Trata-se de EXECUÇÃO FISCAL proposta pela UNIÃO - FAZENDA NACIONAL em face de REUNIDOS COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, objetivando a cobrança de débito consubstanciado nas certidões de dívida ativa nº 70423327807-60; nº 70423327811-47; nº 70423327810-66; nº 70423327806-80; nº 70423327815-70; nº 70423327809-22; nº 70423327814-90; nº 70423327813-09; nº 70423327808-41; nº 70423327812-28 e nº 70223024055-17, no valor de R$3.186.324,39 (três milhões, cento e oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e trinta e nove centavos).
A Parte Executada foi citada, conforme certificado no evento 09, em 12 de março de 2025, mas não cumpriu à determinação do art. 8º da LEF, ou seja, deixou transcorrer o prazo legal de 05 (cinco) dias sem pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos, ou garantir a execução.
Decisão de evento 17 determinou a penhora de dinheiro e/ou ativos, até o limite da dívida exequenda, via SISBAJUD, nos termos do art. 854 do CPC/2015 c/c arts. 7º e 11 da LEF.
Em 16/04/2025 foi realizado o bloqueio de R$792.812,16 (setecentos e noventa e dois mil oitocentos e doze reais e dezesseis centavos) em contas bancárias de titularidade de REUNIDOS COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA, mediante consulta ao sistema SISBAJUD, conforme se depreende do detalhamento da ordem de bloqueio do evento 19.
Na petição de evento 18, a Parte Executada apresentou exceção de pré-executividade, na qual alegou que, em 31/01/2024, aderiu ao programa Regularize, instituído pela Lei n° 14.740/2023, estando incluídas no r. acordo as certidões de dívida ativa executadas, cujos créditos estariam com a exigibilidade suspensa, nos termos do artigo 151, inciso VI, do CTN. Ao final, requereu a extinção do feito executivo, diante da inexigibilidade dos títulos, nos termos do artigo 803, inciso I, do CPC.
Na petição de evento 21, complementando o pedido da peça anterior, argumenta que "o bloqueio judicial de valor expressivo diretamente na conta bancária da Executada inviabiliza a utilização de recursos absolutamente essenciais à sua operação cotidiana, especialmente para o pagamento da folha de salários, quitação de empréstimos e obrigações com fornecedores". Neste contexto, requereu a concessão da tutela de urgência para o imediato desbloqueio dos valores constritos via SISBAJUD ou, subsidiariamente, o desbloqueio parcial de 70% do montante bloqueado, a fim de possibilitar a quitação parcial das verbas salariais de seus empregados.
Nos anexos 2 e 3 do evento 21, apresentou o seguintes: (i) declaração contábil da empresa, sustentando que entre 23/04/2025 e 20/05/2025 a empresa terá um déficit operacional estimado em R$ 735.890,00 (setecentos e trinta e cinco mil oitocentos e noventa reais) e (ii) resumo geral consolidado sobre valores pagos aos funcionários na folha de pagamento.
No evento 22, apresenta nova petição, reiterando o pedido de tutela de urgência, diante de fato novo, qual seja, o vencimento de parcela do parcelamento fiscal em 30/04/2025, no valor de R$ 78.833,43 (setenta e oito mil oitocentos e trinta e três reais e quarenta e três centavos).
Decisão de evento 23, fundamentando não ser possível ao Juízo determinar de imediato o desbloqueio do valor constrito sem a prévia oitiva da Exequente, determinou a intimação da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, COM URGÊNCIA, para se manifestar conclusivamente acerca das alegações, pedidos e documentos apresentados pela Parte Executada.
Decisão de evento 29 determina a intimação da Parte Executada para apresentar nos autos seus atos constitutivos.
Na petição de evento 31 a Parte Executada cumpre a determinação e apresenta a 11ª Alteração Contratual da Sociedade Empresária no evento.
Na manifestação do evento 32, a Exequente alega, em suma: (i) a inadequação exceção de pré-executividade por demandar dilação probatória; (ii) o indeferimento administrativo do parcelamento; (iii) a presunção de liquidez, certeza e exigibilidade da CDA.
