, abusos, chamada de filhos da puta, imbecis, inúteis; que Marcelo ameaçava os funcionários de demissão; que presenciou Marcelo chamar a reclamante de imbecil, inútil e ameaçá-la de demissão; (...) que a gerência do restaurante tinha conhecimento de como o Marcelo agia, mas nada foi feito; (...)" (fl. 213 do PDF; ID. 10424ac). O depoimento da testemunha corrobora a alegação da reclamante, demonstrando comportamento abusivo e reiterado do superior, e a negligência da reclamada em solucionar a questão. Evidente, portanto, o dano moral, justificando-se a indenização deferida. Reputo, porém, que o valor arbitrado na Origem já considera a gravidade das condutas e a repercussão negativa na esfera psíquica da trabalhadora, mostrando-se proporcional e suficiente para compensar o sofrimento experimentado, não havendo elementos nos autos que demonstrem a necessidade de sua revisão para cima. Mantenho. 3. Honorários advocatícios sucumbenciais A parte autora requer a majoração dos honorários advocatícios, alegando a realização de trabalho adicional por sua patrona nesta fase recursal. À análise. Nos termos do artigo 791-A da CLT é cabível a condenação da parte sucumbente ao pagamento de honorários advocatícios, a serem fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Nesse passo, considerando-se a condenação no montante autorizado no citado dispositivo legal de 5% do valor que resultar da liquidação da sentença dos pedidos que tenham sido julgados total ou parcialmente procedentes - percentual condizente com os parâmetros do artigo 791-A, § 2º, da CLT , bem como com a importância da causa; com o trabalho realizado pelos patronos e o tempo exigido para o seu serviço - nada há a alterar na decisão recorrida. Mantenho. III. DO EXPOSTO, ACORDAM os Magistrados da 10ª Turma do Tribunal Regional da 2ª Região em CONHECER do recurso da reclamante e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos da fundamentação do voto. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES. Tomaram parte no julgamento: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES, ANA MARIA MORAES BARBOSA MACEDO e SÔNIA APARECIDA GINDRO. Votação: por maioria, vencido o voto da Desembargadora Sônia Aparecida Gindro, que fixava o valor da indenização por danos morais em R$ 10.000,00. São Paulo, 1 de Maio de 2025. ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES Relator lvz VOTOS Voto do(a) Des(a). SONIA APARECIDA GINDRO / 10ª Turma - Cadeira 2 PROCESSO n. 1000908-14.2024.5.02.0068 DECLARAÇÃO DE VOTO DIVERGENTE Com o relatório elaborado pelo Exmº. Desembargador Relator, por defender posicionamento diverso daquele constante do r. voto condutor do acórdão, apresento, ainda que de modo conciso e bastante resumido, as seguintes razões de divergência. Pois bem. No presente caso, reputo pertinente majorar o valor da indenização por danos morais, eis que fixada na Origem em R$ 3.000,00, diante do último salário do autor (R$ 3.360,00), correspondeu a menos que um salário percebido pelo obreiro, de molde a classificar o dano como irrisório, o que não foi, em efetivo, o caso. Fixaria em R$ 10.000,00 (pouco menos que 3 salários últimos percebidos pelo demandante), o que se encontra dentro do postulado na inicial à base de R$ 25.000,00. Provejo o recurso da reclamante nestes termos. É como voto. Sônia Aparecida Gindro Terceira Votante 1. SAO PAULO/SP, 23 de maio de 2025. ARIELA OLIVEIRA DE MORAES Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- FAMIGLIA NINO COMERCIO DE ALIMENTOS E BEBIDAS LTDA
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26/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 10ª Turma | Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTAPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª TURMA Relator: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES ROT 1000908-14.2024.5.02.0068 RECORRENTE: MARIANA CASTRO DA SILVA RECORRIDO: FAMIGLIA NINO COMERCIO DE ALIMENTOS E BEBIDAS LTDA E OUTROS (1) Ficam as partes INTIMADAS quanto aos termos do v. Acórdão proferido nos presentes autos (#id:ac6bae5): PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª Turma PROCESSO nº 1000908-14.2024.5.02.0068 (ROT) RECORRENTE: MARIANA CASTRO DA SILVA RECORRIDOS: GIULIETTA FOGO & VINO COMERCIO DE ALIMENTOS E BEBIDAS LTDA, PORTO LUNA RESTAURANTE E LANCHONETE LTDA RELATOR: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES JUÍZA PROLATORA DA SENTENÇA: LUANA MADUREIRA DOS ANJOS RELATÓRIO Vistos, etc. A r. sentença (fl. 231 do PDF; ID. 24309c0), cujo relatório adoto, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista para condenar as reclamadas ao pagamento de compensação por dano moral, no importe de R$ 3.000,00, e honorários advocatícios sucumbenciais. Recurso ordinário da reclamante (fl. 242 do PDF; ID. 0fb5051) pleiteando a reforma da r. sentença quanto a nulidade do banco de horas, improcedência do pedido de horas extras, valor da indenização por danos morais, inclusive em razão de imposição de jornada de trabalho abusiva, e honorários advocatícios. Sem contrarrazões. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO V O T O I. Conheço do recurso, uma vez que estão presentes os pressupostos de admissibilidade. II. MÉRITO 1. Nulidade do banco de horas. Horas extras. Com relação às horas extras, domingos e feriados, bem como à nulidade do banco de horas, a r. sentença decidiu: "A petição inicial indica que a autora laborava com horários de entrada e saída variável, apontando, por amostragem, que no mês de novembro de 2023 " laborou com horários de entrada variável entre 08h00min e 10h50min e saiu entre os horários de 16h20min e 00h00min" e não folgou 4 vezes no mês, o que invalida, no seu entender, o acordo de compensação. Além disso, informa que o intervalo intrajornada era de uma hora, em regra, mas que já chegou a ser forçada a cumprir 3 horas de pausa intervalar. Como se nota, a reclamante não aponta qual era a média da jornada laborada ao longo do contrato, mas destaca que "como o controle de jornada da Reclamante era feito através de cartão ponto, o excesso de horas extras ou devidas à Reclamante deverão ser demonstradas pelas Reclamadas e da apresentação de tais documentos confrontando com os holerites, extrair-se-á, a quantidade de horas extras não pagas", o que indica que a jornada laborada era efetivamente consignada nos controles de ponto. Em depoimento pessoal, a autora afirmou que "não registrava corretamente a jornada de trabalho (...) que, na verdade, podia registrar corretamente sua jornada no ponto, mas geralmente estava quebrado e lhe reclamada dada uma folha para registro manual e a depoente não se lembrava mais dos horários efetivamente trabalhados", o que contraria os termos lançados na exordial. Como é a peça portal que estabelece os limites da lide e que, como visto, a autora sequer apontou uma média da jornada praticada e, ainda, que os controles de ponto trazidos pela defesa estão validados pela trabalhadora, reputo válidos tais documentos, entendendo que registram a íntegra a jornada laborada, até porque nada em sentido contrário foi demonstrado, uma vez que a testemunha convidada pela empregada declarou que não trabalhou nos mesmos horários em que a autora, nada podendo comprovar, portanto, acerca da jornada de trabalho daquela. Diante disso, sendo válidos os espelhos de ponto trazidos ao caderno processual, incumbia a reclamante, nos termos do artigo 818, I da CLT, apontar, pelo cotejo de tais documentos com os recibos de pagamento, diferenças de horas extras, intervalo intrajornada, domingos, feriados e adicional noturno, encargo do qual não se desvencilhou a contento. Embora, em razões finais (fls. 226/230), a autora tenha indicado dias em que o intervalo intrajornada de uma hora não foi usufruído e, ainda, outros, em que a pausa intervalar superou o limite de duas horas, deixou de levar em conta, para a apresentação de diferenças, a compensação de jornada através do banco de horas instituído pela ré, autorizado pela norma coletiva da categoria (cláusula 17ª da CCT). Vale pontuar que os espelhos de ponto da reclamante registram créditos, débitos e saldos no banco de horas e os recibos de pagamento indicam a quitação de saldo de banco de horas (fl. 187), o que foi desconsiderado pela trabalhadora em suas razões finais. É bem verdade que a autora, em suas razões finais, impugnou os recibos de pagamento acostados aos autos e não assinados pela empregada, apenas no que tange ao pagamento de horas extras. Contudo, a despeito da previsão do artigo 464 da CLT, não é crível que a reclamante tenha recebido todas as parcelas descritas nos comprovantes de pagamento, mas que apenas as horas extras deles constantes não tenham sido adimplidas. Pontuo, por fim, que o labor extraordinário, ainda que habitual, não descaracteriza o sistema de compensação de jornada, nos termos do artigo 59-B da CLT. Tudo somado, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos de horas extras, domingos e feriados em dobro e adicional noturno. O pedido de