Processo nº 8012135-70.2025.8.05.0080
ID: 300175188
Tribunal: TJBA
Órgão: VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAM CONTRA A MULHER DE FEIRA DE SANTANA
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 8012135-70.2025.8.05.0080
Data de Disponibilização:
17/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAM CONTRA A MULHER DE FEIRA DE SANTANA Processo: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO n. 8012135-70.2025.8…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAM CONTRA A MULHER DE FEIRA DE SANTANA Processo: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO n. 8012135-70.2025.8.05.0080 Órgão Julgador: VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAM CONTRA A MULHER DE FEIRA DE SANTANA AUTORIDADE: Ministério Público do Estado da Bahia Advogado(s): REU: CIBELE SANTOS DA SILVA Advogado(s): DECISÃO R. Vistos. Trata-se de ação penal instaurada pela justiça pública em face de CIBELE SANTOS DA SILVA, qualificado nos autos, fls. 01, em razão da suposta prática do crime de lesão corporal, tipificado no art. 129, §3º, do Código Penal, realizado na data de 31 de janeiro de 2018, com a incidência da Lei 11340/2006, tendo como vítimas a sua sobrinha, V. S. S., e a sua filha, à época adolescente com 14 (quatorze) anos de idade. A denúncia foi recebida em data de 23 de abril de 2025. É o relatório. Decido. Sem delongas, a lei 11.340/2006 foi editada para promover uma correção da desigualdade histórica de gêneros, visando resgatar a dignidade da mulher que sempre sofreu, sigilosamente ou com reduzida capacidade de reação, violência doméstica e familiar ou decorrente de relação íntima de afeto, pelo simples fato de pertencer ao gênero feminino. A referida lei, diante da singeleza da matéria, não se contentando em tipificar a conduta delituosa motivada em razão da diferença de gênero, prescreveu a necessidade do surgimento de Juízos especializados para tratar da matéria. Como se vê, este Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher é competente para tratar de crimes que configurem violência de gênero, ocorrida no âmbito doméstico e familiar e/ou decorrente de relação íntima de afeto, o que não se afigura da leitura do caderno informativo, contudo, devido à peculiaridade de a vítima ser adolescente0 de 14 (quatorze) anos de idade, e sobrinha da acusada, donde se extrai que a sua vulnerabilidade decorre de sua idade e da relação doméstica de coabitação. Da análise atenta dos autos, depreende-se que a denunciada exercia o poder familiar sobre a vítima, pessoa menor de idade, uma vez que, à época dos fatos, ambas residiam no mesmo domicílio. Consta que, após uma desavença motivada por razão fútil - relacionada ao uso de um perfume -, a denunciada agrediu fisicamente a vítima. Tal circunstância encontra respaldo no relatório médico acostado aos autos, bem como nas declarações prestadas tanto pela vítima quanto pela própria denunciada, conforme apurado no inquérito policial. Dessa forma, considerando os elementos informativos até então coligidos, especialmente o relato da vítima, infere-se que a agressão não decorreu de menosprezo ou discriminação em razão do sexo feminino, mas sim do contexto de vulnerabilidade e da autoridade exercida pela denunciada sobre a vítima. Assim, não restando evidenciada a motivação baseada em violência de gênero, afasta-se, neste caso, a incidência da Lei nº 11.340/2006, razão pela qual não se atrai a competência deste Juízo especializado. Nesse sentido: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VÍTIMA MENINA DE 4 ANOS. COMPETÊNCIA. VARA CRIMINAL. PREVALÊNCIA DA CONDIÇÃO DE CRIANÇA. MOTIVAÇÃO DA CONDUTA. PRECEDENTE. 1. Caso em que se apura a prática de crime de estupro de vulnerável, em tese praticado por genitor contra filha de 4 anos de idade. Assim, ainda que fosse o caso de violência doméstica, deve prevalecer, para fins de fixação de competência, a condição de criança da vítima, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente. 2. Ademais, por outra senda, esta Corte já decidiu que, "verifica-se que o fato de a vítima ser do sexo feminino não foi determinante para a prática do crime de estupro de vulnerável pelo paciente, mas sim a idade da ofendida e a sua fragilidade perante o agressor, seu próprio pai, motivo pelo qual não há que se falar em competência do Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher"(HC n. 344.369/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/5/2016, DJe 25/5/2016). 