Matheus Cardoso De Freitas Barros x Gessi Santana De Oliveira
Número do Processo:
1001464-90.2022.5.02.0066
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRT2
Classe:
AçãO TRABALHISTA - RITO ORDINáRIO
Grau:
1º Grau
Órgão:
66ª Vara do Trabalho de São Paulo
Última atualização encontrada em
21 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
As atualizações mais recentes estão bloqueadas.
Assine para desbloquear as últimas atualizações deste processo. -
03/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 4ª Turma | Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTAPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 4ª TURMA Relatora: MARIA ISABEL CUEVA MORAES ROT 1001464-90.2022.5.02.0066 RECORRENTE: MATHEUS CARDOSO DE FREITAS BARROS RECORRIDO: GESSI SANTANA DE OLIVEIRA PROCESSO nº 1001464-90.2022.5.02.0066 (ROT) RECORRENTE: MATHEUS CARDOSO DE FREITAS BARROS RECORRIDO: GESSI SANTANA DE OLIVEIRA RELATORA: MARIA ISABEL CUEVA MORAES I - R E L A T Ó R I O Adoto o relatório da r. Sentença, id. a13999f, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial, complementada pela decisão id. d6137cd, que julgou improcedentes os embargos de declaração opostos pelo reclamante. Recurso Ordinário interposto pelo reclamante, id. 0171529, pretendendo a reforma da decisão a quo, a fim de que sejam deferidos: a) adicional por acúmulo de função; b) majoração da indenização por danos morais. Contrarrazões pela reclamada id. 271d501. É o relatório. II - V O T O 1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Acúmulo de função. Requisitos não preenchidos. Diferenças salariais indevidas. Insurge-se o reclamante, pugnando pela reforma da r. sentença, ao argumento de que "foi contratado para exercer a função de motoboy, porém, era obrigado a realizar funções fora de sua alçada, tendo que abastecer a geladeira, comprar mercadorias (carne, alface, ovos e etc) e, ainda fazer entregas particulares constantemente", conforme petição inicial (id. abaebaa). Ainda, afirma que "ao acumular as funções citadas, o Recorrente ficou sobrecarregado, sem receber remuneração adequada para o exercer do cargo em comento." Postulou o recebimento de um plus salarial pelo cargo acumulado. Analisa-se. Extrai-se da interpretação do art. 456, parágrafo único, da CLT, que o acúmulo de funções não acarreta como efeito automático o direito a outro salário ou ao recebimento de diferenças salariais (plus). Há que se entender o 'acúmulo de funções' de modo restrito, pressupondo a efetiva prestação de serviços em funções ou tarefas que não tenham sido expressamente indicadas no contrato de trabalho, e que não digam respeito, ainda que indiretamente, ao cargo exercido pelo empregado. Além disso, se as atividades, tarefas ou funções apresentarem correlação lógica ou prática com o cargo do empregado, não se exigindo maior fidúcia ou responsabilidade diversa daquela necessária ao cumprimento regular do contrato de trabalho, nem capacitação técnica altamente diferenciada, não estamos diante de 'acúmulo de funções', mas sim diante da própria dinâmica da relação de emprego moderno. Insatisfeitos esses pressupostos, não há razão jurídica ou fática para deferimento de qualquer 'compensação salarial', ainda que sob denominação diversa, sob pena de o Estado imiscuir-se na administração e gestão da empresa, afrontando a segunda parte do inc. IV do art. 1º da Constituição da República (princípio fundamental da livre iniciativa). O preenchimento de tais requisitos exige prova cabal e irrefragável, recaindo sobre o laborista o ônus probandi, por ser fato constitutivo do direito, ex vi art. 818 da CLT c/c art. 373, I, do CPC/2015. Pois bem. No caso vertente, não se vislumbra que as atividades desempenhadas pelo reclamante e descritas na inicial, não tenham relação, ainda que indiretamente, com o cargo exercido. Ainda, o reclamante não produziu nenhuma prova do alegado acúmulo de funções, ônus que lhe competia, nos termos do art. 818 da CLT. Ademais, é bem de ver que, à luz do quadrante fático descortinado nos fólios processuais, inexiste efetiva incompatibilidade funcional entre os misteres descritos pelo reclamante, não se divisando, por consectário lógico, carga ocupacional qualitativamente superior à primariamente contratada, sendo forçoso concluir que não estão presentes os requisitos autorizativos do plus salarial susoelencados. Por tais fundamentos, nego provimento ao recurso. 2.2. Danos morais Sabemos que a prática de ação que resulte prejuízo a outrem enseja o dever de indenizar por danos materiais ou morais, de conformidade com a gravidade dos fatos e a intensidade dos danos causados à pessoa ou ao seu patrimônio, nos termos preconizados pela Constituição Federal (art. 5º, V e X). Nesse sentido, vale transcrever as lições de Carlos Alberto Bittar: "As ações humanas lesivas a interesses alheios acarretam, no plano do Direito, a necessidade de reparação de danos havidos, como desde os tempos imemoráveis, se tem assentado na consciência dos povos, diante de exigências naturais da própria vida em sociedade". (in Reparação Civil por Danos Morais, 3ª ed. Revista dos Tribunais, p. 13). No que se refere, especificamente, ao assédio moral, segundo a psicanalista e vitimóloga francesa Marie-France Hirigoyen, é "toda e qualquer conduta abusiva que se manifesta, sobretudo, por comportamentos, palavras, gestos, escritos que atentem, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou a integridade física ou psíquica de uma pessoa, colocando em perigo seu emprego ou degradando o clima de trabalho" (in Assédio moral - A violência perversa no cotidiano. 3ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 17). Pode-se afirmar, ademais, de acordo com a abordagem de Marie-France Hirigoyen, que o assédio moral nasce como algo inofensivo e propaga-se de forma silenciosa, sorrateira e traiçoeira. Esses ataques, porém, vão se multiplicando e a pessoa é acuada, posta em situações de inferioridade, submetida a manobras hostis e degradantes de forma recorrente, por períodos cada vez maiores, o que pode chegar à violência manifesta. Vale acrescer a definição legal de assédio moral estampado no artigo 29 do Código do Trabalho de Portugal (Lei n. 7/2009), fonte subsidiária do Direito do Trabalho pátrio (direito comparado - art. 8º da CLT), no sentido de que "entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador". Revela-se, portanto, o assédio moral por comportamentos agressivos e práticas repetitivas e sistematizadas de violência psicológica, no ambiente de trabalho, que colimam desqualificar, desmoralizar, desestabilizar profissional, emocional e moralmente o assediado, tornando seu ambiente de trabalho desagradável, insuportável e hostil, violando os direitos de personalidade da vítima e ocasionando graves danos a sua saúde física e psíquica que podem evoluir para incapacidade laboral. Sendo espécie de violência de ordem psíquica e jurídica, o assédio moral configura-se como um mal a ser combatido, por razões humanísticas, sociais e econômicas. O trabalhador ao ser admitido pela empresa não se despe de sua dignidade na condição de ser humano, dotado de um plexo de direitos inerentes à sua personalidade (v.g. integridade da honra, imagem, intimidade, liberdade e equilíbrio biopsíquico), devendo, por isto, o empregador proporcionar a observância dos direitos da personalidade, com vistas a eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Agregue-se a isso que, para efeitos de danos ao patrimônio moral do ofendido, é assente que não é preciso provar que a vítima se sentiu ofendida, magoada, desonrada com a conduta do autor. O dano moral dispensa prova em concreto, pois se passa no interior da personalidade, tem presunção absoluta. Cabe ressaltar, neste ínterim, que é objetiva a responsabilidade civil patronal, decorrente de dano moral praticado por seus prepostos perante a vítima, independendo de culpa da empresa no evento danoso, nos termos do art. 932, III, da CC/02 e Súmula 341 do STF ("É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto"). Basta, apenas, a prova de que o preposto praticou fato ofensivo a bens imateriais do trabalhador inerentes à sua personalidade, tais como a dignidade, honra, intimidade, liberdade e imagem, do qual deriva inexoravelmente o dano moral in re ipsa. Nesse sendeiro, segue a doutrina de Sergio Cavalieri, para quem "o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum. Assim, por exemplo, provada a perda de um filho, do cônjuge, ou de outro ente querido, não há que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre do próprio fato de acordo com as regras de experiência comum". (in Programa de Responsabilidade Civil. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 80). Em síntese: provada a existência do fato ilícito, ensejador do constrangimento, mostra-se devido o ressarcimento civil por dano moral, nos moldes do art. 186 do Código Civil: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito"; assim como à luz do art. 927 diploma legal: "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo". Delineados esses contornos e volvendo-se à hipótese dos autos, verifico da leitura do depoimento da primeira testemunha ouvida a rogo do demandante, restou evidenciado o assédio moral afirmado na exordial: "(...) que já presenciou o reclamante sendo ofendido pelo Sr. Gesse, que isso foi de 2019 a 2021, o que quer dizer é que o Sr. Gesse se referia ao reclamante como gordo (...)" Também a segunda testemunha do reclamante presenciou o uso de termos agressivos pelo Sr. Gessi contra o autor: "(...) perguntado porque ele saiu rs porque ele saiu por conta do Dr. Gesse, que o Sr. Gessi começou a xingar ele com palavras ofensivas, que isso é porque o Sr. Gessi faz isso sempre com todos os funcionários, que nesse dia ele chamou o reclamante de inútil e de idiota (..)" (id. 0d79e83) Ressalte-se que é a Instância Monocrática quem detém melhores condições de aferir a veracidade das declarações prestadas em juízo, atribuindo maior ou menor valor aos depoimentos de acordo com o comportamento das testemunhas durante o