Lenice Soares Da Silva x Banco Agibank S.A

Número do Processo: 7004550-35.2025.8.22.0007

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRO
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Cacoal - 1ª Vara Cível
Última atualização encontrada em 30 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 30/06/2025 - Intimação
    Órgão: Cacoal - 1ª Vara Cível | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Cacoal - 1ª Vara Cível Avenida Cuiabá, nº 2025, Bairro Centro, CEP 76963-731, Cacoal, - de 1727 a 2065 Processo: 7004550-35.2025.8.22.0007 Classe: Procedimento Comum Cível AUTOR: LENICE SOARES DA SILVA ADVOGADO DO AUTOR: JHONNY RICARDO TIEM, OAB nº MT27235A REU: BANCO AGIBANK S.A ADVOGADO DO REU: DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA, OAB nº RO7828 SENTENÇA A parte autora ajuizou ação declaratória de inexistência de débito c/c reparação de danos materiais e morais em face da parte ré, ambas acima nominadas, aduzindo que desconhece a realização de qualquer contratação com a ré e que foi surpreendida ao constatar os descontos em seu benefício previdenciário. Por isso, requer seja a ré compelida a não realizar descontos em sua conta, repetir em dobro os valores descontados e pagar indenização pelos danos morais suportados. Juntou documentos. Invertido o ônus probatório, foi a ré citada, arguindo preliminarmente existência de ações idênticas promovidas pelo patrono da parte autora e prática de litigância predatória, assim como ausência de interesse de agir, ainda, apresentou impugnação a gratuidade judiciária conferida à autora, bem como argumentou inexistir representação válida no feito. No mérito, alegou a existência de contratação realizada de forma eletrônica/digital e a inexistência de dever de devolução em dobro dos valores descontados do benefício da autora, bem como a inocorrência de danos morais. Requereu a improcedência da ação. A parte autora impugnou o documento contratual apresentado pela ré, alegando insuficiência de comprovação de contratação e de assinatura idônea, repisando os termos da exordial, aduzindo que inexiste termo de contratação. Intimadas a especificarem as provas que pretendem produzir, as partes pugnaram pelo julgamento antecipado da lide. Eis o relato. DECIDO. As partes são legítimas e encontram-se regularmente representadas. Presentes as condições de desenvolvimento válido e regular do processo. Das preliminares Levanta a parte ré, a existência de múltiplas ações idênticas distribuídas pelo patrono da parte autora e prática de litigância predatória, motivo este passível de extinção processual com aplicação de multa por litigância de má-fé. No entanto, não merece razão tais argumentos. Observa-se que a ré levanta estes argumentos sem contudo apresentar quaisquer comprovações, tendo-se claro que não há demais ações em trâmite com os mesmos pedidos e causa de pedir, portanto, descabido o reconhecimento das teses aduzidas em contestação referente a aplicação de multa pela prática de desvio ético e/ou de litigância predatória. Neste contexto, REJEITO as preliminares arguidas. A ré apresenta preliminar de ausência de interesse de agir por parte da autora diante da inexistência de pretensão resistida. O interesse processual está assentado na adequação, necessidade e utilidade do processo, não sendo necessário a parte lesada comprovar o prévio requerimento administrativo para configurar seu interesse processual. Compreendendo então, que a ausência de prévia procura pela solução extrajudicial de resolução de conflitos não caracteriza falta de interesse processual, sob pena de ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, art. 5.º, XXXV, da Constituição Federal. Deste modo, REJEITO a preliminar supra. Ainda, impugnou a ré, a benesse da gratuidade judiciária conferida à autora. A impugnação à concessão da assistência judiciária gratuita deve vir acompanhada de elementos probatórios que demonstrem a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos para a concessão do referido benefício assistencial. Ausentes provas que contrariem a condição de necessitado, deve ser mantido o benefício assistencial deferido no limiar da demanda. Assim, REJEITO a preliminar arguida. Por fim, levantou a ré preliminarmente, ausência de representação válida no processo, argumentando que a parte autora se fez representar nos autos por meio da sociedade de advogado, o que não seria previsto na legislação. A procuração juntada em ID 118991427 encontra-se em plena consonância com o entendimento positivado no art. 105 do Código De Processo Civil, inexistindo qualquer defeito ou nulidade, tendo cumprido a parte autora com os requisitos necessários à sua correta representação processual. Portanto, REJEITO a preliminar