1. Maiclerson Gomes Da Silva (Impetrante) x 2. Tribunal De Justiça Do Estado De São Paulo (Impetrado)
ID: 339484831
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: HABEAS CORPUS
Nº Processo: 0176241-92.2025.3.00.0000
Data de Disponibilização:
31/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
MAICLERSON GOMES DA SILVA
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
HC 1004181/SP (2025/0176241-1)
RELATOR
:
MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
IMPETRANTE
:
MAICLERSON GOMES DA SILVA
ADVOGADO
:
MAICLERSON GOMES DA SILVA - SP386394
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO …
HC 1004181/SP (2025/0176241-1)
RELATOR
:
MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
IMPETRANTE
:
MAICLERSON GOMES DA SILVA
ADVOGADO
:
MAICLERSON GOMES DA SILVA - SP386394
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE
:
TALES RAFAEL PEREIRA VALUTA
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de TALES RAFAEL PEREIRA VALUTA contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento da Apelação n. 1500751-02.2020.8.26.0457.
Consta dos autos que o paciente foi condenado à pena de 11 anos e 8 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 26 dias-multa, pela prática do crime tipificado no artigo 157, §2º, incisos II e V, e §2º-A, todos do Código Penal (e-STJ fls. 662/669).
Contra essa decisão, a defesa interpôs recurso de apelação, "alegando ter ocorrido condenação ultra petita, ante a não capitulação na denúncia do artigo 157, §2º, inciso V, do Código Penal. Afirma ter ocorrido violação ao artigo 226 do Código de Processo Penal. No mérito busca absolvição por falta de provas. Subsidiariamente requer fixação da pena no piso, substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou fixação do regime aberto" (e-STJ fl. 9).
Contudo, em sessão de julgamento realizada no dia 31/1/2024, a 7ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, à unanimidade, negou provimento ao recurso, em acórdão assim ementado (e-STJ fl. 8):
RECONHECIMENTO - validade reconhecimento fotográfico categórico em delegacia confirmação em sede judicial reconhecimento válido rejeitada a preliminar. ROUBO materialidade boletim de ocorrência, auto de apreensão, relatório de investigação e prova oral subtração de bem mediante grave ameaça. ROUBO autoria negativa do réu que não convence vítima que relatam a dinâmica do roubo depoimento dos policiais validade ausente qualquer prova de falsidade no quanto alegam testemunha que relata o encontro com o acusado, pegando com ele o bem para transporte. CONSUMAÇÃO roubo na forma consumada bens das vítimas retirados de suas posses mansa e pacífica. CONCURSO DE AGENTES demonstrado três agentes associados na prática criminosa com funções definidas majorante presente. EMPREGO DE ARMA DE FOGO demonstração prova oral presente a majorante. RESTRIÇÃO DA LIBERDADE DA VÍTIMA vítimas que permaneceram mais de duas horas com as liberdades restringidas ausente pedido ultra petita fatos narrados na denúncia. DOSIMETRIA primeira fase alta reprovabilidade 06 vítimas no crime exasperação em 1/6 segunda fase ausentes agravantes ou atenuantes pena mantida terceira fase causas de aumento do concurso de agentes, restrição a liberdade das vítimas e emprego de arma de fogo aumentos cumulados. REGIME fechado alta reprovabilidade concurso de agentes, restrição a liberdade das vítimas e emprego de arma de fogo quantum da pena. SUBSTITUIÇÃO E SURSIS não cabimento quantum da pena e crime cometido com grave ameaça NEGADO PROVIMENTO.
No presente habeas corpus, a defesa, em síntese, renova a tese de nulidade do reconhecimento fotográfico e sustenta teses referentes à dosimetria da pena, quais sejam: fixação da pena-base no mínimo; afastamento da causa de aumento da arma de fogo pela ausência de perícia; aplicação de fração única ou, ao menos, a limitação do incremento devido ao cúmulo das majorantes no patamar de 2/3, afastamento da causa de aumento da restrição da liberdade da vítima, pois não descrita na denúncia.
Ao final, pugna, liminarmente, pela suspensão da pena definitiva, até o julgamento definitivo deste habeas corpus. No mérito, requer seja concedida a ordem para (e-STJ fl. 6):
1.1. Excluir a causa de aumento prevista no art. 157, § redimensionando a pena;
1.2. Subsidiariamente, limitar a fração de aumento das majorantes a 2/3(dois terços) no total;
1.3. Reconhecer a nulidade do reconhecimento fotográfico, com anulação do feito desde o ato viciado ou, caso mantida a condenação, determinar novo cálculo à vista das teses supra;
1.4. Afastar o aumento relativo à restrição de liberdade, por violação ao contraditório;
1.5. Ajustar o regime prisional conforme o novo quantum de pena, expedindo competente alvará de soltura se ultimada a pena-base em patamar que autorize regime diverso do fechado.
A liminar foi indeferida (e-STJ fls. 865/867). Prestadas as informações (e-STJ fls. 870/908), o Ministério Público Federal se manifestou nos seguintes termos (e-STJ fls. 912/920):
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE REVISÃO CRIMINAL. NÃO CONHECIMENTO. ROUBO MAJORADO. ALEGADA NULIDADE DO RECONHECIMENTO DO PACIENTE. DOSIMETRIA. PRETENDIDA ALTERAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO. MANEJO TARDIO DO WRIT. PRECLUSÃO. PETIÇÃO INICIAL. INCONSISTÊNCIAS. INDICAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIAS INEXISTENTES OU SEM CORRESPONDÊNCIA COM AS TESES VENTILADAS. TENTATIVA DE INDUZIR ESSA CORTE SUPERIOR A ERRO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FE. NÃO CONHECIMENTO.
Parecer pelo não conhecimento do habeas corpus.
É o relatório. Decido.
Em razão da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça passou a acompanhar a orientação do Supremo Tribunal Federal, no sentido de não ser admissível o emprego do writ como sucedâneo de recurso ou revisão criminal, a fim de não se desvirtuar a finalidade dessa garantia constitucional, preservando, assim, sua utilidade e eficácia, e garantindo a celeridade que o seu julgamento requer. Referido entendimento foi ratificado pela Terceira Seção, em 10/6/2020, no julgamento da Questão de Ordem no Habeas Corpus n. 535.063/SP.
Nessa linha de intelecção, como forma de racionalizar o emprego do writ e prestigiar o sistema recursal, não se admite a sua impetração em substituição ao recurso próprio. Todavia, em homenagem ao princípio da ampla defesa, tem se admitido o exame da insurgência, para verificar a existência de eventual constrangimento ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.
Busca a defesa, no presente writ, a) nulidade do reconhecimento fotográfico; b) refazimento da dosimetria da pena para b.1) fixar a pena-base no mínimo legal; b.2) excluir a causa de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º-A, I, do CP; b.3) limitar a fração de aumento das causas de aumento de pena a 2/3 no total; b.4) afastar a causa de aumento de pena relativa à restrição de liberdade da vítima; b.5) ajustar o regime prisional, em consonância com a nova pena fixada.
A jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que o acusado não pode ser condenado com base apenas em eventual reconhecimento falho, ou seja, sem o cumprimento das formalidades legais, as quais constituem, em verdade, garantia mínima para quem se encontra na condição de suspeito da prática de um delito.
No entanto, é possível que o julgador, destinatário das provas, convença-se da autoria delitiva a partir de outras provas que não guardem relação de causa e efeito com o ato do reconhecimento falho, porquanto, sem prejuízo da nova orientação, não se pode olvidar que vigora no nosso sistema probatório o princípio do livre convencimento motivado.
Assim, "diante da existência de outros elementos de prova, acerca da autoria do delito, não é possível declarar a ilicitude de todo o conjunto probatório, devendo o magistrado de origem analisar o nexo de causalidade e eventual existência de fonte independente, nos termos do art. 157, § 1º, do Código de Processo Penal" (HC 588.135/SP, Relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 8/9/2020, DJe de 14/9/2020).
Com efeito, o Magistrado não está comprometido com qualquer critério de valoração prévia da prova, mas livre na formação do seu convencimento e na adoção daquele que lhe parecer mais convincente. Assim, permite-se que elementos informativos de investigação e indícios suficientes sirvam de fundamento ao juízo, desde que existam, também, provas produzidas judicialmente. Ou seja, para se concluir sobre a veracidade ou falsidade de um fato, o juiz penal pode se servir tanto de elementos de prova – produzidos em contraditório – como de informações trazidas pela investigação.
Para a melhor compreensão dos fatos, transcreve-se da denúncia (e-STJ fls. 532/534):
[...].
Segundo o apurado, nas circunstâncias de tempo mencionadas, as vítimas estavam reunidas na residência de José Augusto e Pamela, situada no local dos fatos, onde o primeiro ofendido trabalha como tratorista. Em dado momento, dois indivíduos adentraram na casa pelos fundos e subjugaram José Augusto, Pamela, Paulo Roberto, Juliana e Jenifer com o emprego de armas de fogo (um revólver e uma pistola), anunciando o roubo.
Após render o grupo, os roubadores trancaram os ofendidos no interior da casa e, na companhia do terceiro elemento, iniciaram as manobras para a subtração do trator e da bomba hidráulica.
A certa altura, as vítimas divisaram pela janela da sala a chegada de um caminhão guincho ao sítio, e foram orientadas pelos roubadores que, caso fossem questionadas sobre a carga pelo motorista do referido caminhão, deveriam confirmar que tudo estava bem, porquanto o indicado motorista não sabia sobre o roubo.
O trator e a bomba foram embarcados no guincho e o caminhão deixou o local com os bens, seguido pelos roubadores.
A polícia militar foi acionada e interceptou o caminhão carregado com o trator e com a bomba hidráulica na altura do Km 37,5 da rodovia SP-225, no sentido Aguaí/SP.
Conquanto os roubadores tenham conseguido fugir, o motorista do caminhão que transportava os bens roubados, Nestor Yochi Yokogawa, e sua esposa que o acompanhava, Nilza Sumie Utiumi, foram abordados.
Nestor e Nilza afirmaram aos policiais que desconheciam a origem ilícita dos bens que levavam, disseram que foram contratados por um homem, por meio de ligação telefônica e aplicativo WhatsApp, para realizar o frete de Pirassununga/SP até Araraquara/SP, e que receberam a quantia de R$1.850,00 (mil oitocentos e cinquenta reais) pelo serviço.
O celular de Nestor foi apreendido e, no decorrer das investigações, constatou-se que a linha (19) 99900-4762, utilizada para a contratação do frete, estava relacionada ao denunciado TALES, conforme consignado nas fls. 492/493 do relatório final da i. autoridade policial.
TALES foi reconhecido como o indivíduo que recebeu o caminhão no Sítio São Manoel para o embarque e transporte do trator e da bomba hidráulica roubados (cf. fls. 255/258).
Na hipótese dos autos, a Corte local, ao analisar a alegação defensiva de nulidade do reconhecimento fotográfico, registrou (e-STJ fls. 9/11):
Do reconhecimento
A defesa alega nulidade ou insuficiência probatória pelo fato de o reconhecimento não ter observado o disposto no artigo 226 do Código de Processo Penal.
Tradicionalmente se entendia pela não obrigatoriedade de que outras pessoas fossem colocadas ao lado do acusado. Tratava-se de interpretação literal do artigo 226, II, do Código de Processo Penal: “a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança...”.
Contudo, em julgamento paradigma que alterou a interpretação historicamente consolidada sobre o dispositivo mencionado o Superior Tribunal de Justiça entendeu da seguinte forma:
“O reconhecimento de pessoas deve, portanto, observar o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, cujas formalidades constituem garantia mínima para quem se vê na condição de suspeito da prática de um crime, não se tratando, como se tem compreendido, de "mera recomendação" do legislador. Em verdade, a inobservância de tal procedimento enseja a nulidade da prova e, portanto, não pode servir de lastro para sua condenação”
Desta forma, o disposto no mencionado artigo havia passado a ser de observância obrigatória sob pena de se inviabilizar a condenação.
Ocorre que a exigência de obrigatoriedade do dispositivo referido desconsidera peculiaridades tanto dos mais variegados casos concretos, como de locais e contextos nos quais a presença de outros sujeitos se mostra inviável.
Atentando-se a isso o Superior Tribunal de Justiça passou a mitigar a exigência de observância do artigo 226 do Código de Processo Penal a partir de certos critérios.
Em um primeiro julgado referida Corte entendeu que se a vítima é capaz de identificar o autor do fato não se exige a instauração do procedimento do artigo 226 do Código de Processo Penal:
“Se a vítima é capaz de individualizar o autor do fato, é desnecessário instaurar o procedimento do art. 226 do CPP. Antes, esta Corte dizia que o procedimento não era vinculante; agora, evoluiu no sentido de exigir sua observância, o que não significa que a prova de autoria deverá sempre observar o procedimento do art. 226 do Código de Processo Penal.”.
Posteriormente, fez-se novo distinguishing para o julgado paradigma e se entendeu que no âmbito do reconhecimento fotográfico, ainda que não se observe o artigo 226 do Código de Processo Penal, se a vítima relatar o delito e demonstrar que não há riscos de reconhecimento ele não será invalidado.
“No caso em que o reconhecimento fotográfico na fase inquisitorial não tenha observado o procedimento legal, mas a vítima relata o delito de forma que não denota riscos de um reconhecimento falho, dá-se ensejo a distinguishing quanto ao acórdão do HC 598.886/SC, que invalida qualquer reconhecimento formal - pessoal ou fotográfico - que não siga estritamente o que determina o art. 226 do CPP” .
