Jackson Fernando De Oliveira x Benevenuto Tavares Zanette e outros
Número do Processo:
1037491-83.2021.8.11.0041
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMT
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
7ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ
Última atualização encontrada em
16 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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24/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 7ª VARA CÍVEL DE CUIABÁ | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELProcesso nº 1037491-83.2021.8.11.0041 (h) VISTOS, JACKSON FERNANDO DE OLIVEIRA propôs AÇÃO ANULATÓRIA DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL (Confissão de Dívida) em desfavor de VALMOR ZANETTE e BENEVENUTO TAVARES ZANETTE. Narra a parte autora que juntamente com a sua companheira Dayanna Priscila Zark Borges, fundaram em 22 de novembro de 2011, a ESPAÇO VIP COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA, sendo que na data de 12 de julho de 2016, o senhor Estevão Carradore, visando a ampliação de seu negócio, locou um imóvel localizado na Rodovia Mário Andreazza, n.º 03, Bairro Guarita, Várzea Grande, MT CEP 78144-900, que se trata de um terreno de propriedade do senhor HELOIZO JOSÉ DA CONCEIÇÃO, brasileiro, comerciante, portador do RG: 095.494 SSP/MT, e CPF: 137.942.911-83, residente e domiciliado a Rua Flor de Lotus, Quadra 11, casa 18, Bairro Jardim Tarumã em Várzea Grande – MT. Assevera que na mesma época o postulante JACKSON FERNANDO DE OLIVEIRA e ALEXANDRE ZANETTI GHIORZI, brasileiro, casado, empresário, portador da cédula de identidade RG n.º 1114386-0 SSP/MT e do CPF n.º 925.313.961-15, com endereço atual sito a Avenida Campo Grande, n.º 1438, Bairro Centro, Primavera do Leste/MT CEP 78850-000, celebraram informalmente com o senhor Estevão Carradore uma parceria para exercício da atividade comercial na ESPAÇO VIP COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA. Com efeito, em que pese o registro e o comando da empresa estar constando apenas em nome de Estevão, Jackson e Alexandre também auxiliava nas atividades da empresa, inclusive na gestão. Alega que Valmor, atuava em operações irregulares de fomento “Agiotagem”, e que captou uma série de recursos junto ao Banco do Brasil, e por esta razão estava em vias de ter seu patrimônio alcançado por EXECUÇÃO JUDICIAL promovia não só pelo banco, mas também, pela Fazenda Pública do Estado de Mato Grosso, conforme se vê, nas ações PJE n.º 0001086-98.2012.8.12.0111, n.º 0002370-78.2010.8.12.0111, n.º 0000308- 02.2009.8.12.0111 e n.º 0000298-55.2009.8.12.0111, por essa razão, precisava se desfazer daqueles recurso. Afirma que VALMOR ZANETTE, decidiu com vias a ocultar o patrimônio exequível, celebrar por intermédio de seu filho Benevenuto Tavares Zanette, um ‘contrato’ de parceria com o Sr. Estevão Carradore, juntamente com os demais parceiros de negócio. O empreendimento em questão, fora definitivamente denominado como CONFRARIA ESPAÇO VIP. Para ingresso na empreitada, Valmor exigiu, também fazer parte das operações da empresa já estabelecida ESPAÇO VIP COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA, tendo em vista que a mesma, já estava estabelecida e que, já possuía a época faturamento considerável. Aduz que em 21 de maio de 2018, foi celebrado (06 - Documento 06 - Instrumento de Confissão de Dívida - 21 de maio de 2018), onde o RECLAMANTE e o senhor Estevão, confessavam uma dívida cujo objeto seria a construção da CONFRARIA ESPAÇO VIP e de supostas dívidas contraídas no cartão de crédito do senhor Estevão, no entanto, os valores apresentados, não puderem ser contestados, assim como também não foram roborados através de outros documentos contratos, fatura, ou notas fiscais, valendo neste ponto, apenas e tão somente a palavra de Valmor. Relata que Valmor é conhecido por ser violento, acostumado com a lida das operações informais de fomento (Agiotagem). Durante a festa de inauguração do empreendimento, Valmor tratou de deixar verbalmente claro a todos que ali estavam, colaboradores e convidados, que seria ele quem havia pago por tudo ali, por isso, ditava as regras. Por conta desse posicionamento e dessas colocações, Valmor terminou por se desentender com Estevão, tentando lhe agredir fisicamente, fato este, que só não se consumou, pois, houve a intervenção dos seguranças, gerando situação bastante constrangedora para todos os presentes. Afirma que entendendo por suficiente a constituição em mora, Valmor fazendo uso de seu filho Benevenuto ingressou neste juízo, com a Execução Judicial n.