AUTOR | : ANTONIO CARLOS PALERMO |
ADVOGADO(A) | : FRED WILSON PEREIRA (OAB RJ145339) |
RÉU | : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF |
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de demanda movida contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) visando sua responsabilização por danos materiais e morais em razão de descontos alegadamente realizados em benefício em favor de entidade associativa privada.
É incontroverso que a parte autora sofreu descontos em seu benefício relativos a mensalidade de entidade associativa. A alegação da parte autora é de que nunca se associou e de que seria vítima de fraude. Sustenta que o INSS seria responsável pelos descontos, mesmo que em favor de terceiros. A questão posta, portanto, é se existe conduta ilícita a ensejar responsabilização do INSS, caso se comprove algum tipo de vício ou fraude na obtenção do consentimento do débito pelo beneficiário junto a esse associação.
A responsabilidade civil do Estado é objetiva, nos termos do art. 37, §6, Constituição Federal. Sendo assim, não há de se falar em dolo ou culpa, mas apenas na existência de conduta, nexo causal e dano, como pressupostos da responsabilidade civil. Afasto a incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação entabulada com o INSS, vez que a autarquia não pode ser considerada fornecedora como definido pela legislação consumerista.
O art. 115, V, da Lei 8.213/1991 permite que sejam descontadas mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados. O Decreto 3.048/1999 procedimentaliza a realização de tais descontos, tendo sido incluída a previsão da possibilidade de rescisão unilateral de acordos de cooperação técnica com entidades associativas em razão da existência de irregularidades (Art. 154, §1º-F, incluído pelo Decreto 10.537/2020). A partir da edição da Instrução Normativa INSS 162 de 14/03/2024, passou-se a exigir formalização, pelo beneficiário, da autorização de desconto por meio de termo de adesão, firmado e assinado com assinatura eletrônica avançada e biometria, apresentação do documento de identificação oficial, válido e com foto, e número do Cadastro de Pessoa Física – CPF (art. 4º, II). Tal regra, no entanto, somente se aplica a novas adesões (art. 4º, §6º).
Logo, até então a IN 162/2024, o comando de consignação era feito diretamente pela associação, após a celebração de acordo de cooperação com o INSS. Naquele cenário normativo, inexistia obrigação legal ou regulamentar de que o INSS obtivesse, previamente ao débito, cópia das autorizações dadas pelo beneficiário. Desde 2020, no entanto, existia previsão de que o INSS deveria monitorar possíveis irregularidades e descredenciar entidades inidôneas.
Era meu entendimento de que eventual fraude ou vício na obtenção de consentimento por terceiro seria fato externo à atividade do INSS, o qual consistia apenas na realização de acordos de cooperação técnica, operacionalização de descontos programados e repasse de recursos em favor de terceiro conveniado e identificado. No entanto, notícias recentes dão conta da existência de irregularidades do INSS na realização dos próprios acordos de cooperação técnica. O credenciamento de entidades inidôneas teria ocorrido com ciência ou conivência de agentes públicos. Essas entidades, por sua vez, teriam praticados atos fraudulentos a fim de se apropriar de recursos dos beneficiários do INSS sem que eles tenham se associado ou autorizado o desconto. Se confirmadas as denúncias e, no caso concreto, for confirmada a ausência de autorização de descontos a entidade inidônea, é possível que se esteja diante de fortuito interno, o que poderia dar ensejo à responsabilização autônoma do INSS.
O próprio INSS suspendeu descontos, determinou a devolução de mensalidades referentes ao mês de abril e possibilitou a contestação administrativa dos descontos pelos canais de atendimento online e telefônico, na forma prevista na Instrução Normativa INSS 186/2025.
A questão da existência e extensão da responsabilidade do INSS foi suscitada pela União na ADPF 1236/DF. Ao mesmo tempo que reconhece a existência de irregularidades, a União pede que o STF adote uma série de medidas para prevenir a explosão da litigiosidade, a existência de decisões contraditórias e a responsabilização do INSS por condutas que, a seu ver, seriam atribuíveis apenas a terceiros.
Em medida cautelar na ADPF 1236/DF em 17/06/2025, o Ministro Relator Dias Toffoli solicitou informações; determinou a designação de audiência de conciliação para o dia 24/06/2025; e suspendeu a prescrição de todas as pretensões indenizatórias de todos os lesados pelos atos objeto da demanda. Postergou a apreciação do pedido de “suspensão do andamento dos processos e da eficácia das decisões que tratam de controvérsias pertinentes aos requisitos, fundamentos e extensão da responsabilidade da União e do INSS pelos descontos associativos indevidos realizados por atos fraudulentos de terceiros que tenham sido realizados entre março de 2020 e março de 2025 (conforme artigo 3º da Instrução Normativa PRES/INSS nº 186/2025)”.
Em que pese inexista determinação de suspensão da tramitação dos processos nesse momento, entendo que a adoção de critérios de responsabilização do INSS em divergência com a orientação a ser dada pelo STF implicaria em quebra de isonomia, bem como prejuízo à Administração da Justiça.
Por todo o exposto, com fundamento no art. 6º da Lei 9.099/1995, determino a suspensão do feito pelo prazo de 90 (noventa) dias.
Decorrido sem decisão na ADPF 1236/DF, venham imediatamente conclusos para sentença.