Cabe apontar que o reconhecimento foi realizado, sem qualquer dúvida, pelo motorista que foi contratado para transportar o trator e a bomba. Reconheceu o acusado também em juízo com absoluta certeza.
Portanto, de rigor a validade do reconhecimento realizado.
Por sua vez, consta da sentença condenatória, no ponto mantida em sede recursal, que (e-STJ fls. 666/667):
Apesar da sua negativa, o réu foi reconhecido pela testemunha Nestor, que não manifestou qualquer insegurança em afirmar que foi ele a pessoa que o atendeu na porteira da fazenda, pagou pelo serviço, colocou o trator em cima do caminhão e permaneceu com ele auxiliando a amarrar o trator na carroceria do guincho.
A testemunha Nestor reconheceu o réu tanto em solo policial, quanto em juízo, ressaltando-se que o reconhecimento havido nesta data foi de relevantíssimo valor probatório eis que o réu ficou ao lado de mais dois indivíduos, um deles de características físicas bastante semelhantes e ainda assim Nestor foi assertivo em afirmar que foi ele a pessoa com quem teve contato na data dos fatos.
Ademais, respeitada a combatividade da aguerrida defesa, embora o local dos fatos não tivesse iluminação adequada, Nestor por diversas vezes durante o seu depoimento ressaltou que o contato inicial com o réu se deu ainda à luz do dia e que, mesmo com o cair da tarde, os faróis do caminhão e do trator permaneceram acesos durante todo tempo. Ressaltou que ficou "cara a cara" com o réu e, por isso, não tem nenhuma dúvida em reconhecê-lo como o "caseiro" que o recebeu na fazenda e colocou o trator no seu caminhão.
Verifica-se que embora as instâncias ordinárias tenham efetivamente abordado o tema do reconhecimento fotográfico, não o examinaram sob o enfoque do que prevê o art. 226 do CPP, objeto da presente impugnação. Não se explicitou a forma pela qual foi feito o reconhecimento, o que inviabiliza perquirir se houve falha a viciá-lo, sob pena de indevida supressão de instância.
Ainda que assim não fosse, verifica-se que a condenação do paciente não se baseou apenas no reconhecimento fotográfico alegadamente nulo. Com efeito, a testemunha Nestor ratificou judicialmente, com firmeza, o reconhecimento do réu, esclarecendo que reconhece o acusado com "100%" de certeza que era ele. Ficou "cara a cara" com ele no momento do pagamento do serviço e não tem dúvida de que seja ele. Ainda estava claro. (e-STJ fl. 22).
Ademais, O celular de Nestor foi apreendido e, no decorrer das investigações, constatou-se que a linha (19) 99900-4762, utilizada para a contratação do frete, estava relacionada ao denunciado Tales (e-STJ fl. 12).
Ainda, aliada a toda a narrativa exposta, a versão das vítimas foi uníssona em afirmar que estavam na residência de José Augusto e Pamela, local dos fatos, quando dois indivíduos entraram armados na casa, pelos fundos, subjugaram os presentes (José Augusto, Pamela, Paulo Roberto, Juliana e Jenifer), com emprego de arma de fogo e usando máscara, e anunciaram o assalto. Uma vez rendido o grupo, pegaram os celulares e trancaram as vítimas no interior da casa (e-STJ fls. 15/17).
Nesse contexto, não obstante eventual não observância do art. 226 do Código de Processo Penal, não é possível desconsiderar as particularidades do caso concreto, em especial as seguras declarações da testemunha, tanto em sede inquisitorial quanto em juízo, além dos demais elementos probatórios válidos e autônomos colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
Nesse sentido:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DAS MAJORANTES DO USO DE ARMA DE FOGO E DO CONCURSO DE AGENTES. EXCLUSÃO DA INDENIZAÇÃO FIXADA À VÍTIMA. FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA ACERCA DESSAS MATÉRIAS NÃO ATACADOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 182 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ QUANTO A ESSES PONTOS. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. NULIDADE POR OFENSA AO ART. 226 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. NÃO VERIFICADA. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS VÁLIDOS DE PROVA QUE EMBASAM A CONDENAÇÃO. AUTORIA DELITIVA CONFIGURADA. CONCLUSÃO DIVERSA QUE DEMANDA REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
1. A impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada é requisito para o conhecimento do agravo regimental. Na hipótese, o presente recurso não merece ser conhecido em relação às pretensões de afastamento das majorantes do crime de roubo e de exclusão da indenização a título de danos morais fixada em favor da vítima, ante a incidência da Súmula n. 182 do STJ no tocante aos referidos pontos.
2. Em revisão à anterior orientação jurisprudencial, ambas as Turmas Criminais que compõem esta Corte, a partir do julgamento do HC n. 598.886/SC (Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz), realizado em 27/10/2020, passaram a dar nova interpretação ao art. 226 do CPP, segundo a qual a inobservância do procedimento descrito no mencionado dispositivo legal torna inválido o reconhecimento da pessoa suspeita e não poderá servir de lastro a eventual condenação, mesmo se confirmado em juízo.
3. Contudo, atualmente, este Tribunal vem adotando o entendimento de que, ainda que o reconhecimento do réu haja sido feito em desacordo com o modelo legal e, assim, não possa ser sopesado, nem mesmo de forma suplementar, para fundamentar a condenação do réu, certo é que se houver outras provas, independentes e suficientes o bastante, produzidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, para lastrear o decreto condenatório, não haverá nulidade a ser declarada (AgRg nos EDcl no HC n. 656845/PR, Rel. Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 28/11/2022).
4. Na hipótese em tela, embora não tenham sido observados os procedimentos dispostos no art. 226 do CPP, o conjunto probatório coletado no feito, notadamente os depoimentos da vítima e dos agentes policiais prestados em juízo, foram considerados como versões firmes e coerentes acerca dos fatos delitivos e da autoria imputada ao agravante.
5. Conforme ressaltado pela Corte a quo, previamente ao reconhecimento fotográfico feito em delegacia, foi realizada pela vítima a descrição detalhada acerca dos fatos e das características físicas dos acusados, sendo que, somente posteriormente, foram-lhe apresentadas as fotografias dos possíveis suspeitos, com lastro em sua declaração, momento em que reconheceu, de pronto, o agravante como um dos autores do delito. Ao prestar suas declarações em Juízo, a ofendida confirmou o reconhecimento fotográfico feito extrajudicialmente e narrou, de maneira firme e detalhada a empreitada criminosa, enfatizando que o ora agravante era o único que não estava encapuzado, motivo pelo qual, após a apresentação das fotografias dos suspeitos na delegacia, o reconhecimento do réu foi feito de imediato e com total segurança, em razão das "características marcantes do acusado, luzes no cabelo e nariz achatado".
