Juliano Gabriel Lourenco Da Silva x Banco Itaucard S.A.

Número do Processo: 5008318-27.2025.8.21.0008

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRS
Classe: APELAçãO CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Gab. Desa. Katia Elenise Oliveira da Silva
Última atualização encontrada em 13 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 13/06/2025 - Intimação
    Órgão: Gab. Desa. Katia Elenise Oliveira da Silva | Classe: APELAçãO CíVEL
    Apelação Cível Nº 5008318-27.2025.8.21.0008/RS

    TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

    RELATORA: Desembargadora KATIA ELENISE OLIVEIRA DA SILVA
    APELANTE: JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA (AUTOR)
    ADVOGADO(A): CRISTIAN GRAEBIN (OAB RS051727)
    APELADO: BANCO ITAUCARD S.A. (RÉU)
    ADVOGADO(A): Cristiane Belinati Garcia Lopes (OAB PR019937)

    EMENTA

    APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.

    DECISÃO MONOCRÁTICA, COM FUNDAMENTO NO ART. 932, INCISOS IV E V DO CPC, COMBINADO COM O ART. 206, INC. XXXVI, DO RITJRS.

    JUROS REMUNERATÓRIOS. POSSIBILIDADE DE ATENDIMENTO DO PEDIDO DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA AUFERIDA PELO BACEN NAS HIPÓTESES EM QUE VERIFICADA ABUSIVIDADE NA TAXA CONTRATADA, O QUE NÃO REFLETE O CASO EM TELA.

    RECURSO DESPROVIDO.

    DECISÃO MONOCRÁTICA

    De início, consigno a possibilidade de julgamento monocrático do presente recurso, a teor do disposto pelos artigos 932, incisos IV e V, alíneas “a”, “b” e “c” do Código de Processo Civil e 206, inciso XXXVI, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça. Dito isso e estando, portanto, justificada a apreciação singular na hipótese, passo, de pronto, à análise da irresignação.

    Trata-se de recurso de apelação interposto por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA em face da sentença, proferida nos autos da ação revisional de contrato que contende com BANCO ITAUCARD S.A., cujo relatório e dispositivo transcrevo abaixo:

     

    Cuidam os autos de ação revisional ajuizada por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA contra BANCO ITAUCARD S.A..

    Relatou a parte autora ter celebrado com o réu contrato bancário para financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária. Defendeu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, requerendo antecipação de tutela e a revisão contratual em razão da nulidade de cláusulas contratuais abusivas. Pediu, ainda, a descaracterização da mora e a restituição ou compensação dos valores pagos a maior. Juntou documentos.

    Citada, a parte ré apresentou contestação. No mérito, alegou que as partes realizaram contratação sem vícios, sendo possíveis, lícitas e válidas as cláusulas entabuladas. Juntou documentos.

    Sem mais provas, vieram os autos conclusos.

    [...]

    Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a ação revisional ajuizada por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA contra BANCO ITAUCARD S.A., relativa ao(s) contrato(s) objeto(s) dos autos.

    Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, que restam suspensas em tendo havido o deferimento da AJG.

    Interposta apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Com a juntada das contrarrazões, devolva-se à origem, para remessa de apelação ao Tribunal de Justiça.

    Não havendo recurso, devolva-se à origem para providências finais, como apuração de custas, expedição de alvarás e baixa.

     

    Em suas razões (evento 38, APELAÇÃO1), a parte recorrente postula a limitação dos juros remuneratórios à taxa média auferida pelo BACEN.

    Apresentadas contrarrazões (evento 43, CONTRAZAP1), vieram os autos conclusos a este Tribunal de Justiça para julgamento.

    É o relatório.

    Preenchidos os requisitos legais, conheço do recurso.

     

    DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL

    É legitima a revisão judicial de contrato em situações excepcionais, em que configurada circunstância imprevisível ao tempo da pactuação ou causa de abusividade notória.

    Nos casos em que o ajuste decorre de adesão a termos prévia e unilateralmente estipulados pela instituição financeira, incide o Código de Defesa do Consumidor consoante o enunciado da Súmula 297 do STJ1, o que, por certo, importa em alguns temperamentos à teoria geral dos contratos, em face do reconhecimento da hipossuficiência da parte aderente.

     

    DOS JUROS REMUNERATÓRIOS

    No que pertine aos juros remuneratórios, o Superior Tribunal de Justiça a quem compete a uniformização da interpretação da legislação federal, sedimentou, no Recurso Especial nº 1.061.530/RS:

    ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

    a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

    b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

    c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

    d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

    Nessa esteira, para a revisão da taxa de juros remuneratórios, nos contratos firmados com as instituições financeiras que compreendem o Sistema Financeiro Nacional, serão observadas as regras da legislação consumerista, que não permitem vantagem excessiva dos bancos em desfavor dos consumidores (artigos 39, inciso V, e 51, inciso IV, ambos do Código de Defesa do Consumidor).