º 1027235-82.2022.8.12.0041, exigindo o pagamento da suposta dívida que na conta dos REQUERIDOS, a quantia já alcança a cifra de R$ 222.163,37 (duzentos e vinte e dois mil cento e sessenta e três reais e trinta e sete centavos). Por fim, requer em sede de tutela de urgência, seja determinada a conversão da ação de execução nº 1027235- 81.2021.8.11.0041, tramitando neste juízo, em ação monitória, assim como seja sobrestado referido processo executivo, e no mérito, a procedência da demanda, para declarar a nulidade do Instrumento de Confissão de Dívida, em virtude da ilegitimidade do RECLAMANTE para figurar como devedor no supradito termo e pela invalidade de sua formulação, nulidade do Contrato de Novação de Dívida, por vicio de forma, e de consentimento e por acender de instrumento nulo de pleno direito, além da concessão dos benefícios da justiça gratuita. Decisão de ID. 75189712, indeferindo o pedido de tutela de urgência, concedendo os benefícios da justiça gratuita e determinando a citação da Requerida. Audiência de conciliação realizada no dia 02/05/2023, sem êxito (ID. 116514859). Contestação apresentada no ID. 117999599, arguindo a preliminar de impugnação a justiça gratuita, carência da ação por falta de interesse de agir, inépcia da inicial, ilegitimidade passiva do Requerido/Valmor, e no mérito, a improcedência dos pedidos. Impugnação a contestação de ID. 119325393. Intimadas para apresentarem as provas que pretendem produzir, o Autor pugnou pela produção de prova testemunhal (ID. 120977085), assim como o Requerido no ID. 121794721. Sentença de improcedência no ID. 140255401. A parte Autora interpôs recurso de apelação, o qual foi provido, acolhendo a preliminar para cassar a r. sentença e determinar o retorno dos autos a instância de origem para seu regular processamento, a fim de que seja realizada a instrução probatória, com a produção da prova pretendida pela parte (ID. 160517840). Audiência de instrução realizada no dia 11/03/2025, foi ouvida testemunha arrolada pelo Autor, Sr. ESTEVÃO CARRADORE. Após, foi ouvida testemunha arrolada pelo Autor, Sr. HELOIZO JOSÉ DA CONCEIÇÃO. Ato continuo, foi ouvida testemunha arrolada pelos Requeridos, Sr. IGOR PALAVRO. Após, foi ouvida testemunha arrolada pelos Requeridos, Sr. ELVES MARQUES CARVALHO. Por fim, foi ouvida testemunha arrolada pelos Requeridos, Sr. MARIO ANTONIO PAGOT (ID. 186681936). Alegações finais apresentadas pelos Requeridos no ID. 174485172 e pelo Autor no ID. 188371680. Após, vieram os autos conclusos. É O RELATÓRIO DECIDO. PRELIMINARES DA IMPUGNAÇÃO A JUSTIÇA GRATUITA Com efeito, a Lei nº 1.060/50 em seu art. 4º assegura à parte os benefícios da assistência judiciária desde que a mesma preste a informação na própria petição inicial de que não tem condições de arcar com custas processuais e com os honorários advocatícios sem prejuízo próprio ou de sua família. Por sua vez, o §1º do referido dispositivo legal estabelece que a condição de hipossuficiência é presumidamente verdadeira até prova em contrário. Compulsando os autos, verifico que a parte Impugnante não logrou êxito ao tentar comprovar suas alegações no sentido que a parte Impugnada possui condição suficiente para arcar com as despesas processuais, sem prejuízo do seu sustento e de sua família. Não obstante a isso, ressalto que nada impede em havendo uma mudança no cenário fático aqui produzido, seja o benefício da ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA, revogado, a qualquer tempo. Ademais, segundo a jurisprudência dominante, a hipossuficiência não significa a miséria da parte, mas somente a impossibilidade de arcar com custas do processo sem que disso resulte prejudicada a sua própria sobrevivência ou de sua família. Diante do exposto, REJEITO A IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA requerida e deferida em favor da parte Impugnada. DA INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL De acordo com Código de Processo Civil, o pedido deve ser certo e determinado, sendo admitida a formulação de pedido genérico apenas em casos específicos, cita-se: Art. 322. O pedido deve ser certo. § 1o Compreendem-se no principal os juros legais, a correção monetária e as