6. Além disso, os policiais civis que conduziram as investigações, ao prestarem depoimento em juízo como testemunhas, foram categóricos ao afirmar que a vítima e seu filho, o qual também estava no local do crime, quando compareceram à delegacia e lhe foram apresentadas as fotos dos possíveis suspeitos, reconheceram em conjunto e de imediato a fotografia do agravante, apontando, com firmeza, a sua participação no delito. Os agente públicos salientaram, também, que o filho da ofendida, antes de realizar o reconhecimento fotográfico perante a autoridade policial, já tinha afirmado que "um dos indivíduos, se chamava 'Vitinho', que teria visto algumas vezes ele pela região, que este era o único que não estava encapuzado".
7. Desse modo, a conclusão do Tribunal de origem encontra amparo na atual jurisprudência desta Corte, no sentido de que a inobservância das formalidades previstas no art. 226 do CPP não configura necessariamente nulidade, notadamente quando o reconhecimento fotográfico for realizado com segurança pela vítima, bem como estiver a sentença condenatória amparada em outros elementos probatórios válidos e autônomos colhidos sob o crivo do contraditória e da ampla defesa, como no caso em epígrafe.
8. Para se acatar o pleito absolutório fundado na suposta ausência de provas suficientes para a condenação, seria inevitável o revolvimento fático-probatório do feito, vedado pela Súmula n. 7 deste Superior Tribunal de Justiça.
9. Agravo regimental parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido.
(AgRg no REsp n. 1.991.935/TO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 7/2/2023, DJe de 14/2/2023.)
No tocante à dosimetria da pena, a Corte de origem fundamentou (e-STJ fls. 31/33):
Da dosimetria
Em primeira fase, em razão das circunstâncias do fato, com grave ameaça exercida contra seis pessoas, três das quais mulheres, além de uma criança, enseja em maior reprovabilidade, de modo que a reprimenda foi corretamente exasperada em 1/6, fixada em 04 anos e 08 meses de reclusão e 11 dias-multa.
Em segunda fase, ausentes agravantes ou atenuantes, mantida a pena inalterada.
Em terceira fase, presentes as majorantes do concurso de agentes, restrição a liberdade da vítima e emprego de arma de fogo.
O artigo 68, parágrafo único do Código Penal repete norma existente no artigo 50, parágrafo único da Parte Geral de 1940 e estabelece que na hipótese de causas de aumento ou diminuição da Parte Especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a que mais aumente ou diminua.
Observando-se o léxico em sua forma literal pode se dizer que há aqui maior espectro de discricionariedade, já que a lei permite que o juiz escolha se aplica todos os aumentos ou apenas um, não sendo obrigatória a aplicação de todos, ao contrário do que se dá com majorantes ou causas de diminuição da Parte Geral.
O Superior Tribunal de Justiça, adotando a corrente que preza pela não obrigatoriedade da aplicação de única causa, amparado em julgados do Pretório Excelso também permite a computação das majorantes adicionais:
“A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça e a do Supremo Tribunal Federal são no sentido de que o art. 68, Parágrafo Único, do Código Penal, não exige que o juiz aplique uma única causa de aumento da parte especial do Código Penal quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha da fração imposta. - Assim, não há ilegalidade flagrante, em tese, na cumulação de causas de aumento da parte especial do Código Penal, sendo razoável a interpretação da lei no sentido de que eventual afastamento da dupla cumulação deverá ser feito apenas no caso de sobreposição do campo de aplicação ou excessividade do resultado (ARE 896.843/MT, Rel. Min. GILMAR MENDES, SEGUNDA TURMA, DJe 23/09/2015).
Apenas se obsta a aplicação de mais de uma majorante quando ensejar sobreposição do campo de aplicação (a ensejar bis in idem) ou excessividade do resultado.
Desse modo, aumentada a pena inicialmente a metade, ante as majorantes do concurso de agentes e restrição a liberdade das vítimas, fixada em 07 anos de reclusão e 16 dias-multa.
Em seguida, face o emprego de arma de fogo, aumentada a reprimenda em 2/3, fixada, em definitivo, em 11 anos e 08 meses de reclusão e 26 dias-multa.
O regime fechado impõe-se. O apelante demonstrou culpabilidade acima do normal, com alta periculosidade, praticando o delito contra 06 vítimas, sendo que o fez mediante grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, agindo em concurso de agentes, restringindo a liberdade das vítimas por tempo considerável. Demonstrou ousadia, reprovabilidade e periculosidade acima do normal, sendo o regime fechado o único adequado no caso em exame, nos termos do artigo 33, §3º, c.c. artigo 59, ambos do Código Penal.
Ademais, o regime menos gravoso, em face da maior reprovabilidade não terá o condão de desestimular a prática de novos crimes, o que por si só já autoriza o regime fechado. Finalmente, pelo quantum de pena impossível outro regime.
[...].
Ante o quantum da pena e a prática de crime com grave ameaça, inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou a suspensão condicional da pena.
Ante o exposto, rejeito a preliminar e NEGO PROVIMENTO ao recurso.
Verifica-se que o incremento da pena-base se deu com base nas circunstâncias do crime, eis que praticado contra seis vítimas, dentre as quais uma criança. Assim, não há ilegalidade a ser sanada. Nesse sentido:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO.
SUBSTITUIÇÃO DE RECURSO PRÓPRIO. INADMISSIBILIDADE. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS: INVASÃO DE DOMICÍLIO. CULPABILIDADE: VIOLÊNCIA DESMEDIDA. RESTRIÇÃO DA LIBERDADE POR TEMPO RELEVANTE. AUMENTO CUMULADO FUNDAMENTADO. Ordem não conhecida.
I. CASO EM EXAME
1. Habeas corpus impetrado como substitutivo de revisão criminal, visando à revisão da dosimetria da pena aplicada em condenação por roubo circunstanciado.
2. A pena foi fixada acima do mínimo legal devido à invasão de domicílio e violência contra as vítimas, com aumento por concurso de agentes, restrição de liberdade e uso de arma de fogo.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
3. A questão em discussão consiste em saber se é admissível o habeas corpus como substitutivo de recurso próprio e se há flagrante ilegalidade na dosimetria da pena que justifique a concessão da ordem de ofício. III. RAZÕES DE DECIDIR
4. O habeas corpus não é admitido como substitutivo de recurso próprio, conforme entendimento consolidado do STJ e STF.
5. Não foi constatada flagrante ilegalidade na dosimetria da pena que justificasse a concessão da ordem de ofício, tendo sido bem fundamentada a valoração das circunstâncias do crime, diante da invasão de domicílio, em local com três crianças, além da culpabilidade, pelo uso de coronhadas.
6. A individualização da pena foi devidamente fundamentada, considerando as circunstâncias do crime do delito, modo que adequada a consideração da restrição da liberdade, tendo as vítimas permanecido parte do tempo sob a mira de arma na sala e depois trancadas em cômodo da residência, o que perdurou para além da fuga.
