Zizelda Gomes Dos Reis Rodrigues e outros x Advocacia-Geral Do Estado
Número do Processo:
5000659-59.2023.8.13.0363
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMG
Classe:
Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Grau:
1º Grau
Órgão:
1º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de João Pinheiro
Última atualização encontrada em
07 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
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26/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de João Pinheiro | Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda PúblicaPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de João Pinheiro / 1º Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de João Pinheiro Avenida Zico Dornelas, 791, Santa Cruz, João Pinheiro - MG - CEP: 38770-000 PROCESSO Nº: 5000659-59.2023.8.13.0363 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA (14695) ASSUNTO: [Indenização por Dano Material] AUTOR: AMILTON OLIVEIRA DA GAMA CPF: 044.179.516-16 e outros RÉU: ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO CPF: 16.745.465/0001-01 SENTENÇA Vistos. Dispensado o relatório, uma vez que a referida demanda é processada nos termos da Lei n.° 9.099/95. Decido. 1. Fundamentação 1.1 Da Preliminar de Intempestividade da Contestação Os requerentes arguiram a intempestividade da contestação apresentada pelo Estado de Minas Gerais, pleiteando seu desentranhamento e a aplicação dos efeitos da revelia. Conforme se verifica nos autos, a citação do Estado de Minas Gerais ocorreu em 28 de julho de 2023, na pessoa de Sérgio Pessoa de Paula Castro (ID 9868085480). O prazo para a Fazenda Pública contestar é de 30 (trinta) dias úteis, em dobro, nos termos do art. 183 do Código de Processo Civil. Realizando a contagem do prazo a partir da data da citação (28/07/2023), o termo inicial para a contagem do prazo de 30 dias úteis seria o primeiro dia útil subsequente, ou seja, 31/07/2023. Computando-se os dias úteis, o trigésimo dia útil para a apresentação da contestação recairia em 08 de setembro de 2023. A contestação, contudo, foi protocolada somente em 15 de outubro de 2023 (ID 10090083909), evidenciando, de fato, sua intempestividade. Dessa forma, acolho a preliminar de intempestividade da contestação. 2. Do Mérito 2.1 Da Responsabilidade Civil do Estado A controvérsia central da presente demanda reside na análise da responsabilidade civil do Estado de Minas Gerais pelos danos supostamente causados aos requerentes em decorrência da conduta do Oficial do Cartório de Registro Civil e das Pessoas Naturais de Brasilândia de Minas. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, § 6º, estabelece a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Essa norma constitucional consagra a teoria do risco administrativo, segundo a qual basta a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta do agente público (comissiva ou omissiva) e o dano sofrido pelo particular, sendo desnecessária a aferição de culpa do agente. Ademais, a Lei nº 8.935/94, que regulamenta os serviços notariais e de registro, dispõe em seu art. 22 que "Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso." Embora a responsabilidade primária do notário ou registrador seja subjetiva, a responsabilidade do Estado, por se tratar de serviço público delegado, é objetiva e solidária, conforme entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal em regime de repercussão geral (RE 842.846/SC). Portanto, a responsabilidade do Estado de Minas Gerais pelos atos praticados pelo Oficial do Cartório de Registro Civil e das Pessoas Naturais de Brasilândia de Minas é objetiva, bastando a demonstração do dano e do nexo de causalidade. 2.2. Da Análise do Ato Administrativo pelo Poder Judiciário A tese defensiva do Estado de Minas Gerais, de que o Poder Judiciário não poderia analisar o mérito do ato administrativo, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes, não se sustenta. O controle judicial dos atos administrativos, em regra, limita-se à verificação da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da publicidade e da eficiência, bem como da razoabilidade e proporcionalidade, sem adentrar no juízo de conveniência e oportunidade da Administração. No presente caso, a discussão não se refere ao mérito discricionário de um ato administrativo, mas sim à sua legalidade e à existência de falha na prestação do serviço público delegado, que teria gerado danos aos particulares. A atuação do Poder Judiciário, neste contexto, visa garantir a observância dos direitos dos administrados e a conformidade da conduta estatal com o ordenamento jurídico, não configurando indevida intromissão no mérito administrativo. Assim, é plenamente cabível a análise da conduta do Oficial do Cartório por este Juízo, no que tange à sua legalidade e aos danos por ela gerados. 