Coop Industrial E Comercial Limitada x Royal Agenciamentos De Cargas Ltda. - Epp

Número do Processo: 5015963-44.2025.8.24.0033

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJSC
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Itajaí
Última atualização encontrada em 18 de julho de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 25/06/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Itajaí | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Procedimento Comum Cível Nº 5015963-44.2025.8.24.0033/SC
    AUTOR: COOP INDUSTRIAL E COMERCIAL LIMITADA
    ADVOGADO(A): RIZIERI CESAR MEZADRI (OAB SC020670)
    ADVOGADO(A): SIMONE CRISTINE DAVEL (OAB SC029073)
    ADVOGADO(A): GABRIELLA SEDREZ REIS GOETTEN DE SOUZA (OAB SC024289)
    ADVOGADO(A): JONATAS GOETTEN DE SOUZA (OAB SC024480)
    RÉU: ROYAL AGENCIAMENTOS DE CARGAS LTDA. - EPP
    ADVOGADO(A): JAIRO HENRIQUE WALDHAUER DA SILVA (OAB SC051020)
    ADVOGADO(A): BRUNO TUSSI (OAB SC020783)
    ADVOGADO(A): RICARDO MOISÉS DE ALMEIDA PLATCHEK (OAB SC019659)
    ADVOGADO(A): ORLANDO DA SILVA NETO (OAB SC038896)

    DESPACHO/DECISÃO

    I. Trata-se de ação de obrigação de fazer proposta por COOP INDUSTRIAL E COMERCIAL LIMITADA contra ROYAL AGENCIAMENTOS DE CARGAS LTDA. - EPP.

    Foi deferida tutela de urgência, nestes termos: "Ante o exposto, concede-se tutela de urgência para determinar que a ré retire o bloqueio no sistema "Siscomex Carga" do Conhecimento de Embarque ns. 182505134566107, 18250513456702 e 182505126092932, no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 2.000,00, limitada a R$ 200.000,00".

    A ré compareceu ao feito postulando a reconsideração da decisão que concedeu a tutela de urgência. Entre outros argumentos, asseverou:

    [...] percebe-se que o fim e objetivo da presente demanda, declaradamente, é a obtenção da mercadoria sem a apresentação da via original do conhecimento de embarque, podendo-se traduzir em um ato ilícito em prejuízo ao vendedor da mercadoria.

    Cientes do lapso legal existente na matéria, algumas empresas consignatárias/importadoras (como parece ser o caso da AUTORA), passaram a se valer dessa falha legislativa/normativa para obter a liberação de mercadorias sem o efetivo pagamento das mesmas ao exportador/vendedor, posto que, sem o comando de retenção de carga pelo transportador o recinto alfandegado entende não haver qualquer entrave para entrega da carga, especialmente pela problemática da nova redação do art. 57 da Instrução Normativa nº 680/2006.

    Novamente, da peça vestibular, extrai-se que a mercadoria não foi adimplida de forma completa, posto que o documento acostado no evento n.º 1, anexo 7, é, segundo declaração da AUTORA, apenas o valor do adiantamento das mercadorias.

    [...]

    Em contato com o remetente/vendedor/exportador da mercadoria, a RÉ foi informada que a mercadoria não foi quitada, bem como, que os conhecimentos de embarque originais estão China. Foram encaminhadas as proformas de compra e venda20, demonstrando que o valor das mercadorias soma a quantia de USD 175.494,60 (cento e setenta e cinco mil, quatrocentos e noventa e quatro dólares americanos e sessenta centavos), valor que, utilizando o mesmo índice de conversão utilizado para atribuir o valor da causa, perfaz a quantia de R$ 978.452,59 (novecentos e setenta e oito mil, quatrocentos e cinquenta e dois reais e cinquenta e nove centavos). 

    Por conta da inadimplência da AUTORA e do elevado valor das mercadorias, a RÉ 21 recebeu ordem expressa do transportador (emissor do conhecimento de embarque) e do exportador, por e-mail22, para que a mercadoria não seja liberada à AUTORA, sem o recolhimento dos conhecimentos de embarque:

    [...]

