Jaime Soares Pereira x Banco Agibank S.A

Número do Processo: 6049682-35.2024.8.09.0006

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJGO
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Anápolis - UPJ Varas Cíveis: 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 5ª e 6ª
Última atualização encontrada em 25 de julho de 2025.

Intimações e Editais

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  2. 01/07/2025 - Intimação
    Órgão: Anápolis - UPJ Varas Cíveis: 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 5ª e 6ª | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE GOIÁSGabinete da 5ª Vara Cível da Comarca de AnápolisAutos n.: 6049682-35.2024.8.09.0006 SENTENÇA I - RELATÓRIO JAIME SOARES PEREIRA propôs AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em desfavor de BANCO AGIBANK S.A.Aduz o requerente, em suma, que recebeu uma ligação de uma representante da empresa requerida, que lhe ofereceu uma redução de empréstimo, logo depois o autor percebeu que na verdade foi feito um empréstimo em seu nome utilizando 6 (seis) anos do seu décimo terceiro. Inconformado, diz o requerente que entrou em contato com a parte ré informando que não tinha nenhum interesse em realizar o referido empréstimo, momento em que foi orientado a devolver o valor ao Banco para que pudesse ser realizado o cancelamento. Diante disso, sustenta que efetuou a devolução em 2 (duas) TED’s, uma no valor de R$ 16.441,05 (dezesseis mil, quatrocentos e quarenta e um reais e cinco centavos) e outra no valor de R$ 7.150,37 (sete mil, cento e cinquenta reais e trinta e sete centavos). Alega que se dirigiu a agência bancária do Banco Itaú para sacar a sua aposentadoria e constatou que não havia saldo disponível, posto que fora realizada uma portabilidade para o Banco Agibank.Menciona que se deslocou até a agência da empresa ré que informou que foi feita uma portabilidade via telefone e 1 (um) empréstimo consignado perfazendo um total de R$ 23.591,42 (vinte e três mil e quinhentos e noventa e um reais e quarenta e dois centavos), os quais são desconhecidos da parte autora.Diante do exposto, propõe a presente demanda buscando a declaração de nulidade do contrato de empréstimo, a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais e na restituição dos valores descontados em seu benefício. Pede a concessão de liminar, protesta por provas, dá valor à causa e anexa documentos (evento 01).Decisão de evento 06, concedendo a justiça gratuita ao autor e deferindo a tutela de urgência para determinar que a parte ré suspenda as cobranças referentes ao débito em questão.O réu apresentou contestação arguindo preliminar de ilegitimidade passiva.No mérito, afirma que por mera liberalidade, o autor firmou com o Banco réu, por livre e espontânea vontade, o contrato de empréstimo consignado de nº 1512835796, em 06/02/2024, no valor de R$ 17.008,53 (dezessete mil e oito reais e cinquenta e três centavos), para ser pago em 84 parcelas de R$ 396,56 (trezentos e noventa e seis reais e cinquenta e seis centavos), sendo liberada a quantia de R$ 16.441,05 (dezesseis mil quatrocentos e quarenta e um reais e cinco centavos) na conta da parte autora.O requerido afirma que para a contratação foi utilizado o reconhecimento biométrico para a assinatura eletrônica do contrato de empréstimo consignado, bem como o envio de documento pessoal com foto, tendo o autor recebido o montante contratado em conta corrente de sua titularidade, devendo prevalecer a higidez do negócio jurídico objeto da lide.Isto posto, requer o acolhimento da preliminar, e no mérito, que sejam julgados improcedentes os pedidos da inicial. Protesta por provas e apresenta documentos (evento 12).O autor impugnou a contestação (evento 16).Instadas a manifestarem a respeito da produção de provas, as partes pleitearam o julgamento antecipado da lide (eventos 20 e 21).Decisão de evento 24, reconhecendo que o feito está pronto para ser julgado. As partes não recorreram da decisão.Ato contínuo, os autos me vieram conclusos para sentença. II - FUNDAMENTAÇÃOTrata-se de Ação Declaratória de Nulidade Contratual C/C Repetição de Indébito e Danos Morais proposta por Jaime Soares Pereira em desfavor de Banco Agibank S/A.Aplica-se neste caso, o disposto no inciso I, do artigo 355, do Código de Processo Civil, sendo o conjunto probatório coligido aos autos suficiente para