indenização por danos morais decorrentes do labor em jornada variável improcede. Isso porque, pelos controles de ponto, observa-se que a reclamante sempre iniciou a sua jornada no período diurno, aproximadamente entre 8h e 10h, inexistindo, assim, a imprevisibilidade capaz de retirar da empregada a possibilidade de se organizar para realizar atividades extralaborais" (fls. 232-234 do PDF; ID. 24309c0). A parte autora se insurge contra a decisão, alegando que o banco de horas é inválido, pois laborou além do limite de 10 horas diárias, bem como que apontou incorreções no pagamento de horas extras. Pois bem. O reconhecimento da validade dos espelhos de ponto pela sentença não foi objeto de recurso. A análise desses documentos demonstra que a autora estava submetida a regime de compensação de jornada (banco de horas), previsto na cláusula 17ª da CCT 2023/2025 (fl. 27 do PDF; ID. 3e0bc36), em conformidade com o art. 59, § 2º, da CLT. Não se nega que tanto a norma coletiva quanto a legislação vedam a extrapolação do limite máximo de dez horas diárias no sistema de banco de horas. A reclamante, em razões finais, apontou corretamente que apenas no dia 24/10/2023 laborou por período superior a dez horas. A alegação de que "no dia 14/10/23 a autora entrou as 09:34, saiu para intervalo as 11:44, retornou as 12:41 e permaneceu até as 22:02, totalizando 11,5 horas de trabalho" (fl. 226 do PDF; ID. 49a17f7) não corresponde aos registros do cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318). Da mesma forma, não procede a afirmação de que "no dia 08/10 entrou as 09:54, saiu para almoço as 15:20, retornou após duas horas, as 17:40 e permaneceu até as 21:28, totalizando 10,5 de trabalho" (fl. 227 do PDF; ID. 49a17f7), pois os horários registrados no cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318) não corroboram tal jornada. Quanto à alegação de que "no dia 03/10, entrou as 09:54, saiu para descanso as 15:20, só retornou após mais de duas horas, as 17:40 e permaneceu até 21:28, o que totalizou jornada de 11 horas" (fl. 227 do PDF; ID. 49a17f7), ainda que tais horários correspondam aos registrados no cartão de ponto (fl. 193 do PDF; ID. 8941318), a apuração da jornada está equivocada. Considerando-se a extrapolação de 20 minutos no limite do intervalo intrajornada, o tempo total de labor naquele dia foi de 9h34min, sem ultrapassar o limite máximo de dez horas diárias no sistema de banco de horas. Assim, reputo que o fato de em apenas um dia a reclamante ter laborado mais de dez horas não é suficiente para tornar nulo o banco de horas instituído, mormente considerando que os extratos de lançamentos de banco de horas indicam que a autora efetivamente gozava dos benefícios do sistema de compensação, durante toda a vigência do contrato. Tampouco há de se admitir a descaracterização do acordo de compensação pela habitual prestação de horas extras. Primeiro, porque, rememore-se que o item III da Súmula 85 do TST, não a beneficia, na medida em que tal item (III) diz respeito à compensação de jornada semanal, e não ao banco de horas, o qual tem previsão no item V da citada Súmula, que assim dispõe: "as disposições nesta súmula não se aplicam ao regime compensatório na modalidade "banco de horas" que somente pode ser instituído por negociação coletiva". Segundo, porque a questão foi sedimentada com a vigência do artigo 59- B, parágrafo único da CLT, que prevê que a prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesse passo, reputa-se válido o sistema de compensação mediante "banco de horas" e, à míngua de qualquer demonstrativo de diferenças de horas extras, que entendia devidas, considerando-se a validade do banco de horas - ônus que incumbia à autora, pois constitutivo do direito vindicado - conclui-se que compensadas ou devidamente remuneradas as horas extras. Mantenho. 