    Em tradução livre do referido e-mail enviado, Excelência, o remetente (exportador) das cargas afirma que “Sou proprietário da Shaoxing Pantian e, por meio deste, informo que não autorizo a liberação das cargas dos seguintes contêineres: 1) Nº BL: NGBS064213 Nº DO CONTÊINER: TLLU8078439, TCLU9752239; 2) Nº BL: NGBS064213 Nº DO CONTÊINER: TLLU8078439, TCLU9752239; 3) Nº BL: NGBS064210 Nº DO CONTÊINER: TIIU4906791, CMAU4887618, visto que o destinatário não pagou a carga e que todos os documentos referentes à remessa permanecem sob posse da China”. (com grifo no original)

    [...]

    Portanto, resta nítido que o modus operandi de algumas empresas consignatárias/compradoras/importadoras, como parecer ser o caso da AUTORA, consiste em: i) efetivar o pagamento do valor de frete e demais taxas e requisitar o desbloqueio e retirada da retenção do CE Mercante/Siscomex Carga; ii) assim que a restrição é removida, o consignatário retira a carga do Terminal/Recinto Alfandegado sem ter pago o remetente/vendedor/exportador pela mesma e sem estar na posse da via original do conhecimento de embarque, já que os depositários/Terminais/Recintos Alfandegados não exigem mais a sua apresentação em via original para que as mercadorias sejam retiradas. 

    Alerta-se, ainda, que a única trava que impede que a entrega das mercadorias ocorra sem o pagamento do valor das mesmas para o respectivo vendedor/exportador é, justamente, o bloqueio inserido no CE Mercante/Siscomex Carga. (grifo no original)

    Requereu:

    [...] requer-se que V. Exa., analisando toda a problemática aqui exposta, reconsidere a decisão proferida no evento nº 08 e exija que a AUTORA apresente em juízo a via original do conhecimento de embarque, evitando-se que o Poder Judiciário seja o instrumento pelo qual a função de título de crédito possa ser ferida e uma inadimplência internacional possa ser concretizada. 

    Sucessivamente, seja exigida da AUTORA caução no valor da mercadoria, garantindo eventual exigência de indenização pelo extravio de carga com a entrega da mercadoria a quem não é sua proprietária de fato e de direito.

    Por fim, seja, antes do cumprimento da ordem pela RÉ, notificado o recinto alfandegado BARRA DO RIO TERMINAL PORTUÁRIO S/A, com endereço na Rua Arnoldo Lopes Gonzaga, nº 507, Barra do Rio, município de Itajaí/SC, CEP 88305-570, para que, sob pena de multa no valor da mercadoria, colete as vias originais dos conhecimentos de embarque antes de permitir que as mercadorias saiam de seu estabelecimento.

    As alternativas indicadas acima em nenhuma hipótese contrariam a decisão de V. Exa., mas a completam de forma que o direito do possuidor do conhecimento de embarque e o dever do transportador sejam protegidos. 

     

    II. Assim como o pedido de liminar foi analisado independentemente de oitiva da parte ré (contraditório diferido), é possível analisar o requerimento da demandada sem a oitiva da autora, em razão da urgência, eis que está na iminência de ser iniciado o prazo para incidência da multa cominatória aplicada na decisão do evento 8.

    Além disso, a tutela provisória "pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada" (art. 296 do CPC).

    Os fatos e argumentos trazidos pela ré são contundentes, fragilizando aquilo que se entendeu, num primeiro momento, como plausibilidade do direito da autora.

    Na petição inicial, a autora assevera que houve bloqueio da carga em razão da falta de apresentação dos conhecimentos de transporte originais. Argumentou que o frete da operação já foi pago, assim como as taxas locais. Aduziu não haver qualquer pendência com a exportadora.

    Entretanto, a documentação trazida pela ré indica o contrário, isto é, provável pendência financeira da autora com a exportadora, eis que não teria havido o pagamento integral do valor devido pelas mercadorias (evento 14, DOC5)

    Ademais, a autora deixa claro na inicial que pretende a retirada da restrição no Siscomex Carga para "liberação de suas mercadorias sem necessidade da apresentação do conhecimento marítimo de transporte de modo físico (Bill of Lading). Intuitivo, portanto, que não está de posse dos conhecimentos originais, até porque apenas copias com inicial.

    Isso reforça a informação, trazida pela ré, de que os conhecimentos de embarque originais estão em poder do exportador. E se a autora não dispõe dos conhecimentos de embarque originais, não possui prova de ser a titular da carga e, portanto, não tem o direito de retira-la.