prolação de sentença, eis que se trata de matéria exclusivamente de direito.Cite-se a Súmula nº 28 do TJGO:“Afasta-se a preliminar de cerceamento de defesa, suscitada em razão do julgamento antecipado da lide, quando existem nos autos provas suficientes à formação do convencimento do juiz e a parte interessada não se desincumbe do ônus de demonstrar o seu prejuízo, sem o qual não há que se falar em nulidade.” O processo encontra-se em ordem e as partes representadas, não havendo irregularidades ou nulidades a serem sanadas.Ressalto que o processo teve tramitação normal e que foram observados os interesses dos sujeitos da relação processual quanto ao contraditório e ampla defesa.Ademais, destaco que a preliminar arguida pela parte ré se confunde com o próprio mérito da causa e com ele será analisado, sobretudo em razão do princípio da primazia da decisão de mérito, trazido pelo artigo 6º do Código de Processo Civil: “Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.  Havendo confusão da preliminar com o mérito e devendo-se conferir primazia da decisão de mérito, há que se rejeitar a preliminar. Passo a análise do mérito.Trata-se de ação ordinária pela qual pretende o autor a declaração de inexistência de relação jurídica com o réu, referente ao contrato de empréstimo consignado, discutido nos autos, a repetição do indébito em dobro e a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, na quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), conforme pedidos elencados no evento 01.Disse o autor que foi contatado pelo banco réu que lhe ofereceu a redução de valor de empréstimo consignado. Afirma que logo depois percebeu que na verdade foi feito um empréstimo em seu nome utilizando 6 (seis) anos do seu décimo terceiro. Inconformado, o requerente afirma que entrou em contato com a parte ré informando que não tinha nenhum interesse em realizar o referido empréstimo, momento em que foi orientado a devolver o valor ao Banco para que pudesse ser realizado o cancelamento.Ademais, alega o autor que dirigir-se à agência bancária em que costumava receber seu benefício previdenciário observou que não havia saldo disponível, indignado, procurou o seu gerente, momento em foi lhe informado que fora realizado uma portabilidade para o Banco Agibank, em seguida o requerente se deslocou até a agência da empresa ré que informou que foi feito uma portabilidade via telefone, e a contratação de 1 (um) empréstimo consignado. No entanto, o autor alega que não solicitou a portabilidade bancária e a contratação de empréstimo consignado com o banco réu (evento 01).Por outro lado, argumenta o requerido que a parte autora contratou junto ao Banco, Cédula de Crédito Bancário, de forma eletrônica, após o envio de selfie e dos documentos pessoais, bem como autorizou a troca de domicílio bancário de pagamento de benefício do INSS (evento 12).Sem delongas, registro que na relação jurídica em apreço se aplicam as disposições do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista a presença das figuras do consumidor e do fornecedor de serviços, nos termos dos artigos 2° e 3°, ambos do referido Diploma Legal.Além do mais, a Súmula n° 297 do Superior Tribunal de Justiça não deixa dúvidas quanto à incidência das regras constantes no Código Consumerista em relação às instituições financeiras ao dispor:“Súmula n° 297. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. É de trivial conhecimento que o fornecedor responde objetivamente pela falha no serviço prestado, nos termos do artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõe:“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.§ 1°. O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:I – o modo de seu fornecimento;II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;III – a época em que foi fornecido”. Consoante se observa do dispositivo acima transcrito, a responsabilidade imposta pelo artigo 14 é independente de culpa e se baseia na conduta, dano e nexo causal. Destaco que a referida teoria da responsabilidade objetiva teve inspiração nos princípios da boa-fé, da equidade, da reparação do dano, como forma de propiciar a entrega de uma tutela jurisdicional mais justa e tem buscado suporte na teoria do risco.Apesar de o caso ser de típica relação de consumo, na qual é possível aplicar a inversão do ônus da prova, consoante previsto no artigo 6º, inciso