3. Agravo regimental desprovido. (STJ AgRg no REsp: 1490974 RJ 2014/0280388-8, Relator: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 20/08/2019, T6 - Sexta Turma). Enunciado nº 22 da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (COPEVID): Crimes contra crianças ou adolescentes: competência Enunciado nº 22 (004/2015): O Ministério Público deve zelar para que, existindo Vara Especializada em Crimes contra Crianças e Adolescentes, quando a vítima for do sexo feminino em contexto de violência doméstica e familiar, a competência para conhecimento e julgamento seja das Varas Especializadas e não dos Juízos de Violência Doméstica, por se tratar de crime contra a vulnerabilidade da infância e juventude, reafirmando a competência do Juízo da Infância e Juventude quanto às medidas de proteção previstas no ECA. (Aprovado na Plenária da I Reunião Ordinária do GNDH de 04 a 06/03/2015 e pelo Co-legiado do CNPG em 23/03/2015). Tribunal de Justiça do Estado da Bahia Seção Criminal Conflito de Jurisdição nº 8057643-22.2024.8.05.0000 Origem do Processo: Comarca de Feira de Santana Suscitante: Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal - Crimes contra Crianças e Adolescentes da Comarca de Feira de Santana Suscitado: Juízo da Vara de Violência Doméstica Familiar Contra a Mulher da Comarca de Feira de Santana Procuradora de Justiça: Marilene Pereira Mota Relator: Mario Alberto Simões Hirs CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA (SUSCITANTE). JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA (SUSCITADO). SUPOSTOS CRIMES DE LESÃO CORPORAL, EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER (129 § 9º DO CP C/C INCISO III DO ART. 5º E DO INCISO I DO ART. 7º, AMBOS DA LEI 11.340/06) PRATICADOS PELO PAI CONTRA FILHA MENOR. EMBORA PRATICADOS NO ÂMBITO FAMILIAR, NÃO CUIDAM DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO, NÃO RESTANDO EVIDENCIADO, PELO COTEJO DO ARCABOUÇO PROBATÓRIO COLHIDO DURANTE A FASE INVESTIGATÓRIA, A CONDIÇÃO DE VULNERABILIDADE E OPRESSÃO DA VÍTIMA, DE MODO QUE NÃO SE DEVE APLICAR A LEI Nº. 11.340/2006 (LEI MARIA DA PENHA). LESÃO CORPORAL PRATICADA POR PAI CONTRA FILHA, NA INTENÇÃO DE EDUCAR E CORRIGIR A DESOBEDIÊNCIA, SE AMOLDA À DESCRIÇÃO DO DELITO DE MAUS-TRATOS, PREVISTO NO ART. 136, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL, E NÃO AO TIPO PENAL DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA PREVISTO NO ARTIGO 129, § 9º DO MESMO DIPLOMA LEGAL. CONFLITO CONHECIDO E JULGADO IMPROCEDENTE. DECLARANDO A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA (SUSCITANTE). ACÓRDÃO Vistos etc., acordam, os Desembargadores integrantes da Seção Criminal do Tribunal de Justiça da Bahia, a unanimidade de votos, em JULGAR IMPROCEDENTE O CONFLITO, declarando a competência do JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA (SUSCITANTE) para julgar a ação penal nº 8001833-16.2024.8.05.0080. RELATÓRIO Cuida-se de CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO suscitado pelo JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA em face do JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA, nos autos do processo nº 8001833- 16.2024.8.05.0080. Segundo consta dos autos, foi registrada ocorrência policial para apuração da prática, em tese, de crime de lesão corporal, tipificado no art. 129 §9º do Código Penal, em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, na forma do inciso III do art. 5º e do inciso I do art. 7º, ambos da Lei 11.340/06, praticados por AMILTON DA CONCEIÇÃO LINS contra sua filha, de 15 (quinze) anos de idade, pois, conforme a Denúncia: [...] Extrai-se dos autos que, no dia 05 de março de 2017, por volta das 23h30min, em