7. Aumento cumulativo empregado sem flagrante ilegalidade, indicado a pluralidade de agentes, a atuação noturna, e divisão de tarefas, bem como uso de várias armas e subtração que gerou elevado prejuízo.
IV. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
(HC n. 832.387/SC, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 22/10/2024, DJe de 29/10/2024.)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. OPOSIÇÃO DE DOIS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONTRA O MESMO ACÓRDÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA E PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. NULIDADE DA DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E DE INÉPCIA DA DENÚNCIA POR VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. QUESTÕES SUPERADAS DIANTE DA SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA, CONFIRMADA EM SEGUNDO GRAU. NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. INOCORRÊNCIA. NULIDADE DA PROVA POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. FUNDADAS RAZÕES PARA O INGRESSO EM DOMICÍLIO. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. ILICITUDE DA PROVA EM RAZÃO DAS AGRESSÕES SOFRIDAS PELO PACIENTE. AUSÊNCIA DE PROVAS. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. NULIDADE DO RECONHECIMENTO PESSOAL POR INOBSERVÂNCIA AO ART. 226 DO CPP. OUTROS ELEMENTOS DE PROVA APTOS A RESPALDAR A CONDENAÇÃO. OITIVA DAS VÍTIMAS E TESTEMUNHAS SEM A PRESENÇA DO RÉU EM AUDIÊNCIA REALIZADA POR VIDEOCONFERÊNCIA. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO MOTIVADO DA PRODUÇÃO DE PROVA REQUERIDA PELA DEFESA NO CURSO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
[...].
15. As circunstâncias do crime, por sua vez, foram valoradas negativamente em razão do concurso de agentes, bem como pelo fato de o delito ter sido cometido contra uma vítima grávida e uma criança de 2 anos, que ficaram sob a mira de arma de fogo.
[...]
18. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 789.650/PR, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 4/3/2024, DJe de 6/3/2024.)
No que tange à causa de aumento de emprego de arma de fogo, a Terceira Seção deste Tribunal Superior decidiu ser desnecessária a apreensão da arma utilizada no crime e a realização de exame pericial para atestar a sua potencialidade lesiva, quando presentes outros elementos probatórios que atestem o seu efetivo emprego na prática delitiva (EREsp n. 961.863/RS, Relator Ministro CELSO LIMONGI – Desembargador Convocado do TJ/SP), Relator para acórdão Ministro GILSON DIPP, Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 6/4/2011). No mesmo sentido:
PROCESSO PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO. RECONHECIMENTO. INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 226 DO CPP. CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA EM OUTRAS PROVAS. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. AFASTAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E PERÍCIA DA ARMA. DESNECESSIDADE. RELATO SEGURO DAS VÍTIMAS. AGRAVANTE DO ART. 61, INCISO II, LETRA "H", DO CP. PRESENÇA DE CRIANÇA. LEGALIDADE. TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA. MAJORANTES DO CONCURSO DE PESSOAS E DO USO DE ARMA DE FOGO NO CRIME DE ROUBO. ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. MOTIVAÇÃO CONCRETA E IDÔNEA APRESENTADA PELO TRIBUNAL A QUO PARA A APLICAÇÃO CUMULATIVA DAS CAUSAS DE AUMENTO. CONCURSO FORMAL. PLEITO DE RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO. IMPROCEDÊNCIA. PATRIMÔNIOS DE VÍTIMAS DISTINTAS. DELITO CONSUMADO. POSSE MANSA E PACÍFICA DA RES FURTIVA. DESNECESSIDADE. RESP 1.499.050/RJ (TEMA 916) JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS. SÚMULA 582/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça, por ocasião do julgamento do HC n. 598.886/SC (Relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ), realizado em 27/10/2020, propôs nova interpretação do art. 226 do CPP, segundo a qual a inobservância do procedimento descrito no mencionado dispositivo legal torna inválido o reconhecimento da pessoa suspeita e não poderá servir de lastro a eventual condenação, mesmo se confirmado o reconhecimento em juízo. Tal entendimento foi acolhido pela Quinta Turma desta Corte, no julgamento do Habeas Corpus n. 652.284/SC, de minha relatoria, em sessão de julgamento realizada no dia 27/4/2021.
2. No presente caso, pela leitura do acórdão recorrido, verifica-se que, dos elementos probatórios que instruem o feito, a autoria delitiva do crime de roubo não tem como único elemento de prova o reconhecimento pelas vítimas, o que gera distinguishing em relação ao acórdão paradigma da alteração jurisprudencial. Verifica-se que a autoria delitiva não foi estabelecida apenas no reconhecimento do réu, mas em outras provas, como os depoimentos coesos das vítimas e das testemunhas, imagens de câmera de segurança e pelo fato do ofendido, além de mancar, como capturado nas imagens, vestir uma jaqueta utilizada, no momento do crime, por outro envolvido. Além disso, as duas vítimas reconheceram o réu em audiência, quando colocado entre dois outros homens. Dessa forma, não foi apenas o reconhecimento realizado pelas vítimas que embasou a condenação do envolvido pela prática do crime. Assim, comprovada a autoria delitiva.
3. No que tange à causa de aumento do delito de roubo prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal, a Terceira Seção deste Tribunal Superior decidiu ser desnecessária a apreensão da arma utilizada no crime e a realização de exame pericial para atestar a sua potencialidade lesiva, quando presentes outros elementos probatórios que atestem o seu efetivo emprego na prática delitiva (EREsp n. 961.863/RS, Relator Ministro CELSO LIMONGI - Desembargador Convocado do TJ/SP), Relator para acórdão Ministro GILSON DIPP, Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 6/4/2011).
4. A Corte de origem concluiu pela utilização ostensiva da arma de fogo, comprovada pela prova oral coligida em Juízo, em especial pelos seguros relatos das vítimas. Assim, tendo sido confirmada a utilização ostensiva da arma de fogo na conduta criminosa, deve ser mantida a causa de aumento do inciso I do § 2°-A do art. 157 do CP.
5. Ainda, em relação à exclusão da majorante do emprego de arma de fogo, sob o argumento de que não fora o acusado que fez uso da arma ou de violência para a prática delitiva, o pleito não merece melhor sorte. Em atendimento à teoria monista ou unitária adotada pelo Código Penal, apesar do réu não ter praticado a violência elementar do crime de roubo, conforme o entendimento consagrado por este Superior Tribunal de Justiça, havendo prévia convergência de vontades para a prática de tal delito, as circunstâncias objetivas da prática criminosa comunica-se ao coautor, mesmo não sendo ele o executor direto do gravame.
6. [...]
13. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp n. 2.127.610/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022.)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES. AFASTAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E PERÍCIA DA ARMA. DESNECESSIDADE. RELATO SEGURO DA VÍTIMA. CONCURSO DE AGENTES AMPARADO NO RELATO DA VÍTIMA E DO AGENTE POLICIAL. REGIME CORRETAMENTE FIXADO. QUANTUM DA PENA E GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA.