VIII da Lei Consumerista, o Magistrado também deve observar as regras de distribuição do ônus da prova, conforme o artigo 373 e incisos do Código de Processo Civil, de forma que incumbe à parte autora produzir a prova quanto aos fatos constitutivos do seu direito e à ré, produzir a prova quanto aos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos.A controvérsia cinge-se sobre perquirir se o contrato de mútuo bancário, efetuado pelo requerente é válido ou não e assim, se as respectivas cobranças realizadas pelo Banco réu, são legais e devem persistir.Neste aspecto, os documentos jungidos pela parte ré na ocasião da contestação evidenciam a existência de contratação, na data de 06/02/2024, de uma CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - CCB - N.º 1512835796, em nome do autor, de forma eletrônica, realizando ainda a solicitação de Troca de Domicílio Bancário de Pagamento de Benefício do INSS (arquivos 02 e 06 – evento 12).Na peça de ingresso, a parte autora informou não ter contratado junto à parte ré nenhum tipo de empréstimo, não tendo celebrado o referido contrato, sendo que transferiu o valor de R$ 24.741,79 (vinte e quatro mil, setecentos e quarenta e um reais e setenta e nove centavos), buscando cancelar o referido empréstimo (eventos 01 e 16).Tratando-se de prova de fato negativo, a saber, a não contratação do empréstimo, apresenta-se de extrema dificuldade para o requerente a sua comprovação, tratando-se, na verdade, de prova diabólica.Nesse sentido, diante dos questionamentos e versando a operação de empréstimo sob a forma digital, formalizado através de aparelho de telefonia móvel, era ônus do banco trazer o áudio de gravação do contato telefônico ou o suposto SMS que precedeu à anuência e, com isso, demonstrar a real intenção das partes, ademais porque a contratação se deu através de correspondente bancário localizado em outro Estado.Portanto, incumbia ao requerido, esclarecer a dúvida e exibir o teor da gravação do diálogo que precedeu a contratação do empréstimo, ou então produzir prova pericial que conclusivamente atestasse a existência do pacto.A contratação do empréstimo foi realizada de forma eletrônica, via Internet Banking, sem a necessidade do uso de cartão da conta bancária ou qualquer identificação segura do mutuário contratante, a corroborar com a tese de que o autor foi vítima de contratação fraudulenta realizada por terceiro.Era dever da referida instituição financeira verificar e validar a identidade e a qualificação da titular da conta, bem como a autenticidade das informações fornecidas pelos estelionatários, inclusive mediante confrontação dessas informações com as disponíveis em bancos de dados de caráter público ou privado (Art. 2° da Resolução nº 4.753/2019 do BACEN). No entanto, verifica-se que o endereço constante no instrumento de empréstimo é totalmente divergente do endereço de residência do autor, situação essa que passou despercebida pelo réu. Da mesma forma, cabia à instituição financeira verificar, em tempo real, a conformidade da contratação do empréstimo antes de liberar o valor na conta bancária do cliente, certificando-se da geolocalização do aparelho telefônico utilizado na operação e adotando as medidas necessárias para garantir a regularidade da transação mencionada, o que não foi feito.Sob esse aspecto, cabe destacar que as operações relativas a consignação de descontos para pagamentos de empréstimos e cartão de crédito, contraídos nos benefícios da Previdência Social, foram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PREV nº 28/2008, principalmente em relação à autorização por escrito ou por meio eletrônico e apresentação de documentos pessoais do contratante, bem como quanto ao dever da instituição financeira de dar ciência prévia ao beneficiário de informações consistentes no valor total da operação. Vejamos:"Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que:(...)II - mediante contrato firmado e assinado com apresentação do documento de identidade e/ou Carteira Nacional de Habilitação - CNH, e Cadastro de Pessoa Física - CPF, junto com a autorização de consignação assinada, prevista no convênio; e III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência." (Alterados pela Instrução Normativa INSS/PRESS nº 39, de 18 de junho de 2009)” No caso, por ser inequívoca a relação de consumo e, portanto, admissível