Processo nº 50041146620244036326
Número do Processo:
5004114-66.2024.4.03.6326
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF3
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba
Última atualização encontrada em
03 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
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03/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5004114-66.2024.4.03.6326 / 1ª Vara Gabinete JEF de Piracicaba AUTOR: GISELDO JOSE DA SILVA, THAUANA MONIQUE TOLEDO CRIVELARI DA SILVA Advogado do(a) AUTOR: ODAIR JOSE DE OLIVEIRA JUNIOR - SP498528 REU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF SENTENÇA Trata-se de ação de conhecimento pela qual a parte autora pretende a devolução dos valores pagos a título de juros de fase de obra no período de junho/2024 a novembro/2024, no valor de R$ 3.576,69 conforme petição inicial, emendada no ID 355709017. Ainda, pretende a declaração de inexigibilidade de débito referente aos juros de obra cobrados nos meses de dezembro/2024, janeiro/2025 e fevereiro/2025. Dispensado o relatório (art. 38 da Lei n. 9099/95). Decido. Inicialmente, rejeito as alegações de inépcia da inicial e de falta de interesse de agir, porquanto não se referem aos presentes autos. Ainda, rejeito a alegação de ilegitimidade passiva, porquanto afeta ao mérito da demanda. Ainda em caráter inicial, faz-se necessário reafirmar a plena aplicabilidade das disposições do Código de Defesa do Consumidor às relações nas quais as instituições financeiras ocupem a posição de fornecedores. Neste sentido está a Súmula n. 297 do STJ, segundo a qual “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Ademais, a matéria já não comporta discussão desde a decisão proferida na ADIN n. 2591, na qual o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 3º, § 2º do CDC, em especial a menção desse dispositivo legal às operações de “natureza bancária”. No caso concreto, a parte autora afirma que celebrou com a ré contrato de financiamento de imóvel na planta, o qual previa a cobrança de uma taxa durante a execução das obras. Aduz que havia um prazo para o término das obras e encerramento da cobrança de juros referente à fase de obra, sendo que, no entanto, o referido prazo não teria sido respeitado, prorrogando a cobrança destes juros de forma indevida. A jurisprudência possui entendimento pacífico no sentido da legalidade da cobrança de encargos ao consumidor durante a fase de execução das obras, conforme precedentes abaixo: EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. "JUROS NO PÉ". SÚMULA 83/STJ. 1. A Segunda Seção, no julgamento do EREsp 670.117/PB, decidiu que não é abusiva a cláusula de cobrança de juros compensatórios incidentes em período anterior à entrega das chaves nos contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em construção sob o regime de incorporação imobiliária (Rel. para acórdão Ministro Antonio Carlos Ferreira, julgado em 13.6.2012). 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 144.732/RJ, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 15/09/2016, DJe 21/09/2016) EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - JUROS COMPENSATÓRIOS - JUROS NO PÉ - COBRANÇA ANTES DA ENTREGA DO IMÓVEL - POSSIBILIDADE - PRECEDENTE DA SEGUNDA SEÇÃO - DECISÃO AGRAVADA RECONSIDERADA - PROVIMENTO. 1.- Quanto aos juros compensatórios denominados "Juros no pé", aplica-se a jurisprudência firmada pela 2ª Seção, harmonizando o entendimento de suas Turmas, no sentido de que " não considera abusiva cláusula contratual que preveja a cobrança de juros antes da entrega das chaves, que, ademais, confere maior transparência ao contrato e vem ao encontro do direito à informação do consumidor (art. 6º, III, do CDC), abrindo a possibilidade de correção de eventuais abusos" (EREsp 670117/PB, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Rel. p/ Acórdão Min. ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 26/11/2012)." 2.- Agravo Regimental provido, reconhecida a legalidade da cláusula do contrato de promessa de compra e venda de imóvel que previu a cobrança de juros compensatórios de 1% (um por cento) a partir da assinatura do contrato. (AgRg no Ag 1384004/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 25/06/2014) Do entendimento acima exposto, contudo, é possível se extrair a conclusão de que a cobrança destes encargos, após a conclusão da obra, se mostra ilegítima, porquanto cessada a circunstância de fato na qual se fundamenta (fase de construção). Deveras, foge à lógica razoável que a cobrança destes encargos seja postergada para após a referida fase, de modo a prorrogar o término do financiamento, incluindo-se mensalidades alheias à perspectiva contratual fornecida ao mutuário quando contratado o financiamento. O contrato celebrado entre a CEF e a autora é típico contrato de adesão, porquanto suas cláusulas já se acham previamente redigidas, sendo certo que o consumidor se posiciona, em tal relação jurídica, na condição de hipossuficiente, de forma que, consoante se infere do art. 6º, III, do CDC, constitui direito básico seu “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. É ainda o mesmo diploma legal que estabelece, in verbis: “Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance. Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. § 3o Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor. § 4° As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão. Neste diapasão, a locução “na fase de construção” contida na cláusula 6ª do contrato firmado entre as partes (pág. 08 do ID 348204564) resulta em limitação temporal à cobrança do encargo questionado nestes autos, porquanto dirigida ao consumidor vulnerável, não podendo ser entendida na acepção técnica defendida pela CEF. Isso porque, para o consumidor, a fase de construção deve corresponder, em último caso, ao prazo estipulado no contrato para tanto, não sendo possível prorrogar o pagamento do referido encargo para a efetiva conclusão das obras, sob pena de se modificar o objeto do contrato, acrescendo-se a ele parcelas que não foram inicialmente previstas, bem como se postergando, indefinidamente, o início da fase de amortização e, consequentemente, o prazo previamente entabulado entre as partes para a quitação do financiamento. De se ver que quando firmada a avença, forneceu-se à parte autora uma perspectiva de seu endividamento, sendo esse fato levado em conta na manifestação da vontade de contratar. É potestativa – e, portanto, nula – qualquer disposição contratual que permita ao fornecedor, unilateralmente, ampliar a obrigação inicialmente assumida pelo consumidor. Flagrante, inclusive, o desequilíbrio contratual gerado por essa conduta. Nessa toada, o contrato firmado entre as partes prevê prazo determinado para a construção (fase de obra), e, da leitura conjunta de suas disposições, é possível se concluir que referido prazo delimita o encerramento da primeira fase contratual (a fase de obra), com o seu simples decurso, ainda que pendente de efetiva conclusão da obra. Dentro desse contexto contratual, é ilegal a cobrança de encargos referentes à fase de construção e consequente postergação do início da fase de amortização pela ré, após a entrega das chaves do imóvel. No contrato celebrado entre as partes (em 30/11/2023 - pág. 19 do ID 348204564), o prazo de término da fase de construção deveria se encerrar em 30/06/2024, conforme item B8.2 do seu resumo (pág. 02 do ID 348204564 – prazo de 07 meses). Contudo, inexiste nos autos notícia do encerramento da fase de obra. Assim, considerando as diretrizes expostas no decorrer desta fundamentação, e observando os limites objetivos do pedido inicial, conclui-se que a cobrança realizada nos meses de julho/2024 em diante, a título de juros de obra, é indevida. Consequentemente, a parte autora faz jus à declaração de inexigibilidade das cobranças realizadas nos meses de dezembro/2024, janeiro/2025 e fevereiro/2025, bem como cobranças futuras a título do referido encargo. Ainda, a parte autora deve ser ressarcida dos pagamentos realizados, a título de juros de obra, no mês de julho/2024 e seguintes. Face ao exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS, para: a) declarar inexigíveis os débitos cobrados nos meses de dezembro/2024, janeiro/2025 e fevereiro/2025, bem como futuros, a título de juros de obra, devendo a ré se abster de realizar atos de cobrança referentes a eles, sob pena de multa a ser fixada oportunamente; b) condenar a ré à restituição, de forma simples, dos juros cobrados da parte autora na fase de obra nos meses de julho/2024 e seguintes, conforme apurado em liquidação de sentença, devendo tais valores ser devidamente atualizados e acrescido de juros de mora a contar da data dos pagamentos indevidos (Súmula 54 do STJ), adotando-se os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal (Resolução CJF n. 784/2022). Em razão dos elementos de prova coligidos nos autos, defiro, a título de evidencia, art. 311 do CPC, a tutela de urgência vindicada na inicial e determino que a ré se abstenha de realizar cobranças relativas a juros da fase de obra nos meses de julho/2024 e seguintes. Sem condenação ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais nesta instância (art. 55 da Lei n. 9099/95). Caso haja interesse em recorrer desta decisão, cientifico de que o prazo para recurso é de 10 (dez) dias. Em sendo apresentado recurso inominado, intime-se a parte recorrida para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal. Vindas estas, ou certificada pela Secretaria sua ausência, encaminhem-se os presentes autos para a Turma Recursal. Sobrevindo o trânsito em julgado, em nada sendo requerido, arquivem-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Piracicaba, na data da assinatura.