1. Ambas as causas de aumento foram devidamente amparadas pelo relato seguro e consistente da vítima, que, além de ter visto a arma, garantiu ter sido abordada por uma pessoa e, em seguida, outra embarcou no veículo.
2. Consoante jurisprudência pacífica desta Casa, é dispensável a apreensão e perícia da arma utilizada no delito de roubo, "quando evidenciada sua utilização por outros meios de prova, tais como a palavra da vítima ou o depoimento de testemunhas" (AgRg no AREsp 1.577.607/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 9/3/2020).
3. O concurso de agentes restou demonstrado não apenas pelo relato da vítima como também pelo "dos servidores policiais, a comprovar a dinâmica dos acontecimentos em comparsaria", sendo que para afastar tal entendimento seria necessário o revolvimento de matéria fático-probatória, incabível em habeas corpus.
4. O regime foi corretamente fixado com base no quantum da pena e na gravidade concreta da conduta, "praticado com truculência tamanha que desborda do tipo penal, ainda mais em concurso de agentes, com ostentação de arma de fogo e contra vítima grávida".
5. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC n. 699.286/SP, relator Ministro Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 28/6/2022, DJe de 1/7/2022.)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. DOSIMETRIA. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APREENSÃO E PERÍCIA. DESNECESSIDADE. FLAGRANTE ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades.
Assim, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e dos critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, por exigirem revolvimento probatório.
2. A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos Embargos de Divergência n. 961.863/RS, firmou o entendimento de que é despicienda a apreensão e a perícia da arma de fogo, para a incidência da majorante do § 2º-A, I, do art. 157 do CP, quando existirem, nos autos, outros elementos de prova que evidenciem a sua utilização no roubo, como na hipótese, em que há farta comprovação testemunhal atestando o seu emprego.
3. Quanto à alegação da defesa de que há julgados recentes afastando a incidência da causa de aumento quando a arma se encontrar desmuniciada, inapta para efetuar disparos ou, ainda, quando se tratar de simulacro, cumpre ressaltar que o artefato precisa ter sido apreendido para que seja constatado tratar-se de simulacro ou, ainda, realizada perícia técnica, o que não ocorreu no caso em comento. Ademais, a simples manifestação do réu no sentido do uso de simulacro, sem qualquer respaldo em outro elemento de prova dos autos, não afasta a incidência da causa de aumento de pena.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no HC n. 720.951/MS, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 29/3/2022, DJe de 1/4/2022.)
É o que se verifica nos autos. Com efeito, a Corte de origem concluiu pela utilização de arma de fogo, comprovada pela prova oral coligida em Juízo, constando do acórdão que Consoante a prova oral, empregadas duas armas de fogo na prática do roubo, de modo que presente a majorante (e-STJ fls. 781).
Relativamente à incidência da causa de aumento de pena de restrição da liberdade das vítimas, o Tribunal de origem afastou a tese de que se trata de emendatio libelli sem contraditório, fundamentando (e-STJ fls. 779/780):
No roubo, por ser ele crime complexo, existe, no mero ato de desenvolvimento da execução, a restrição da liberdade da vítima.
JÚLIO FABBRINI MIRABETE ao tratar da privação de liberdade no crime de roubo leciona que “por força do artigo 1º da lei nº 9.426/96, que acrescentou incisos ao art. 157, 'se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade' (inc. V), o roubo passa a ser qualificado, com o aumento de pena de um terço”.
Logo, para que esteja caracterizada a causa de aumento prevista no artigo 157, §2º, V, do Código Penal, mostra-se necessário que a restrição de liberdade da vítima não seja aquela momentânea, ato de desenvolvimento da execução da ameaça e subtração, mas que assuma relevância jurídica, em face do maior tempo de restrição, extrapolando o tempo em que decorre da prática imediata da grave ameaça e imediata subtração.
Assim, configura-se a causa de aumento quando, por tempo juridicamente relevante, o agente mantém a restrição da liberdade da vítima com intuito de realizar a subtração ou para assegurar ou facilitar a vantagem decorrente do crime.
[...].
Este é o caso dos autos, onde a causa de aumento ficou caracterizada, tendo as vítimas permanecido com suas liberdades restringidas por mais de duas horas.
Consigne-se que “para a incidência da majorante prevista no art. 157, § 2º, V, do CP, se faz necessário que a privação da liberdade da vítima se dê por período de tempo juridicamente relevante, ou seja, superior ao necessário para a consumação do delito (...)” .
Ainda, cabe pontuar que o reconhecimento da causa de aumento não enseja em julgamento ultra petita.
Possível referida alteração da capitulação uma vez que embora o membro do Ministério Público não tenha capitulado na denúncia de tal forma, descreveu os elementos que compõe o injusto penal, sendo, portanto, cabível a aplicação da emendatio libelli.
Importante ressaltar que pelo princípio da correlação, decorrente dos postulados “narra mihi factum, dabo tibi jus” e “iura novit curia”, importa, para efeito de delimitar a acusação, a imputação fática descrita na denúncia, ou seja, a delimitação na petição inicial da conduta praticada. É exatamente este fato descrito, a imputação, objeto da prova, que vincula o juiz quando de sua decisão.
Havendo correspondência entre o fato descrito e aquele reconhecido na sentença como o ensejador da condenação, a capitulação jurídica adequada é dever do magistrado, justamente em razão dos postulados mencionados.
Tal é a conclusão que se extrai do disposto no artigo 383 do Código de Processo Penal, que traz o instituto da emendatio libelli.
Presente, portanto, a majorante da restrição à liberdade das vítimas.
Com efeito, verifica-se na hipótese a aplicação do instituto da emendatio libelli, visto que o Magistrado de primeiro grau reconheceu, embora não capitulada de forma expressa na denúncia, a causa de aumento de pena, mantendo-se a mesma base fática descrita na exordial acusatória.
Desse modo, "não havendo modificação quanto ao fato descrito na exordial acusatória, como a hipótese presente, pode o magistrado dar nova classificação jurídica ao fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), prescindindo de aditamento da peça exordial ou mesmo de abertura de prazo para a defesa se manifestar, já que o réu se defende dos fatos narrados pela acusação e não dos dispositivos de lei indicados " (AgRg no REsp 1.129.640/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe de 15/2/2013).
A propósito:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 334 DO CÓDIGO PENAL - CPP. CONTRABANDO. OFENSA AOS ARTS. 383 E 384 DO CPP. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. CONDUTA DELITIVA. FATOS DESCRITOS NA INICIAL ACUSATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Não se vislumbra a alegada violação dos arts. 383 e 384 do CPP, porquanto a hipótese dos autos demonstra que a denúncia contém a exposição de todos os fatos juridicamente relevantes e necessários à tipificação do delito imputado ao agravante, o que lhe garantiu o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório.