a inversão do ônus da prova, era ônus da instituição financeira demonstrar que os procedimentos operacionais relativos à consignação de descontos acima mencionados foram observados, o que não ocorreu na hipótese em tela, já que não há provas de que o requerente enviou autorização de consignação assinada, prevista no convênio.Logo, incapaz de responsabilizar a parte autora pelo pagamento do débito em questão.A respeito da livre manifestação do agente, são esclarecedores os ensinamentos de Maria Helena Diniz: "É indubitável que a manifestação da vontade exerce papel preponderante no negócio jurídico, sendo um de seus elementos básicos. Tal declaração volitiva deverá ser livre e de boa fé, não podendo conter vício de consentimento, nem social, sob pena de invalidade negocial. R. Limongi França define o consentimento como 'a anuência válida do sujeito a respeito do entabulamento de uma relação jurídica sobre determinado objeto” (Curso de Direito Civil Brasileiro, Editora Saraiva, 20ª edição, 1º vol., p. 383).Não é crível, ademais, que alguém contrate um empréstimo e logo em seguida procure o banco, relate fraude na contratação, devolva o valor recebido em sua conta e ajuíze demanda pedindo a anulação do contrato e confessa que os valores foram creditados em sua conta de forma errada. No mínimo muito estranho tal atitude.E no caso, como se viu, a instituição bancária requerida não comprovou que o autor quis, de forma inequívoca, celebrar o contrato por meio de "biometria facial". Desta forma, entendo não haver elementos suficientes que corroborem validade da contratação do empréstimo pelo autor, em especial a respeito da sua livre manifestação de vontade em contratar.Destaco, ainda, que não há que se falar em culpa exclusiva de terceiro, a afastar a responsabilidade do requerido, vez que, no caso, trata-se de fortuito interno, ou seja, de próprio risco inerente ao empreendimento.O entendimento encontra-se consolidado na Súmula 479 do STJ, verbis:"Súmula 479: As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias." Desta forma, é imperiosa a declaração de nulidade da Cédula de Crédito Bancário - Empréstimo Consignado n° 1512835796, objeto da lide, celebrada com o Banco Agibank S/A e, consequentemente, da inexistência de débitos dela decorrente.Neste sentido, são os seguintes julgados:RECURSO INOMINADO. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATO E DEVOLUÇÃO DE PARCELAS DESCONTADAS DO CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATO E DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIA. PRETENSÃO DE EXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO ELETRÔNICA QUE NÃO SE SUSTENTA NO CASO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ASSINATURA ELETRÔNICA DO CONTRATANTE, JÁ QUE A APONTADA NÃO IDENTIFICA O SIGNATÁRIO. ENVIO DE ‘SELFIE’ E FOTO DE DOCUMENTO QUE, POR SI SÓ, NÃO GERAM PRESUNÇÃO DE CONTRATAÇÃO, JÁ QUE NÃO COMPROVADA A RAZÃO DE TAIS ENCAMINHAMENTOS. SUPOSTA CONTRATAÇÃO COM PESSOA IDOSA QUE MERECE CUIDADOS DIFERENCIADOS POR SER PESSOA HIPER VULNERÁVEL, MORMENTE QUANDO A RELAÇÃO SE DER PELO MEIO VIRTUAL. DANOS MORAIS, NO ENTANTO, INEXISTENTES NO CASO. EXTRATO BANCÁRIO REVELANDO ALTA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA, QUE NÃO PERMITE CONCLUIR QUE OS DESCONTOS HAVIDOS TERIAM DESORGANIZADO FINANCEIRAMENTE A PARTE A PONTO DE COMPROMETER ATRIBUTO DE SUA PERSONALIDADE. SENTENÇA MODIFICADA EM PARTE. Recurso parcialmente provido.(TJ-RS - Recurso Cível: 00139112020228219000 PORTO XAVIER, Relator: Luís Francisco Franco, Data de Julgamento: 30/06/2022, Terceira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: 05/07/2022) Apelação. Contratação eletrônica de empréstimo e cartão de crédito consignado por meio de biometria facial. Improcedência. Inconformismo da autora. Idoso. Aplicabilidade do CDC. Ausência de comprovação da efetiva manifestação da vontade e ciência inequívoca da contratação. Consumidor hipervulnerável. Validade da contratação não demonstrada. Fraude evidenciada. Precedentes da Corte. Cabimento de reparação por danos materiais e danos morais. Ação ora julgada parcialmente procedente. Recurso provido.