Processo nº 50030184920244036315
Número do Processo:
5003018-49.2024.4.03.6315
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF3
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara Gabinete JEF de Sorocaba
Última atualização encontrada em
02 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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02/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara Gabinete JEF de Sorocaba | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5003018-49.2024.4.03.6315 / 2ª Vara Gabinete JEF de Sorocaba CRIANÇA INTERESSADA: T. H. C. D. S. REPRESENTANTE: JESSICA SANTOS DA SILVA Advogados do(a) CRIANÇA INTERESSADA: PATRICIA DE ALMEIDA SILVA NASCIMENTO - SP276118, REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS S E N T E N Ç A RELATÓRIO Trata-se de ação proposta em face ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS pleiteando-se a concessão de BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (BPC/LOAS) à PESSOA COM DEFICIÊNCIA. Em contestação apresentada, a parte ré afasta as alegações aduzidas, requerendo a improcedência do pedido e subsidiariamente a concessão em patamares inferiores aos postulados. Foram realizados perícia médica e estudo socioeconômico. As partes foram intimadas a se manifestar sobre os laudos. É, em breve síntese, o que cumpria relatar, pois dispensado o relatório, nos termos da lei (Lei 9.099/1995, art. 38). Fundamento e decido. FUNDAMENTAÇÃO A. QUESTÕES PROCESSUAIS Inexistentes preliminares a serem analisadas neste momento, sendo que as questões eventualmente afetas a este tópico, que se encontrem ligadas com as questões de mérito, nos itens abaixo serão analisadas. Assim, presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao julgamento da ação. B. MÉRITO: BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA e AO IDOSO (BPC/LOAS) B.1) REQUISITOS GERAIS A parte autora postula a concessão do benefício de prestação continuada (BPC/LOAS) previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, regulamentado pelo art. 20 da Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS). A Constituição Federal prevê, por meio da assistência social, independentemente de contribuição à seguridade social, “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei” (Constituição, art. 203, V). A Lei nº 8.742/1993, em seu art. 20, e em seus parágrafos, estabelece os requisitos para a concessão: “Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (…) § 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 3º Observados os demais critérios de elegibilidade definidos nesta Lei, terão direito ao benefício financeiro de que trata o caput deste artigo a pessoa com deficiência ou a pessoa idosa com renda familiar mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (…) § 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. § 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento. § 11-A. O regulamento de que trata o § 11 deste artigo poderá ampliar o limite de renda mensal familiar per capita previsto no § 3º deste artigo para até 1/2 (meio) salário-mínimo, observado o disposto no art. 20-B desta Lei. (…) § 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 estabelece um critério objetivo inicial, presumindo a condição de miserabilidade para famílias com renda mensal per capita igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação nº 4.374/PE e o Recurso Extraordinário nº 567.985/MT (repercussão geral - Tema STF 27), declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da LOAS, por entender que o critério de 1/4 do salário mínimo estava defasado e não era o único meio de comprovar a condição de miserabilidade. Posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.112.557/MG, consolidou o entendimento de que: "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." Assim, o critério de 1/4 do salário mínimo gera uma presunção absoluta de miserabilidade, mas não exclui a possibilidade de comprovação da hipossuficiência por outros meios, caso a renda per capita seja superior a esse patamar, conforme previsto expressamente no § 11 do art. 20 da LOAS e no art. 20-B do mesmo diploma legal (incluído pela Lei nº 14.176/2021), que preveem a análise de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade e vulnerabilidade. Entretanto, a jurisprudência majoritária tem entendido que, mesmo com a flexibilização, a renda familiar per capita superior a 1/2 (meio) salário mínimo, via de regra, afasta a condição de miserabilidade ou vulnerabilidade social extrema exigida para o benefício assistencial, salvo situações excepcionalíssimas devidamente comprovadas nos autos (como gastos extraordinários e permanentes com saúde não cobertos pelo SUS, que comprometam