verbas de sucumbência, inclusive os honorários advocatícios. § 2o A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé. Art. 323. Na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las. Art. 324. O pedido deve ser determinado. § 1o É lícito, porém, formular pedido genérico: I - nas ações universais, se o autor não puder individuar os bens demandados; II - quando não for possível determinar, desde logo, as consequências do ato ou do fato; III - quando a determinação do objeto ou do valor da condenação depender de ato que deva ser praticado pelo réu. § 2o O disposto neste artigo aplica-se à reconvenção. No caso em tela, verifico que a parte Requerida conseguiu defender-se de todos os pontos elencados nos fundamentos e nos pedidos, de tal modo, não vislumbro a hipótese de indeferimento da petição inicial. Ademais, se for o caso, verificada a incorreção dos pedidos ou desconexão dos fundamentos da causa de pedir às normas processuais e legislações atinentes à questão de fundo, a providência a ser tomada é a improcedência e não o indeferimento de pronto da petição inicial. Portanto, rejeito a preliminar. CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE EM AGIR Como sabido, o interesse de agir diz respeito ao binômio necessidade-adequação, sendo que a necessidade está relacionada ao fato de a parte ter de submeter a questão à análise do Poder Judiciário para ver satisfeita a sua pretensão e a adequação refere-se à utilização de meio processual apto à solução da lide. Sobre o tema, assim leciona Humberto Theodoro Júnior: "Localiza-se o interesse processual não apenas na utilidade, mas especificamente na necessidade do processo como remédio apto à aplicação do direito objetivo no caso concreto, pois a tutela jurisdicional não é jamais outorgada sem uma necessidade, como adverte Allorio. Essa necessidade se encontra naquela situação que nos leva a procurar uma solução judicial, sob pena de, se não fizermos, vermo-nos na contingência de não podermos ter satisfeita uma pretensão." (Curso de Direito Processual Civil, 15 ed., Forense, v. 1, p. 56). Com efeito, existe interesse processual quando o autor tem a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou conservar o seu direito, sobretudo demonstrando o seu direito, as razões pelas quais entende ser cabível os pedidos, bem como a sua finalidade. Dessa forma, afasto a preliminar suscitada, vez que sobejamente configurado o interesse de agir do autor. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO 2º RÉU – VALMOR ZANETTE Alega a parte Requerida que o 2º Requerido é parte ilegítima para figurar no polo passivo desta demanda, visto que não figurou como credor do acordo formalizado que originou o Instrumento Particular de Novação de Dívida, objeto desta demanda anulatória, pelo que requer, neste particular, a extinção do feito sem a resolução do mérito. Sobre a ilegitimidade passiva, o Professor, Humberto Theodoro Júnior, citando Arruda Alvim, que "a legitimidade do réu decorre do fato de ser ele a pessoa indicada, em sendo procedente a ação, a suportar os efeitos oriundos da sentença" (in Curso de Direito Processual Civil; Vol. I; 44ª. Ed; Forense; pág. 67). Sobre a legitimidade, leciona Cândido Rangel Dinamarco: Legitimidade ad causam é qualidade para estar em juízo, como demandante ou demandado, em relação a determinado conflito trazido ao exame do juiz. Ela depende sempre de uma necessária relação entre o sujeito e a causa e traduz-se na relevância que o resultado desta virá a ter sobre sua esfera de direitos, seja para favorecê-la ou para restringi-la. Sempre que a procedência de uma demanda seja apta a melhorar o patrimônio ou a vida do autor, ele será parte legítima; sempre que ela for apta a atuar sobre a vida ou patrimônio do réu, também esse será parte legítima. Daí conceituar-se essa condição da ação como relação de legítima adequação entre o sujeito e a causa. (Cândido Rangel Dinamarco, em Instituições de direito processual civil, 4. ed., São Paulo: Malheiros Editores, vol. II, p. 306) Segundo Alexandre Freitas Câmara: (...) deve o juiz raciocinar admitindo, provisoriamente, e por hipótese, que todas as afirmações do autor são verdadeiras, para que se possa verificar se estão presentes as condições da ação."