(TJ-SP - AC: 10008990220218260145 SP 1000899-02.2021.8.26.0145, Relator: Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, Data de Julgamento: 24/06/2022, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/06/2022) As cobranças e descontos perpetrados se mostram desamparados de qualquer fundamento legal e faz revelar o dolo perpetrado pelo requerido, ao cobrar as quantias sabidamente indevidas. Dessa forma, a solução para a questão é a devolução das quantias indevidamente descontadas no benefício previdenciário da autora, em dobro, nos termos do parágrafo único do artigo 42 do CDC.Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Por derradeiro, ainda que o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 14, admita a reparação de danos, inclusive os morais, independente de culpa, a espécie tratada nos autos não configura o denominado “dano moral puro”, expressão que se refere às circunstâncias que, de per si, configuram o dano moral.Quanto à sua caracterização, prevalece na doutrina que o dano moral deve ser definido como uma lesão aos direitos da personalidade, os quais, na lição do doutrinador Flávio Tartuce, são aqueles que “(…) têm por objeto os modos de ser, físicos ou morais do indivíduo" (Manual de Direito Civil, Volume Único, 9 ed., p. 82).Assim, para que se possa falar nessa espécie de dano, é necessária a demonstração da ocorrência de uma lesão a qualquer dos direitos de personalidade da vítima, como suas liberdades (crença, profissão, locomoção), honra (subjetiva ou objetiva), imagem, vida privada, nome, integridade física, integridade psíquica e integridade intelectual.Adotando este entendimento, a doutrinadora Maria Celina Bodin de Moraes conceitua o dano moral como "(...) aquele que, independentemente de prejuízo material, fere direitos personalíssimos. Isto é, todo e qualquer atributo que individualiza cada pessoa, tal como a liberdade, a honra, a atividade profissional, a reputação, as manifestações culturais e intelectuais entre outros. O dano ainda é considerado moral quando os efeitos da ação, embora não repercutam na órbita de seu patrimônio material, origina angústia, dor, sofrimento, tristeza, humilhação à vítima, trazendo-lhe sensações e emoções negativas”. (Danos à Pessoa Humana: Uma Leitura Civil-Constitucional dos Danos Morais, Editora Renovar, 2009, p. 157).A partir dessas noções, vislumbro que no caso em deslinde, o dano moral decorre do fato de o autor ter sido privado de valores descontados indevidamente em seu benefício previdenciário, de reduzido valor, destinado a lhe garantir alimentos, e ter sido obrigado a contratar advogado e acionar o Poder Judiciário para resolver a questão decorrente da fraude bancária.A propósito:APELAÇÃO. CONTRATO BANCÁRIO – FRAUDE. Ação declaratória de inexistência de relação contratual c.c. com pedidos de reparação por danos materiais e morais - Contratos de Empréstimos Consignados em Benefício Previdenciário – Pactuações em ambiente virtual mediante biometria facial (captação de "selfie") – Contratações impugnadas. Caso concreto: Relação de consumo - Cumpre ao Banco o ônus da prova da existência e validade dos contratos de empréstimos consignados - Questionamentos sobre o teor do diálogo mantido entre o autor e o preposto do Banco a sugerir que a relação contratual foi precedida de ligação telefônica por aparelho de telefonia móvel – Banco que, instado a exibir o áudio da gravação e os contratos renegociados, quedou-se inerte - Só a cópia dos contratos eletrônicos e das etapas que se seguiram, com suposta captação de biometria facial e de documento pessoal, não servem para se contrapor à alegação de que se tratou de contratação fraudulenta - Contratos que, à falta de prova concreta do elemento volitivo, foram corretamente declarados inexistentes - Devolução em dobro dos valores descontados sem amparo contratual - Danos morais reconhecidos pela privação de recursos de subsistência - Indenização bem arbitrada em R$ 10.000,00 - Valor adequado e que cumpre as finalidades do ressarcimento e da advertência – Ação julgada procedente – Sentença confirmada. - RECURSO DESPROVIDO.