    Segundo o art. 754 do CC, "as mercadorias devem ser entregues ao destinatário, ou a quem apresentar o conhecimento endossado, devendo aquele que as receber conferi-las e apresentar as reclamações que tiver, sob pena de decadência dos direitos". Prevê o art. 887 do CC que "o título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei". E conforme o art. 894 do CC, "o portador de título representativo de mercadoria tem o direito de transferi-lo, de conformidade com as normas que regulam a sua circulação, ou de receber aquela independentemente de quaisquer formalidades, além da entrega do título devidamente quitado"

    E nos termos do art. 519 do Código Comercial, "o capitão é considerado verdadeiro depositário da carga e de quaisquer efeitos que receber a bordo, e como tal está obrigado à sua guarda, bom acondicionamento e conservação, e à sua pronta entrega à vista dos conhecimentos".

    Da interpretação dos referidos dispositivos extrai-se que o conhecimento de embarque possui funções importantes no transporte marítimo e tem natureza de título de crédito, eis que pode ser endossado. Assim, a posse e apresentação do original do conhecimento de embarque é essencial para comprovar a propriedade da carga e retira-la.

    Assim, o conhecimento de embarque, "também conhecido como Bill of Lading, é um documento fundamental no transporte internacional de mercadorias, especialmente no transporte marítimo. Ele tem três funções principais: atua como recibo, comprovando que as mercadorias foram entregues ao transportador; serve como contrato de transporte, estipulando os termos e condições sob os quais o transporte será realizado; e funciona como título de propriedade, permitindo que o detentor do documento tenha posse sobre as mercadorias e possa transferi-la a terceiros" (link: https://www.migalhas.com.br/quentes/415505/e-valida-exigencia-de-conhecimento-de-embarque-para-liberar-mercadoria).

    Portanto, a pretensão da autora de receber as mercadorias sem apresentar os conhecimentos de embarque originais, pretendendo, para isso, obrigar a ré a retirar o bloqueio no Siscomex Carga, não se apresenta plausível. 

    Nesse sentido, em caso semelhante, o Juiz Frederico dos Santos Messias, da VARA DO NÚCLEO ESPECIALIZADO DE JUSTIÇA 4.0 - DIREITO MARÍTIMO, do FORO NÚCLEO ESPECIALIZADO 4.0 - ESTADUAL, PODER JUDICIÁRIO DE SÃO PAULO (processo n. 1019374-11.2024.8.26.0562), decidiu:

    Vistos. 1- Do Relatório. Trata-se de Obrigação de Fazer cumulada com Indenização em que a autora aduz, em síntese, que no exercício regular de suas atividades importou mercadorias da empresa Hong Kong Housewares Manufactiring Co., Limited, pagando por elas o devido preço conforme, negociação feita entre as partes e swifts bancários. O embarque está coberto pelo conhecimento de embarque número 06BRZ2304002 - Porto de Embarque Qingdao (China) e Porto de descarga Santos/SP, indicando a autora como adquirente das mercadorias. Informa que a operação está quitada, pagamento da carga e fretes/taxas locais. Afirma que, mesmo tendo quitado o valor devido ao exportador, bem como todas as despesas referentes ao frete e taxas locais, a requerida não efetuou o repasse do frete ao armador Maersk, impedindo por consequência que a autora tenha acesso às mercadorias. Notificada, a requerida informou que recebeu instruções do exportador para não liberar a carga. Pretende a obrigação de fazer consistente no repasse do frete pago ao armador e consequente retirada da trava do Siscomex, bem como a condenação ao pagamento das despesas de armazenagem compreendidas entre o período que se efetuou o pagamento do frete até a retirada da trava do Siscomex (fls. 01/10 - inicial; fls. 11/49 - documentos). A ré foi intimada para manifestação prévia ao pedido de tutela provisória (fls. 55) e ofertou a sua manifestação (fls. 62/66), informando que não há qualquer cobrança de valor, mas cumprimento de notificação do Shipper, tendo este afirmado que estava na posse do conhecimento de embarque original, não tendo recebido as mercadorias. Sobreveio manifestação da autora (fls. 79/81). A tutela provisória foi indeferida (fls. 82/84). A ré, citada, ofereceu contestação (fls. 109/124 - razões da defesa; fls. 125/136 - documentos), sustentando, em breves linhas, matéria preliminar (impugnação ao valor da causa) e, no mérito, que não há qualquer cobrança de valor, mas cumprimento de notificação do Shipper, tendo este afirmado que estava na posse do conhecimento de embarque original, não tendo recebido as mercadorias. Houve Réplica (fls. 141/151). 2- Da delimitação da controvérsia. A controvérsia posta nos autos consiste em decidir os seguintes pontos: 1) A natureza jurídica do Conhecimento de Embarque no transporte marítimo de cargas; 2) A validade da exigência do Conhecimento de Embarque original para liberação da carga, estando quitadas todas as despesas decorrentes da relação jurídica; e 3) A validade da recusa da entrega da carga quando há ordem do shipper para não entregar. 3- A natureza jurídica do Conhecimento de Embarque no transporte marítimo de cargas. O Código Civil, ao tratar do contrato de transporte em geral, em seu Capítulo XIV, estabelece regras a respeito do Conhecimento de Embarque, em especial, sobre a entrega da coisa transportada. Merecem destaque, porque importantes ao caso, os artigos 743, 744, 748, 754 e 755, que estabelecem a obrigatoriedade da emissão do Conhecimento de Embarque pelo transportador, a possibilidade de desistência ou entrega à outro destinatário e a entrega ao destinatário ou a quem apresentar o Conhecimento de Embarque endossado, existindo até mesmo a possibilidade de depósito em juízo da coisa transportada se houve dúvida quanto ao recebedor. No âmbito do Código Comercial, na sua parte vigente, o Capítulo II, trata dos "CONHECIMENTOS", o destaque está nos artigos 580, 583, 587 e 589, que, em linhas gerais, ressaltam a importância do Conhecimento de Embarque para preservação da segurança na execução do contrato do transporte marítimo. Nesse contexto, especificamente em relação ao transporte marítimo de cargas, tem-se a figura do Bill of Lading (BL) (conhecimento de embarque marítimo), a consistir no documento, no que interessa ao caso, representativo do contrato estabelecido entre o embarcador e o transportador. É um verdadeiro orientador das relações contratuais. Ao mesmo tempo, o BL se constitui em recibo de entrega da mercadoria, pois a sua posse comprova o recebimento da carga para transporte, é um título de crédito, pois garante a retirada da mercadoria junto ao transportador no destino final e, por fim, documento que representa o contrato de transporte entre embarcador e transportador. Exemplo típico desse título de crédito é o conhecimento de frete (Dec. n. 19.473/30; CC-02, art. 744). Sua emissão cabe às empresas de transporte por água, terra ou ar. A finalidade originária desse instrumento é a prova do recebimento da mercadoria, pela empresa transportadora, e da obrigação que ela assume de entregá-la incólume em certo destino. O conhecimento de frete tem, no entanto, função subsidiária, na medida em que possibilita ao depositante, proprietário da mercadoria despachada, negociá-la mediante endosso do título. (...) Em se tratando, contudo, de conhecimento de frete negociável, o seu endosso transfere a propriedade da mercadoria transportada, que deverá ser entregue, no destino, ao endossatário ou portador legitimado do título. Os conhecimentos de embarque podem ser endossados a terceiros. Os endossos podem ser feitos em