H. B. M. S. x A. A. De B. S. P. L. e outros

Número do Processo: 1001874-38.2024.8.26.0268

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJSP
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Foro de Itapecerica da Serra - 3ª Vara
Última atualização encontrada em 03 de julho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 03/07/2025 - Intimação
    Órgão: Foro de Itapecerica da Serra - 3ª Vara | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Processo 1001874-38.2024.8.26.0268 - Procedimento Comum Cível - Indenização por Dano Moral - H.B.M.S. - C.N.U.C.C. - - A.A.B.S.P. - Vistos. Trata-se de ação ordinária de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais c/c pedido de tutela de urgência proposta por HEITOR BASALIA MODOLO SEGA, menor impúbere representado por sua genitora NIVEA JOANA D'ARC MODOLO SEGA, em face de CENTRAL NACIONAL UNIMED - COOPERATIVA CENTRAL e ALLCARE ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS EM SAÚDE LTDA, na qual alega que é beneficiário do plano de saúde UNIMED NACIONAL desde junho de 2018, na modalidade contrato coletivo por adesão firmado em convênio pela segunda requerida, que figura como administradora do referido plano de assistência à saúde. Sustenta o autor que foi diagnosticado com Transtornos Específicos do Desenvolvimento da Fala e da Linguagem (CID F 80.0) e Transtorno do Espectro Autista com desordem do desenvolvimento intelectual e com ausência de linguagem funcional (CID 11 6A02.5), necessitando de tratamento multidisciplinar intensivo, incluindo terapia ABA de 40 horas semanais, terapia ocupacional com integração sensorial de 3 horas semanais, fonoterapia para fala e linguagem com PECs, Prompt e laserterapia de 3 horas semanais, musicoterapia de 1 hora semanal e psicomotricidade de 1 hora semanal, conforme prescrição médica especializada. Narra que sempre cumpriu rigorosamente suas obrigações contratuais, realizando o pagamento das mensalidades antes mesmo do vencimento, demonstrando total interesse em permanecer cliente das empresas requeridas. Contudo, foi surpreendido em 09 de abril de 2024 com o comunicado de descontinuidade do contrato, alegadamente por desequilíbrio econômico-financeiro, o que considera indevido posto que não incorreu em inadimplência e encontrava-se em pleno tratamento médico essencial à sua saúde e desenvolvimento. Diante desses fatos, sustenta que o cancelamento sumário e arbitrário do plano de saúde viola os princípios da função social do contrato, da boa-fé objetiva e da proteção ao consumidor hipossuficiente, especialmente considerando sua condição de menor portador de necessidades especiais em tratamento contínuo. Argumenta que a interrupção abrupta do tratamento causaria danos irreversíveis ao seu desenvolvimento cognitivo, linguístico e social, constituindo grave violação aos direitos fundamentais à saúde, à vida digna e à proteção integral da criança e do adolescente. Ao final, requereu a concessão de tutela de urgência para determinar o imediato restabelecimento da cobertura do seguro de saúde, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00; no mérito, a procedência total da ação tornando definitiva a liminar, a condenação das rés ao pagamento de danos morais em valor não inferior a R$ 10.000,00 e a condenação à devolução em dobro de eventuais despesas médicas que deveriam estar cobertas pelo plano durante o período de cancelamento. Por meio da decisão proferida às fls. 152/154, foi deferida a tutela de urgência para determinar a manutenção do plano de saúde no prazo de 48 horas, nas mesmas condições e com a mesma cobertura, mediante o pagamento das contraprestações mensais, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 até o limite de R$ 100.000,00. Devidamente citada, a requerida CENTRAL NACIONAL UNIMED apresentou contestação às fls. 346/356, na qual assevera que o cancelamento do contrato foi lícito e regular, uma vez que foram cumpridos todos os requisitos legais e contratuais: cláusula contratual prevendo a possibilidade de rescisão, ultrapassagem do prazo de 12 meses da avença, notificação prévia com antecedência mínima de 60 dias, respeito à continuidade do vínculo contratual para beneficiários internados ou em tratamento médico grave, e observância do art. 13 da Lei 9.656/98. Sustenta que o menor não se encontra em situação de internação hospitalar ou tratamento garantidor de sobrevivência nos termos do Tema 1082 do STJ, mas apenas em tratamento multidisciplinar de melhoria da qualidade de vida. Argumenta pela bilateralidade do contrato e pela aplicação do princípio da intervenção mínima, defendendo que a rescisão unilateral é direito das operadoras em contratos coletivos. Nega a existência de danos morais e contesta a possibilidade de inversão do ônus da prova. Por sua vez, a requerida ALLCARE ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS apresentou contestação às fls. 433/477, na qual preliminarmente impugna a concessão da justiça gratuita por ausência de comprovação da miserabilidade. No mérito, sustenta que o cancelamento decorreu de análise técnica, econômico-financeira e atuarial do contrato, fundamentada na elevação dos custos médicos e verificação do índice de sinistralidade que tornou inviável a manutenção do plano. Argumenta que