(TJ-SP - AC: 10287402820218260482 SP 1028740-28.2021.8.26.0482, Relator: Edgard Rosa, Data de Julgamento: 05/09/2022, 22ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/09/2022) Sobre a fixação do quantum relativo aos danos morais, esta é de livre estipulação do juiz, balizado pelos estreitos limites dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Desta forma, atendendo ao binário pedagógico e sancionador da medida, o magistrado deve cuidar de fixar um montante que sirva para coibir novos atos ilícitos semelhantes, bem como, ao mesmo tempo, para indenizar, efetivamente, aquele que se viu lesado.Ainda na seara do quantum indenizatório, corroborando os parâmetros dados pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, o art. 944 do Código Civil estabelece que a indenização se mede pela extensão do dano. Deve ser considerado, pois, o descaso da parte requerida em não procurar solucionar amigavelmente os transtornos causados, evitando assim a inevitável demora inerente às formalidades processuais.Nesse sentido é a lição de Caio Mário da Silva Pereira (in Responsabilidade Civil, 4ª ed., 1993, p. 60), nos seguintes termos:A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva. O Desembargador carioca Sérgio Cavalieri Filho (na obra Programa de Responsabilidade Civil, 8ª ed., Editora Atlas S/A, 2009, p. 93), ao tratar do arbitramento do dano moral, assim se manifestou:Creio, também, que este é outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade. A razoabilidade é o critério que permite cotejar meios e fins, causas e consequências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes. Por outro lado, não há critérios absolutos para a fixação da indenização por dano moral, devendo a indenização ser fixada de maneira comedida, de modo que não represente enriquecimento sem causa por parte da vítima, ao passo que não pode ser ínfima ao ponto de não representar uma repreensão ao causador do dano.Ressalta-se que o caráter punitivo do dano moral é medida de castigo e desestimulante ao ofensor. Assim, o valor da indenização deve ser proporcional a lesão, ou seja, verifica-se a intensidade da lesão para mais ou menos, para a fixação do quantum indenizatório.Destarte, vários fatores devem ser levados em consideração, como a capacidade econômica das partes e a repercussão do ato ilícito em análise. Assim, nessa ordem, entendo como justa no presente caso a fixação da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser suportado pelo réu.Por fim, cabe ao réu, por meio de ação regressiva contra os beneficiários das transferências via PIX, reaver os valores concedidos ao autor por meio do empréstimo fraudulento.Sem necessidade de maiores debates que delongam a resolução da lide, entendo pela procedência dos pedidos feitos na inicial. III - DISPOSITIVOAnte o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de Declaração de Nulidade Contratual C/C Repetição de Indébito e Danos Morais apresentado por Jaime Soares Pereira em desfavor de Banco Agibank S/A, para: a) declarar a nulidade contratual e a inexistência de débitos provenientes da Cédula de Crédito Bancário - Empréstimo Consignado n° 1512835796;b) condenar o réu na devolução das quantias indevidamente descontadas na aposentadoria da parte autora, em dobro, acrescido de correção monetária pelo IPCA e juros legais (Taxa Selic - IPCA) a contar do desconto de cada parcela, até o efetivo pagamento.c) condenar o réu, ainda, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros legais e correção monetária pelo IPCA, a contar desta data e até efetivo pagamentoConfirmo a tutela antecipada de urgência concedida nos autos.Por fim, condeno o réu ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2°, do CPC.O pedido de cumprimento da sentença deverá observar o art. 523, da Lei nº 13105/15 (CPC), devendo ser postulado no prazo de até 30 (trinta) dias após o trânsito em julgado da sentença, com aplicação do inciso III, do art. 485, do CPC, ante a ausência de regulamentação específica, sob pena de arquivamento dos autos.Caso ocorra a interposição de recurso de apelação, deverá a Escrivania proceder a intimação da parte recorrida para apresentar as contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias (art. 1.010, § 1°, do CPC).Caso seja interposta Apelação Adesiva, intime-se a parte apelante para apresentar as contrarrazões (art. 1.010, § 2°, do CPC).Cumpridas as formalidades previstas nos §§ 1° e 2°, do art. 1.010, do CPC, o que deverá ser certificado, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça, independente de nova conclusão (art. 1.010, § 3°, do CPC).Publicada e Registrada no Sistema PJD, com a intimação das partes. Anápolis/GO, data registrada no sistema. PEDRO PAULO DE OLIVEIRAJuiz de Direito     E3
  3. 01/07/2025 - Documento obtido via DJEN
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