Carlos Anunciacao Santos e outros x Juliano Martins Mansur e outros
Número do Processo:
8174102-75.2022.8.05.0001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJBA
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
9ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
Última atualização encontrada em
21 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
As atualizações mais recentes estão bloqueadas.
Assine para desbloquear as últimas atualizações deste processo. -
27/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 9ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 9ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8174102-75.2022.8.05.0001 Órgão Julgador: 9ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR AUTOR: CARLOS ANUNCIACAO SANTOS Advogado(s): EDUARDO RODRIGUES DE SOUZA (OAB:BA21441) REU: SABEMI SEGURADORA SA Advogado(s): JULIANO MARTINS MANSUR (OAB:RJ113786) SENTENÇA Vistos, etc… CARLOS ANUNCIACAO SANTOS, devidamente qualificado, ajuizou a presente Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Materiais e Morais contra SABEMI SEGURADORA SA, também qualificada, alegando ter sofrido com descontos indevidos na quantia inicial de R$ 50,00 (cinquenta reais), debitados desde fevereiro de 2019, decorrentes de seguro não contratado. Requereu a antecipação da tutela para que a parte acionada proceda a suspensão imediata dos descontos, sob pena de multa correspondente ao valor da cobrança indevida. No mérito, pleiteia a declaração de nulidade do contrato de seguro, bem como a reparação por danos materiais e morais. Gratuidade da justiça deferida, bem como a concessão da antecipação da tutela (Id n° 350502162). Intimada, a parte autora procedeu ao depósito judicial no valor de R$ 5.460,01 (cinco mil quatrocentos e sessenta reais e um centavo), em razão dos rendimentos do depósito em conta judicial do primeiro processo (Id n° 403704407). A parte ré apresentou contestação e documentos (Id n° 360636532 e seguintes). No mérito, sustenta a legalidade dos contratos celebrados e que a cobrança faz parte do exercício regular do direito. Pugna pela improcedência do pedido. Apresentada a réplica (Id n° 378694354). Intimadas para especificar as provas que pretendiam produzir, a parte autora requereu a produção de perícia grafotécnica (Id n° 378694354). Invertido o ônus da prova (Id n° 444463731), parte ré não se manifestou (Id n° 458479595). Sem mais provas a produzir, vieram os autos conclusos para julgamento. É O RELATÓRIO. DECIDO. Pretende a parte autora obter provimento jurisdicional declarando a inexistência da relação jurídica, bem como indenização pelos danos morais e materiais sofridos, ao sustentar que o contrato seguro fora firmado fraudulentamente através do uso da sua assinatura. Diante do exposto, deve-se partir ao exame das provas trazidas aos autos. No caso em comento, a responsabilidade do fornecedor é objetiva, já que o fato de terceiro só rompe o nexo causal se o fortuito for externo, isto é, não decorrer de atividade normalmente desenvolvida pelo fornecedor. Ocorre que a perpetração de fraudes constitui risco inerente ao exercício da atividade comercial e de prestação de serviços, a evidenciar típica hipótese de fortuito interno, a qual não se revela suficiente, por si só, para afastar o nexo causal e, consequentemente, o dever de indenizar. Saliente-se que, sendo caso de responsabilidade objetiva, a acionada só dela se eximiria se comprovasse que prestara o serviço corretamente, sendo-lhe exigível a prova da excludente de que cuida a Lei 8.078 de 1990, ou que o defeito adviera por culpa do consumidor. Ademais, em se tratando de ação declaratória de inexistência de débito, a jurisprudência pátria tem se manifestado no sentido de que o ônus da prova da existência da relação contratual é do credor. Isso porque não se pode exigir do devedor a comprovação de que não possui a dívida impugnada perante o credor, tendo em vista que se trata de demonstração de fato negativo, configurando-se a denominada prova diabólica. Nesses casos, aplica-se a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, em que o ônus da prova é distribuído para quem puder suportá-lo, tendo como fundamento o princípio da igualdade, invertendo-se, desta forma, a teoria estática. Verifica-se que a parte autora