branco (torna o conhecimento ao portador, e quem estiver com sua posse pode reclamar a mercadoria) ou em preto (endossado a alguém definido, sendo que somente este poderá reclamar a mercadoria). O endosso é feito na frente do conhecimento, onde estão as cláusulas representando o contrato de transporte. A transmissão da cártula, por meio de endosso (em preto ou em branco), importa na transferência da propriedade da coisa transportada a terceira pessoa que detiver o conhecimento de transporte. É, pois, o proprietário da carga aquele que figura no título de crédito como seu credor ou aquele que detém a cártula endossada, daí a necessidade de apresentação do original do conhecimento de transporte para o exercício do direito de retirar a mercadoria transportada junto ao transportador. O Conhecimento de Embarque, a partir de características próprias dos títulos de crédito, a permitir a sua regular circulação, sem a necessidade da tradição física da carga que representa, sendo possível, portanto, a sua negociação com terceiro, diferente daquele que se apresenta no porto de descarga como seu titular, permitiria, a não se exigir a apresentação do documento original, a entrega da carga para quem não é mais o verdadeiro dono ou a quem não tenha cumprido com os pagamentos a que estava obrigado. É a partir dessa característica principal, qual seja, a livre circulação do Conhecimento de Embarque, a lhe conferir a natureza de verdadeiro título de crédito, que deve ser analisada a possibilidade ou não de exigência do documento original para liberação da carga. 4- A validade da exigência do Conhecimento de Embarque original para liberação da carga. Estabelecido como premissa a natureza de título de crédito do Conhecimento de Embarque, em especial, a sua característica de livre circulação, cabe analisar a validade da exigência do Conhecimento de Embarque original para liberação da carga. Nessa quadra, o artigo 54, da IN/RFB 680/2006, exige apresentação da via original do conhecimento de embarque. Por outro lado, o artigo 18, §2º, I, alínea C, da mesma IN/RFB 680/2006, estabelece que não é necessária essa exibição da vira original do CE nos despachos de mercadoria acobertada por Conhecimento Eletrônico (CE). Por sua vez, o artigo 7º, do Decreto-Lei nº 116, de 25/01/1967, estabelece a as hipóteses em que é lícito ao armador a retenção da carga para pagamento do frete ou contribuição de avaria grossa declarada. É preciso não de perder de vista que o transportador marítimo (efetivo ou contratual) não é dono da carga transportada, sendo responsável pela sua condução da origem ao destino, entregando-a a quem de direito. Assume ele, porém, para além do transporte (obrigação principal), a condição de depositário da carga (obrigação secundária), durante o transporte e até a efetiva entrega ao seu dono ou consignatário, assumindo, portanto, os riscos pela entrega à terceiro não autorizado. Portanto, ao exigir a apresentação do original do Conhecimento de Embarque, ainda que quitado o frete e as taxas locais, não está ele propriamente exercendo qualquer retenção, na medida em que desinteressado para tal fim, mas apenas e tão somente preservando-se de futura responsabilidade, no caso de entrega da carga para quem não de direito. Por isso, reputo não se tratar, aqui, de aplicação do artigo 7º, do Decreto-Lei nº 116, de 25/01/1967, pois, nesses casos o armador, é interessado na retenção. Nessas condições, a exigência do Conhecimento de Embarque original é condição para a liberação da carga, mesmo nos casos de Conhecimento Eletrônico, porquanto se trata de regra específica e restrita ao despacho aduaneiro. Nesse sentido: TUTELA DE URGÊNCIA - CARÁTER ANTECEDENTE E PREPARATÓRIO DE AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL - PEDIDO DE LIBERAÇÃO DE DUZENTAS E CINQUENTA E DUAS TONELADAS DE ÓLEO LUBRIFICANTE - AUTORA QUE NÃO EXIBIU OS ORIGINAIS DOS CONHECIMENTOS DE EMBARQUE OU QUE SEQUER FIGURA NAS CÓPIAS DELES COMO CONSIGNATÁRIA DA CARGA TRANSPORTADA - RETENÇÃO LEGÍTIMA PELA TRANSPORTADORA - REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS - DECISÃO REFORMADA - AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.(TJSP; Agravo de Instrumento 2160685-10.2024.8.26.0000; Relator (a):Matheus Fontes; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; N/A -N/A; Data do Julgamento: 05/09/2024). Sem o destaque no original. Confira-se, ainda, outros precedentes no âmbito do Tribunal de Justiça de São Paulo: Apelação nº 4006433-61.2013.8.26.0562, Relator Desembargador Campos Mello, julgado em 8 de maio de 2014; Apelação nº 1004445-85.2015.8.26.0562, Relator Desembargador Roberto Mac Cracken, julgada em 22 de outubro de 2015. Apelação nº 1001305-43.2015.8.26.0562, Relator Desembargador Sérgio Shimura, julgada em 30 de março de 2016; Apelação nº 1004448-40.2015.8.26.0562, Relator Desembargador Correia Lima, julgada em 12 de setembro de 2016; Apelação nº 4005846-39.2013.8.26.0562, Relator Desembargador Ricardo Negrão, julgada em 12 de setembro de 2016; Apelação nº 1002286-09.2014.8.26.0562, Relator designado Desembargador Cerqueira Leite, julgada em 