REQUERENTE | : MANOEL ALBINO DE SOUZA |
ADVOGADO(A) | : RAFAEL CASAGRANDE VELHO (OAB SC035925) |
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de AÇÃO ANULATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS E TUTELA DE URGÊNCIA ajuizada por MANOEL ALBINO DE SOUZA em face de ALVES CUNHA CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA e BANCO CREFISA S.A.
Alega o autor que, em abril deste ano, foi contatado por telefone por uma empresa chamada Alves Cunha Consultoria, que afirmou que ele era beneficiário de um pecúlio do INSS. Inocentemente, o autor seguiu as instruções fornecidas, confirmando seus dados cadastrais e enviando uma selfie, procedimento que mascarava um golpe.
Alguns dias depois, ao receber sua aposentadoria e o 13º salário, o autor percebeu descontos indevidos em sua conta. Ao pesquisar o paradeiro dos descontos, descobriu que havia sido instituído em seu nome um empréstimo consignado (Contrato nº 097002196067) sem sua autorização, no valor de R$ 34.314,09, dividido em 96 parcelas de R$ 766,27, além de ter sido depositado indevidamente o valor de R$ 33.255,22 em sua conta.
Ao tomar conhecimento da fraude, o autor procurou o Procon, onde a situação foi confirmada, inclusive com a selfie enviada. Posteriormente, a empresa voltou a contatar o autor oferecendo o cancelamento do empréstimo sob a condição de ele transferir valores para uma conta indicada, totalizando R$ 33.304,20. Em razão disso, o autor ajuizou a presente demanda visando a anulação do contrato, a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente e o pagamento de indenização a título de danos morais.
Requer, liminarmente, que seja determinada a suspensão dos descontos que entende indevidos.
Juntou documentos.
Vieram-me os autos conclusos.
É o breve relato necessário.
DECIDO.
1. Da Tutela de Urgência
O artigo 294 do Código de Processo Civil permite a antecipação provisória dos efeitos da tutela definitiva se presentes as situações de urgência ou evidência.
As tutelas provisórias estão a sedimentar a teoria das tutelas diferenciadas, de modo a romper com o modelo neutro e único de processo ordinário de cognição plena.
São provisórias porque as possibilidades de cognição do processo ainda não se esgotaram, o que apenas ocorrerá no provimento definitivo.
O caso dos autos está atrair a aplicação da modalidade de tutela de urgência.
A antecipação provisória dos efeitos da tutela de urgência pressupõe a demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, bem como da reversibilidade da medida (art. 300, CPC).
No caso em questão, o pedido de tutela cautelar não atende ao primeiro requisito essencial.
A plausibilidade do direito invocado não está suficientemente delineada, ao menos em análise inaudita altera pars.
Isso porque não é possível presumir que as informações sigilosas alegadamente utilizadas pelos criminosos para se passar por representantes da parte ré tenham sido vazadas por esta. É comum que golpistas, por meio de engenharia social, consigam fazer com que a vítima revele esses dados, e não é raro que sites ou outros mecanismos tecnológicos também os capte e armazene indevidamente, o que ocorre sem interferência do banco.
Nesse ponto, cabe mencionar que não há nenhum registro acerca da dinâmica do contato realizado pelos criminosos.
Além disso, a relação causal entre a posse dos dados e as autorizações eventualmente concedidas pela parte autora, que resultaram nas movimentações não autorizadas, precisa ser melhor analisada após a oportunidade do contraditório pleno.
Em outras palavras, ao menos em cognição sumária, parece estar claro que a autora foi vitimada por golpe, mas não resta suficientemente delineada a responsabilidade do réu.
Não há demonstração sumária de que tal acesso tenha sido ocasionado por falha da reclamada e, assim, não há suficientes indicativos de falha na prestação do serviço bancário.