severamente o orçamento familiar). Portanto, a concessão do benefício exige a comprovação cumulativa de dois REQUISITOS: (i) Ter 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais (requisito AO IDOSO) ou ser pessoa com deficiência que possua impedimento de longo prazo de no mínimo de 2 anos (requisito À PESSOA COM DEFICIÊNCIA); e (ii) Não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família (requisito SOCIOECONÔMICO/HIPOSSUFICIÊNCIA). B.2) REQUISITO ETÁRIO (IDOSO) Não se aplica no presente caso, pois se pleiteia benefício assistencial para pessoa com deficiência. B.3) REQUISITO DEFICIÊNCIA A condição de pessoa com deficiência foi analisada por meio de perícia médica judicial (id 328798112). A conclusão pericial é clara e tecnicamente fundamentada, indicando que “Após anamnese, avaliação clínica, análise de exames médicos e documentos constantes nos autos concluo que a parte autora é classificada como deficiente”. Trata-se, nos termos do art. 20, §§ 2º e 10, da Lei nº 8.742/1993, de condição que configura impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual e sensorial. Diante do exposto, com base na prova pericial e nos demais elementos probatórios, conclui-se que a parte autora preenche o requisito da deficiência para fins de concessão do BPC-LOAS, pois possui impedimento de longo prazo de natureza que, em interação com as barreiras existentes, obstrui sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Art. 20, §§ 2º e 10, da Lei nº 8.742/1993). B.4) REQUISITO SOCIOECONÔMICO (HIPOSSUFICIÊNCIA E VULNERABILIDADE) Para aferir a situação socioeconômica da parte autora, foi realizado ESTUDO SOCIAL (ID. 338654016). No Laudo Socioeconômico constatou-se que a autora reside com seus pais, Jéssica Santos da Silva (25 anos) e Kelvin Rodrigo Branco Cardoso (28 anos). É relatado no laudo que: “O imóvel é alugado há 3 anos. Possui energia elétrica e água encanada. Construção em alvenaria, piso cerâmico, em boas condições de habitabilidade, com 4 cômodos, sendo 1 cozinha, 1 sala, 2 dormitórios e 1 banheiro. A residência está guarnecida com mobílias e utensílios domésticos, em bom estado de conservação. (...) O pai não tem comprometimento em saúde e exerce atividade laboral de modo formal, na função de estoquista desde 25/06/2024 até a presente data. (...) A avó e tia materna são as pessoas mais próximas que ofertam apoio emocional, mas não possuem condições e apoiar financeiramente. (...) Renda bruta mensal: R$1.800,00 · Componentes do núcleo familiar: 3 · Renda per capita familiar: R$600,00 ”. Embora a renda per capita seja superior a 1/4 do salário mínimo, ela ainda se encontra abaixo de 1/2 salário mínimo e a análise conjunta dos demais elementos probatórios, conforme autorizado pelo art. 20, § 11, da LOAS e pela jurisprudência, demonstra a efetiva situação de vulnerabilidade e miserabilidade. O laudo social descreveu ausência de outras fontes de renda ou apoio, e, principalmente, elevado gasto com aluguel. Essas circunstâncias fáticas, aliadas à renda reduzida, indicam que a família não possui meios de prover a subsistência da parte autora com dignidade. Pelo exposto, verifica-se que o grupo familiar da parte autora se enquadra na condição de hipossuficiência econômica e vulnerabilidade social exigida para a concessão do BPC-LOAS, seja pelo critério objetivo da renda per capita e pela análise conjunta das condições concretas de vida, nos termos do art. 20, §§ 3º e 11 da LOAS e da jurisprudência aplicável. B.5) CONCLUSÃO DE MÉRITO Tendo sido demonstrado o preenchimento cumulativo dos requisitos de deficiência/impedimento de longo prazo e de hipossuficiência socioeconômica/vulnerabilidade, a parte autora faz jus ao Benefício de Prestação Continuada (BPC-LOAS). C. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA A parte autora requereu a antecipação dos efeitos da tutela para implantação imediata do benefício. Nos termos do art. 300 do CPC, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso, a probabilidade do direito ficou demonstrada pela fundamentação supra, que concluiu pelo preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício. O perigo de dano é evidente, considerando o caráter alimentar do benefício e a situação de vulnerabilidade socioeconômica da parte autora, que necessita dos valores para garantir sua subsistência digna. A demora na implantação poderia agravar sua condição. Ademais, em se tratando de benefício assistencial devido a pessoa em situação de vulnerabilidade, a medida é reversível caso a decisão seja reformada, mediante cessação dos pagamentos futuros. Assim, DEFERE-SE O PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA de urgência para determinar ao INSS a implantação do benefício