2.3. Da Configuração do Dano Moral Os requerentes alegam ter sofrido dano moral em virtude da frustração da cerimônia de casamento na data originalmente agendada, bem como pelo constrangimento perante familiares e amigos. A conduta do Oficial do Cartório, ao agendar um casamento para um dia que se revelou feriado municipal e, na véspera, comunicar a impossibilidade da celebração sem o pagamento de uma diligência extra, configura uma falha na prestação do serviço público delegado. A organização de um casamento é um evento de grande significado pessoal e social, que envolve planejamento detalhado, expectativas e investimentos emocionais e financeiros consideráveis. A comunicação da impossibilidade de realização da cerimônia na data marcada, com tão pouca antecedência e por meio de uma simples mensagem de texto, demonstra negligência por parte do serviço cartorário. Tal conduta frustrou a legítima expectativa dos nubentes e os expôs a uma situação vexatória e humilhante perante seus convidados, muitos dos quais se deslocaram de outras localidades para o evento. A testemunha José Cardoso de Almeida, ouvida em audiência (ID 10318231697), pôde corroborar a situação de constrangimento e abalo sofrida pelos autores, confirmando a repercussão negativa do ocorrido no círculo social do casal. O dano moral, nesse contexto, é in re ipsa, ou seja, decorre da própria violação do direito da personalidade, sendo presumível o abalo psicológico e a angústia experimentados pelos requerentes. A frustração de um evento tão marcante na vida de um casal, por falha atribuível ao serviço público, ultrapassa o mero dissabor cotidiano e enseja a devida reparação. Para a fixação do quantum indenizatório, devem ser observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando-se a extensão do dano, a gravidade da conduta, a capacidade econômica das partes e o caráter pedagógico da medida, a fim de desestimular a reiteração de condutas semelhantes. Os requerentes pleitearam o valor mínimo de 20 (vinte) salários-mínimos. Considerando a gravidade da falha na prestação do serviço, o impacto emocional e social causado aos nubentes, e a necessidade de se coibir a negligência na atuação dos serviços delegados, entendo que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada um dos autores, totalizando R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de danos morais, mostra-se adequado e justo. 2.4. Da Configuração do Dano Material Os requerentes também pleitearam indenização por danos materiais, decorrentes das despesas contraídas para a realização da festa de casamento que restaram perdidas ou tiveram custos adicionais em razão do cancelamento e remarcação. A petição inicial menciona gastos com 10 mesas e 40 cadeiras( R$ 101,00), bebidas(R$ 319,00) e aluguel de salão(R$ 800,00). Os comprovantes dessas despesas foram anexados aos autos (ID 9732273453). Apesar da alegação do requerido de que os autores não tiveram prejuízo material e que a festa ocorreu normalmente, consta nos autos que o casamento foi remarcado para outra data (26/12/2022), o que, por si só, já indica a possibilidade de custos adicionais ou perdas de valores já investidos. A defesa não apresentou qualquer prova capaz de refutar os comprovantes de despesas apresentados pelos autores, nem demonstrou que os valores pagos aos fornecedores foram integralmente ressarcidos ou que os serviços foram prestados sem qualquer ônus adicional decorrente da alteração da data. A falha no agendamento do casamento pelo Oficial do Cartório, que resultou na necessidade de alteração da data da cerimônia, gerou diretamente os prejuízos materiais alegados. O nexo de causalidade entre a conduta negligente do agente público e os danos materiais sofridos pelos requerentes está, portanto, configurado. Os comprovantes de despesas (ID 9732273453) demonstram gastos com aluguel de mesas e cadeiras, e outros itens relacionados à festa. Os autores pleitearam o valor mínimo de 10 (dez) salários mínimos. Contudo, considerando os comprovantes apresentados, entendo que o valor de R$1.220,00 (mil duzentos e vinte reais) a título de danos materiais é razoável e proporcional aos prejuízos demonstrados. 3.Dispositivo Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo procedente os pedidos formulados na inicial, para: a) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor R$6.000,00(seis mil reais), sendo R$3.000,00(três mil reais) para cada um dos requerentes; b) condenar o réu ao pagamento de indenização por danos materiais no importe de R$1.220,00 (mil duzentos e vinte reais). Sobre os valores, deverão incidir correção monetária pelos índices da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ) e juros de mora, conforme o índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09), a partir da data do evento danoso (Súmula 54 do STJ), qual seja, 21/12/2022. Sem custas e honorários advocatícios, nos termos da Lei 9.099/95. Nada sendo requerido, arquive-se com baixa. Publique-se. Registre-se. Intime-se. João Pinheiro (MG), data da assinatura eletrônica. HUGO SILVA OLIVEIRA Juiz de Direito