21 de junho 1003158-24.2014.8.26.0562, agosto de 2017; Relatora Apelação nº Desembargadora Silvia Maria Facchina Espósito Martinez, julgada em 31 de de 2017; Apelação nº 0004814-62.2016.8.26.0562, Relator Desembargador Irineu Fava, julgada em 20 de setembro de 2017; Apelação nº 1016482-13.2016.8.26.0562, Relatora Desembargadora Maria Salete Correa Dias, julgada em 19 de março de 2018; Apelação nº 1029394-70.2016.8.26.0100, Relator Desembargador Souza Lopes, julgada em 25 de abril de 2018; Apelação nº 1024420-30.2014.8.26.0562, Relator Desembargador Salles Vieira, julgada em 25 de outubro de 2018; Apelação nº 1001947-74.2019.8.26.0562, Relator Desembargador Gilberto dos Santos, julgada em 14 de setembro de 2020; Apelação nº 1096980-22.2019.8.26.0100, Relator Desembargador Vicentini Barroso, julgada em 10 de novembro de 2020; Apelação nº 1029062-02.2021.8.26.0562, Relator Desembargador Jairo Brazil, julgada em 14 de junho de 2023. Todavia, não se desconhece o fato de que o Conhecimento de Embarque (Bill of Lading) poderá ser expedido com cláusula de não negociabilidade, o que impede o endosso à terceiros, a afastar a característica da livre circulação. Nesses casos, de forma excepcional, porque o Conhecimento de Embarque perde a característica da livre circulação (não negociável), é possível afastar-se a regra da exigência do original para liberação da carga, mediante prova que incumbe ao interessado na liberação. Portanto, reputo válida a exigência do Conhecimento de Embarque original para liberação da carga, salvo, de modo excepcional, nas hipóteses em que o documento é expedido com cláusula de não negociabilidade, mediante prova que incumbe ao interessado na liberação. 5- A validade da recusa da entrega da carga, no caso concreto, quando há ordem do shipper para não entregar. A situação dos autos possui peculiaridade a ser considerada para fins de julgamento, a saber: a existência de ordem expressa do shipper para não entregar a carga, sob pena de responsabilidade do transportador pelo valor da carga. Em sede manifestação prévia ao pedido de tutela provisória e, posteriormente, em sede de contestação, a ré afirmou que a não liberação da carga está fundada em ordem expressa do shipper para não entregar. Ademais, a própria autora já houvera trazido tal questão, por ocasião do documento de fls. 41/44, tendo sido expressamente notificada que: "... Fomos notificados pelo Shipper (exportador) que ele está na posse do BL original, e, comunicou que se a Sea Sky liberar as mercadorias, sem a apresentação do BL original, irá cobrar da nossa empresa o valor das mercadorias. Portanto, precisamos da liberação pelo Shipper (exportador). Peço-lhe a gentileza de solicitarem ao mesmo (exportador) que nos isente de responsabilidade sobre as mercadorias...". À evidência que, na condição de apenas transportador, tendo recebido ordem expressa do shipper para não entrega da mercadoria, não pode ser obrigado com a entrega, sob pena de assumir, em nome próprio, a responsabilidade pelos prejuízos que vier a causar por descumprir a ordem recebida. Cabe, portanto, à autora, resolver diretamente com o shipper, a pendência sobre a entrega da mercadoria, inclusive, para, no caso de ação judicial, permitir que este último apresente as suas razões que, inclusive, poderão delinear os contornos da boa-fé objetiva das partes na relação contratual. 6- Da solução do caso. Soluciono a controvérsia dos autos com as seguintes definições: 1) O Conhecimento de Embarque possui natureza jurídica de título de crédito, estando sujeito, como regra, à livre circulação; 2) É válida a exigência do Conhecimento de Embarque original para liberação da carga, salvo, de modo excepcional, nas hipóteses em que o documento é expedido com cláusula de não negociabilidade, mediante prova que incumbe ao interessado na liberação; e 3) Havendo ordem expressa do shipper para não entregar a carga, cabe à parte interessada resolver a pendência diretamente com este último, inclusive, para, no caso de ação judicial, permitir que ele apresente as suas razões, visando delinear os contornos da boa-fé objetiva das partes na relação contratual. 7- Do dispositivo da sentença. Pelo exposto e pelo que mais dos autos consta, com fundamento no artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido. A parte autora sucumbente arcará com as custas e despesas do processo, bem como com os honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor atualizado da causa. PIC (grifou-se)

    Nesse cenário, o bloqueio de carga no Siscomex não se afigura ilegal ou abusivo, mas como uma garantia legítima ao exportador e ao regular cumprimento das obrigações assumidas.

    III. Ante o exposto, revoga-se a tutela de urgência deferida no evento 8.

    Aguarde-se a contestação da ré.

     


     

  3. 12/06/2025 - Lista de distribuição
    Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Itajaí | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Processo 5015963-44.2025.8.24.0033 distribuido para 1ª Vara Cível da Comarca de Itajaí na data de 10/06/2025.
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