interrogatório, em face mesmo da imediatidade na colheita da prova oral. Desse modo, a este Tribunal ad quemi mpõe prestigiar o convencimento formado pelo MM. Juízo de origem, porquanto, na condição de condutor da instrução processual, encontra-se em posição privilegiada para reconhecer a veracidade dos fatos narrados pelas testemunhas. Em suma, haja vista o princípio da imediatidade, no caso dos autos, deve-se prestigiar a valoração que foi atribuída à prova oral pelo magistrado de primeiro grau, pois extraída por quem teve a possibilidade de, além de ouvir, sentir todas as reações dos depoentes. Nesse passo, restaram comprovados os xingamentos e ofensas, configurada prática agressiva e ofensiva adotada pelo réu. O reclamante era humilhado na frente de outras pessoas, tanto que a testemunha autoral presenciou tal comportamento do superior hierárquico. Não se faz necessário que o ambiente de trabalho seja extremamente formalista. No entanto, o trabalhador tem direito a um ambiente saudável e digno, em que as pessoas convivam em harmonia, cada qual respeitando a individualidade alheia. Em síntese conclusiva, entendo que a conduta patronal excedeu demasiadamente os estritos limites do poder diretivo empresarial (art. 2º da CLT c/c o art. 187 do CC), não se conformando muito menos aos postulados éticos que devem presidir a execução do contrato de trabalho (art. 422 do CC c/c o art. 8º da CLT), caracterizando-se ipso facto como ato ilícito (art. 186 do CC/02), gerador do dever de indenizar, a título de danos morais (art. 927 do CC/02 c/c o art. 8º da CLT), o patente abalo psicológico sofrido pelo trabalhador, que viu conspurcada a sua dignidade humana e os direitos gerais da personalidade. Nessa esteira de raciocínio, segue a remansosa e pacífica jurisprudência do c. TST: EMENTA: (...) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ASSÉDIO MORAL. CONSTRANGIMENTO AO EMPREGADO COM A UTILIZAÇÃO DE PALAVRAS DE BAIXO CALÃO. No caso, ficou consignado nos autos que o gerente agiu de forma desrespeitosa com os seus subordinados, os supervisores de venda, pressionando-os para o cumprimento de metas, com a utilização de palavras de baixo calão. Diante dos graves fatos narrados no acórdão regional, relativos à situação de humilhação e desrespeito por que passou a reclamante, o consequente dano moral é considerado in re ipsa, já que decorre da própria natureza dos fatos ocorridos, prescindindo, assim, de prova da sua ocorrência, em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido. Não há falar, portanto, em violação dos artigos 186 e 927 do Código Civil. (TST - RR 1945-45.2012.5.03.0017 - 2ª Turma - Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta - Data de Julgamento: 03/09/2014) (g.n.) Quanto ao arbitramento do valor indenizatório a título de danos morais, entende-se que ele deve ser fixado tomando em consideração a gravidade e a repercussão da ofensa, a culpa do ofensor, a condição econômica das partes, a pessoa do ofendido e, por fim, a intensidade do sofrimento que lhe foi causado. O julgador deve se atentar, ainda, para o desestímulo ao lesante, vetor pedagógico da indenização, de maneira a impedir a reiteração da conduta em outras situações, sem olvidar do bom senso, da experiência de vida, a realidade e as peculiaridades do caso individualmente. Nestes termos e considerando que a repercussão danosa é íntima, de modo que não se pode estabelecer com precisão a sua extensão, atentando para os parâmetros da razoabilidade e critérios suso mencionados, entendo que o valor da indenização compensatória pelo dano moral arbitrada na origem no montante de R$ 2.000,00 (dois mil reais) deve ser majorado. Em face do exposto, dou provimento parcial ao apelo do reclamante para majorar o montante arbitrado a título de danos morais para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o qual se mostra suficiente tanto a reconfortar a vítima, quanto a inibir a reincidência por parte da infratora, sem propiciar enriquecimento indevido. III - D I S P O S I T I V O POSTO ISSO, ACORDAM os Magistrados da 4a Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em, por unanimidade de votos, CONHECER do recurso ordinário interposto pelo reclamante, e no mérito DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL para majorar o montante arbitrado a título de danos morais para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Tudo nos termos da fundamentação do voto da Relatora. Presidiu a sessão a Excelentíssima Desembargadora Presidente Ivani Contini Bramante. Tomaram parte no julgamento as Excelentíssimas Desembargadoras Maria Isabel Cueva Moraes, Lycanthia Carolina Ramage e Ivani Contini Bramante. Relatora: Maria Isabel Cueva Moraes. Integrou a sessão virtual o (a) representante do Ministério Público. MARIA ISABEL CUEVA MORAES Desembargadora Federal do Trabalho Relatora SAO PAULO/SP, 02 de julho de 2025. FERNANDA LOYOLA BALBO Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- GESSI SANTANA DE OLIVEIRA
-
03/07/2025 - Documento obtido via DJENAcórdão Baixar (PDF)