impugnou a legitimidade do contrato de seguro de acidentes pessoais acostado pela ré, principalmente no que diz respeito à autenticidade de sua assinatura (Id n° 360636533). Mesmo com a inversão do ônus da prova em favor da parte autora, nos termos do art. 6°, VIII, do CDC, ausente requerimento expresso da parte ré para atestar a veracidade do documento. Nesses termos, o STJ, no Tema 106, estabelece que "Na hipótese em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a esta o ônus de provar a autenticidade". Dessa forma, a acionada não se desincumbiu do seu ônus probatório nos termos do teor dos art. 428, I e 429, II, ambos do CPC, logo, não é possível admitir que o contrato número 5936204, objeto da controvérsia, seja válido. Ressalte-se que não há aceitação tácita decorrente do lapso temporal entre a data de celebração do contrato e da distribuição da ação, quando, em verdade, se trata de vício na aceitação do consumidor. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DESCONTOS ALEGADAMENTE INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM RAZÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO SUPOSTAMENTE NÃO CONTRATADO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA, COM FUNDAMENTO NO INSTITUTO DA SUPRESSIO, EM VISTA DA OMISSÃO DA CONSUMIDORA PELO PERÍODO DE 26 MESES ATÉ A APRESENTAÇÃO DE QUALQUER INSURGÊNCIA CONTRA OS DESCONTOS EFETIVADOS MENSALMENTE . APELO DA PARTE AUTORA. AVENTADA A INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DA SUPRESSIO AO CASO EM TELA. PROCEDÊNCIA. CONSTITUI PRÁTICA ABUSIVA O FORNECIMENTO DE QUALQUER PRODUTO OU SERVIÇO - INCLUSIVE DE NATUREZA BANCÁRIA - SEM SOLICITAÇÃO PRÉVIA E AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DO CONSUMIDOR . EXEGESE DO ARTIGO 39, III E VI, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SENTENÇA CASSADA. "[...] em se tratando de práticas abusivas vedadas pelo código consumerista, não pode ser atribuído ao silêncio do consumidor (em um dado decurso de tempo) o mesmo efeito jurídico previsto no artigo 111 do Código Civil (anuência/aceitação tácita), tendo em vista a exigência legal de declaração de vontade expressa para a prestação de serviços ou aquisição de produtos no mercado de consumo, ressalvada tão somente a hipótese de 'prática habitual' entre as partes"(STJ. REsp n. 1.326 .592/GO, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/5/2019, DJe de 6/8/2019). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. (TJ-SC - Apelação: 5005341-13 .2023.8.24.0020, Relator.: André Carvalho, Data de Julgamento: 14/11/2023, Terceira Câmara de Direito Civil) A participação do réu no evento danoso acabou demonstrada na medida em que concorreu para a indevida utilização dos dados da parte autora na formalização do negócio jurídico questionado ao não constatar a fraude ou não aceitar de pronto a versão do consumidor. Ademais, ao réu incumbia garantir a segurança dos serviços prestados e, havendo imputação de defeito no serviço, provar fato caracterizador de qualquer das excludentes de responsabilidade objetiva previstas no CDC. No entanto, desse ônus probatório não se desincumbiu. No caso sob testilha, não se descarta que a fraude tenha origem por iniciativa de terceiros. No entanto, a participação de terceiros para a ocorrência dos danos suportados pela parte autora não exclui a participação da ré no ocorrido, quando a dinâmica do procedimento interno foi criada pela instituição, visando justamente combater tais acontecimentos. Assim, deve à parte ré ser imputada a responsabilidade pela má prestação de serviço. No caso em apreço o consumidor viu-se obrigada a percorrer um longo caminho para esclarecer os fatos, não atendida pelo réu de maneira satisfatória, resultando em constrangimento de ver seu nome vinculado ao contrato, mesmo após tentar buscar administrativamente solucionar emblema com o réu, esclarecendo que sequer houve celebração do negócio jurídico, além de descontados indevidamente da sua aposentadoria valores de seguro não contratado. Não se pode admitir em face do consumidor, mormente os hipervulneráveis, conduta violadora da boa-fé objetiva. A contratação na forma como ocorreu deixou patente método de captação de clientes que não pode ser aceito, uma vez que afetou diretamente a verba alimentar da parte autora, indispensável à sua sobrevivência. É devida, portanto, a devolução dos valores cobrados indevidamente ao autor a título de reparação por danos materiais. Desse modo, depreende-se do conjunto probatório posto nos autos, razão assiste à parte autora merecendo prevalecer a versão autoral dos fatos, impondo-se a declaração de inexistência da relação jurídica, rejeitando-se a formalização do contrato de seguro sob nº 360636533, que ensejou a imputação do contrato de prestação de serviço, devendo ser restabelecida a situação ao estado anterior com a devolução dos valores indevidamente descontados de maneira atualizada. A restituição de tais quantias ao autor deverá ser feita de forma simples, tendo em vista que não há elementos que levem à conclusão de que a ré tenha agido de má-fé. Ademais, impõe-se a imediata suspensão dos descontos em conta corrente do acionante, se ainda persistirem, com a devolução do valor atualizado, compensando-se o montante recebido pelo autor, ambos atualizados a ser apurado em liquidação de sentença. Quanto ao alegado dano moral sofrido, restou configurada a falha na prestação do serviço pela ré na medida em que não se valeu de meios próprios de proteção ao consumidor permitindo que fosse perfectibilizado dos descontos em nome do autor sem a sua autorização, causando-lhe constrangimentos e prejuízos indenizáveis. Fixada a responsabilidade do acionado pelos danos morais, resta determinar o quantum indenizatório. Não havendo parâmetros legais objetivos para fixar a indenização de reparação do dano moral, deverá esta ser arbitrada prudentemente de modo a compensar os danos sofridos, mas "nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva", conforme recomenda Caio Mário da Silva Pereira, procurando, ainda, desestimular novas práticas negligentes que possam resultar na oferta de serviços defeituosos pela parte ré. "A indenização por dano moral é arbitrável mediante estimativa prudencial que leve em conta a necessidade de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual e novo atentado, o autor da ofensa" (TJSP - 2ª C. - Ap. - Rel. Cezar Peluso - RJTJESP 156/94). Quando se cuida de dano moral, o fulcro do conceito ressarcitório acha-se deslocado para a convergência de duas forças: "caráter punitivo" para que o causador do dano, pelo fato da condenação, se veja castigado pela ofensa que praticou; e o "caráter compensatório" para a vítima que receberá uma soma que lhe proporcione alento como contrapartida do mal sofrido. Diante dos fatos relatados, das provas carreadas aos autos, da extensão do dano, da condição social das partes e da repercussão financeira que a condenação deve gerar no patrimônio da parte ré e da parte autora, plenamente satisfatório a fixação da reparação pelo dano moral praticado no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a ser paga pela ré. Posto isto, julgo PROCEDENTE, em parte, o pedido, extinguindo o feito com resolução de mérito com fulcro no art. 487, I, do CPC, para: a) determinar que a parte ré cesse os descontos mensais na conta corrente da parte autora, sob pena de aplicação de multa mensal no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais); b) condenar a parte ré ao pagamento do valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a título de indenização pelos danos morais causados à parte autora devidamente atualizado e corrigido monetariamente pelo IPCA, bem como incidência de juros moratórios nos termos do parágrafo 1º do art. 406 do Código Civil, ambos a partir da presente decisão até o pagamento efetivo; c) condenar a parte ré a restituir ao autor, de forma simples, os valores indevidamente descontados em seu benefício previdenciário em decorrência da contratação inexigível, ambas as importâncias corrigidas pelo IPCA desde o desembolso e com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação e desde o termo previsto na Lei 14.905/24 na forma do parágrafo 1º do art. 406 do Código Civil, respeitada a prescrição trienal, a ser apurado em liquidação de sentença. Por ter decaído de maior parte do pedido, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação nos termos do art. 85 do CPC. P. R. I. Salvador, 20 de maio de 2025 Gustavo Miranda Araújo Juiz de Direito
-
27/05/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)