arguida. Não havendo mais preliminares ou questões processuais pendentes, bem como inexistente o pedido de produção de outras provas, passo a analisar o mérito. Do mérito Alegando a parte autora fato negativo, de que não havia contratado nenhum produto/serviço apto a ensejar os descontos das mensalidades de seu benefício previdenciário e tratando-se de relação consumerista, incumbe à parte ré provar a exigibilidade dos débitos. Embora assevere na peça contestatória a improcedência dos pedidos autorais, a parte ré não obteve êxito na comprovação da existência de relação jurídica entre as partes. Defende a ré a regularidade da contratação, apresentando nos autos contrato de adesão que alega ter sido assinado eletronicamente pela parte autora. No entanto, o contrato apresentado não permite verificar a existência e regularidade da aludida assinatura da parte autora, não se desincumbindo a ré de seu ônus probatório, nos termos do art. 373, II, do CPC. O contrato eletrônico, embora cercado de particularidades, deve seguir as mesmas regras dos contratos em geral para sua validade, ou seja, não pode dispensar formalidades básicas, entre elas a assinatura, a qual pode se dar de forma eletrônica ou digital, por meios que possibilitem verificar sua autenticidade e a integridade do documento, conforme art. 4º, II, da Lei nº 14.063/20. No caso dos autos, a assinatura eletrônica foi impugnada pela parte autora, cabendo à instituição financeira o ônus de comprovar a autenticidade da assinatura, conforme Tema 1.061 do STJ, ônus do qual não se desincumbiu. Destarte, incontroverso o fato de que a parte autora não realizou nenhuma contratação com a requerida, devendo esta ser responsabilizada pelos danos causados. O nexo de causalidade entre os danos alegados pela parte autora e a conduta da ré estão devidamente comprovados, especialmente diante da apresentação do extrato previdenciário colacionado com a exordial. Desta forma, logrou êxito a parte autora em comprovar a existência de nexo causal e o ato ilícito da ré, pois responsável pelo desconto de valores sem amparo legal. Assim,evidente a sua conduta culposa, devendo ser responsabilizada pelos danos causados. Conforme dispõe o art. 186 do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. O art. 927, ao tratar da responsabilidade civil, dispõe que “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.” A legislação consumerista, por sua vez, assenta a responsabilidade objetiva do prestador de serviços pelos danos causados pelo simples fato do serviço, nos seguintes termos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Destarte, deve-se observar na espécie o contido no artigo 14, do CDC, que consagra a teoria da responsabilidade objetiva do fornecedor nas relações de consumo, respondendo o fornecedor de serviços, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, de modo que a parte ré somente se exime do dever de indenizar se comprovar a inexistência de defeito na prestação do serviço ou a presença de excludente do nexo causal, o que, conforme fundamentação supra, não ocorreu. Portanto, não demonstrando a ré que estava no exercício regular de seu direito ao exigir as prestações da parte autora e deixando de provar o fato extintivo do direito para o qual o autor busca tutela, deve indenizar a autora pelos danos sofridos. Desta forma, a ré não demonstrou a existência de qualquer elemento capaz de elidir sua parcela de culpa, devendo responder em razão da sua negligência, nos termos do artigo 927 do Código Civil. Da repetição do indébito Não houve impugnação aos valores apresentados com a exordial, presumindo-se verdadeiros nos termos do art. 341 do CPC. A repetição do indébito na modalidade dobrada é tratada nos seguintes termos pelo Código Civil e pelo Código de Defesa do Consumidor: CC - Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição. CDC - Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Como se nota, o Código Civil pune a propositura de ação judicial para cobrança de valor que o devedor já pagou ou superior ao crédito, ao passo que o Código de Defesa do Consumidor exige como requisito da repetição o pagamento do excesso. Ainda, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia firmou-se no sentido de que, para repetição dobrada do indébito, é necessária também prova do dolo ou da má-fé do credor (e.g. TJRO - Apelação 10087489320068220005, Rel. Juiz Osny Claro de O. Junior, J. 09/11/2010; e STJ - AgRg no REsp 1190608/PB, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, julgado em 18/10/2011, DJe 26/10/2011). A parte ré não apresentou nenhuma justificativa para a inclusão do débito em face da parte autora, tampouco demonstrou que tenha cientificado a parte autora quanto a sua suposta associação. Nesse