Francisco Alves Linhares Neto x Felipe Gazola Vieira Marques
Número do Processo:
3004544-82.2024.8.06.0167
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJCE
Classe:
RECURSO INOMINADO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2º Gabinete da 1ª Turma Recursal
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2º Gabinete da 1ª Turma Recursal | Classe: RECURSO INOMINADO CíVELESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO 1ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS GABINETE DA JUÍZA GERITSA SAMPAIO FERNANDES RECURSO INOMINADO: 3004544-82.2024.8.06.0167 RECORRENTE: ANTÔNIO FERNANDES DE SOUSA RECORRIDO: BANCO BMG S.A. ORIGEM: 1ª UNIDADE DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E CRIMINAL DA COMARCA DE SOBRAL RELATORA: JUÍZA GERITSA SAMPAIO FERNANDES EMENTA: RECURSO INOMINADO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CAUSA DE PEDIR QUE SE FUNDA NA AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO. CONTRATO COM ACEITE ELETRÔNICO POR MEIO DE FOTOGRAFIA DO TIPO SELFIE. CONTRATAÇÃO IMPUGNADA PELO AUTOR EM RÉPLICA. DEMAIS DOCUMENTOS PROBATÓRIOS INSUFICIENTES PARA O DESLINDE DO FEITO EM BUSCA DA VERDADE REAL. NECESSIDADE DE PERÍCIA. PROVA COMPLEXA QUE AFASTA A COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS, NOS TERMOS DO ART. 3º, DA LEI N. 9.099/1995. INCOMPETÊNCIA RECONHECIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, DE OFÍCIO, A TEOR DO ART. 51, INCISO II, DA LEI Nº 9.099/95. SENTENÇA ANULADA. RECURSO NÃO CONHECIDO E PREJUDICADO. ACÓRDÃO Acordam os membros da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado do Ceará, à unanimidade de votos, em ANULAR A SENTENÇA e NÃO CONHECER DO RECURSO INOMINADO INTERPOSTO por restar PREJUDICADO, nos termos do voto da relatora. Acórdão assinado pela juíza relatora, em conformidade com o disposto no art. 61, do Regimento Interno das Turmas Recursais. Fortaleza, data da assinatura digital. GERITSA SAMPAIO FERNANDES JUÍZA RELATORA RELATÓRIO Trata-se de "ação declaratória de nulidade de contrato c/c reparação por danos materiais e morais" ajuizada por Antônio Fernandes de Sousa contra o Banco BMG S.A, insurgindo-se em face dos 20 (vintes) descontos mensais realizados em seu benefício previdenciário referente ao contrato de cartão de crédito consignado de nº 17334468, no valor total de R$ 1.212,00. Requereu a declaração de nulidade da contratação, a condenação do reclamado ao pagamento de indenização por dano moral no importe de R$ 7.000,00 (sete mil reais), e a repetição do indébito na forma dobrada. Juntou histórico de empréstimo consignado (Id 20142176). Em sede de contestação (Id 20142244), o banco defendeu a regularidade das cobranças, sob o argumento de que o autor contratou o cartão de crédito consignado "BMG Card", mediante a assinatura do termo de adesão e do termo de autorização para desconto em folha de pagamento, ambas validadas por biometria facial. Pleiteou a improcedência da ação e, subsidiariamente, em caso de eventual condenação, a repetição do indébito na forma simples além da restituição pelo autor dos valores que lhe foram disponibilizados. Juntou cédula de crédito bancário, cópia dos documentos do autor, fotografia do autor, termo de adesão, faturas (Ids. 20142246, 20142248, 20142249 e 20142251). O autor ofertou réplica no Id 20142253, na qual destacou que a juntada da foto do autor é incapaz de provar a higidez do contrato, pois não existe validação por qualquer mecanismo de autenticação e segurança. Afirmou ainda que o instrumento apresentado pelo banco não é válido. Sobreveio sentença (Id 20142254) de improcedência dos pedidos autorais, sob o fundamento de que a instituição demandada provou a efetivação do contrato impugnado pelo autor, mediante a juntada de contrato válido assinado eletronicamente, restando clara a demonstração da manifestação de vontade do reclamante e não se visualizando responsabilidade da parte reclamada quando ao dano moral pleiteado na inicial. O reclamante interpôs recurso inominado (Id 20142256) argumentando que "a parte requerida não acostou provas suficientes sobre os termos da citada contratação, pois, em que pese a instituição defenda a validade da assinatura digital por meio de biometria facial, não se verificou os parâmetros usados para aferição da suposta contratação pela consumidora". Afirmou ainda que "não há comprovação da existência da certificação digital, sendo a suposta "biometria facial" tão somente uma foto da parte autora". Assim, requereu a reforma da sentença objetivando o julgamento de procedência dos pedidos iniciais. Contrarrazões pelo desprovimento do apelo no Id 20142262. É o relatório. VOTO A controvérsia recursal se refere a validade do contrato de cartão de crédito consignado firmado digitalmente e a consequente obrigação de restituição dos valores descontados, bem como a reparação moral pertinente. Em relação aos contratos eletrônicos existem particularidades específicas dentre as quais pode se citar a flexibilização da sua formalização, ocorrendo a instrumentalização do acordo mediante informações digitais. Além disso, exige-se do contrato eletrônico a certificação eletrônica e a assinatura digital devidamente aferida por autoridade certificadora legalmente constituída. Nesse contexto, tem-se que a validade do instrumento negocial eletrônico pressupõe a autenticidade e presencialidade do contratante, a qual se dá com a utilização de procedimentos que asseguram a integridade da informação e identificação do emissor, tais como a utilização da assinatura digital criptografada e o arquivamento do documento eletrônico contendo o histórico de autenticação, endereços IP dos signatários, dados de geolocalização, dentre outros. Conquanto se reconheça a possibilidade de contratação eletrônica, nos termos do art. 411, inciso II, do CPC, um documento eletrônico é autêntico quando sua autoria está identificada por qualquer meio legal de certificação, o que inocorreu no caso em análise. A mera apresentação de cédula bancária e assinatura atribuída ao consumidor não comprova a validade da contratação, especialmente diante da impugnação expressa do autor. Da detida análise dos documentos anexados nos Ids 20142249 e 20142251, estes não contêm, de forma clara, todos os critérios para validade da assinatura eletrônica, sendo a identificação do emissor, o histórico de autenticação, endereço IP e assinatura digital criptografada e certificada por terceiro diante de sua biometria facial, a fim de evidenciar, assim, a sua integridade, consentimento e autenticidade. Logo, não é possível inferir, sem o auxílio de uma perícia técnica especializada, se de fato houve a contratação pelo recorrente com assinatura eletrônica, tornando a causa complexa, por demandar a realização de prova pericial, acompanhada por ambas as partes, as quais poderão formular quesitos, indicando assistentes técnicos, se assim desejarem, e sendo-lhes, ao final, oportunizado impugnar a conclusão a que chegar o especialista, na forma do que dispõem o art. 464 e seguintes do CPC. Em sendo assim, esse procedimento não se coaduna ao microssistema jurídico dos Juizados Especiais, por expressa disposição do art. 3º da Lei n. 9.099/1995, que limita a competência para o julgamento de causas cíveis de menor complexidade, e o grau de dificuldade da causa é aferido pela especificidade técnica da prova, como orienta o FONAJE, em seu enunciado n. 54: "A menor complexidade da causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direito material, restando afastada a causa da competência desta Justiça Especializada". Ante o exposto, JULGO PREJUDICADO O RECURSO INOMINADO, diante da necessidade de prova pericial e a incompetência dos juizados especiais para processar e julgar, razão pela qual extingo o processo sem resolução de mérito, o que faço com arrimo no art. 51, inciso II, da Lei nº 9.099/95. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, ante o resultado do julgamento. É como voto. Fortaleza, data supra. GERITSA SAMPAIO FERNANDES JUÍZA RELATORA