TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas
RELATORA | : Desembargadora KATIA ELENISE OLIVEIRA DA SILVA |
APELANTE | : JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA (AUTOR) |
ADVOGADO(A) | : CRISTIAN GRAEBIN (OAB RS051727) |
APELADO | : BANCO ITAUCARD S.A. (RÉU) |
ADVOGADO(A) | : Cristiane Belinati Garcia Lopes (OAB PR019937) |
EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.
DECISÃO MONOCRÁTICA, COM FUNDAMENTO NO ART. 932, INCISOS IV E V DO CPC, COMBINADO COM O ART. 206, INC. XXXVI, DO RITJRS.
JUROS REMUNERATÓRIOS. POSSIBILIDADE DE ATENDIMENTO DO PEDIDO DE LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA AUFERIDA PELO BACEN NAS HIPÓTESES EM QUE VERIFICADA ABUSIVIDADE NA TAXA CONTRATADA, O QUE NÃO REFLETE O CASO EM TELA.
RECURSO DESPROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA
De início, consigno a possibilidade de julgamento monocrático do presente recurso, a teor do disposto pelos artigos 932, incisos IV e V, alíneas “a”, “b” e “c” do Código de Processo Civil e 206, inciso XXXVI, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça. Dito isso e estando, portanto, justificada a apreciação singular na hipótese, passo, de pronto, à análise da irresignação.
Trata-se de recurso de apelação interposto por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA em face da sentença, proferida nos autos da ação revisional de contrato que contende com BANCO ITAUCARD S.A., cujo relatório e dispositivo transcrevo abaixo:
Cuidam os autos de ação revisional ajuizada por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA contra BANCO ITAUCARD S.A..
Relatou a parte autora ter celebrado com o réu contrato bancário para financiamento de veículo com garantia de alienação fiduciária. Defendeu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, requerendo antecipação de tutela e a revisão contratual em razão da nulidade de cláusulas contratuais abusivas. Pediu, ainda, a descaracterização da mora e a restituição ou compensação dos valores pagos a maior. Juntou documentos.
Citada, a parte ré apresentou contestação. No mérito, alegou que as partes realizaram contratação sem vícios, sendo possíveis, lícitas e válidas as cláusulas entabuladas. Juntou documentos.
Sem mais provas, vieram os autos conclusos.
[...]
Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a ação revisional ajuizada por JULIANO GABRIEL LOURENCO DA SILVA contra BANCO ITAUCARD S.A., relativa ao(s) contrato(s) objeto(s) dos autos.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, que restam suspensas em tendo havido o deferimento da AJG.
Interposta apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Com a juntada das contrarrazões, devolva-se à origem, para remessa de apelação ao Tribunal de Justiça.
Não havendo recurso, devolva-se à origem para providências finais, como apuração de custas, expedição de alvarás e baixa.
Em suas razões (evento 38, APELAÇÃO1), a parte recorrente postula a limitação dos juros remuneratórios à taxa média auferida pelo BACEN.
Apresentadas contrarrazões (evento 43, CONTRAZAP1), vieram os autos conclusos a este Tribunal de Justiça para julgamento.
É o relatório.
Preenchidos os requisitos legais, conheço do recurso.
DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL
É legitima a revisão judicial de contrato em situações excepcionais, em que configurada circunstância imprevisível ao tempo da pactuação ou causa de abusividade notória.
Nos casos em que o ajuste decorre de adesão a termos prévia e unilateralmente estipulados pela instituição financeira, incide o Código de Defesa do Consumidor consoante o enunciado da Súmula 297 do STJ1, o que, por certo, importa em alguns temperamentos à teoria geral dos contratos, em face do reconhecimento da hipossuficiência da parte aderente.
DOS JUROS REMUNERATÓRIOS
No que pertine aos juros remuneratórios, o Superior Tribunal de Justiça a quem compete a uniformização da interpretação da legislação federal, sedimentou, no Recurso Especial nº 1.061.530/RS:
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
Nessa esteira, para a revisão da taxa de juros remuneratórios, nos contratos firmados com as instituições financeiras que compreendem o Sistema Financeiro Nacional, serão observadas as regras da legislação consumerista, que não permitem vantagem excessiva dos bancos em desfavor dos consumidores (artigos 39, inciso V, e 51, inciso IV, ambos do Código de Defesa do Consumidor).
No julgamento do REsp 2.009.6142, a Superior Corte especificou critérios para análise da abusividade das taxas de juros remuneratórios contratadas:
a) a caracterização de relação de consumo;
b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e
c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.
Somado a isso, a orientação da Superior Corte é no sentido de que a taxa média de mercado auferida pelo BACEN é um elemento norteador do exame da existência de abusividade e não elemento limitador.
Diante do posicionamento sedimentado pelo STJ sobre os vetores de análise da abusividade dos juros remuneratórios e da posição firmada pelos Colegas que integram esta 13ª Câmara Cível deste Tribunal, refleti sobre o tema, bem como, a fim de não gerar expectativa de direito, e, evitar dificuldade ao próprio consumidor no adimplemento do contrato, considerando as tutelas provisórias que envolvem demandas dessa natureza, revejo minha posição, e retomo o entendimento da maioria.
Feitas essas considerações, passo ao exame do caso concreto.
No contrato submetido à revisão nestes autos (FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM MÓVEL), verifica-se que a taxa pactuada entre as partes está em concordância com a média de mercado.
Digo isso, pois, conforme o estipulado pelo Banco Central do Brasil – BACEN, o percentual médio de juros para o período da contratação (04/2023) foi de 28,46% ao ano (20749 - Taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Aquisição de veículos) enquanto o contrato apresentou juros anuais de 35,27% ao ano, como vê do instrumento contratual (evento 1, CONTR4).
A diferença entre a taxa contratada e a média apurada pelo BACEN não alcança patamar significativo, inexistindo discrepância na totalidade do débito pactuado com o montante emprestado. E mesmo considerando a garantia de alienação fiduciária ofertada, circunstância que mitiga os riscos do negócio, as taxas previamente pactuadas não importam em desvantagem excessiva ao consumidor.
Dessa forma, na situação em apreço, considerando a orientação da Superior Instância no sentido de que a taxa média de mercado não é um limitador, mas elemento norteador para o exame de eventual abusividade, na situação em apreço as taxas ajustadas não devem ser consideradas abusivas.
Feitas estas considerações, impõe-se o desacolhimento da irresignação.
DA COMPENSAÇÃO E REPETIÇÃO DE VALORES
Considerando que somente aquele que recebeu o que lhe não era devido, fica, por força de lei, obrigado a restituir, e, no caso em tela, o contrato está sendo mantido, o pleito não prospera.
DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS
Ausente modificação no resultado do presente julgamento, permanece inalterada a distribuição dos ônus de sucumbência.
Outrossim, no que se refere à remuneração dos procuradores, tratando-se de recurso interposto já sob a vigência da lei 13.105/2015, aplicável à espécie o disposto no artigo 85, § 113, do supracitado regramento, motivo pelo qual vão majorados os honorários advocatícios, arbitrados na origem, para 15% sobre o valor atualizado da causa.
Suspendo a exigibilidade dos ônus sucumbenciais, na medida em que a parte autora goza do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do artigo 98, parágrafo 3.º, do Código de Processo Civil.
DISPOSITIVO
Isto posto, nego provimento ao recurso.
Agendada intimação.