cumpriu rigorosamente o dever de informação, comunicando previamente o cancelamento com mais de 30 dias de antecedência e orientando sobre a possibilidade de portabilidade sem cumprimento de novos prazos de carência. Sustenta sua condição de mera administradora de benefícios, impedida normativamente de exercer atividades assistenciais próprias de operadoras, defendendo a ausência de responsabilidade pelos tratamentos médicos. Nega a existência de danos morais e requer a improcedência dos pedidos. O Ministério Público manifestou-se às fls. 119/121 pela concessão da tutela pretendida, considerando a necessidade de garantir a continuidade dos tratamentos vitais do infante, e posteriormente às fls. 536/544 opinou pela procedência parcial dos pedidos, reconhecendo a abusividade do cancelamento durante tratamento médico essencial e a configuração de danos morais, sugerindo indenização de R$ 5.000,00. Intimadas a especificarem as provas, as partes requeridas manifestaram desinteresse na produção de provas adicionais (fls. 514 e 515/516), enquanto a parte autora requereu o julgamento antecipado da lide por se tratar de matéria eminentemente de direito (fls. 529/530). É o relatório. Fundamento e decido. O feito encontra-se em ordem, com a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, inexistindo qualquer preliminar ou nulidade a ser abordada. Superado esse introito, anoto que a presente demanda versa essencialmente sobre a validade da rescisão unilateral de contrato de plano de saúde coletivo durante tratamento médico continuado de menor portador de transtorno do espectro autista. O cerne da controvérsia reside na interpretação da extensão dos direitos do consumidor-beneficiário de plano de saúde coletivo quando em tratamento médico essencial, confrontada com os alegados direitos da operadora de promover rescisão unilateral motivada por desequilíbrio econômico-financeiro. A questão transcende a mera análise contratual, envolvendo direitos fundamentais constitucionalmente assegurados, especialmente considerando tratar-se de menor em situação de vulnerabilidade múltipla: pela idade, pela condição de saúde e pela hipossuficiência na relação consumerista. O ordenamento jurídico brasileiro confere proteção especial à saúde, consagrando-a como direito fundamental no art. 6º da Constituição Federal e como direito social no art. 196, que estabelece ser "a saúde direito de todos e dever do Estado, garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". Paralelamente, o art. 227 da Carta Magna assegura com absoluta prioridade o direito à saúde da criança e do adolescente, impondo à família, à sociedade e ao Estado o dever de colocá-los a salvo de toda forma de negligência e discriminação. A Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), em seu art. 4º, estabelece que "é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação", determinando em seu art. 11 que "é assegurado atendimento médico à criança e ao adolescente, através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde". A Lei 12.764/12, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, estabelece em seu art. 2º como diretrizes: "I - a intersetorialidade no desenvolvimento das ações e das políticas e no atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista; II - a participação da comunidade na formulação de políticas públicas voltadas para as pessoas com transtorno do espectro autista e o controle social da sua implantação, acompanhamento e avaliação; III - a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com transtorno do espectro autista, objetivando o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e nutrientes". No âmbito das relações de consumo, a Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) estabelece em seu art. 6º, III, como direito básico do consumidor "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem". A Lei 9.656/98, que regulamenta os planos e seguros privados de assistência à saúde, estabelece em seu art. 13, parágrafo único, III, a vedação da "suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias consecutivos, ou cento e oitenta dias intercalados, nos últimos doze meses de vigência do contrato, sendo vedada a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, em qualquer hipótese, durante a ocorrência de internação do titular". No caso em tela, restou incontroverso que o autor é menor de idade portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA) em grau severo, com comprometimento significativo da linguagem, comunicação e interação social, conforme amplamente documentado pelos relatórios médicos especializados acostados aos autos. A documentação médica demonstra de forma inequívoca que o tratamento multidisciplinar proposto não constitui mero conforto ou melhoria cosmética da qualidade de vida, mas sim intervenção terapêutica essencial para o desenvolvimento neurológico, cognitivo e social da criança, com potencial de prevenir deterioração funcional e promover ganhos significativos em sua capacidade de comunicação e autonomia. O método ABA (Applied Behavior Analysis), especificamente prescrito em 40 horas semanais, constitui abordagem terapêutica cientificamente validada e reconhecida como padrão-ouro no tratamento do TEA, sendo expressamente contemplada