(in Lições de Direito Processual Civil, 8ª ed., vol. 1, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 127) Contudo, a análise detida dos autos e, em especial, da prova oral produzida em audiência de instrução, revela uma participação ativa e central de Valmor Zanette nos negócios que deram origem à suposta dívida. A despeito de não figurar formalmente em todos os instrumentos contratuais, a materialidade fática aponta para sua ingerência direta e decisiva. A testemunha Estevão Carradore, arrolada pelo próprio autor, foi categórica ao afirmar que Valmor "sempre esteve à frente dos negócios", sendo ele o "responsável pelos aportes financeiros e mentor da operação", impondo sua vontade aos demais envolvidos, conforme relatado nas alegações finais do autor (ID 188371680). Mais do que isso, a testemunha Heloizo José da Conceição, proprietário do imóvel onde foi construído o barracão do Espaço VIP, confirmou ter adquirido a referida estrutura pelo valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), pago integralmente aos requeridos Benevenuto e Valmor Zanette, que foram quem lhe venderam o barracão (ID 188371680). Este fato, por si só, demonstra a participação direta de Valmor Zanette na transação que, segundo o autor, compensaria os valores supostamente investidos. Embora as testemunhas arroladas pelos requeridos tenham afirmado desconhecer a prática de agiotagem ou comportamentos violentos por parte de Valmor, tal circunstância não afasta sua legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. A questão da ilegitimidade passiva ad causam deve ser analisada sob a ótica da pertinência subjetiva da lide, ou seja, se a parte possui relação com a pretensão deduzida em juízo. No caso em tela, a pretensão anulatória do título executivo e a discussão sobre a origem e validade da dívida envolvem diretamente a atuação de Valmor Zanette, que, conforme a prova oral, foi o principal articulador e beneficiário das operações financeiras e negociais. A alegação de que Valmor não figura nos instrumentos contratuais é mitigada pela própria natureza da controvérsia, que busca desconstituir a validade de um título que, segundo o autor, foi constituído sem causa lícita e com a participação ativa de Valmor na gestão e recebimento de valores. Se a dívida confessada e novada tem sua origem em operações nas quais Valmor Zanette teve participação preponderante, sua presença no polo passivo é indispensável para a completa e eficaz resolução da lide, em observância ao princípio da economia processual e da efetividade da jurisdição. Assim, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva de Valmor Zanette. DO MÉRITO Com fulcro na permissão legal do artigo 370 do CPC, sobretudo considerando ser o juiz destinatário das provas, por estar suficientemente convencido sobre os pontos controvertidos, tomando por base as provas carreadas no caderno processual, passo a sentenciar o feito, na forma do inciso I do artigo 355 do Código de Processo Civil. O Autor pretende a declaração de nulidade do Instrumento de Confissão de Dívida firmado no dia 21 de maio de 2018, em virtude da ilegitimidade do Autor para figurar como devedor no supradito termo e pela invalidade de sua formulação, bem como o Contrato de Novação de Dívida firmado em 19 de fevereiro de 2019, por vicio de forma, e de consentimento e por acender de instrumento nulo de pleno direito. O Requerido, por sua vez, alega que não houve coação do Autor para assinar o instrumento de confissão de dívida, sendo após isso, não conseguindo pagar a dívida, ele próprio, propôs ao credor (1º Requerido) a novação da dívida, como forma de quitar a dívida em questão. Pois bem. Com efeito, para que o negócio jurídico seja tido como válido pelo ordenamento jurídico, produzindo, assim, todos os efeitos, faz-se mister que atenda certos requisitos que dizem respeito à pessoa do agente, ao objeto da relação e à forma da emissão de vontade. Nos termos do artigo 104, do Código Civil “a validade do negócio jurídico requer agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, e forma prescrita ou não defesa em lei”. Em primeiro lugar, a capacidade do agente é aquela necessária para a prática dos atos da vida civil. Nesse sentido, em regra, é necessário que o sujeito seja maior de 18 anos ou emancipado, desde que ele não seja interditado ou silvícola. Nos casos em que o agente for absolutamente incapaz, a representação deve ser feita pelos pais, tutor ou curador, conforme o caso, e ele não participa do ato. Já os relativamente incapazes participam do