cenário, há que se concluir pelo dolo da parte ré em obter vantagem econômica mediante a cobrança de prestação sem amparo legal ou nenhuma justificativa plausível e, portanto indevido, ensejando assim a repetição dobrada do indébito. Portanto, os valores a serem ressarcidos à parte autora, devem ser em dobro e corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora desde o desconto indevido. Do dano moral Quanto ao pedido de indenização por danos morais, para a apuração da existência de dano moral indenizável, cumpre aferir se da situação fática constante dos autos houve a configuração de danos morais ao autor. Com efeito, a parte autora percebe benefício previdenciário de baixo valor, que constitui sua verba alimentar, e sofreu desconto em sua renda. O desconto indevido de verba alimentar certamente configura situação que transborda os meros aborrecimentos cotidianos. Frise-se que a parte autora percebia benefícios no valor próximo de um salário-mínimo, portanto, o desconto de sua renda prejudica sobremaneira o seu sustento e o seu direito a uma vida digna. Destarte, o desconto indevido realizado acarreta abalo emocional e constrangimento de ordem pessoal, sendo devida a indenização por dano moral. Estes fatos certamente repercutem na esfera psicológica da parte, que se sente impotente diante da infringência de seus direitos pela ré. Além do prisma compensatório, a indenização por danos morais possui caráter pedagógico, a fim de inibir a parte ré de reiterar na adoção de condutas como as objeto dos autos, em evidente afronta aos direitos dos contratantes. Negar a condenação à indenização por danos morais, limitando-se a compelir a parte a fazer o que determina a lei, implica estímulo à parte ré em continuar descumprindo os princípios contratuais e as normas legais, uma vez que seria mais vantajoso assim agir. Assim, plenamente configurado o dano moral. A par das peculiaridades alhures narradas, revelando a gravidade do dano moral, a fixação do valor da indenização deve dar-se por arbitramento e operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, à capacidade econômica das partes, atentando-se à situação econômica atual, e às peculiaridades de cada caso. Repiso, deve ter-se, também, como parâmetro, o caráter inibitório do valor dos danos morais, homenageando a teoria do desestímulo. Observando os critérios acima esposados, razoável fixar o valor a ser pago a título de danos morais em R$5.000,00. Ressalte-se que a condenação em danos morais em valor inferior ao pleiteado não importa em sucumbência recíproca. Dispositivo Posto isso, com fundamento no artigo 14 do CDC, artigos 186 e 927 do Código Civil e artigos 341 e 373 do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: A) DECLARAR a inexistência de negócio jurídico que justifique os descontos indicados na exordial; B) CONDENAR a ré a restituir à parte autora, em dobro, os valores descontados, corrigidos monetariamente e acrescido de juros de mora a partir do desembolso/desconto; C) CONDENAR a parte ré a pagar à parte autora, a título de indenização por danos morais, o valor atual de R$5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos e com juros a partir desta data; D) ESTABELECER que a correção monetária e os juros de mora deverão observar as prescrições dos artigos 389, parágrafo único e 406, § 1º do Código Civil. E) CONDENAR a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios ao causídico da parte autora que fixo em 10% sobre o valor da condenação, com espeque no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil. F) EXTINGUIR o feito com julgamento do mérito, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil. Publicação e registro via PJE. Intimação das partes com advogado constituído via DJEN. À CPE: Em caso de recurso, desnecessária conclusão. Intime-se para contrarrazões no prazo de 15 dias e, após, remetam-se os autos ao segundo grau. Após o trânsito em julgado, evolua-se a classe e notifique-se a parte vencida para, no prazo de 15 dias, comprovar o recolhimento das custas processuais finais (§1º do art. 35 do Regimento de Custas). Decorrido in albis o prazo supra, expeça-se certidão do débito, encaminhando-a ao Tabelionato de Protesto de Títulos, acompanhada da presente sentença (§2º do art. 35, Lei 3.896/2016), consignando as informações do §3º do art. 35 e do art. 36 do Regimento de Custas. Requerido em qualquer tempo, mediante comprovação de pagamento, emissão da declaração de anuência (art. 38 do Regimento de Custas), fica desde já deferido, independentemente de conclusão. Informado o pagamento das custas ou inscrito o valor em dívida ativa e ausentes outros requerimentos, arquivem-se. Cacoal, 27 de junho de 2025 Emy Karla Yamamoto Roque Juíza de Direito