Na petição de evento 33, a Executada sustenta que a decisão administrativa foi proferida somente após o ajuizamento da presente Execução e após o bloqueio de ativos financeiros da Executada.
É o relatório.
Decido.
Em sede de execução fiscal, em princípio, a defesa do executado deve se realizar através dos Embargos, nos termos do artigo 16 da Lei nº 6.830/1980. Todavia, é assente na doutrina e na jurisprudência o cabimento de exceção de pré-executividade quando a parte pretende arguir matérias de ordem pública ou nulidades absolutas que dispensam, para seu exame, dilação probatória.
Assim, é possível suscitar, por meio da referida exceção, questões que devam ser conhecidas de ofício pelo juiz, como as atinentes à liquidez do título executivo, aos pressupostos processuais e às condições da ação executiva.
Neste sentido já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça, inclusive sob o regime do artigo 543-C do C.P.C./73, conforme se infere da Ementa abaixo transcrita, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL - RECONHECIMENTO DE DECADÊNCIA EM EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE - CABIMENTO - POSIÇÃO FIRMADA NO RESP 1.104.900/ES, JULGADO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC - DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA - EMBARGOS REJEITADOS.
1. Esta Corte, no julgamento do REsp 1.104.900/ES, submetido à sistemática do art. 543-C, do CPC, firmou entendimento no sentido de admitir exceção de pré-executividade nas situações em que não se faz necessária dilação probatória ou em que as questões possam ser conhecidas de ofício pelo magistrado, como as condições da ação, os pressupostos processuais, a decadência e a prescrição.
(...)
(EDcl no REsp 1187995/DF. Relatora Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Convocada TRF 3ª Região). Segunda Turma. Julgamento em 04/12/2012. Publicado em 17/12/2012)
O entendimento da Corte Especial foi sedimentado na Súmula nº 393, in litteris:
A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.
A excipiente requer a extinção da execução fiscal uma vez que as inscrições nº 7022302405517, 7042332780922, 7042332780680, 7042332781066, 7042332780841, 7042332780760, 7042332781570, 7042332781490, 7042332781309, 7042332781228 e 7042332781147, no valor original de R$ 3.186.324,39 (três milhões, cento e oitenta e seis mil, trezentos e vinte e quatro reais e trinta e nove centavos), foram objeto de pedido de parcelamento em janeiro de 2024, data anterior ao ajuizamento da presente execução fiscal.
Como cediço, o parcelamento do crédito tributário é causa suspensiva da exigibilidade, nos termos do artigo 151, VI, do Código Tributário Nacional (CTN).
O caso concreto, todavia, merece especial atenção.
Conforme preceitua o art. 155-A do mesmo diploma legislativo, o parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica.
Isto é, a produção de efeitos suspensivos da exigibilidade do crédito tributário advindos do parcelamento condiciona-se ao preenchimento dos requisitos legais.
No caso em análise, a contribuinte realizou o pedido de parcelamento com fundamento na Lei n° 14.740/2023, que dispunha sobre a autorregularização incentivada de tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda.
Com efeito, o art. 2º da referida lei previa expressamente que tal parcelamento somente se aplicava aos tributos não constituídos até a data de publicação, qual seja, 30.11.2023.
Ocorre que, todos os créditos em cobro deixam de atender ao requisito essencial uma vez que foram objeto de declaração pessoal em data anterior.
Mas não é só. Outra condição para a adesão à autorregulação era o pagamento de, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) do débito à vista (art. 3º, I , da lei 14.740/2023).
Da análise da DARF referente ao pagamento da primeira parcela (evento 32, anexo 2, pgs. 130/131), verifica-se que a Contribuinte efetuou o pagamento de apenas R$110.137,53 (cento e dez mil cento e trinta e sete reais e cinquenta e três centavos), valor muito inferior ao exigido.
De acordo com a Instrução Normativa RFB nº 2.168, de 28 de dezembro de 2023 que tem como objetivo orientar a execução da autorregularização incentivada instituída pela Lei nº 14.740, o requerimento de adesão não produzirá nenhum efeito sem o pagamento deste valor.