Nesse sentido, julgado que se amolda perfeitamente ao caso concreto:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA FORMULADO PELO AUTOR, POR MEIO DO QUAL PRETENDIA A SUSPENSÃO DAS COBRANÇAS DOS EMPRÉSTIMOS QUE ALEGA SEREM FRAUDULENTOS. INSURGÊNCIA DO DEMANDANTE. AVENTADA A PRESENÇA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEFERIMENTO DA PROVIDÊNCIA LIMINAR REQUERIDA NA ORIGEM. INSUBSISTÊNCIA. CONSUMAÇÃO DO GOLPE QUE, AO MENOS EM ANÁLISE PERFUNCTÓRIA DA MATÉRIA, SE DEU SEM A INTERFERÊNCIA EFETIVA DA CASA BANCÁRIA AGRAVADA. INEXISTÊNCIA, POR ORA, DE NEXO CAUSAL ENTRE EVENTUAL CONDUTA DO BANCO E OS DANOS ADVINDOS DA FRAUDE APLICADA. FORTUITO EXTERNO À ATIVIDADE COMERCIAL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE AFASTA A APLICAÇÃO DA SÚMULA 479 DA CORTE SUPERIOR AO CASO CONCRETO. EVENTUAL CULPA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PELO EPISÓDIO QUE SOMENTE PODERÁ SER AFERIDA MEDIANTE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5043659-91.2024.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Nunes Júnior, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 03-10-2024).
Logo, o indeferimento da tutela de urgência é medida de rigor, sem prejuízo de, a requerimento da parte interessada, ser realizada nova análise após a contestação.
É de ressaltar que esta magistrada não descura da situação e nem é insensível à vulnerabilidade dos idosos em tais circunstâncias (vítimas de golpes em transações bancárias); porém, em face da segurança jurídica, tendo em vista que os entendimentos do TJSC e do STJ vão de encontro ao pedido da parte autora, entendo por bem indeferir o pedido de tutela de urgência antes da realização do contraditório.
2. Da Conciliação
O Código de Processo Civil de 2015 consagrou como norma fundamental a autocomposição. É, pois, dever do Magistrado estimular a autocomposição como reforço da participação popular no exercício do poder. Garante-se, assim, maior legitimidade democrática no exercício da jurisdição.
De outro lado, não se descuida que a novel legislação também consagrou os princípios da eficiência e da razoável duração do processo, estes com caráter constitucional. É dizer, as partes têm o direito de – observada a complexidade da questão, o comportamento dos litigantes e a atuação do órgão jurisdicional – obter em prazo razoável a solução da lide.
E é nesse cenário que a audiência de conciliação prevista no art. 334 do CPC deve ser analisada, bem como ponderada frente às peculiaridades do caso concreto.
Em casos semelhantes ao do presente feito, a experiência comprova que os litigantes não possuem interesses conciliatórios no nascedouro da relação processual.
É daí que se conclui que a designação de audiência de conciliação se mostra, nesse momento, em diligência inútil, que apenas contribui para a morosidade processual e aumento do custo da prestação jurisdicional. O que vai de encontro aos princípios constitucionais da eficiência e da razoável duração do processo.
Não se está a dizer que as partes não podem convencionar. Em absoluto que não. A qualquer momento poderão fazê-lo, o que é estimulado por este Juízo. O que se pretende aqui é apenas e tão somente evitar a produção de atos sabidamente inúteis, postura que encontra esteio no artigo 139, II, do Código de Processo Civil.
Assim, deixo de designar, por ora, a audiência de que trata o art. 334 do Código de Processo Civil, alertando as partes, entretanto, que a qualquer momento poderão promover a solução consensual do conflito e, caso queiram, requerer designação de audiência para este fim.
Diante do exposto:
1. INDEFIRO o pedido de tutela de urgência.
2. Deixo de designar, por ora, a audiência de conciliação, alertando as partes, entretanto, que a qualquer momento poderão promover a solução consensual do conflito e, caso queiram, requerer designação de audiência para este fim.
3. CITE-SE a parte ré para oferecer contestação no prazo de 15 (quinze) dias úteis (art. 335 do CPC).
3.1 Fica consignado que a parte ré deverá apresentar as provas que pretende produzir ou eventual rol de testemunhas juntamente com a contestação, a fim de possibilitar a análise da pertinência das provas no saneamento do processo.
3.2 Saliento, ainda, incumbe-lhe a impugnação específica sobre todos os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiras as alegações não impugnadas, salvo nas exceções legais (CPC, art. 341).
4. Havendo alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, ou, ainda, menção às matérias enumeradas no artigo 337 do CPC, intime-se a parte autora para se manifestar no prazo de 15 dias.
5. Caso contrário, voltem conclusos para saneamento, sem prejuízo da possibilidade de imediato julgamento antecipado.
Cumpra-se.