2. O princípio da congruência ou correlação no processo penal estabelece a necessidade de correspondência entre a exposição dos fatos narrados pela acusação e a sentença. Por isso, o réu se defende dos fatos, e não da classificação jurídica da conduta a ele imputada (HC 119.264/STF, PRIMEIRA TURMA, Rel. Ministra ROSA WEBER, DJe de 5/6/2014). 3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1662204/RS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 5/2/2019, DJe de 11/2/2019)
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PECULATO EM CONTINUIDADE DELITIVA. CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ART. 327, § 2º, DO CP. PACIENTE QUE EXERCIA CARGO EM COMISSÃO DE CHEFE DO DEPARTAMENTO PESSOAL DE PREFEITURA MUNICIPAL. FATO DESCRITO NA DENÚNCIA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. INEXISTÊNCIA. INSTITUTO DA EMENDATIO LIBELLI. PRECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL
INEXISTENTE. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo de revisão criminal e de recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado a justificar a concessão da ordem, de ofício.
2. Segundo a orientação jurisprudencial desta Corte, "não havendo modificação quanto ao fato descrito na exordial acusatória, como a hipótese presente, pode o magistrado dar nova classificação jurídica ao fato definido na denúncia ao prolatar a sentença (emendatio libelli), prescindindo de aditamento da peça exordial ou mesmo de abertura de prazo para a defesa se manifestar, já que o réu se defende dos fatos narrados pela acusação e não dos dispositivos de lei indicados " (AgRg no REsp 1.129.640/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe de 15/2/2013).
3. O princípio da congruência ou correlação no processo penal estabelece a necessidade de correspondência entre a exposição dos fatos narrados pela acusação e a sentença. Por isso, o réu se defende dos fatos, e não da classificação jurídica da conduta a ele imputada (HC 119.264/STF, Primeira Turma, Rel. Ministra ROSA WEBER, DJe de 5/6/2014).
4. No caso dos autos, a condenação está em estrita correlação com a imputação feita na denúncia, no sentido de que o crime foi cometido pela chefe do departamento pessoal, cargo comissionado que a paciente exercia na prefeitura municipal, situação descrita na exordial acusatória.
5. Habeas corpus não conhecido.
(HC n. 526.584/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 22/10/2019, DJe de 4/11/2019.)
No mais, quanto à incidência cumulativa das causas de aumento, segue o teor do parágrafo único do art. 68 do Código Penal:
No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.
Acerca dessa norma, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que não se exige que o juiz aplique uma única causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha. A propósito:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CF, ART. 102, I, “D” E “I”. ROL TAXATIVO. CRIMES DE ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR COMETIDO CONTRA MENOR (CP, ART. 214 C/C 224, “A”) E DE PRODUÇÃO DE PORNOGRAFIA INFANTIL (ECA, ART. 241). ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA DE “FOTOGRAFAR” MENORES EM CENAS DE SEXO EXPLÍCITO À ÉPOCA DOS ACONTECIMENTOS. IMPROCEDÊNCIA. INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL E TELEOLÓGICA DO ART. 241 DO ECA, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 10.764/2003. IMPUGNAÇÃO DA INCIDÊNCIA CONCOMITANTE DE DUAS CAUSAS DE AUMENTO DE PENA PREVISTAS NO ART. 226 DO CÓDIGO PENAL. NÃO CONHECIMENTO DO PEDIDO. DOSIMETRIA. REAPRECIAÇÃO DOS ELEMENTOS CONSIDERADOS PARA FIXAÇÃO DA PENA NA CONDENAÇÃO. INVIABILIDADE EM SEDE DE HABEAS CORPUS. NÃO APRECIAÇÃO DO TEMA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS E PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA CONFIGURADA. EXISTÊNCIA DE AMPARO LÓGICO-TEXTUAL À APLICAÇÃO SIMULTÂNEA DOS INCISOS I E II DO ART. 226 DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS EXTINTO POR INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL.
[...]
4. Na espécie, o paciente teve sua pena majorada duas vezes ante a incidência concomitante dos incisos I e II do art. 226 do Código Penal, uma vez que, além de ser padastro da criança abusada sexualmente, consumou o crime mediante concurso de agentes. Inexistência de arbitrariedade ou excesso que justifique a intervenção corretiva do Supremo Tribunal Federal.
5. É que art. 68, parágrafo único, do Código Penal, estabelece, sob o ângulo literal, apenas uma possibilidade (e não um dever) de o magistrado, na hipótese de concurso de causas de aumento de pena previstas na parte especial, limitar-se a um só aumento, sendo certo que é válida a incidência concomitante das majorantes, sobretudo nas hipóteses em que sua previsão é desde já arbitrada em patamar fixo pelo legislador, como ocorre com o art. 226, I e II, do CP, que não comporta margem para a extensão judicial do quantum exasperado.
[...]
7. Habeas corpus extinto por inadequação da via processual. (HC 110.960/DF, Rel. Min. LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJe 24/09/2014).
Assim, não há ilegalidade flagrante, em tese, na cumulação de causas de aumento da parte especial do Código Penal, sendo razoável a interpretação da lei no sentido de que eventual afastamento da dupla cumulação deverá ser feito apenas no caso de sobreposição do campo de aplicação ou excessividade do resultado (ARE n. 896.843/MT, Relator Ministro GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe 23/9/2015).
Nesse sentido, a depender do caso, a presença de mais de uma causa de aumento do crime de roubo, associada a outros elementos indicativos da gravidade em concreto do delito praticado, poderá ensejar o incremento cumulativo da reprimenda, mas tais circunstâncias devem estar devidamente explicitadas na motivação empregada, conforme exige o art. 93, inciso IX, da Constituição da República. Nesse sentido:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. VIA INADEQUADA. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO CONCURSO DE AGENTES E PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. LEI N.º 13.654/2018. DOSIMETRIA. INSURGÊNCIA DEFENSIVA NO SENTIDO DE SER VEDADO O CÚMULO DE CAUSAS DE AUMENTO DA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL. PLEITO DE QUE SEJA APLICADA APENAS A MAJORANTE DE MAIOR VALOR. IMPROCEDÊNCIA. INTERPRETAÇÃO CORRETA DO ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DAS DUAS CAUSAS DE AUMENTO, HAVENDO FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA, NA HIPÓTESE. PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO SOMENTE DA CAUSA DE AUMENTO DO ART. 157, § 2.º-A, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA, DE OFÍCIO.
[...]
- A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça e a do Supremo Tribunal Federal são no sentido de que o art. 68, Parágrafo Único, do Código Penal, não exige que o juiz aplique uma única causa de aumento da parte especial do Código Penal quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha da fração imposta.
- Assim, não há ilegalidade flagrante, em tese, na cumulação de causas de aumento da parte especial do Código Penal, sendo razoável a interpretação da lei no sentido de que eventual afastamento da dupla cumulação deverá ser feito apenas no caso de sobreposição do campo de aplicação ou excessividade do resultado (ARE 896.843/MT, Rel. Min. GILMAR MENDES, SEGUNDA TURMA, DJe 23/09/2015).