uma residência localizada na Rua 12 de julho, nº 33, casa, bairro: Feira X, nesta Cidade denunciado, voluntária e conscientemente, agrediu fisicamente a sua filha, S.S.L., causando-lhe lesões corporais, em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher. Nas condições de tempo e lugar acima descritas, após uma discussão entre o denunciado e a genitora da vítima, ele ao ver sua filha, com o aparelho celular na mão, pediu o mesmo e diante da recusa da entrega, o denunciado tomou o aparelho a força e agrediu a vítima fisicamente com um tapa no rosto e um murro em sua boca, causando-lhe lesões corporais. Expedida a guia para exame de lesões corporais, a vítima submeteuse a este em 09 de março de 2017, evidenciando o respectivo laudo: "Escoriação e edema em região zigomática esquerda". [...] Distribuídos os autos ao JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA, à referida Vara declarou a sua incompetência para processar e julgar o presente feito, ao tempo em que determinou a remessa dos autos ao JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA, alegando que o processo em comento apura crime contra a criança e o adolescente, cuja competência é da Vara Criminal, nos termos da Lei nº 10.845/2007. Por conseguinte, após declínio da competência e remessa dos autos para o Juízo da 1ª Vara Criminal de Feira de Santana/BA, esta suscitou o presente conflito, sob alegação de que "para configurar a incidência da Lei Maria da Penha, não é necessário que agressor e agredida tenham vínculo sanguíneo ou relação afetiva, bastando, para tanto, que este se valha do ambiente doméstico para efetivar a agressão, como no presente caso". Nesta senda, em decisão o juízo criminal suscitou o conflito negativo de competência. Dispensada as informações. A douta Procuradora de Justiça, Dra. MARILENE PEREIRA MOTA, oficiou pela competência do Juízo Suscitante, qual seja, o JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA/BA (ID 69961477). É o Relatório. VOTO Como visto, cuida-se de CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO suscitado pelo JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL - CRIMES CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA em face do JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA, nos autos do processo nº 8001833- 16.2024.8.05.0080. Não assiste razão ao Juízo Suscitante. Como visto, a questão controvertida não se relaciona à verificação da existência, ou não, de violência baseada em questão de gênero. A controvérsia quanto ao juízo competente para processar e julgar os fatos expostos na ocorrência policial reside no fato de a Lei nº 13.431/2017 ter estabelecido o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, conferindo-lhes tratamento especial, independentemente do gênero. Numa análise minudente dos autos, razão assiste ao Juízo Suscitado, tendo em vista que os eventuais delitos, embora praticados no âmbito familiar, não cuidam de violência de gênero, não restando evidenciado, pelo cotejo do arcabouço probatório colhido durante a fase investigatória, a condição de vulnerabilidade e opressão da vítima, de modo que não se deve aplicar a Lei nº. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Consabido, a Lei nº. 11.340/2006 foi instituída para combater, com mais rigor, a violência e a desigualdade de gênero comum na sociedade, o que não se amolda no caso concreto, uma vez que os supostos delitos praticados no âmbito familiar, quais sejam, lesões corporais, pois agrediu a vítima, sua filha, com um tapa no rosto e um murro em sua boca, não envolve questão de gênero tão necessária para o reconhecimento e aplicação da legislação especializada. A Lei Maria da Penha trouxe um manto protetor para a mulher em situação de violência doméstica e seus familiares, disciplinando também sobre programas de reabilitação para homens agressores, o que indubitavelmente concorre para educação dos homens para questões de gênero, diminuindo assim a violência contra as mulheres. A Vara Especializada de proteção à mulher é competente para julgamento das condutas contra a mulher baseadas no gênero e que venham a produzir morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial no âmbito da unidade doméstica, da família e em qualquer relação íntima de afeto. Não basta que a conduta típica seja perpetrada contra pessoa do sexo feminino, mas é primordial que o seja em razão do gênero. Cinge-se, aparentemente, que o desentendimento entre o suposto agressor (genitor) e a vítima (filha), provocando as lesões corporais descritas na Denúncia, na intenção de educar e corrigir a desobediência, se amolda à descrição do delito de maustratos, previsto no art. 136, caput, do Código Penal, e não ao tipo penal de violência doméstica previsto no artigo 129, § 9º do mesmo diploma legal. Não restam dúvidas de que não houve violência doméstica praticada contra a vítima, a fim de que seja reconhecida a sua vulnerabilidade e hipossuficiência em relação ao agressor, sendo, portanto, forçoso reconhecer que a decisão que declinou a competência para o Juízo da Vara de Violência Doméstica é equivocada, não tendo observado as peculiaridades do caso concreto. A Lei nº. 11.340/06 foi criada para proteger a mulher em razão da sua inferioridade ou vulnerabilidade em relação ao agressor de modo que, a princípio, a mulher jamais poderia figurar como autora de qualquer delito que estivesse figurando como vítima uma outra mulher, conforme se depreende da leitura do artigo 5º da citada lei, in verbis: Artigo 5º: Para os efeitos desta lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (...). Nessa esteira de intelecção, vale salientar que ainda que existam entendimentos no sentido de ser possível o sujeito ativo da violência doméstica ser mulher, fato é que para tanto é necessário o requisito da existência da situação de vulnerabilidade da vítima frente ao agressor ou a motivação de gênero, tendo, como motivação, dessa forma, a opressão à mulher (fundamento de aplicação da Lei Maria da Penha), e não apenas a ocorrência de uma simples agressão moral, física, psicológica ou patrimonial da vítima em razão de desavenças, conforme já se manifestou diversos pretórios pátrios, principalmente o egrégio Superior Tribunal de Justiça. Nesse sentido: [...] 1. Delito de lesões corporais envolvendo agressões mútuas entre namorados não configura hipótese de incidência da Lei 11.340/06, que tem como objeto a mulher numa perspectiva de gênero e em condições de hipossuficiência ou vulnerabilidade. 2. Sujeito passivo da violência doméstica objeto da referida lei é a mulher. Sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade, além da convivência, com ou sem coabitação. 2. No caso, não fica evidenciado que as agressões sofridas tenham como motivação a opressão à mulher, que é o fundamento de aplicação da Lei Maria da Penha. Sendo o motivo que deu origem às agressões mútuas o ciúme da namorada, não há qualquer motivação de gênero ou situação de vulnerabilidade que caracterize hipótese de incidência da Lei 11.340/06. [...] 2. Com efeito, tenho que, inicialmente, não se pode enquadrar a conduta dos pacientes como sendo de violência doméstica ou familiar, já que a relação entre réu e vítima não se enquadra entre as previstas no artigo 5º da Lei 11.340/2006; 3. Ainda que assim não fosse, no caso, a Lei 11.340/06 não seria aplicada, pois não se cuida de situação relacionada a vulnerabilidade, hipossuficiência, inferioridade física ou econômica existente entre agressor e vítima. Não havendo hipossuficiência e/ou vulnerabilidade entre as partes, não há o menor risco de motivo que enseje a aplicação da legislação penal especial; 4. Dessa forma, está-se a tratar, em tese, diante do delito previsto no artigo 147, caput, do Código Penal, que prevê pena de detenção de 1 a 6 meses. Assim, a competência para julgar o fato é do Juizado Especial Criminal; 5. Ordem concedida para que os autos sejam da representação sejam encaminhados ao juizado especial competente. No mesmo sentido, a jurisprudência pátria é pacífica, a exemplos dos julgados colacionados a seguir: LEI N. 11340, DE 2006. INAPLICABILIDADE. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETENCIA. COMPETENCIA DO JUÍZO CRIMINAL. Conflito negativo de competência entre Juízo Criminal e Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Imputação de conduta típica de extorsão mediante sequestro praticada pela mãe e ex-companheiro, tendo como vítima a filha da primeira. O Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher somente é competente para julgamento das condutas contra a mulher baseadas no gênero e que venham a produzir morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial no âmbito da unidade doméstica, da família e em qualquer relação íntima de afeto. Não basta que a conduta típica seja perpetrada contra pessoa do sexo feminino, mas é primordial que o seja em razão do gênero. Conforme disposição preambular da batizada Lei Maria da Penha, esta foi editada para ajustar o ordenamento jurídico interno às normas de direito internacional sobre o tema, em especial à Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres, ratificada pelo Brasil, sem reservas, pelo Decreto Legislativo n. 26/94,e que de forma expressa disciplina que a discriminação contra as mulheres significa toda distinção, exclusão ou restrição fundada no sexo. No caso em comento, e que resultou o conflito negativo de competência, não pode ser aplicada a referida lei, posto tratar-se de uma conduta onde a mãe e seu ex-companheiro teriam, em tese, sequestrado e exigido resgate para a liberação da filha de 10 anos daquela. O crime não teve qualquer relação com o gênero feminimo da criança, mas pura e simplesmente com sua própria condição de menor impúbere. Fosse a vítima homem, a conduta também existiria, vez que o importante para os agentes era a pouca idade da vítima que pôde ser facilmente enganada, a ponto de acompanhar o sequestrador até o local do cativeiro, só percebendo que algo não estava correto ao solicitar o retorno para casa e teve a sua pretensão negada, o que caracterizou a privação da liberdade. Desta sorte, não sendo a infração praticada em razão do gênero "mulher" da vítima, mas apenas tendo como vítima uma mulher, a competência não é do Juizado. Conflito conhecido e procedente, declarando-se a competência do Juízo da 6a. Vara Criminal de Nova Iguaçu, na forma do voto do relator. (TJRJ. CONFLITO DE JURISDIÇÃO - 2007.055.00047. JULGADO EM 30/08/2007. SETIMA CÂMARA CRIMINAL - Unanime. RELATOR: DESEMBARGADOR GILMAR AUGUSTO TEIXEIRA) LEI N. 11340, DE 2006. CAPITULACAO DO CRIME. AUSENCIA. CONFLITO DE JURISDICAO. COMPETENCIA DA VARA CRIMINAL COMUM. Conflito de jurisdição. Violência familiar contra a mulher. Infração penal. Competência. A competência para o processo e julgamento dos crimes indicados na Lei n. 11.340/06 é, no âmbito do nosso Tribunal de Justiça, dos Juizados da Violência Familiar contra a Mulher e Especiais Criminais, quer sejam os fatos em apuração complexos ou não. Por outro lado, a simples narrativa dos fatos no registro de ocorrência policial não permite, de imediato, que se defina qual a infração penal que é realmente atribuída ao interessado ou qual a forma de violência doméstica e familiar contra a mulher por ele cometida. Em vista disso, se afigura prematuro o declínio de competência pelo Juízo suscitado, que é, por ora, por força de distribuição, competente para a apreciação do decreto das medidas protetivas em favor da vítima e melhor instrução do feito, o que ensejará a correta capitulação dos fatos e, via de consequência, do Juízo competente para o seu julgamento. Conflito procedente. (TJRJ. CONFLITO DE JURISDIÇÃO - 2007.055.00017. JULGADO EM 05/06/2007. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL - Unanime. RELATOR: DESEMBARGADOR MOACIR PESSOA DE ARAUJO) PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER E JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. MAUS-TRATOS. MÃE E FILHA. VIOLÊNCIA DE GÊNERO NÃO DEMONSTRADA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO. 1. A lei 11.340/2006 é de aplicação restrita e deve incidir apenas quando a ação ou omissão que configurem a violência doméstica e familiar possuam motivação de gênero e há uma situação de inferioridade ou vulnerabilidade da ofendida em relação ao agressor. 2. Se os maus tratos infligidos à criança do sexo feminino decorrem da vulnerabilidade decorrente da condição de filha, em face da sua criação e educação, sem qualquer conotação motivada pelo gênero mulher, não há aplicação da lei maria da penha. 3. Conflito conhecido para declarar competente o juízo suscitado. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. LEI "MARIA DA PENHA" (LEI 11.340/06). COMPETÊNCIA PARA PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DE AMEAÇA E/OU VIAS DE FATO DE FILHA CONTRA MAE. VIOLÊNCIA NÃO BASEADA EM GÊNERO. 1. O Juiz suscitante alega que a competência é do Juizado Especial Criminal, em razão da igualdade de gênero entre vítima e suposta agressora, ao passo que o suscitado aduziu que é da 4ª Vara Criminal, por se tratar de violência doméstica atinente à Lei Maria da Penha. 2. Não incide a Lei 11.340/06 em suposta ameaça e/ou vias de fato envolvendo filha e mãe pela ausência violência baseada no gênero. CONFLITO DE COMPETÊNCIA PROCEDENTE. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CONTRAVENÇÃO PENAL. PERTURBAÇÃO DE TRANQUILIDADE. AUSÊNCIA DE QUESTÕES DE GÊNERO. RELAÇÃO FAMILIAR ENTRE MÃE E FILHA, QUE, POR SI SÓ, NÃO ENSEJA A APLICAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. O caso em tela remete a situação em que a filha da vítima, após dirigir-se embriagada a sua residência, teria começado a ofendê-la, em voz alta, sendo que as palavras teriam sido ouvidas pelos vizinhos, causando constrangimento na vítima. As suspeitas que recaem sobre a recorrida não revelam prevalecimento de relações de gênero apenas porque ocorreram em ambiente familiar. O fato de a vítima ser do sexo feminino não foi decisivo para a prática do delito. Como instrumento de combate a uma violência historicamente sedimentada, a Lei 11.340/2006 almeja muito mais do que a ampliação do âmbito de aplicação da lei penal ou do que a judicialização dos conflitos domésticos. Competência do Juizado Especial Criminal e não do Juizado da Violência Doméstica e Familiar. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO DESPROVIDO. UNÂNIME. EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA LESÃO CORPORAL DE ÂMBITO FAMILIAR - ART. 129 § 9º DO CP - CRIME SUPOSTAMENTE PRATICADO PELA FILHA CONTRA A MÃE - NÃO EVIDENCIADA SITUAÇÃO DE FRAGILIDADE OU VULNERABILIDADE PROVENIENTE DO GÊNERO MULHER INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO - A AGRESSÃO TERIA OCORRIDO APÓS UMA DISCUSSÃO POR MOTIVO BANAL, EM RAZÃO DE UM VIDRO DE ACETONA QUE A FILHA HAVIA PEGADO EMPRESTADO DA MÃE, QUE AO SABER, RETIROU DE SUAS MÃOS - INAPLICABILIDADE DA LEI 11.340/06 - COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 32ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL. Conflito negativo de competência suscitado pelo I Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Capital, apontando como competente o Juízo de Direito da 32ª Vara Criminal da Capital. Tratando-se de suposta lesão corporal de filha contra a mãe, no interior de sua residência, podemos falar que existe vínculo afetivo entre as envolvidas, porém, a violência não se deu em razão da vulnerabilidade da mãe, mas sim, em razão de uma discussão entre as duas, o que afasta o procedimento elencado na Lei Maria da Penha. Isto porque os fatos narrados na exordial não revelam uma relação de dominação-subordinação da mãe com sua filha. Também não restou evidenciada a situação de vulnerabilidade experimentada pela suposta ofendida, não havendo qualquer ligação com a violência que o legislador pretendeu coibir com o advento da Lei Maria da Penha. PROCEDÊNCIA DO CONFLITO, firmando-se a competência do Juízo Suscitado. Destarte, in casu, ante a inexistência da situação de vulnerabilidade da vítima frente ao agressor ou em razão da motivação de gênero, não há que se falar em competência do Juízo Suscitado, a fim de que fosse possível a aplicação da Lei nº. 11.340/2006. Diante do quanto exposto, em harmonia com o parecer ministerial, votase pela IMPROCEDÊNCIA DO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA para reconhecer a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Feira de Santana para processar e julgar a ação penal. Salvador, data registrada no sistema Mario Alberto Simões Hirs Relator. CONFLITO A QUE SE CONHECE PARA DECLARAR COMPETENTE O JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA. 1. Trata-se de Conflito Negativo de Competência entre o Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal, suscitante, e o Juízo de Direito da Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Feira de Santana, suscitado, nos autos da Ação Penal nº 0003266-51.2011.8.05.0080, ajuizada em desfavor de Railton dos Santos Filho, denunciado pela prática do delito tipificado no art. 217-A, caput, c/c o art. 226, inciso II, ambos do Código Penal, eis que, aproveitando-se da vulnerabilidade da sua enteada A.E.J.F., de 03 (três) anos de idade à época do fato, teria praticado com esta ato libidinoso, qual seja, sexo anal. 2. Conheço do conflito de competência, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade. 3. O crime perpetrado tem natureza eminentemente sexual e não a de delito de violência doméstica e familiar contra a mulher, daqueles em que há submissão do gênero feminino ao masculino, saindo da esfera de proteção da Lei nº 11.340/06, devendo, portanto, ser julgado pelo juízo comum. PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA Seção Criminal GABINETE DA DESEMBARGADORA Nágila Maria Sales Brito Conflito de Jurisdição - Competência nº 0003266-51.2011.8.05.0080 4. Ademais, conforme a Lei de Organização e Divisão Judiciária do Estado da Bahia, Lei nº 10.845/2007, a competência para o processamento de crimes que tenham como vítima a criança e o adolescente é da 1ª Vara Criminal da Comarca de Feira de Santana. 5. Ante o exposto, CONHEÇO do conflito Negativo de Competência e DECLARO COMPETENTE PARA PROCESSAR E JULGAR A AÇÃO PENAL Nº 0003266- 51.2011.8.05.0080 O JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA.Conflito de Jurisdição; Origem: Feira de Santana; Processo nº 0003266-51.2011.8.05.0080; Suscitante : Juíza de Direito de Feira de Santana - 1ª Vara Criminal; Suscitado : Juíza de Direito de Feira de Santana - Vara de Violência Doméstica Fam Contra A Mulher; Interessado : Ministério Público do Estado da Bahia Interessado : Railton dos Santos Filho; Relatora: Desembargadora Nágila Maria Sales Brito) CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO ENTRE JUÍZES COM A MESMA COMPETÊNCIA TERRITORIAL. VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA (SUSCITANTE) E 1ª VARA CRIMINAL DA MESMA COMARCA (SUSCITADO). AÇÃO CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA. ALEGADO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A, CAPUT, DO CP) PERPETRADO EM DESFAVOR DE CRIANÇA DE 8 ANOS DE IDADE, DO SEXO FEMININO, SUPOSTAMENTE PRATICADO POR SEU PADRASTO. INCIDÊNCIA DO ART. 23 DA LEI Nº 13.431/2017. VULNERABILIDADE DECORRENTE DA CONDIÇÃO DE PESSOA HUMANA EM DESENVOLVIMENTO. PROTEÇÃO INTEGRAL E ABSOLUTA PRIORIDADE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO STJ NO JULGAMENTO DO HC N. 728.173/RJ, DO EAREsp Nº 2.099.532/RJ E DO RESP-2.005.974/RJ. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA, A QUEM CUMPRE PROCESSAR E JULGAR, CUMULATIVAMENTE, OS FEITOS RELATIVOS AOS CRIMES CONTRA A CRIANÇA E ADOLESCENTE. CONFLITO CONHECIDO E JULGADO PROCEDENTE PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA/BA, EM DISSONÂCIA COM O PARECER DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA (Desembargadora Nágila Maria Sales Brito - 14.05.2025). Assim, com fulcro nos arts. art. 69, I e III, e art. 74, do Código de Processo Penal, reconheço a incompetência absoluta deste Juízo, declino da competência e determino a imediata remessa dos presentes autos à 1ª Vara Crime desta Comarca, observando o cartório a respectiva baixa no Setor de Distribuição. Dê-se ciência ao Ministério Público. P. R. I. C FEIRA DE SANTANA/BA, 13 de junho de 2025. Wagner Ribeiro Rodrigues Juiz de Direito
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