Dessa forma, não se trata de um parcelamento comum em que a Exequente estava emitindo DARFs desde janeiro de 2024, mas de um pedido de autorregulação em que parte não atendia qualquer condição legal. Nesse sentido, o pagamento das parcelas não se presta a gerar uma expectativa de direito contra legem que permita à Contribuinte furtar-se ao cumprimento de sua obrigação tributária. Ainda que se tivesse gerado uma legítima expectativa, não se poderia, ao final, adotar uma decisão que violasse a literal disposição de Lei.
Dessa forma, entendo que, não obstante a decisão de indeferimento tenha se dado somente em 29/04/2025, o pedido de parcelamento além de não observar qualquer requisito legal, não produziu efeito por não ter sido pago o valor mínimo 50% da dívida consolidada na primeira parcela.
Por fim, em relação à alegação acerca do pedido de desbloqueio, entendo que os documentos apresentados pela parte Executada não são capazes e suficientes para demonstrar a impossibilidade de continuação das atividades empresariais.
Observe-se que a mera apresentação declaração contábil produzida de forma unilateral, não se apresenta como documentação suficiente para demonstrar que o bloqueio realizado, por si só, é apto a gerar a impossibilidade de continuação de sua atividade.
Isso porque, é cediço que a pessoa jurídica possui compromissos a serem honrados. Todavia, é de rigor que a Parte Executada comprove que a constrição realizada teve realmente o condão de impossibilitar, de fato, o desenvolvimento de suas atividades empresariais.
Ressalte-se que, qualquer alegação quanto à gravosidade de medida constritiva realizada em autos executivos sempre deverá ser acompanhada de comprovação, inequívoca, dos prejuízos a serem efetivamente suportados pela parte.
Nesta mesma linha é o entendimento jurisprudencial do E. Tribunal Regional Federal da 2ª Região, conforme transcrito:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA SOBRE O FATURAMENTO. PERCENTUAL DE 5%. RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. INVIABILIDADDE DAS ATIVIDADES EMPRESARIAIS. NÃO COMPROVAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
1. Trata-se de agravo de instrumento visando à reforma da decisão que deferiu o pedido de penhora sobre o faturamento mensal das empresas executadas, no percentual de cinco por cento.
2. O Superior Tribunal de Justiça tem admitido a penhora sobre o faturamento, de forma excepcional, desde que preenchidos os seguintes requisitos: i) o devedor não possua bens ou, se os tiver, sejam esses de difícil execução ou insuficientes a saldar o crédito demandado; ii) haja indicação de administrador e esquema de pagamento; iii) que o percentual fixado sobre o faturamento não torne inviável o exercício da atividade empresarial (STJ, 3ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1421489/RJ, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJe de 24/05/2012).
3. No caso em tela, as agravantes apontaram como fato impeditivo da manutenção da penhora sobre o faturamento a existência de medida constritiva idêntica adotada nos autos de outros processos. No entanto, o que lograram demonstrar foi a existência de penhoras de créditos de vendas de algumas das empresas ora recorrentes, referentes, tão somente, aos produtos da marca UAI.
4. Assim, embora haja a existência de muitas outras execuções fiscais em face das agravantes, não restou comprovado que o percentual estipulado (5%) para a penhora sobre o faturamento irá comprometer as atividades das empresas devedoras.
5. Há, nos autos originários, ordem de penhora de dois imóveis, de propriedade de uma das devedoras, mas a diligência constritiva ainda não foi cumprida e, em consulta a alguns dos processos executivos em que figuram no pólo passivo as recorrentes, depreende-se que os referidos imóveis já se encontram penhorados para garantia de distintas execuções fiscais.
6. Considerando, assim, que inexiste, atualmente, outra penhora que garanta a execução em questão e o valor do débito executado, deve ser mantida a penhora sobre o faturamento impugnada.
7. Conforme já destacado pelo e. Superior Tribunal de Justiça, a tese de violação ao princípio da menor onerosidade não pode ser defendida de modo genérico ou simplesmente retórico, cabendo à parte executada a comprovação, inequívoca, dos prejuízos a serem efetivamente suportados, bem como da possibilidade, sem comprometimento dos objetivos do processo de execução, de satisfação da pretensão creditória por outros meios (AgRg no REsp 1051276/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2008, DJe 12/02/2009), o que não ocorreu nos presentes autos.
8. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.
(TRF2 2011.02.01.007442-3. Órgão julgador: 3ª TURMA ESPECIALIZADA. Relatora CLAUDIA NEIVA. Data de decisão: 10/11/2015). Grifei
Na hipótese dos autos, ainda que o valor fosse destinado ao pagamento de salários, isso não impediria, por si só, a constrição de tais valores, sob pena de ineficácia do art. 854 do CPC/15 e da ordem preferencial de penhora do art. 11 da lei nº 6.830/80.
Dessa forma, sobre os valores depositados em contas da pessoa jurídica executada inexiste qualquer hipótese de impenhorabilidade prevista no art. 833 do CPC/15, sendo legítima a constrição de tais montantes.
A propósito, vejamos o posicionamento do E. Tribunal Regional Federal da 2ª Região (grifo nosso):
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA ELETRÔNICA PELO BACEN-JUD. CONTA DE EMPRESA. PAGAMENTO DE SALÁRIOS DE EMPREGADOS. BLOQUEIO MANTIDO.
1. O objeto do presente agravo cinge-se em determinar se os valores penhorados via Bacen- Jud, na conta da pessoa jurídica executada, constituem bens impenhoráveis. Na origem, trata- se de execução fiscal proposta pela UNIÃO FEDERAL/FAZENDA NACIONAL em face da empresa executada KRISTYLUX INDUSTRIA E COMERCIO DE ROUPAS LTDA, para cobrança de débito fiscal no valor de R$ 4.860.237,16 (quatro milhões, oitocentos e sessenta mil, duzentos e trinta e sete reais e dezesseis centavos), atualizado até 03/2018. 2. Em 08/03/2018 foi realizado o bloqueio da quantia de R$ 169.364,64 (cento e sessenta e nove mil, trezentos e sessenta e quatro reais e sessenta e quatro centavos), através do sistema BACENJUD (fls. 128/129), tendo sido deferido pelo juízo a quo em 16/02/2018 (fls. 270/271).
3. Esclarece a agravante que a manutenção da decisão causará danos irreparáveis, tais como a suspensão das atividades da empresa e a possível demissão em massa dos funcionários. Alega que o valor penhorado destinava-se, exclusivamente, ao pagamento da segunda parcela da salário referente de seus empregados, referente ao mês de fevereiro.
4. Não obstante as alegações da parte executada, a conta corrente da sociedade empresária não se enquadra em nenhuma das hipóteses de impenhorabilidade absoluta prevista no art. 833, do CPC/2015. Estando os valores depositados em conta bancária de titularidade de pessoa jurídica, e não em nome do trabalhador assalariado pessoa física, não detêm natureza alimentar e não são equiparados a salário (art. 833, IV, do CPC) porque, em conjunto com as demais receitas, compõem o faturamento da sociedade - que se destina a cobrir suas despesas operacionais, tais como insumos, fornecedores e e tributos -, sendo, portanto, penhoráveis.
5. Ainda que parte desses valores fossem destinados ao pagamento de salários de funcionários, tal utilização dos valores como capital de giro é a situação normal de qualquer empresa e, portanto, por si só, não pode ensejar óbice ao bloqueio via Bacen-Jud, sob pena de inviabilizar por completo qualquer bloqueio judicial de valores pertencentes a empresas e tornar "letra morta" a inovação do art. 655-A do CPC.
6. Agravo improvido.
(TRF2 - AG 0002405-84.2018.4.02.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES, QUARTA TURMA ESPECIALIZADA, j. 24/07/2018, DJe 01/08/2018)
In casu, verifico que não houve demonstração inequívoca de que o bloqueio realizado impede as atividades da pessoa jurídica colocando em risco sua existência.
Diante do exposto, INDEFIRO a exceção de pré-executividade apresentada.
Intime-se a Exequente para que se manifeste a respeito da imputação dos valores pagos no âmbito administrativo, no prazo urgente de 2 (dois) dias.
Após, voltem imediatamente conclusos.
Autos vistos em inspeção judicial, realizada entre 19/05/2025 e 23/05/2025.