no prazo a ser fixado no dispositivo. D. PARÂMETROS PARA CUMPRIMENTO E PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS D.1) Data de Início do Benefício (DIB) e Data de Início do Pagamento (DIP) O benefício é devido desde a Data de Entrada do Requerimento administrativo - DER, momento em que a autarquia teve ciência da pretensão e no qual os requisitos já se encontravam preenchidos, conforme análise realizada. A Data de Início do Pagamento - DIP deverá coincidir com o primeiro dia do mês de implantação efetiva do benefício em folha de pagamento, a ser realizada em cumprimento à tutela de urgência deferida. As parcelas vencidas correspondem ao período entre a DIB e a DIP. D.2) Correção Monetária e Juros de Mora Sobre as parcelas vencidas, deverão incidir correção monetária e juros de mora, observando-se os critérios definidos pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 870.947/SE (Tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.495.146/MG (Tema 905), até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 113/2021. Assim: a) Correção Monetária: Aplicar o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), previsto no art. 41-A da Lei nº 8.213/1991, desde o vencimento de cada parcela; b) Juros de Mora: Aplicar os juros incidentes sobre a caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, a contar da citação. A partir de 09/12/2021, data da publicação da Emenda Constitucional nº 113/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente (art. 3º da EC 113/2021). E. REQUERIMENTOS FINAIS E DEMAIS QUESTÕES PROCESSUAIS E.1) Justiça Gratuita Considerando a natureza do benefício pleiteado e a comprovação da hipossuficiência econômica nos autos, defere-se à parte autora os benefícios da Justiça Gratuita, nos termos do art. 98 do CPC. E.2) Honorários Periciais Os honorários periciais relativos à perícia médica e social são devidos pela parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, que no caso foi o INSS. Tendo a parte autora sido beneficiária da justiça gratuita, o pagamento será requisitado à Seção Judiciária após o trânsito em julgado, nos termos da Resolução CJF nº 305/2014 e CJF nº 937/2025, observadas as disposições da Lei nº 13.876/2019. E.3) Obrigação de Reavaliação Periódica (Art. 21, LOAS) Ressalta-se que a concessão do benefício não é definitiva, estando a parte autora sujeita à reavaliação periódica das condições que lhe deram origem, a cada 2 (dois) anos, conforme determina o art. 21 da Lei nº 8.742/1993, sob pena de suspensão ou cessação do benefício. E.4) Custas e Honorários Advocatícios (Aplicação do Rito dos Juizados Especiais Federais) Em razão do processamento do feito sob o rito dos Juizados Especiais Federais, não há condenação em custas processuais nem em honorários advocatícios nesta instância, conforme disposto no art. 55, caput, da Lei nº 9.099/1995, aplicado subsidiariamente por força do art. 1º da Lei nº 10.259/2001. DISPOSITIVO Diante do exposto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora (CPF nº 592.410.618-71 e NB nº 87/714.619.348-0) em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: I. CONDENAR o INSS a conceder e implantar em favor da parte autora o Benefício de Prestação Continuada (BPC-LOAS) à pessoa com deficiência (Código 87), com Renda Mensal Inicial (RMI) correspondente a 1 (um) salário mínimo vigente; II. DETERMINAR que a Data de Início do Benefício (DIB) seja fixada na DER(04.03.2024); III. CONDENAR o INSS a pagar à parte autora as parcelas vencidas desde a DIB até a Data de Início do Pagamento (DIP), a serem apuradas em liquidação de sentença, observada a prescrição das parcelas anteriores ao quinquídio legal, se aplicável, acrescidas de correção monetária e juros de mora nos termos da fundamentação supra; IV. DEFERIR a tutela provisória de urgência e DETERMINAR ao INSS que cumpra a obrigação de fazer descrita no item I (implantação do benefício), no prazo máximo de 45 dias úteis a contar da intimação específica para este fim, sob pena de multa diária a ser fixada em caso de descumprimento. Defere-se à parte autora os benefícios da Justiça Gratuita. Honorários periciais a cargo da parte ré (INSS), a serem requisitados à Seção Judiciária após o trânsito em julgado, nos termos da fundamentação supra. Sem custas e sem honorários advocatícios nesta instância (art. 55, Lei nº 9.099/1995 c/c art. 1º, Lei nº 10.259/2001). A presente decisão observará estritamente os termos e limites da fundamentação acima, que integra este dispositivo para todos os fins. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se. SOROCABA, 30 de junho de 2025.
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02/07/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)