na Nota Técnica NAT/JUS-SP nº 1/19, que o define como "método de ensino de comportamentos apropriados, dividindo as tarefas em pequenos passos e treinando os pacientes de forma sistemática e precisa". A argumentação das requeridas de que o tratamento não se enquadra na proteção do Tema 1082 do STJ por não envolver risco imediato de vida revela interpretação restritiva e inadequada dos direitos fundamentais em questão. O conceito de "incolumidade física" referido na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça deve ser interpretado de forma ampla, abrangendo não apenas o risco de morte iminente, mas também situações em que a interrupção do tratamento possa causar prejuízos irreversíveis ao desenvolvimento e à integridade física, mental e social do paciente. No caso específico do TEA, a literatura médica é unânime ao demonstrar que a interrupção abrupta de tratamento intensivo durante a fase crítica do desenvolvimento neurológico (especialmente na primeira infância) pode resultar em perdas funcionais permanentes e irreversíveis, constituindo, portanto, risco concreto à incolumidade física e mental da criança. A alegação de desequilíbrio econômico-financeiro como justificativa para a rescisão unilateral não pode prosperar quando confrontada com os direitos fundamentais em questão. Embora seja legítimo o interesse empresarial na manutenção do equilíbrio econômico dos contratos, tal interesse não pode sobrepor-se aos direitos constitucionalmente assegurados à saúde, à vida digna e à proteção integral da criança. A própria natureza dos contratos de assistência à saúde, caracterizados pela função social preponderante e pela essencialidade do objeto contratual, impõe limitações ao exercício de direitos potestivos pelas operadoras, especialmente quando tal exercício possa comprometer o acesso a tratamentos de saúde essenciais. Ademais, a documentação acostada aos autos comprova que o autor mantinha rigorosa adimplência contratual, tendo inclusive antecipado pagamentos, o que afasta qualquer alegação de inadimplemento como causa justificadora da rescisão. A conduta das requeridas caracteriza prática abusiva nos termos do art. 39, II, do CDC, consistente em "recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes", bem como violação ao dever de continuidade dos serviços essenciais, conforme art. 6º, X, do mesmo diploma legal. Quanto aos danos morais pleiteados, é manifesta sua configuração no caso em apreço. A conduta das requeridas, ao promover a rescisão unilateral do contrato durante tratamento médico essencial de menor portador de deficiência, extrapolou os limites do mero descumprimento contratual, caracterizando violação à dignidade da pessoa humana e aos direitos da personalidade. A especial vulnerabilidade do autor - menor de idade, portador de deficiência e em tratamento médico continuado - agrava significativamente o dano moral sofrido, considerando não apenas o sofrimento presente, mas também a angústia gerada pela incerteza quanto à continuidade do tratamento e os potenciais prejuízos ao seu desenvolvimento futuro. A fixação do quantum indenizatório deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, considerando a gravidade da conduta, a condição econômica das partes, a extensão do dano e o caráter pedagógico da sanção. No caso em apreço, considerando todos esses fatores, entendo adequada a fixação da indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais). Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: a) CONFIRMAR a tutela de urgência anteriormente deferida, determinando às requeridas que mantenham o plano de saúde do autor nas mesmas condições contratuais anteriormente vigentes, garantindo a integralidade da cobertura assistencial prescrita, especialmente o tratamento multidisciplinar com método ABA, terapia ocupacional, fonoterapia, musicoterapia e psicomotricidade, conforme prescrição médica; b) CONDENAR as requeridas, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (cinco mil reais), comcorreçãomonetária pelo IPCA a partir da presente data (Súmula 362 do STJ) ejurosmoratórios à razão da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), deduzido o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), nos termos do art. 406, §§1º e 3º, CC, também a partir desta data.; c) CONDENAR as requeridas ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Transitada em julgado, arquivem-se os autos com as baixas de praxe. P.R.I.C. - ADV: LUIZ GUILHERME MENDES BARRETO (OAB 200863/SP), ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB 23255/PE), VANESSA ALMEIDA DE SOUZA FIRMINO (OAB 516266/SP), ROSIVANIA ALMEIDA DE SOUZA (OAB 121051/MG)
  2. 17/06/2025 - Intimação
    Órgão: Foro de Itapecerica da Serra - 3ª Vara | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Processo 1001874-38.2024.8.26.0268 - Procedimento Comum Cível - Indenização por Dano Moral - H.B.M.S. - C.N.U.C.C. - - A.A.B.S.P. - Vistos. Tornem ao MP, para parecer final. Após, tornem conclusos. Intime-se. - ADV: VANESSA ALMEIDA DE SOUZA FIRMINO (OAB 516266/SP), LUIZ GUILHERME MENDES BARRETO (OAB 200863/SP), ROSIVANIA ALMEIDA DE SOUZA (OAB 121051/MG), ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO (OAB 23255/PE)
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