2. Indenização por danos morais A respeito da indenização por danos morais e assédio, o MM. Juízo a quo decidiu: "O reclamante relata, na petição inicial, que sofreu abalos de ordem imaterial, sob o fundamento de ter sido alvo de assédio moral, pelas condutas do Chefe de Cozinha, Sr, Marcelo, pessoa que tinha comportamento agressivo e "utilizava-se se palavrões com excesso constrangedor, além de deixar explícito que o que a Reclamada esperava dos empregados era uma submissão quase que escrava". A reclamada, em contestação, negou os fatos narrados na inicial. Pois bem. São fundamentos da República Federativa do Brasil, como Estado Democrático de Direito que é, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (artigo 1o, III e IV, da CF/88), tendo como objetivo a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e marginalização social, bem como a promoção do bem de todos, sem qualquer forma de discriminação (art. 3o, I, III e IV). Nesse sentido, o artigo o artigo 170, "caput", da Constituição Federal de 1988, prevê que a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e da livre iniciativa, devendo ser observado o princípio da função social da propriedade e a redução das desigualdades sociais e regionais (incisos III e VII), em consonância com o artigo 5o, XXII e XXXIII, que garante o direito fundamental de propriedade desde que atenda à sua função social. Diante disso, conclusão lógica é de que no Estado Democrático de Direito em que vivemos, centrado na dignidade da pessoa humana, não existe direito absoluto, de modo que a empresa, no exercício do seu poder de propriedade, tem o dever de efetivar direitos fundamentais em seu complexo, garantindo a dignidade dos seus empregados e prestadores de serviço e coibindo qualquer forma de discriminação ou desrespeito à intimidade, imagem e honra desses. Portanto, o jus variandi do empregador, como qualquer outro poder inserido no Estado Democrático de Direito, não é absoluto, apenas tendo razão de ser se exercido em prol da efetivação dos direitos fundamentais dentro da comunidade empresarial. O assédio moral no ambiente de trabalho constitui-se em abuso de direito do empregador do exercício de seu poder diretivo ou disciplinar, configurando-se na conduta reiterada no tempo capaz de fragilizar a condição emocional do empregado, como a exposição repetida do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, ou a adoção de determinada política empresarial que representa pressão psicológica no indivíduo obreiro, ocasionando lesão em sua honra, liberdade, integridade, vida e em seus sentimentos afetivos. Não é, todavia, qualquer ofensa ou dissabor ocorrido no ambiente laboral que se constitui em assédio moral e enseja direito à indenização por dano à esfera extrapatrimonial do empregado. A caracterização do assédio - sob pena de se banalizar essa espécie de indenização - pressupõe prova robusta de que o ambiente imposto ao obreiro, em abuso do poder empregatício, por tratamento reiteradamente diferenciado, extremamente rigoroso, ou em exposição constante à situação vexatória, seja tal, capaz de gerar verdadeiro abalo emocional ao empregado. Por outro lado, quando verificado que a empresa não cumpre o dever constitucional de efetivar direitos fundamentais de seus empregados e garantir-lhes a segurança e incolumidade física e mental, gerando-lhe dano à sua honra, liberdade, integridade, imagem e vida privada, terá o dever de indenizar. Nessa esteira, o artigo 5º, incisos V, X e XLI da Constituição Federal de 1988, assegura a inviolabilidade à intimidade, vida privada, honra, imagem e aos direitos e liberdades fundamentais de toda pessoa, garantindo a indenização por dano moral ou material decorrente dessa violação. Com tais bases, prevê o artigo 186 do CC/2002, que comete ato ilícito aquele que violar direito e causar dano, ainda que exclusivamente moral, sendo vaticinado pelo artigo 187 desse mesmo Código que o exercício abusivo de um direito, isto é, que excede os limites econômicos, sociais e da boa-fé, também configura ato ilícito, o qual deverá ser indenizado por quem o comete ou pelo seu responsável, nos termos dos artigos 927 e 933 desse mesmo codex. No presente caso, cabia à reclamante, nos termos do artigo 818, I, da CLT e artigo 373, I do CPC/2015, comprovar os fatos relatados na peça portal que poderiam vir a ensejar indenização por danos morais e desse encargo a obreira se desvencilhou satisfatoriamente. Os áudios juntados pelas mídias digitais, às fls. 11/3 e 64, com as degravações acostadas pela trabalhadora, às fls. 215/216, já revelam comportamento inadequado de Marcelo no ambiente laboral. O próprio preposto reconheceu que havia problemas na reclamada em relação às condutas de Marcelo, inclusive queixa da reclamante nesse sentido. Disse o representante legal da reclamada que "... o chefe da reclamante era Marcelo; que o Marcelo tinha personalidade forte, porém a reclamada estava "tratando disso"; que Marcelo era bruto e não sabia se expressar; que a reclamada advertiu Marcelo pela forma dele tratar as pessoas; que muitos funcionários não gostavam da forma como Marcelo os tratava; que Marcelo permanece empregado na reclamada; que