ato, junto com os referidos representantes, que assim os assistem. Em segundo plano, a validade do negócio jurídico requer objeto lícito, que é aquele que não atenta contra a lei, a moral ou os bons costumes, possível, sendo certo que apenas a impossibilidade absoluta, quando a prestação for irrealizável por qualquer pessoa, constitui obstáculo ao negócio jurídico, e determinado ou determinável no momento da execução. Por fim, o terceiro requisito de validade do negócio jurídico é a forma, que deve ser prescrita ou não defesa em lei. Em regra, a forma é livre (art. 107 Código Civil). As partes podem celebrar o contrato por instrumento público, particular, ou verbalmente, a não ser nos casos em que a lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio, exija a forma escrita, pública ou particular. Nesse contexto, é nulo o negócio jurídico quando não revestir a forma prescrita em lei ou for preterida alguma solenidade que a lei considera essencial para a sua validade (art. 166, IV e V, Código Civil). Outrossim, além dos requisitos de validade descritos no artigo 104 do Código Civil, é necessário que o ato não contenha defeitos para que ele seja válido. Nesse sentido, prescreve o artigo 171 do Código Civil, in verbis: Artigo 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico: (...) II – por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores. Cumpre destacar que, conforme os ensinamentos do doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, em sua obra de Direito Civil Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 2005, página 383, coação é “toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre um indivíduo para forçá-lo, contra a sua vontade, a praticar ato ou realizar um negócio”. Para viciar a declaração de vontade, contudo, tem-se que a coação deve incutir fundado temor de dano iminente e considerável à pessoa coagida, à sua família ou bens, segundo o disposto no artigo 151 do Código Civil. No caso concreto, restou incontroverso que as partes celebraram negócio jurídico de confissão de dívida, cuja validade é impugnada pelo Autor, sob o fundamento de que estava sob coação moral irresistível perpetrada pelos Réus, afirmando que somente assinou o documento por ter sido obrigado. A controvérsia se aprofunda na análise da causa debendi, ou seja, a origem e a legitimidade da dívida que lastreou a confissão e a posterior novação. O autor sustenta que não houve prestação de serviço, concessão de crédito ou qualquer relação negocial válida que pudesse dar origem à suposta dívida, e que os valores ali constantes não foram comprovados por meio de documentos idôneos. É fundamental destacar que, em um processo de execução ou em uma ação anulatória de título executivo, embora o título goze de presunção de liquidez, certeza e exigibilidade, essa presunção é relativa e pode ser afastada mediante prova em contrário. No caso de confissão de dívida, a Súmula 300 do Superior Tribunal de Justiça estabelece que "o instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial". Contudo, essa súmula não impede a discussão da causa debendi, especialmente quando há alegação de vícios que maculam a validade do negócio jurídico subjacente. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que "a renegociação de dívida ou a confissão de dívida não impede a discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores" (AgRg no AREsp 600.000/RS, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 17/03/2015, DJe 20/03/2015). A Súmula 286 do STJ, embora frequentemente aplicada a contratos bancários, reflete o princípio de que a novação não convalida vícios intrínsecos da obrigação original, permitindo a revisão dos contratos que a antecederam. A tese dos requeridos de que a novação impede a revisão dos contratos anteriores, com base em julgados que afastam a Súmula 286 do STJ em casos de "inovações substanciais no campo da livre vontade das partes", não se aplica quando a própria causa debendi é questionada em sua licitude e existência. Se a obrigação original é nula ou inexistente, a novação não tem o condão de sanar tal vício fundamental, pois a novação pressupõe a existência de uma obrigação anterior válida, conforme o artigo 360, inciso I, do Código Civil. A distribuição do ônus da prova, nos termos do artigo 373 do Código de Processo Civil, impõe ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito (inciso I) e ao réu o ônus de provar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (inciso II). No presente caso, o autor alega a nulidade do título por ausência de causa lícita e enriquecimento sem causa. Os requeridos, por sua vez, defendem a validade da dívida e da novação. Diante da alegação de inexistência da dívida subjacente, caberia aos requeridos, na condição de credores, comprovar a origem e a legitimidade dos valores que compõem o débito confessado e novado. Neste ponto, a instrução processual revelou-se crucial. Este Juízo, em cumprimento ao acórdão que cassou a sentença anterior por cerceamento de defesa, determinou que os requeridos apresentassem os contratos de empreitada da construção do Espaço VIP, projetos, ARTs, alvarás de construção, notas fiscais dos materiais utilizados e os contratos que fundamentaram a confissão de dívida. Os requeridos, contudo, manifestaram a impossibilidade de apresentar tais documentos, alegando que não os possuíam e que não participaram da administração ou gestão documental da obra, atuando apenas como financiadores. A ausência de tais documentos, que seriam essenciais para comprovar a origem e a composição da dívida, já fragiliza a pretensão dos requeridos. A prova oral produzida em audiência de instrução (ID 186681936) corrobora a tese autoral de que a dívida não possui lastro jurídico válido e que os requeridos buscaram enriquecimento sem causa. A testemunha Estevão Carradore, arrolada pelo autor, foi enfática ao afirmar que Jackson Fernando de Oliveira "jamais esteve à frente dos negócios", "nunca administrou recursos financeiros ou materiais aportados pelos réus Benevenuto e Valmor Zanette". Ao contrário, Estevão demonstrou que "os réus mentiram ao Juízo, uma vez que foram eles próprios os responsáveis pela execução da obra e administração dos recursos, cuja prestação de contas jamais foi realizada, sendo impossível precisar o valor efetivamente gasto na construção do barracão do Espaço VIP" (ID 188371680). Estevão ainda confirmou que Valmor "sempre esteve à frente dos negócios", sendo ele o "responsável pelos aportes financeiros e mentor da operação". A testemunha reconheceu que, de fato, foram depositados valores na conta da empresa Espaço VIP – CNPJ: 14.752.176/0001-04, no montante de R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais), sendo este o único valor aferível como destinado à obra, e ressaltou que tal quantia "jamais foi entregue ou administrada pelo autor, visto que Jackson não tinha acesso à conta bancária para onde foram direcionados os recursos" (IDs 186681940 a 186683847). A testemunha Heloizo José da Conceição, também arrolada pelo autor, confirmou ser o proprietário do imóvel onde foi construído o barracão do Espaço VIP e que foi ele o comprador da referida estrutura, pelo valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), pago integralmente aos requeridos Benevenuto e Valmor Zanette, que foram quem lhe venderam o barracão (IDs 186683849 a 186683851). Heloizo também afirmou que "quem dava as ordens na empreitada era Valmor Zanette", e que "não sabia dizer se o autor geriu ou participou da gestão de recursos durante a obra ou na eventual sociedade de fato". As testemunhas arroladas pelos requeridos, Igor Palavro, Elves Marques Carvalho e Mario Antonio Pagot, embora tenham negado conhecimento sobre a prática de agiotagem ou comportamentos violentos por parte de Valmor, não trouxeram elementos que pudessem comprovar a origem lícita e a composição da dívida cobrada do autor. Seus depoimentos, conforme as próprias alegações finais dos requeridos (ID 174485172), focaram na ausência de conhecimento sobre agiotagem ou ameaças, mas não infirmaram a narrativa do autor e de suas testemunhas quanto à gestão dos recursos e à venda do barracão. A alegação de coação, embora não tenha sido robustamente comprovada pelas testemunhas no que tange à violência física ou ameaças diretas que viciassem o consentimento de forma irresistível, é mitigada pela ausência de prova da própria dívida. O fato de o autor ter renegociado a dívida posteriormente (novação) não convalida uma obrigação que, desde sua origem, carece de causa jurídica lícita e de comprovação de sua existência e montante. O cerne da questão, portanto, não reside apenas na coação, mas na própria validade do objeto do negócio jurídico. O artigo 166, inciso II, do Código Civil, estabelece que "é nulo o negócio jurídico quando for ilícito, impossível ou indeterminado o seu objeto". No presente caso, a confissão de dívida e a novação visam à cobrança de um valor que, conforme a prova produzida, não encontra lastro em uma obrigação válida e comprovada. Os requeridos, apesar de intimados, não apresentaram os documentos que comprovariam a origem e a destinação dos valores supostamente emprestados ou investidos, limitando-se a alegar que não os possuíam. A prova testemunhal, por outro lado, demonstrou que os únicos valores comprovadamente aportados pelos requeridos totalizam R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais). Contudo, restou igualmente provado que o barracão, objeto da suposta aplicação, foi vendido pelos próprios requeridos Benevenuto e Valmor Zanette à testemunha Heloizo José da Conceição pelo montante de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). Essa transação, que gerou um lucro de R$ 110.000,00 (R$ 250.000,00 - R$ 140.000,00) para os requeridos, demonstra que os valores supostamente investidos já foram não apenas compensados, mas superados pelo retorno financeiro obtido com a venda do bem. Diante desse cenário, a pretensão de cobrar do autor a quantia de R$ 222.163,37 (duzentos e vinte e dois mil cento e sessenta e três reais e trinta e sete centavos), por meio de um título executivo desprovido de comprovação de sua origem e composição, configura nítida tentativa de enriquecimento sem causa, vedado pelo artigo 884 do Código Civil. O enriquecimento sem causa ocorre quando há um acréscimo patrimonial de uma parte em detrimento de outra, sem que haja uma justa causa jurídica para tal. No caso em tela, os requeridos auferiram lucro com a venda do barracão e, ainda assim, buscam cobrar uma dívida que não se sustenta em elementos probatórios concretos e que, financeiramente, já foi compensada e superada. A ausência de liquidez, certeza e exigibilidade do título executivo extrajudicial é patente. O artigo 783 do Código de Processo Civil preceitua que "a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa, líquida e exigível". A liquidez pressupõe a determinação exata do quantum debeatur, o que não se verifica, pois o valor de R$ 222.163,37 (duzentos e vinte e dois mil cento e sessenta e três reais e trinta e sete centavos) não está lastreado em documentos contábeis ou fiscais que comprovem sua origem e composição. A certeza diz respeito à existência inequívoca da obrigação, que foi desconstituída pela prova oral que demonstrou que o autor não geriu os recursos nem foi responsável pela obra. A exigibilidade, por sua vez, exige que a obrigação esteja vencida e que não haja causas impeditivas à sua cobrança, o que é afastado pela inexistência de causa subjacente válida e pela compensação patrimonial já ocorrida. Portanto, a confissão de dívida e a novação, no presente caso, não se sustentam como títulos executivos válidos, pois a obrigação que lhes deu origem não foi comprovada em sua existência e licitude, e os valores supostamente devidos já foram compensados pela venda do bem. A pretensão dos requeridos de cobrar a quantia de R$ 222.163,37 (duzentos e vinte e dois mil cento e sessenta e três reais e trinta e sete centavos) do autor, sob tais circunstâncias, revela-se abusiva e desprovida de fundamento jurídico. ANTE O EXPOSTO, com fulcro no artigo 487, I do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial por JACKSON FERNANDO DE OLIVEIRA em face do Requerido BENEVENUTO TAVARES ZANETTE, para DECLARAR A NULIDADE do Instrumento Particular de Confissão de Dívida, datado de 21 de maio de 2018 (ID 68829125), e, por conseguinte, do Instrumento Particular de Novação de Dívida, datado de 19 de fevereiro de 2019, bem como, para DECLARAR A INEXISTÊNCIA de relação jurídica obrigacional entre as partes, no que tange ao débito de R$ 222.163,37 (duzentos e vinte e dois mil, cento e sessenta e três reais e trinta e sete centavos). CONDENO a parte Requerida ao pagamento das custas e despesas processuais, honorários advocatícios que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor atribuído à causa, nos termos do artigo 85, §2º do NCPC. Transitado em julgado, arquive-se. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá/MT, data da assinatura digital. YALE SABO MENDES Juiz de Direito
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24/06/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)