    No julgamento do REsp 2.009.6142, a Superior Corte especificou critérios para análise da abusividade das taxas de juros remuneratórios contratadas: 

    a) a caracterização de relação de consumo;

    b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e

    c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.

    Somado a isso, a orientação da Superior Corte é no sentido de que a taxa média de mercado auferida pelo BACEN é um elemento norteador do exame da existência de abusividade e não elemento limitador.

    Diante do posicionamento sedimentado pelo STJ sobre os vetores de análise da abusividade dos juros remuneratórios e da posição firmada pelos Colegas que integram esta 13ª Câmara Cível deste Tribunal, refleti sobre o tema, bem como, a fim de não gerar expectativa de direito, e, evitar dificuldade ao próprio consumidor no adimplemento do contrato, considerando as tutelas provisórias que envolvem demandas dessa natureza, revejo minha posição, e retomo o entendimento da maioria.

    Feitas essas considerações, passo ao exame do caso concreto.

     

    No contrato submetido à revisão nestes autos (FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM MÓVEL), verifica-se que a taxa pactuada entre as partes está em concordância com a média de mercado.

    Digo isso, pois, conforme o estipulado pelo Banco Central do Brasil – BACEN, o percentual médio de juros para o período da contratação (04/2023) foi de 28,46% ao ano (20749 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos) enquanto o contrato apresentou juros anuais de 35,27% ao ano, como vê do instrumento contratual (evento 1, CONTR4).

    A diferença entre a taxa contratada e a média apurada pelo BACEN não alcança patamar significativo, inexistindo discrepância na totalidade do débito pactuado com o montante emprestado. E mesmo considerando a garantia de alienação fiduciária ofertada, circunstância que mitiga os riscos do negócio, as taxas previamente pactuadas não importam em desvantagem excessiva ao consumidor.

    Dessa forma, na situação em apreço, considerando a orientação da Superior Instância no sentido de que a taxa média de mercado não é um limitador, mas elemento norteador para o exame de eventual abusividade, na situação em apreço as taxas ajustadas não devem ser consideradas abusivas.

    Feitas estas considerações, impõe-se o desacolhimento da irresignação.

     

    DA COMPENSAÇÃO E REPETIÇÃO DE VALORES

    Considerando que somente aquele que recebeu o que lhe não era devido, fica, por força de lei, obrigado a restituir, e, no caso em tela, o contrato está sendo mantido, o pleito não prospera.

     

    DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS

    Ausente modificação no resultado do presente julgamento, permanece inalterada a distribuição dos ônus de sucumbência.

    Outrossim, no que se refere à remuneração dos procuradores, tratando-se de recurso interposto já sob a vigência da lei 13.105/2015, aplicável à espécie o disposto no artigo 85, § 113, do supracitado regramento, motivo pelo qual vão majorados os honorários advocatícios, arbitrados na origem, para 15% sobre o valor atualizado da causa. 

    Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais, na medida em que a parte autora goza do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do artigo 98, parágrafo 3.º, do Código de Processo Civil.

     

    DISPOSITIVO

    Isto posto, nego provimento ao recurso.

    Agendada intimação.

     


    1. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
    2. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. REVISÃO. CARÁTER ABUSIVO. REQUISITOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.1- Recurso especial interposto em 19/4/2022 e concluso ao gabinete em 4/7/2022.2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a menção genérica às “circunstâncias da causa” não descritas na decisão, acompanhada ou não do simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média praticada no mercado, é suficiente para a revisão das taxas de juros remuneratórios pactuadas em contratos de mútuo bancário; e b) qual o incide a ser aplicado, na espécie, aos juros de mora.3- A Segunda Seção, no julgamento REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixou o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.4- Deve-se observar os seguintes requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios: a) a caracterização de relação de consumo; b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.5- São insuficientes para fundamentar o caráter abusivo dos juros remuneratórios: a) a menção genérica às “circunstâncias da causa” – ou outra expressão equivalente; b) o simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média de mercado divulgada pelo BACEN e c) a aplicação de algum limite adotado, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual.6- Na espécie, não se extrai do acórdão impugnado qualquer consideração acerca das peculiaridades da hipótese concreta, limitando-se a cotejar as taxas de juros pactuadas com as correspondentes taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN e a aplicar parâmetro abstrato para aferição do caráter abusivo dos juros, impondo-se, desse modo, o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que aplique o direito à espécie a partir dos parâmetros delineados pela jurisprudência desta Corte Superior.7- Recurso especial parcialmente provido.(RECURSO ESPECIAL Nº 2.009.614 - SC, 3ª TURMA, Relatora: Min, NANCY ANDRIGHI, julgado em 27/09/22, por unanimidade).
    3. [..]. § 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento. [...].