a reclamante reclamou do tratamento de Marcelo para com ela e a reclamada o advertiu; que, depois disso, Marcelo mudou o trato com os funcionários; que não acontecia de Marcelo ameaçar funcionários de demissão ou utilizar palavras de baixo calão; que reconhece a voz de Marcelo nos áudio juntados com a inicial...". Além disso, a testemunha convidada pela reclamante assegurou em seu depoimento que "... o tratamento de Marcelo com os funcionários era abusivo; que Marcelo xingava a equipe toda com palavrões, abusos, chamada de filhos da puta, imbecis, inúteis; que Marcelo ameaçava os funcionários de demissão; que presenciou Marcelo chamar a reclamante de imbecil, inútil e ameaçá-la de demissão; que Marcelo foi trabalhar alcoolizado várias vezes; que Marcelo oferecia bebida alcoólica para a equipe da cozinha; que alguns funcionários aceitavam, mas não eram advertidos posteriormente; que a gerência do restaurante tinha conhecimento de como o Marcelo agia, mas nada foi feito...". Comprovadas as ofensas reiteradas à obreira, verifico que restou provado o ato ilícito e culposo da ré, bem como o dano à esfera moral da autora, pelo que JULGO PROCEDENTE o pedido, para, considerando o caráter pedagógico da punição, a capacidade econômica da reclamada, a extensão do dano e a vedação do ordenamento jurídico brasileiro ao enriquecimento sem causa, condenar a reclamada ao pagamento de indenização no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de danos morais" (fls. 234-237 do PDF; ID. 24309c0). A parte autora requer a majoração da indenização por danos morais, sustentando que o valor de R$ 3.000,00 é incompatível com as ofensas e humilhações sofridas. Alega ainda que a r. sentença não apreciou seu pedido de indenização por danos morais em razão da jornada de trabalho móvel e variável, que teria prejudicado sua vida pessoal. Registre-se, primeiramente, que, conforme já foi visto, não é verdade que a r. sentença omitiu-se quanto ao pedido de indenização por danos morais em razão da imposição de jornada variável, tendo constado expressamente na r. sentença o seguinte: "O pedido de indenização por danos morais decorrentes do labor em jornada variável improcede. Isso porque, pelos controles de ponto, observa-se que a reclamante sempre iniciou a sua jornada no período diurno, aproximadamente entre 8h e 10h, inexistindo, assim, a imprevisibilidade capaz de retirar da empregada a possibilidade de se organizar para realizar atividades extralaborais" (fl. 234 do PDF; ID. 24309c0). O deferimento do pedido de indenização por dano moral requer a reunião dos pressupostos elementares da responsabilidade civil do empregador: a) o dano; b) o ato ilícito (decorrente de conduta culposa ou dolosa) e c) o nexo causal. O ato ilícito patronal pode revelar-se através do abuso de direito (art. 187 do CC), ou seja, quando o comportamento do empregador extrapole seu poder diretivo e vulnere os direitos de personalidade dos indivíduos. Tratando-se de fato constitutivo do direito, cabia à recorrente comprovar que a jornada praticada limitava suas atividades cotidianas, de lazer ou tempo em família, bem como seu direito à desconexão, ônus do qual não se desincumbiu a contento, haja vista a ausência de produção de provas nessa matéria. Salienta-se que não se pode simplesmente presumir que uma vez constatada a prestação habitual de horas extras estaremos diante da degradação da vida social e, consequentemente, de uma lesão à ordem moral da parte obreira, não se tratando de indenização in re ipsa. É fato que existem categorias de lesões extrapatrimoniais que prescindem da efetiva demonstração do dano, cuja ocorrência resta presumível de lesão; todavia esse não é o caso do "dano existencial". Correta, portanto, a r. sentença que rejeitou o pedido de dano moral com fundamento em jornada variável e abusiva. Com relação ao assédio moral nas relações laborais, este pode ser qualificado como o comportamento abusivo do empregador ou seus prepostos, manifestando-se, sobretudo, através de gestos, palavras e escritos que ameaçam, por sua repetição, a integridade física ou psíquica do empregado, degradando o ambiente de trabalho. O trabalhador sofre violência psicológica extrema, de forma habitual, por um período prolongado e com a finalidade de desestabilizá-lo emocionalmente. Caracteriza-se pela ação reiterada no tempo e pela atitude insistente. São ataques repetidos que expõem a vítima a situações vexatórias, discriminatórias e constrangedoras. No caso dos autos, a reclamante alegou na petição inicial que era subordinada a superior hierárquico que tratava os empregados de forma desrespeitosa, utilizando palavrões e exigindo submissão extrema, não podendo sequer deixar o posto de trabalho durante o horário de expediente, sob pena de ser punida com assédio agressivo por Marcelo (fl. 08 do PDF; ID. c41b31c). A prova oral evidencia os maus tratos praticados por superior hierárquico. A testemunha convidada pela parte autora declarou: "Que trabalhou na 1ª reclamada como ajudante de cozinha, de maio a dezembro de 2023; (...) que trabalhou com a reclamante, mas não nos mesmos horários; que quando o depoente chegava, a reclamante já estava; que via a reclamante sair, (...) que o depoente era subordinado ao mesmo chefe da reclamante, Marcelo; que o tratamento de Marcelo com os funcionários era abusivo; que Marcelo xingava a equipe toda com palavrões, abusos, chamada de filhos da puta, imbecis, inúteis; que Marcelo ameaçava os funcionários de demissão; que presenciou Marcelo chamar a reclamante de imbecil, inútil e ameaçá-la de demissão; (...) que a gerência do restaurante tinha conhecimento de como o Marcelo agia, mas nada foi feito; (...)" (fl. 213 do PDF; ID. 10424ac). O depoimento da testemunha corrobora a alegação da reclamante, demonstrando comportamento abusivo e reiterado do superior, e a negligência da reclamada em solucionar a questão. Evidente, portanto, o dano moral, justificando-se a indenização deferida. Reputo, porém, que o valor arbitrado na Origem já considera a gravidade das condutas e a repercussão negativa na esfera psíquica da trabalhadora, mostrando-se proporcional e suficiente para compensar o sofrimento experimentado, não havendo elementos nos autos que demonstrem a necessidade de sua revisão para cima. Mantenho. 3. Honorários advocatícios sucumbenciais A parte autora requer a majoração dos honorários advocatícios, alegando a realização de trabalho adicional por sua patrona nesta fase recursal. À análise. Nos termos do artigo 791-A da CLT é cabível a condenação da parte sucumbente ao pagamento de honorários advocatícios, a serem fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa. Nesse passo, considerando-se a condenação no montante autorizado no citado dispositivo legal de 5% do valor que resultar da liquidação da sentença dos pedidos que tenham sido julgados total ou parcialmente procedentes - percentual condizente com os parâmetros do artigo 791-A, § 2º, da CLT , bem como com a importância da causa; com o trabalho realizado pelos patronos e o tempo exigido para o seu serviço - nada há a alterar na decisão recorrida. Mantenho. III. DO EXPOSTO, ACORDAM os Magistrados da 10ª Turma do Tribunal Regional da 2ª Região em CONHECER do recurso da reclamante e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos da fundamentação do voto. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES. Tomaram parte no julgamento: ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES, ANA MARIA MORAES BARBOSA MACEDO e SÔNIA APARECIDA GINDRO. Votação: por maioria, vencido o voto da Desembargadora Sônia Aparecida Gindro, que fixava o valor da indenização por danos morais em R$ 10.000,00. São Paulo, 1 de Maio de 2025. ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES Relator lvz VOTOS Voto do(a) Des(a). SONIA APARECIDA GINDRO / 10ª Turma - Cadeira 2 PROCESSO n. 1000908-14.2024.5.02.0068 DECLARAÇÃO DE VOTO DIVERGENTE Com o relatório elaborado pelo Exmº. Desembargador Relator, por defender posicionamento diverso daquele constante do r. voto condutor do acórdão, apresento, ainda que de modo conciso e bastante resumido, as seguintes razões de divergência. Pois bem. No presente caso, reputo pertinente majorar o valor da indenização por danos morais, eis que fixada na Origem em R$ 3.000,00, diante do último salário do autor (R$ 3.360,00), correspondeu a menos que um salário percebido pelo obreiro, de molde a classificar o dano como irrisório, o que não foi, em efetivo, o caso. Fixaria em R$ 10.000,00 (pouco menos que 3 salários últimos percebidos pelo demandante), o que se encontra dentro do postulado na inicial à base de R$ 25.000,00. Provejo o recurso da reclamante nestes termos. É como voto. Sônia Aparecida Gindro Terceira Votante 1. SAO PAULO/SP, 23 de maio de 2025. ARIELA OLIVEIRA DE MORAES Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- PORTO LUNA RESTAURANTE E LANCHONETE LTDA
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26/05/2025 - Documento obtido via DJENAcórdão Baixar (PDF)