- Contudo, na hipótese ora analisada, as instâncias ordinárias não fundamentaram, concretamente, o cúmulo de causas de aumento, com remissão a peculiaridades do caso em comento, pois o modus operandi do delito, como narrado, confunde-se com a mera descrição típica das majorantes reconhecidas, não refletindo especial gravidade.
- Assim, respeitada a proporcionalidade da pena no caso concreto, e a intenção da Lei n. 13.654/2018, afasta-se a majorante do art. 157, § 2.º, inciso II ('A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade se há o concurso de duas ou mais pessoas'), aplicando-se apenas a do art. 157, § 2.º-A, inciso I ('A pena aumenta-se de 2/3 (dois terços)' se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo'), ambas do Código Penal.
Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para reduzir a reprimenda do paciente ao novo patamar de 9 anos e 26 dias de reclusão, e 21 dias-multa, mantidos os demais termos da condenação. (HC 472.771/SC, de minha relatoria, Quinta Turma, DJe 13/12/2018).
Na hipótese, extrai-se que as instâncias ordinárias apresentaram motivação concreta e suficiente para a aplicação cumulativa das causas de aumento previstas nos §§ 2º e 2º-A do art. 157 do Código Penal, na medida em que consideraram as circunstâncias concretas da prática delitiva, na qual os roubadores, agindo em concurso, exerceram grave ameaça com uso de arma de fogo, restringindo, por tempo relevante, a liberdade das vítimas - no total de 6, inclusive uma criança - e subtraíram um trator e uma bomba hidráulica.
Em hipóteses análogas, decidiu esta Corte:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. APROVEITAMENTO DA PROVA EMPRESTADA. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. JUNTADA DE DOCUMENTOS NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. ART. 231 DO CPP. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. FRAÇÃO DE REDUÇÃO DECORRENTE DA TENTATIVA. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. FUNDAMENTOS IDÔNEOS. CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. CONCURSO DE CAUSAS DE AUMENTO. ART. 68 DO CÓDIGO PENAL. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. MAJORANTE DO ART. 157, §2º-B DO CP. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. A regra do art. 231 do CPP permite, ressalvados os casos expressos em lei, a juntada de documentos em qualquer fase do processo. Não se verifica cerceamento de defesa quando a prova documental juntada for submetida ao contraditório e garante às partes tempo hábil para que se manifestarem sobre a mesma.
2. Na hipótese, para modificar o entendimento adotado pela Corte a quo quanto ao pleito absolutório, ou, subsidiariamente, em relação à redução de pena pelo reconhecimento da tentativa no delito de roubo, haveria a necessidade de nova análise do conjunto probatório dos autos, situação vedada pelo enunciado da Súmula 7 do STJ.
3. "Pode haver a valoração negativa da culpabilidade, uma vez que a premeditação, com o planejamento das ações, demonstra o maior desvalor dessa circunstância" (HC 532.902/PE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 5/12/2019, DJe 17/12/2019).
4. Reconhecido como fundamento idôneo para a exasperação da pena-base do crime de associação criminosa a menção ao elementos fáticos concretos do crime, como o grande número de integrantes.
Precedentes.
5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e desta Corte é no sentido de que o art. 68, parágrafo único, do Código Penal não exige que o juiz aplique uma única causa de aumento referente à parte especial do Código Penal, quando estiver diante de concurso de majorantes, mas que sempre justifique a escolha da fração imposta.
6. No caso, restou declinada motivação concreta para a aplicação sucessiva dos aumentos, sem que se possa falar em ofensa ao art. 68, parágrafo único, do CP, não tendo sido evidenciada flagrante ilegalidade na aplicação cumulativa das causas de aumento previstas no art. 157, § 2º e § 2º-A, ambos do Código Penal.
7. O art. 157, § 2º-B, do CP estabelece que "[S]e a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo", sem que possa equiparar tal fins de incidência do referido artigo a conduta daquele que porta arma de fogo de uso permitido com numeração suprimida, por ausência de previsão legal. Deveras, quando o legislador pretendeu equiparar as condutas, o fez de forma explícita, como no Estatuto do Desarmamento, já que em seu art. 16, § 2º equiparou o porte de arma de uso proibido ou restrito ao de artefato com supressão, alteração de marca, numeração ou qualquer sinal de identificação, não sendo, pois, admissível que se conclua da mesma forma do caso em tela, por caracterizar agravamento substancial da pena do réu sem sustentáculo na lei penal.
8. Agravo regimental parcialmente provido, para afastar a incidência do regramento contido no art. 157, § 2º-B, do CP. Extensão de efeitos aos corréus, com amparo no art. 580 do Código de Processo Penal.
(AgRg no REsp n. 2.097.042/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 15/4/2024, DJe de 18/4/2024.)
DIREITO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO DE MENORES E ROUBO MAJORADO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PROVA DA MENORIDADE. DOCUMENTO OFICIAL OU EQUIVALENTE. PRESCINDIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE OUTROS DOCUMENTOS. POSSIBILIDADE. DOSIMETRIA DO CRIME DE ROUBO. TERCEIRA FASE. APLICAÇÃO CUMULATIVA DAS CAUSAS DE AUMENTO . POSSIBILIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.
1. "O documento firmado por agente público atestando a idade do inimputável é documento hábil para a comprovação da menoridade da vítima do crime de corrupção de menores" (AgRg no REsp 2.051.115/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 18/4/2023, DJe de 24/4/2023).
2. Desconstituir a conclusão a que chegou a instância ordinária quanto à menoridade da vítima do crime de corrupção de menores demandaria amplo revolvimento de questões fático-probatórias, inviável no habeas corpus. Precedentes.
3. É certo que "o aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes" (Súmula 443/STJ). No caso dos autos, todavia, o acórdão sublinhou fatos adicionais à tipicidade abstrata do crime contra o patrimônio, notadamente o planejamento do modus operandi e o prévio ajuste de funções entre o réu e a adolescente
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no HC n. 749.380/SC, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 11/3/2024, DJe de 14/3/2024.)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO. CUMULAÇÃO DE MAJORANTES. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. POSSIBILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO.
1. O reconhecimento das causas de aumento, bem como das frações aplicadas de forma individuais e cumulativas, apresentam justificativas idôneas para a incidência do duplo aumento, conforme a jurisprudência desta Corte, a qual entende que "é legítima a aplicação cumulada das majorantes, no crime de roubo, quando as circunstâncias do caso concreto demandarem uma sanção mais rigorosa, destacado especialmente por elementos como o modus operandi do delito" (AgRg no AREsp 1.942.931/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 3/11/2021).
2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 836.509/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 30/11/2023, DJe de 6/12/2023.)
Pelo exposto, não conheço do mandamus.
Publique-se.
Relator
REYNALDO SOARES DA FONSECA
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear