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Denner De Barros E Mascaren…
OAB/BA 60.908
DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça como advogado.
ID: 325190956
Tribunal: TJBA
Órgão: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 8000853-34.2021.8.05.0255
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VIVIANE DE FARIAS MACHADO
OAB/RJ XXXXXX
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LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA
OAB/BA XXXXXX
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FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA
OAB/RS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000853-34.2021.8.05.0255 …
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Processo nº 8000853-34.2021.8.05.0255
ID: 325190965
Tribunal: TJBA
Órgão: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 8000853-34.2021.8.05.0255
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VIVIANE DE FARIAS MACHADO
OAB/RJ XXXXXX
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LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA
OAB/BA XXXXXX
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FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA
OAB/RS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000853-34.2021.8.05.0255 …
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000853-34.2021.8.05.0255 Órgão Julgador: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ AUTOR: OSNI MELGACO BULCAO & CIA LTDA Advogado(s): PEDRO GERALDO DO NASCIMENTO (OAB:BA12838), CAMILA PITA MIRANDA registrado(a) civilmente como CAMILA PITA MIRANDA (OAB:BA68900) REU: TNL PCS S/A e outros (2) Advogado(s): FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA registrado(a) civilmente como FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA (OAB:RS80851), LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA (OAB:BA16891) SENTENÇA Atribuo a esta decisão força de MANDADO de CITAÇÃO E BUSCA E APREENSÃO/CARTA/OFÍCIO ou qualquer instrumento necessário ao seu cumprimento Vistos etc. Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais proposta por OSNI MELGAÇO BULCAO & CIA LTDA ME em face de OI TNL PCS S.A e TELEFONICA DO BRASIL VIVO S.A., conforme narrado na inicial. A parte autora sustenta, em síntese, que possuía 33 linhas telefônicas móveis com a operadora OI e, que, em 17/08/2021, recebeu um e-mail, supostamente da OI, informando sobre a arrematação da empresa pelas operadoras CLARO, TIM e VIVO e solicitando documentação para migração para a VIVO. O dito e-mail garantia, expressamente, que não haveria cobrança de multa por rescisão contratual ou portabilidade. Assim, a parte Autora solicitou a portabilidade de 21 linhas, bem como o cancelamento de 12 linhas. No dia 21/09/2021, no entanto, foi surpreendida com a cobrança de multas no valor total de R$ 7.182,30 (sete mil cento e oitenta e dois reais e trinta centavos). Diante disso, a parte Autora ligou para a ouvidoria da OI e foi informada que havia caído em um golpe. Desse modo, a parte Autora pugna pela suspensão das cobranças, anulação das multas e indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais). A TELEFÔNICA BRASIL S.A. defendeu a inaplicabilidade do CDC, por se tratar de pessoa jurídica que não utiliza o serviço como destinatária final, mas como insumo empresarial, somada a ausência de ato ilícito, pois não há qualquer ação ou omissão sua que tenha causado danos à parte autora. Além disso, afirma que a portabilidade foi regular, por ter sido solicitada pela própria autora através de aceite digital válido e que não há evidências de que o e-mail fraudulento tenha sido oriundo de seus sistemas. Já a OI MÓVEL S.A. sustentou que as cobranças são legítimas, decorrentes de quebra de fidelidade contratual, além do fato de a autora ter solicitado a remoção de terminais em 21/09/2021, no entanto, os contratos foram suspensos por inadimplência em 25/02/2022. Ademais, informou que a portabilidade para outras operadoras gera multa contratual proporcional ao tempo restante de fidelidade, não havendo, portanto, irregularidade nas cobranças, Vieram-me os autos conclusos. É o breve relatório. DECIDO. Inicialmente, considerando que os documentos colacionados aos autos se revelam suficientes para solução da lide, sem necessidade de dilação probatória, por se tratar de matéria essencialmente de direito com provas documentais, profiro o julgamento antecipado do mérito (art.355, I, do CPC), por entender suficientes os elementos probatórios dos autos. Nesse viés, importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal já de há muito se posicionou no sentido de que a necessidade de produção de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado (RTJ 115/789), o que se verifica no presente caso. DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - TELEFÔNICA BRASIL S.A (VIVO) A ré suscitou a ilegitimidade passiva "ad causam", sob a alegação de inexistência de relação jurídica com a parte autora que lhe imponha qualquer obrigação. No entanto, não merece acolhida a alegação. Segundo a Teoria da Asserção, adotada pelo Col. Superior Tribunal de Justiça, a legitimidade da parte deve ser apreciada "in status assertionis", ou seja, com base na mera afirmação do autor na inicial. Se for preciso analisar as provas, trata-se de questão de mérito e não de preliminar. Diante disso, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva. DO MÉRITO Contrariamente ao argumento sustentado pela parte ré, está caracterizada a relação de consumo. Embora a autora seja pessoa jurídica, utilizava os serviços de telefonia como insumo necessário para sua atividade empresarial, enquadrando-se no conceito de consumidor pela Teoria Finalista Aprofundada, conforme entendimento consolidado do STJ. A circunstância de possuir 33 linhas móveis não desnatura a relação consumerista, mas apenas evidencia a necessidade empresarial do serviço. Aplicam-se, portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, em especial a responsabilidade objetiva prevista no artigo 14, haja vista o defeito na prestação do serviço. Veja-se: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Ademais, durante o complexo processo de aquisição dos ativos móveis da OI pelas operadoras TIM, CLARO e VIVO, criou-se um ambiente de incerteza e desinformação que foi habilmente explorado por fraudadores. O e-mail recebido pela autora, embora não originário das operadoras, aproveitou-se do conhecimento público sobre a operação empresarial em curso para ludibriar consumidores. Desse modo, as operadoras falharam gravemente ao não estabelecerem canais seguros e oficiais de comunicação sobre o processo de transição, o que criou um ambiente propício para que terceiros se aproveitassem da situação. Conforme se verifica das próprias faturas juntadas pela OI, existiam alertas genéricos sobre golpes, mas nada específico sobre o processo de aquisição em curso, deixando os consumidores vulneráveis a comunicações fraudulentas que se aproveitavam do conhecimento público sobre a operação. Diante do exposto, tratando-se de operação empresarial coordenada entre as três grandes operadoras para aquisição dos ativos da OI, com impacto direto nos consumidores, há responsabilidade solidária pelos danos causados durante o processo de transição. A TELEFÔNICA BRASIL S.A. não pode, portanto, se beneficiar da aquisição de novos clientes e, simultaneamente, se eximir de responsabilidade pelos prejuízos causados no processo. A integração entre as operações das empresas durante a transição torna todas responsáveis pela segurança e transparência do processo perante os consumidores. Trata-se, assim, de falha na prestação do serviço, ensejadora da responsabilidade objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, abaixo transcrito. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. De acordo com o ordenamento pátrio, a responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços é objetiva, bastando a configuração do nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo consumidor e o ato praticado pelo fornecedor, independentemente de culpa, para que haja o dever de ressarcimento. Com efeito, ao disponibilizar os serviços, os fornecedores assumem a responsabilidade de reparar os danos que decorram da falha de prestação do serviço, na medida em que assumiram o dever de segurança em relação às operações realizadas. Outrossim, o art. 18 do CDC prevê a responsabilidade solidária dos fornecedores pelo vício de qualidade ou quantidade do produto que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, bem como pelos vícios decorrentes de incongruências com as indicações anunciadas. Assim, deve ser declarada a inexigibilidade da cobrança da multa no total de R$ 7.182,30. No que concerne aos danos morais, entendo que estes não restaram caracterizados, haja vista a inexistência de ofensa aos direitos da personalidade. In casu, não há que se cogitar em dano moral in re ipsa, de modo que cabia à parte autora demonstrar a ocorrência de violação aos direitos personalíssimos, ônus do qual não se desincumbiu. Em que pese os dissabores advindos do fato, tem-se que o descumprimento contratual, traduzido na cobrança de multa indevida, não gera, por si só, abalo moral indenizável. A mera conduta da parte ré descrita nos autos não é capaz de atingir direitos personalíssimos, não tendo sido demonstrada qualquer circunstância excepcional capaz de gerar abalo extraordinário a justificar indenização extrapatrimonial. Com efeito, embora haja falha na prestação do serviço por parte da ré, as dificuldades enfrentadas pelo autor não têm o condão de conferir direito ao pagamento de indenização por dano moral, pois não inexistiram outras consequências que não o aborrecimento decorrente do fato em si. Daí porque indefiro o pleito de indenização por danos morais. DISPOSITIVO Diante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da parte autora, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para DECLARAR a inexigibilidade das multas contratuais cobradas pela OI MÓVEL S.A. no valor total de R$ 7.182,30 (sete mil, cento e oitenta e dois reais e trinta centavos), determinando que as rés se abstenham de inscrever o nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito em razão dos débitos ora declarados inexigíveis, sob pena de multa diária no importe de R$ 100,00 (cem reais), limitada a R$ 3.000,00 (três mil reais). Sem custas e honorários advocatícios nesta fase processual (artigos 54 e 55 da Lei n. 9.099/95). Em havendo recurso tempestivo e suficientemente preparado (se for o caso), recebo-o, desde já, no efeito devolutivo, intimando-se a parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. Após, remetam-se os autos à Egrégia Turma Recursal. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. TAPEROÁ/BA, data da assinatura eletrônica. ALICE BAHIA SINAY NEVES Juíza Leiga CRYS SÃO BERNARDO VELOSO Juíza de Direito
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Processo nº 8000853-34.2021.8.05.0255
ID: 325190976
Tribunal: TJBA
Órgão: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 8000853-34.2021.8.05.0255
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VIVIANE DE FARIAS MACHADO
OAB/RJ XXXXXX
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LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA
OAB/BA XXXXXX
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FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA
OAB/RS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000853-34.2021.8.05.0255 …
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000853-34.2021.8.05.0255 Órgão Julgador: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ AUTOR: OSNI MELGACO BULCAO & CIA LTDA Advogado(s): PEDRO GERALDO DO NASCIMENTO (OAB:BA12838), CAMILA PITA MIRANDA registrado(a) civilmente como CAMILA PITA MIRANDA (OAB:BA68900) REU: TNL PCS S/A e outros (2) Advogado(s): FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA registrado(a) civilmente como FELIPE ESBROGLIO DE BARROS LIMA (OAB:RS80851), LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA (OAB:BA16891) SENTENÇA Atribuo a esta decisão força de MANDADO de CITAÇÃO E BUSCA E APREENSÃO/CARTA/OFÍCIO ou qualquer instrumento necessário ao seu cumprimento Vistos etc. Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais proposta por OSNI MELGAÇO BULCAO & CIA LTDA ME em face de OI TNL PCS S.A e TELEFONICA DO BRASIL VIVO S.A., conforme narrado na inicial. A parte autora sustenta, em síntese, que possuía 33 linhas telefônicas móveis com a operadora OI e, que, em 17/08/2021, recebeu um e-mail, supostamente da OI, informando sobre a arrematação da empresa pelas operadoras CLARO, TIM e VIVO e solicitando documentação para migração para a VIVO. O dito e-mail garantia, expressamente, que não haveria cobrança de multa por rescisão contratual ou portabilidade. Assim, a parte Autora solicitou a portabilidade de 21 linhas, bem como o cancelamento de 12 linhas. No dia 21/09/2021, no entanto, foi surpreendida com a cobrança de multas no valor total de R$ 7.182,30 (sete mil cento e oitenta e dois reais e trinta centavos). Diante disso, a parte Autora ligou para a ouvidoria da OI e foi informada que havia caído em um golpe. Desse modo, a parte Autora pugna pela suspensão das cobranças, anulação das multas e indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais). A TELEFÔNICA BRASIL S.A. defendeu a inaplicabilidade do CDC, por se tratar de pessoa jurídica que não utiliza o serviço como destinatária final, mas como insumo empresarial, somada a ausência de ato ilícito, pois não há qualquer ação ou omissão sua que tenha causado danos à parte autora. Além disso, afirma que a portabilidade foi regular, por ter sido solicitada pela própria autora através de aceite digital válido e que não há evidências de que o e-mail fraudulento tenha sido oriundo de seus sistemas. Já a OI MÓVEL S.A. sustentou que as cobranças são legítimas, decorrentes de quebra de fidelidade contratual, além do fato de a autora ter solicitado a remoção de terminais em 21/09/2021, no entanto, os contratos foram suspensos por inadimplência em 25/02/2022. Ademais, informou que a portabilidade para outras operadoras gera multa contratual proporcional ao tempo restante de fidelidade, não havendo, portanto, irregularidade nas cobranças, Vieram-me os autos conclusos. É o breve relatório. DECIDO. Inicialmente, considerando que os documentos colacionados aos autos se revelam suficientes para solução da lide, sem necessidade de dilação probatória, por se tratar de matéria essencialmente de direito com provas documentais, profiro o julgamento antecipado do mérito (art.355, I, do CPC), por entender suficientes os elementos probatórios dos autos. Nesse viés, importante ressaltar que o Supremo Tribunal Federal já de há muito se posicionou no sentido de que a necessidade de produção de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado (RTJ 115/789), o que se verifica no presente caso. DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA - TELEFÔNICA BRASIL S.A (VIVO) A ré suscitou a ilegitimidade passiva "ad causam", sob a alegação de inexistência de relação jurídica com a parte autora que lhe imponha qualquer obrigação. No entanto, não merece acolhida a alegação. Segundo a Teoria da Asserção, adotada pelo Col. Superior Tribunal de Justiça, a legitimidade da parte deve ser apreciada "in status assertionis", ou seja, com base na mera afirmação do autor na inicial. Se for preciso analisar as provas, trata-se de questão de mérito e não de preliminar. Diante disso, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva. DO MÉRITO Contrariamente ao argumento sustentado pela parte ré, está caracterizada a relação de consumo. Embora a autora seja pessoa jurídica, utilizava os serviços de telefonia como insumo necessário para sua atividade empresarial, enquadrando-se no conceito de consumidor pela Teoria Finalista Aprofundada, conforme entendimento consolidado do STJ. A circunstância de possuir 33 linhas móveis não desnatura a relação consumerista, mas apenas evidencia a necessidade empresarial do serviço. Aplicam-se, portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, em especial a responsabilidade objetiva prevista no artigo 14, haja vista o defeito na prestação do serviço. Veja-se: Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Ademais, durante o complexo processo de aquisição dos ativos móveis da OI pelas operadoras TIM, CLARO e VIVO, criou-se um ambiente de incerteza e desinformação que foi habilmente explorado por fraudadores. O e-mail recebido pela autora, embora não originário das operadoras, aproveitou-se do conhecimento público sobre a operação empresarial em curso para ludibriar consumidores. Desse modo, as operadoras falharam gravemente ao não estabelecerem canais seguros e oficiais de comunicação sobre o processo de transição, o que criou um ambiente propício para que terceiros se aproveitassem da situação. Conforme se verifica das próprias faturas juntadas pela OI, existiam alertas genéricos sobre golpes, mas nada específico sobre o processo de aquisição em curso, deixando os consumidores vulneráveis a comunicações fraudulentas que se aproveitavam do conhecimento público sobre a operação. Diante do exposto, tratando-se de operação empresarial coordenada entre as três grandes operadoras para aquisição dos ativos da OI, com impacto direto nos consumidores, há responsabilidade solidária pelos danos causados durante o processo de transição. A TELEFÔNICA BRASIL S.A. não pode, portanto, se beneficiar da aquisição de novos clientes e, simultaneamente, se eximir de responsabilidade pelos prejuízos causados no processo. A integração entre as operações das empresas durante a transição torna todas responsáveis pela segurança e transparência do processo perante os consumidores. Trata-se, assim, de falha na prestação do serviço, ensejadora da responsabilidade objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, abaixo transcrito. Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. De acordo com o ordenamento pátrio, a responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços é objetiva, bastando a configuração do nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo consumidor e o ato praticado pelo fornecedor, independentemente de culpa, para que haja o dever de ressarcimento. Com efeito, ao disponibilizar os serviços, os fornecedores assumem a responsabilidade de reparar os danos que decorram da falha de prestação do serviço, na medida em que assumiram o dever de segurança em relação às operações realizadas. Outrossim, o art. 18 do CDC prevê a responsabilidade solidária dos fornecedores pelo vício de qualidade ou quantidade do produto que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, bem como pelos vícios decorrentes de incongruências com as indicações anunciadas. Assim, deve ser declarada a inexigibilidade da cobrança da multa no total de R$ 7.182,30. No que concerne aos danos morais, entendo que estes não restaram caracterizados, haja vista a inexistência de ofensa aos direitos da personalidade. In casu, não há que se cogitar em dano moral in re ipsa, de modo que cabia à parte autora demonstrar a ocorrência de violação aos direitos personalíssimos, ônus do qual não se desincumbiu. Em que pese os dissabores advindos do fato, tem-se que o descumprimento contratual, traduzido na cobrança de multa indevida, não gera, por si só, abalo moral indenizável. A mera conduta da parte ré descrita nos autos não é capaz de atingir direitos personalíssimos, não tendo sido demonstrada qualquer circunstância excepcional capaz de gerar abalo extraordinário a justificar indenização extrapatrimonial. Com efeito, embora haja falha na prestação do serviço por parte da ré, as dificuldades enfrentadas pelo autor não têm o condão de conferir direito ao pagamento de indenização por dano moral, pois não inexistiram outras consequências que não o aborrecimento decorrente do fato em si. Daí porque indefiro o pleito de indenização por danos morais. DISPOSITIVO Diante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos da parte autora, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para DECLARAR a inexigibilidade das multas contratuais cobradas pela OI MÓVEL S.A. no valor total de R$ 7.182,30 (sete mil, cento e oitenta e dois reais e trinta centavos), determinando que as rés se abstenham de inscrever o nome da autora nos órgãos de proteção ao crédito em razão dos débitos ora declarados inexigíveis, sob pena de multa diária no importe de R$ 100,00 (cem reais), limitada a R$ 3.000,00 (três mil reais). Sem custas e honorários advocatícios nesta fase processual (artigos 54 e 55 da Lei n. 9.099/95). Em havendo recurso tempestivo e suficientemente preparado (se for o caso), recebo-o, desde já, no efeito devolutivo, intimando-se a parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. Após, remetam-se os autos à Egrégia Turma Recursal. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. TAPEROÁ/BA, data da assinatura eletrônica. ALICE BAHIA SINAY NEVES Juíza Leiga CRYS SÃO BERNARDO VELOSO Juíza de Direito
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Processo nº 8054658-19.2020.8.05.0001
ID: 314122759
Tribunal: TJBA
Órgão: 9ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR
Classe: EXECUçãO FISCAL
Nº Processo: 8054658-19.2020.8.05.0001
Data de Disponibilização:
02/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA COMARCA DE SALVADOR 9ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA Fórum Ruy Barbosa, sala 304, 3° andar, praça D. Pedro II, s/n, Largo do Campo da Pólvora, Nazaré, CEP: 40040-380, S…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA COMARCA DE SALVADOR 9ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA Fórum Ruy Barbosa, sala 304, 3° andar, praça D. Pedro II, s/n, Largo do Campo da Pólvora, Nazaré, CEP: 40040-380, Salvador-BA. Telefone: (71) 3320-6986 | E-mail: salvador9vfazpub@tjba.jus.br Processo: EXECUÇÃO FISCAL n. 8054658-19.2020.8.05.0001 Órgão Julgador: 9ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR EXEQUENTE: MUNICIPIO DE SALVADOR EXECUTADO: JOSE CARLOS AZEVEDO FIUZA DECISÃO Trata-se de Execução Fiscal proposta para cobrança de IPTU/TL/TRSD dos exercícios de 2012 e 2018, com fundamento na(s) Certidão(ões) de Dívida Ativa acostada(s) com a inicial. Brevemente relatados. Decido. Sem maiores delongas e em atenção ao princípio da razoável duração do processo, da economia processual e do devido processo legal, vislumbra-se a ocorrência de prescrição quanto ao(s) exercício(s) de 2012. O direito da Fazenda Pública cobrar seus créditos prescreve em 05 (cinco) anos e, no caso em tela, observo que a presente Execução Fiscal foi ajuizada após o decurso desse prazo quinquenal para o(s) referido(s) exercício(s). O lançamento do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) é de ofício e ocorre no início de cada exercício, sendo constituído definitivamente com o envio do carnê para o endereço do contribuinte. O STJ, no julgamento, pelo sistema de recursos repetitivos - REsp nº 1641011 e REsp nº 1658517 -, consolidou entendimento de que, uma vez constituído o crédito tributário, o prazo prescricional começa a contar do dia seguinte ao vencimento do imposto, conforme Ementa do REsp 1658517, abaixo transcrita: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. IPTU. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. DIA SEGUINTE AO VENCIMENTO DA EXAÇÃO. PARCELAMENTO DE OFÍCIO DA DÍVIDA TRIBUTÁRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE CAUSA SUSPENSIVA DA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO. MORATÓRIA OU PARCELAMENTO APTO A SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. NECESSÁRIA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO CONTRIBUINTE. PARCELAMENTO DE OFÍCIO. MERO FAVOR FISCAL. APLICAÇÃO DO RITO DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015. ART. 256-I DO RISTJ. RECURSO ESPECIAL DO MUNICÍPIO DE BELÉM/PA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1.1 Tratando-se de lançamento de ofício, o prazo prescricional de cinco anos para que a Fazenda Pública realize a cobrança judicial de seu crédito tributário (art. 174, caput do CTN) referente ao IPTU, começa a fluir somente após o transcurso do prazo estabelecido pela lei local para o vencimento da exação (pagamento voluntário pelo contribuinte), não dispondo o Fisco, até o vencimento estipulado, de pretensão executória legítima para ajuizar execução fiscal objetivando a cobrança judicial, embora já constituído o crédito desde o momento no qual houve o envio do carnê para o endereço do contribuinte (Súmula 397/STJ). Hipótese similar ao julgamento por este STJ do REsp. 1.320.825/RJ (Rel. Min. GURGEL DE FARIA, DJe 17.8.2016), submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 903), no qual restou fixada a tese de que a notificação do contribuinte para o recolhimento do IPVA perfectibiliza a constituição definitiva do crédito tributário, iniciando-se o prazo prescricional para a execução fiscal no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação. 1.2 O parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. 1.3 A liberalidade do Fisco em conceder ao contribuinte a opção de pagamento à vista (cota única) ou parcelado (10 cotas), independente de sua anuência prévia, não configura as hipóteses de suspensão da exigibilidade do crédito tributário previstas no art. 151, I e VI do CTN (moratória ou parcelamento), tampouco causa de interrupção da prescrição, a qual exige o reconhecimento da dívida por parte do contribuinte (art. 174, parág. único, IV do CTN). 1.4 O contribuinte não pode ser despido da autonomia de sua vontade, em decorrência de uma opção unilateral do Estado, que resolve lhe conceder a possibilidade de efetuar o pagamento em cotas parceladas. Se a Fazenda Pública Municipal entende que é mais conveniente oferecer opções parceladas para pagamento do IPTU, o faz dentro de sua política fiscal, por mera liberalidade, o que não induz a conclusão de que houve moratória ou parcelamento do crédito tributário, nos termos do art. 151, I e VI do CTN, apto a suspender o prazo prescricional para a cobrança de referido crédito. Necessária manifestação de vontade do contribuinte a fim de configurar moratória ou parcelamento apto a suspender a exigibilidade do crédito tributário. 1.5 Acórdão submetido ao regime do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 256-I do RISTJ, incluído pela Emenda Regimental 24 de 28.9.2016), cadastrados sob o Tema 980/STJ, fixando-se a seguinte tese: (i) o termo inicial do prazo prescricional da cobrança judicial do Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU inicia-se no dia seguinte à data estipulada para o vencimento da exação; (ii) o parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. (negrito nosso) Com efeito, inicia-se a contagem do prazo prescricional no dia seguinte ao vencimento do tributo. Da documentação acostada com a inicial, se vê a realização de um parcelamento administrativo (nº 984575-5/2019) em que foi incluído o crédito tributário ora exequendo. Do inciso IV do parágrafo único do art. 174, do CTN, deduz-se que a adesão ao parcelamento significa confissão de dívida pelo executado e que ocasiona a interrupção da prescrição. Entretanto, o que se vê no presente caso é que a adesão ao parcelamento se deu no ano de 2019, ou seja, quando já decorrido o prazo prescricional para cobrança do(s) exercício(s) de 2012, de modo que não há que se falar em interrupção do lustro prescricional. Nesse sentido os seguintes julgados: AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. O PARCELAMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO JÁ PRESCRITO NÃO INTERROMPE A PRESCRIÇÃO. Consoante se denota da análise dos autos, o parcelamento dos créditos tributários relativos ao IPTU, exercício de 2000, restou efetivado somente em março de 2008, ou seja, após transcorrido o lapso quinquenal. AGRAVO DESPROVIDO, POR MAIORIA. (Agravo Nº 70053549515, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 24/04/2013). PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PARCELAMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO PRESCRITO. IMPOSSIBILIDADE. CRÉDITO JÁ EXTINTO. ART. 156, V , DO CTN . PRECEDENTES. 1. Não se conhece de Recurso Especial em relação a ofensa ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF. 2. A confissão da dívida para fins de parcelamento do débito importa em interrupção do prazo prescricional, consoante disposto no art. 174, parágrafo único, do CTN. No entanto, o parcelamento acordado após a consumação da prescrição não tem o condão de retroagir como causa interruptiva. Precedentes do STJ. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1223420 RS 2010/0217505-3. SEGUNDA TURMA. Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN. Julgamento: 17 de Fevereiro de 2011. Publicação: DJe 15/03/2011). (negrito nosso) TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO. PARCELAMENTO POSTERIOR À CONSUMAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, o parcelamento, por representar ato de reconhecimento da dívida, suspende a exigibilidade do crédito tributário e interrompe o prazo prescricional, que volta a correr no dia em que o devedor deixa de cumprir o acordo. Todavia, a adesão à programa de parcelamento após a consumação da prescrição não tem o condão de retroagir como causa interruptiva. 2. Hipótese em que a adesão ao novo programa de parcelamento só ocorreu quando já transcorrido o prazo prescricional quinquenal. Logo, resta caracterizada a prescrição. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1528020/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 02/06/2015). Assim, não tendo o parcelamento o condão de retroagir como causa interruptiva, afasta-se a incidência do inciso IV, do parágrafo único do art. 174, do CTN. De outro lado, também não há nos autos indicação de qualquer outra causa suspensiva/interruptiva da prescrição. Com efeito, evidencia-se que ocorreu a prescrição direta em relação a esta espécie tributária, na medida que está patenteado o decurso de prazo superior aos 05 (cinco) anos previstos no art. 174 do CTN para o ajuizamento da ação. Como a Taxa de Lixo / Taxa de Coleta, Remoção e Destinação de Resíduos Sólidos Domiciliares é cobrada pela municipalidade com o IPTU, tendo a mesma data de vencimento, por analogia, segue o mesmo raciocínio na contagem do prazo prescricional, de tal sorte que, existindo sua cobrança, também resta extinto o crédito tributário a ela referente, para o(s) exercício(s) indicado(s), nos termos do inc. V do art. 156 do CTN. Vale trazer o disposto na Súmula 409 do STJ: "Em execução fiscal, a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício (art. 219, § 5º, do CPC)". Ante o exposto, nos termos dos arts. 156, V, e 174, ambos do CTN e art. 487, II, do CPC, extingo parcialmente a presente Execução Fiscal, com relação ao IPTU/TRSD exercício(s) 2012. Deve a execução prosseguir quanto ao(s) outro(s) exercício(s). Publique-se. Intime(m)-se. Salvador-BA, data da assinatura eletrônica. Juiz(a) de Direito, que assina digitalmente.
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Processo nº 8003782-55.2022.8.05.0271
ID: 321677370
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO LUIZ CALMON NAVARRO TEIXEIRA DA SILVA FILHO
OAB/BA XXXXXX
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SERGIO CELSO NUNES SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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DIEGO FREITAS RIBEIRO
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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Processo nº 8003782-55.2022.8.05.0271
ID: 321677376
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO LUIZ CALMON NAVARRO TEIXEIRA DA SILVA FILHO
OAB/BA XXXXXX
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SERGIO CELSO NUNES SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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DIEGO FREITAS RIBEIRO
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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Processo nº 8003782-55.2022.8.05.0271
ID: 321677380
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LAIANE DE SOUSA SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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Processo nº 8003782-55.2022.8.05.0271
ID: 321677389
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO LUIZ CALMON NAVARRO TEIXEIRA DA SILVA FILHO
OAB/BA XXXXXX
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SERGIO CELSO NUNES SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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DIEGO FREITAS RIBEIRO
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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Afonso De Jesus e outros x Andrade Galvao Engenharia Ltda e outros
ID: 331137450
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
ANTONIO LUIZ CALMON NAVARRO TEIXEIRA DA SILVA FILHO
OAB/BA XXXXXX
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SERGIO CELSO NUNES SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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DIEGO FREITAS RIBEIRO
OAB/BA XXXXXX
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LAIANE DE SOUSA SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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Afonso De Jesus e outros x Andrade Galvao Engenharia Ltda e outros
ID: 331137460
Tribunal: TJBA
Órgão: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8003782-55.2022.8.05.0271
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Advogados:
ANTONIO LUIZ CALMON NAVARRO TEIXEIRA DA SILVA FILHO
OAB/BA XXXXXX
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SERGIO CELSO NUNES SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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DIEGO FREITAS RIBEIRO
OAB/BA XXXXXX
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LAIANE DE SOUSA SANTOS
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8003782-55.2022.8.05.0271 Órgão Julgador: 2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA AUTOR: AFONSO DE JESUS Advogado(s): LAIANE DE SOUSA SANTOS registrado(a) civilmente como LAIANE DE SOUSA SANTOS (OAB:BA34756) REU: ANDRADE GALVAO ENGENHARIA LTDA e outros Advogado(s): DIEGO FREITAS RIBEIRO (OAB:BA22096), SERGIO CELSO NUNES SANTOS (OAB:BA18667) SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE URGÊNCIA, proposta por AFONSO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE VALENÇA e ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA. Acerca dos fatos, narrou o demandante em sua petição inicial, em síntese, que era proprietário de um imóvel que adquiriu com recursos próprios. Alegou a parte autora que residiu neste imóvel por cerca de 06 (seis) anos consecutivos, e que a mesma possuía o valor estimado em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Segundo a demandante, em virtude das obras realizadas pelas requeridas, ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, a mesma necessitou desocupar o seu imóvel, sob a alegação inicial de que seria indenizada posteriormente por isso. Por fim, o autor alega que em razão da perda da sua propriedade ficou sem moradia e sem a percepção de aluguel social mensal. Apresentada a fundamentação jurídica, requereu: a) deferimento de tutela de urgência para compelir a prefeitura a cadastrar o autor em programa de recebimento de aluguel social; b) concessão da gratuidade de justiça; c) procedência da ação para condenar as rés no pagamento de indenização a título de danos materiais no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) somados a condenação em danos extrapatrimoniais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais), mais custas e honorários sucumbenciais em 20% sobre o valor da causa. Juntou documentos. Este juízo, antes de decidir o pedido de tutela de urgência, determinou a manifestação das requeridas sobre o pedido em questão (Id. 271029486). Em sua CONTESTAÇÃO, a requerida ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, alegou em sede de preliminares, que é não é parte legitima a figurar na presente demanda, pois não possui nenhuma relação jurídica de direito material com a parte autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. Ainda em preliminares, pugnou pelo reconhecimento da inépcia da inicial em razão da confusão da narração fática e impertinência dos documentos juntados, bem como argumentou pela falta de interesse de agir por parte da autora em razão da ausência de relação jurídica entre as partes. Sobre os fatos, foi alegado pela requerida, em síntese que em 02 de junho de 2008, a empresa firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para a execução de serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Nesse contexto, o Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida de R$ 3.494.743,65, a ser paga em 21 parcelas. De acordo com a ré, após a celebração do acordo, a obra foi retomada. No entanto, o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive serviços anteriores ao acordo. A empresa buscou resolver a questão com o Município, mas sem sucesso. O Município de Valença procedeu com a rescisão unilateral do contrato em 13 de março de 2017, após o vencimento do prazo contratual, levando a empresa a impetrar Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. Ao fim, o Município foi obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. A partir de tais informações, alega que as pretensões movidas pela autora são de atribuição do ente municipal, responsável pelos supostos danos praticados, haja vista que a ônus da ré era tão somente entregar as obras contratadas, o que o fez. Ante ao mérito, pugnou pela inexistência de dano material de sua responsabilidade em razão de danos ocasionados por fato da administração que violou o contrato firmado e atrasou as obras. Ainda, argumentou que o município de Valença procedeu com a devida indenização a todos os moradores locais, e que o autor não fez juntada de laudo ou elementos de prova que apontem aos danos materiais. Neste mesmo sentido, pugnou pelo não reconhecimento dos danos morais. Ao fim da sua peça, a parte requereu o reconhecimento de prática de litigância de má-fé pela requerente, tendo em vista que alterou a verdade dos fatos e busca usar o processo para conseguir objetivo ilegal. Em conclusão, requereu: a) extinção do processo sem resolução do mérito pela ausência de interesse de agir e inépcia da inicial; b) extinção do processo em razão da ilegitimidade passiva; c) improcedência dos pedidos autorais; d) intimação do município de Valença para comprovar a indenização paga a autora; e) condenação da autora em multa por litigância de má-fé. Juntou documentos. Em sua CONTESTAÇÃO, o réu, MUNICÍPIO DE VALENÇA, alegou em preliminar a existência de coisa julgada, bem como alegou a prejudicial de prescrição. Após, requereu pela rejeição da tutela provisória por ausência de pressupostos. Adentrando ao mérito, argumentou a ré que a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) e a moradia da autora era precária, sem alvenaria ou saneamento básico, e sem documentação de posse ou propriedade. Alegou que por tratar-se de local de "invasão" de área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, inclusive a da parte autora, seja pela preservação ambiental, seja pela saúde dos moradores que moravam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Este foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, dentre elas a da parte autora. Sobre o projeto habitacional, declarou que este não foi realizado no local da antiga residência da autora, sendo que lá foi construído um sistema de esgoto, e que a empresa Andrade Galvão é a responsável pelo atraso das obras, não havendo que se falar em ato ilícito passível de indenização. Ainda sobre o projeto em questão, informou que as casas onde as pessoas retiradas das suas casas seriam assentadas, ficaram prontas em meados de 2014, todavia, por suposta omissão da empresa ré 131 unidades habitacionais no Bairro Novo Horizonte foram invadidas por populares, deixando de contemplar os reis legitimados inscritos no programa de habitação. Sobre estes fatos, informou em caráter complementar, que em 10 de junho de 2014 as unidades foram reintegradas. Em conclusão, assentou as teses de que não há danos a serem indenizados, tendo em vista a ausência de ato ilícito, não figurando o mero atraso de obras objeto passível de justificar o dever de indenizar. Ao final requereu o acolhimento das preliminares e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos autorais, com o pedido de litigância de má-fé. Juntou documento. Em RÉPLICA, a autora reiterou os termos da inicial e ainda, manifestou-se no sentido de afastar a ilegitimidade da empresa ré em vistas a responsabilidade solidária deduzida da relação contratual firmada entre as requeridas, justificando a sua presença na demanda. Ao final, pugnou pela procedência dos pedidos. Este juízo intimou as partes para se manifestarem sobre o interesse na produção de provas (Id. 389147396). O autor requereu a produção de prova oral na modalidade de depoimento pessoal das requeridas e oitiva de testemunhas (Id. 398828077). O réu, Município de Valença, requereu a produção de prova oral na modalidade oitiva de testemunha e produção de provas periciais recaída no imóvel da autora (Id. 392361150). O réu, Andrade Galvão Engenharia, requereu a produção de provas orais nas modalidades depoimento pessoal e oitiva de testemunhas, bem como a produção de prova pericial recaída no imóvel da autora (Id. 391627275). Este juízo deferiu a produção das provas requeridas. Realizada a perícia, foi apresentado Laudo em Id. 423092459. Foi apresentada impugnação ao laudo, havendo a devida resposta do perito nomeado (Id. 435999886). Foi juntado pelo requerido Município de Valença, dados sobre os contemplados no projeto viver melhor (Id. 430560824). Procedida com as demais providências, foi designada e realizada audiência de instrução e julgamento (Id. 454915358). Ao final, foi aberto prazo para apresentação das alegações finais. O autor não apresentou as alegações finais, conforme certidão de id. 465205390. A ré Andrade Galvão em suas alegações finais, reiterou os pedidos da contestação. Pugnou pelo afastamento da sua responsabilidade pela situação narrada nos presentes autos, bem como pelo afastamento dos pedidos autorais. A ré, Município de Valença, em suas alegações finais, reiterou os termos da contestação. Alegou que os atrasos ocorreram em razão das ações da ré Andrade Galvão, e que não foi comprovado que nenhuma das residências do conjunto habitacional seria destinada ao autor, o qual, inclusive, não demonstrou que residia no local onde ocorreram as obras. Assim, requereu a improcedência dos pedidos autorais. Eis o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO. Como tido no relatório da presente decisão, trata-se de ação com objetivo central de verificar potencial prática de ato ilícito por parte das requeridas, ensejando no dever de indenizar. Segundo a exordial, o ato ilícito praticado pelas requeridas seria a desocupação do imóvel somada a ausência da devida contraprestação, que por consequência trouxe danos de natureza material e moral a parte demandante. Antes de adentrar ao mérito, passo a analisar as preliminares. A ré Andrade Galvão Engenharia, arguiu três preliminares: inépcia da inicial, ausência de interesse de agir e ilegitimidade passiva. A ré Município de Valença, por sua vez, a título de matéria preliminar, arguiu coisa julgada e, em matéria prejudicial, a prescrição. Analisando a preliminar de inépcia da inicial, tem-se que para fundamentar o requerimento, os réus limitaram-se a alegar que haveria uma confusão da narração fática e impertinência documental no requerimento autoral. O autor se defendeu afirmando a regularidade do seu pleito inicial, pugnando pela rejeição da tese preliminar. Nos termos do artigo 330, §1° do Código de Processo Civil, considera-se inepta uma petição inicial quando: I) lhe faltar pedido ou causa de pedir; II) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV) contiver pedidos incompatíveis entre si. A título didático, tem-se que uma inicial inepta, segundo a doutrina, é aquela que possui defeitos vinculados a causa de pedir e ao pedido que dificultam e impedem o julgamento do mérito da causa, tendo em vista evidentes vícios na identificação e formulação dos elementos da demanda (DIDIER, 2015). Em análise a petição inicial, este juízo não vislumbra os vícios que caracterizam a inépcia. A partir da leitura da exordial é possível delimitar os pedidos certos - pleito indenizatório -, e a causa de pedir - suposto ilícito praticado pelas rés. Mais além, não verifico narração ilógica dos fatos ou incompatibilidade dos requerimentos, de tal modo que não merece prosperar a tese arguida pelas requeridas. Neste sentido, rejeito a tese de inépcia da inicial tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese preliminar de ausência de interesse de agir, observo que a ré Andrade Galvão Engenharia, fundamentou seu requerimento em suposta ausência de relação jurídica material entre as partes que justificasse a propositura da ação. O autor se contrapôs a tal requerimento, alegando que haveria uma relação de solidariedade entre as rés, justificando o interesse em demandar contra ambas. Nos termos do artigo 17 do Código de Processo Civil, o interesse é configurado como uma das condições da ação. Nos termos doutrinários a ideia de interesse de agir, também conhecido como interesse processual, está relacionada à utilidade da prestação jurisdicional buscada por meio da ação judicial. O autor deve demonstrar que a decisão judicial pretendida trará uma melhora em sua situação, justificando assim os recursos gastos pelo Poder Judiciário na resolução do caso (NEVES, 2018). In casu, é evidente o interesse de agir do autor, tendo em vista que buscou o Poder Judiciário para obter reparação a seus direitos supostamente lesados pelas partes. A argumentação da ré no sentido de ausência de relação jurídica material entre esta e o autor descabe para fins de configuração de interesse processual. Neste sentido, rejeito a tese de ausência de interesse de agir tendo em vista o seu não cabimento. Analisando a tese de ilegitimidade passiva arguida pela ré Andrade Galvão Engenharia, tem-se que a argumentação principal foi no sentido de inexistir relação jurídica de direito material entre esta e a autora, tendo em vista que celebrou contrato de obras com o Município de Valença sem a existência de responsabilidade por indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social. O autor contrapôs tal tese pugnando pelo reconhecimento da solidariedade entre as rés. Sobre a questão da legitimidade, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que "para que se caracterize a legitimidade das partes, é necessário que elas sejam sujeitos da relação jurídica de direito material"1. Em desdobramento de tal entendimento, encontra-se em alguns julgados afirmações no sentido de que: A relação jurídica processual deve ser composta pelas mesmas partes que compõem a relação jurídica de direito material que originou a lide. Sendo assim, autor e réu devem ter uma relação jurídica de direito material que os una para que sejam partes legítimas para integrarem a relação jurídica processual2. Na presente situação sub judice, denota-se que de fato, não há uma relação jurídica material entre a ré Andrade Galvão Engenharia e a parte autora, mas tão somente entre a parte autora e a ré Município de Valença, pelas razões que se passa a expor. A título de contexto, sem prejuízo da análise do mérito, as obras realizadas na localidade onde se encontrava o imóvel da autora são ligadas ao Projeto de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2ª Etapa, no Município de Valença-BA, de responsabilidade do ente municipal. Nesse sentido, tem-se que há duas relações jurídicas paralelas. A primeira entre o Município de Valença e a ré Andrade Galvão Engenharia, e a segunda entre o Município de Valença e a parte autora. Em ID. 364487059 consta documentações relativas ao processo de N° 1004150-40.2017.4.01.3300. Na aludida documentação, consta o contrato de concorrência pública 007/2008 firmados entre a Prefeitura de Valença e a Andrade Galvão Engenharia para fins de contratação de empresa do ramo da construção civil para execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia. Na aludida contratação entre as partes não consta nenhuma cláusula relativa a responsabilidade da empresa contratada em relação a indenização, desapropriação ou pagamento de aluguel social, mas tão somente a execução das obras. Sobre tal tema, inclusive, no laudo pericial acostado aos autos, o profissional atestou que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Sabe-se que nos termos das normas de licitação, caso o ente público contratante entenda que é de responsabilidade da contratada proceder com desocupações/desapropriações, deve consignar tal dever em edital de convocação (art. 25, §5°, inciso II, da Lei 14.133/2021) e no contrato firmado entre as partes. Nestes termos, documentalmente, não há relação jurídica material que ligue a ré Andrade Galvão aos fatos narrados pela autora, haja vista que operou nos termos do contrato firmado com o ente municipal, cujo teor não aponta responsabilidades da empresa contratada nos termos dos requerimentos autorais. Por outro lado, é evidente a relação jurídica deduzida entre o autor e o Município de Valença, que pode ser demonstrada, em primeiro momento, a partir do Termo de Autorização e Ciência (Id. id 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. Ainda é necessário pontuar que descabe, na situação em análise, potencial solidariedade entre as partes. Nos termos do artigo 265 do Código Civil, "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes". Como já pontuado, não há previsão contratual no sentido de atribuir a responsabilidade da ré Andrade Galvão por potenciais indenizações em razão de desocupações, sendo está uma incumbência - na ausência de previsão contratual -, do ente municipal, que inclusive, foi responsável pela confecção do termo de ciência das desocupações, pagamento de aluguéis sociais e inclusão dos desalojados em programa de construção de unidades habitacionais. Assim, não há que se falar na existência de relação jurídica de direito material entre a autora e a ré Andrade Galvão Engenharia, haja vista que a empresa atuou nos termos do contrato firmado junto a ré Município de Valença, a qual, nos termos da análise dos autos, possui a relação jurídica de direito material e responsabilidade junto a autora, sendo, portanto, a única legitimada a figurar na presente demanda. Nestes termos, acolho a preliminar de ilegitimidade passiva da ré ANDRADE GALVÃO ENGENHARIA LTDA, determinando a sua exclusão do presente processo. Passo a analisar a preliminar de coisa julgada. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou a existência de coisa julgada, alegando que o autor ingressou com o processo anterior, de nº 0501042-48.2018.8.05.0271 neste juízo. Alegou a existência de sentença e certidão de trânsito em julgado nos autos do processo retromencionado. Ocorre que, em análise aos autos do referido processo, bem como em sentença anexada em id. 379839657, este fora extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, I do CPC. Assim, uma vez em que não houve análise de mérito da demanda, não há que se falar em coisa julgada material, nada obstando a repropositura da ação. Nestes termos, rejeito a preliminar de coisa julgada. Passo a apreciar a tese de prescrição. Em sua contestação, a ré Município de Valença alegou que a pretensão autoral encontra-se fulminada pela prescrição. Argumentou que os fatos ocorreram antes de 2015, e que, seja considerando o prazo prescricional de 3 anos para pretensão indenizatória nos termos do Código Civil, ou seja considerando o prazo de 5 anos para a ajuizamento de ações contra a Fazenda Pública, houve a prescrição no caso concreto. Em leitura dos autos, verifico que a tese não merece prosperar. As pretensões movidas em face da fazenda pública prescrevem em 5 anos nos termos do 20.910/1932. Em regra, a contagem do prazo ocorre de forma objetiva, ou seja, a partir do evento danoso. Todavia, diante de circunstâncias ligadas ao caso concreto, segundo entendimento do STJ, pode-se analisar o prazo prescricional segundo a actio nata em seu viés subjetivo, ou seja, o início da contagem do prazo de prescrição ocorre quando o titular tem o conhecimento da lesão do seu direito. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO ADMINISTRADOR. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA ACTIO NATA EM SUA VERTENTE SUBJETIVA. PECULIARIDADE DO CASO CONCRETO. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA NA ORIGEM. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O STJ adota como regra para o cômputo da prescrição a teoria da actio nata em sua vertente objetiva, considerando a data da efetiva violação ao direito como marco inicial para a contagem. 2. Em situações excepcionais em que demonstrada a inviabilidade de conhecimento dos demais sócios acerca da gestão fraudulenta da sociedade pelo administrador, a regra do art. 189 do CC, assume viés humanizado e voltado aos interesses sociais, admitindo-se como marco inicial não mais o momento da ocorrência da violação do direito, mas a data do conhecimento do ato ou fato do qual decorre o direito de agir. 3. A aplicação da teoria da actio nata em sua vertente subjetiva admite a fluência do prazo prescricional a partir do conhecimento da violação da lesão ao direito subjetivo pelo seu titular e não da violação isoladamente considerada. 4. Identificado que a aplicação da actio nata para fundamentar o termo inicial do prazo prescricional no caso concreto baseou-se em premissa fático-probatória acostada aos autos, sobretudo quanto à vulnerabilidade da publicidade dos atos de administração, sua revisão nesta instância extraordinária encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. 5. A incidência da Súmula n. 7 do STJ quanto à interposição pela alínea a do permissivo constitucional impede o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial sobre a mesma questão. 6. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1494347 SP 2013/0350975-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 10/09/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2024) Na situação em epígrafe, as circunstâncias do caso concreto direcionam o juízo a analisar o prazo prescricional segundo a actio nata subjetiva. Conforme consta no relatório, a autora foi retirada da sua propriedade com a promessa de que receberia uma nova residência em local diverso, mas, não foi estabelecido um termo final por parte do ente público para a entrega das moradias, logo, não houve o estabelecimento de um prazo certo para entrega do direito do autor. Nos termos da inicial e demais documentações, considerando a mora do ente público, os atrasos nas obras e a invasão das moradias prometidas por terceiros estranhos, o autor, junto com outros demandantes, sentiram-se lesados nos seus direitos e acionaram o judiciário. Nessa intelecção, o acionamento do judiciário se deu a partir do conhecimento da lesão dos direitos do autor, logo, devida a aplicação da ação subjetiva para afastar as teses suscitadas pelo réu. Considerando o quanto exposto, entendo que a ação foi movida tempestivamente, e assim, afasto a tese de prescrição. Superadas as preliminares e prejudiciais, passo ao mérito. O objeto de mérito central da ação é o seu pleito indenizatório em razão da desocupação do imóvel de titularidade da autora, localizado na Av. Brasil, s/n, Bairro da Bolívia, Valença-BA, com dimensão total de 52,30m² (Id. 240795655), em razão da execução dos serviços de urbanização da Comunidade do Porto dos Milagres; de urbanização da área de entorno da Comunidade de Porto dos Milagres no Bairro da Bolívia e de ampliação do Loteamento Novo Horizonte - 2° Etapa, no Município de Valença, Bahia, diante do não cumprimento, até a presente data, de qualquer contraprestação por parte do ente municipal. De início, infere-se que o autor, junto de sua petição inicial, fez prova da titularidade do seu imóvel, ao juntar o Termo de Autorização e Ciência (Id. 240795655), no qual o demandante autoriza e toma ciência de que o terreno de sua titularidade será destinado a obras do PTTS Viver Melhor na Bolívia, comprometendo-se a não executar obras particulares na área, que pelo aludido instrumento passaram a ser geridas pelo município. De acordo com o próprio ente municipal, ora parte ré, a demolição ocorreu em uma área de preservação permanente (manguezal) - sem a devida comprovação - onde a moradia da autora era precária, sem alvenaria, saneamento básico ou documentação de posse. Foi alegado que, por tratar-se de uma invasão em área de manguezal, era necessária a remoção das habitações irregulares, incluindo a da autora, tanto para a preservação ambiental quanto para a saúde dos moradores que viviam em palafitas, sem qualquer saneamento básico. Esse foi o motivo da remoção de dezenas de habitações precárias, incluindo a do autor. Pois bem. O ato praticado pelo réu, qual seja a desocupação de imóveis para execução de programa de obras de urbanização, é condizente com o seu dever constitucional em "promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico" (Art. 23, inciso IX, CFRB/88). De acordo com o réu, na situação sub judice, a localização do imóvel da autora - e de muitos outros -, era irregular, em suposta área de preservação ambiental, marcada pela informalidade e ausência de documentos de posse e propriedade, justificando, para finalidades de saneamento básico e análogas, a desocupação para obras de requalificação urbana. Para cumprir com tais finalidades, foi aberto processo licitatório, havendo por vencedora a empresa Andrade Galvão, sendo a responsável pela consecução das obras em questão. Por outro lado, denota-se que a responsabilidade pela desocupação dos imóveis ficou a cargo do ente municipal, o que pode ser comprovado pelo termo de adesão já mencionado nestes autos de evidente autoria do Município de Valença. Importante pontuar que no aludido termo não consta qualquer informação sobre a destinação dos moradores, ou sequer uma promessa de indenização ou contraprestação, sendo apurado durante a instrução processual que de forma não documentada o município se predispôs a proceder com o realojamento das famílias desalojadas em novas unidades habitacionais que seriam construídas no Bairro Novo Horizonte, que pode ser confirmado a partir da lista de contemplados do projeto viver melhor (ID. 430560824). Em primeira análise, pode parecer verossímil a tese da ré de que não houve ato ilícito nas suas condutas, eis que amparadas por justificativas de potencial interesse público. Todavia, durante o curso da instrução foram constatadas pelo juízo um rol de ilicitudes e práticas de quebra de confiança que ocasionaram no agravamento de vulnerabilidades de uma população reconhecidamente carente do município de Valença, bem como irregularidades diametralmente desviantes das normas que regem obras e construções públicas tal como se passa a expor. De início é de conhecimento público da localidade, que parte do Bairro da Bolívia, na cidade de Valença-Bahia, é ocupada por pessoas economicamente vulneráveis em residências simples - muitas delas com estruturação precária -, em proximidade relativa com áreas de manguezais ou terrenos baldios. Nesse mesmo sentido foi o posicionamento do ente municipal que entendeu que tais irregularidades justificariam a obra realizada. Contudo, a tese de que os residentes não possuíam documento de comprovação das suas residências não procede, conforme próprio documento municipal reconhecendo que os moradores - como o autor - possuíam um imóvel na localidade (termo de autorização Id. 240795655). Neste mesmo sentido, o laudo pericial (Id. 423092459), constata que a partir da avaliação do Termo de Autorização e Ciência apresentado, emitido pela Secretaria de Promoção Social e assinado pela autora, restou evidenciado o reconhecimento por parte do município, da existência da posse do imóvel. Assim, tem-se que, apesar de serem residências carentes e em área de evidente vulnerabilidade social, muitos moradores gozaram de documentação que comprovou a aquisição onerosa e devida posse e titularidade dos imóveis que foram desocupados pelo ente municipal. Logo, descabe a tese do réu de que os imóveis não possuíam documentação de posse/propriedade. Neste caso, sendo evidenciada a posse e/ou propriedade da autora - e dos demais moradores -, é necessário que seja imposto o dever de proteção constitucional ao seu direito, que somente é mitigado face a função social da propriedade (Art. 5°, inciso XXIII, CFRB/88), qual, in casu, se materializa na necessidade de realização das obras públicas. Sabe-se que, caso um ente público considere mitigar o direito de propriedade em razão de justificativas de interesse público - como é o caso -, ele encontrará amparo legal na própria Carta Magna. Na situação em análise, o ente municipal identificou que muitas residências deveriam ser desocupadas para que fosse realizada uma obra pública de requalificação. Todavia, ao longo da instrução, não foram apresentadas documentações ou elementos indiciários que apontassem um devido planejamento legal para a desocupação/desapropriação das casas nos termos, seja da lei de desapropriação ou seja na lei de licitações. A título meramente didático, nos termos do Decreto Lei 3.365/41, construções como a intentada pelo município são qualificadas como de utilidade pública. Nessa situação, a norma de regência determina a desapropriação, seja pelo próprio ente ou seja pelo concessionário de serviço/obra pública devidamente autorizado. Todavia, tais previsões não foram observadas na presente situação, haja vista que não foram intentados procedimentos de desapropriação/desocupação pelo município e nem atribuída tal responsabilidade a empresa contratada, como demonstra tanto em leitura do contrato firmado pelo município com a tomadora de serviços, quanto em leitura do laudo pericial, apontando que não foram encontrados documentos que atribuam a Andrade Galvão a responsabilidade de pagamentos de Aluguéis Sociais, Indenizações, Desapropriações e demais assuntos citados. Nestes termos, seria juridicamente viável a existência de procedimentos desta natureza, haja vista a segurança jurídica para todas as partes, seja para garantir a efetiva destinação do imóvel para fins de interesse público, ou seja, para assegurar a devida indenização - direta ou indireta -, por parte dos desapropriados ou desocupados dos seus bens - o que não foi observado na presente situação. Durante a audiência de instrução e julgamento e considerando a multiplicidade de casos sobre a mesma situação fática, restou evidenciado que o município - ainda que de forma distinta das previsões legais -, havia se comprometido a, em ato seguinte a desocupação, proceder com o cadastramento dos desalojados para receberem unidades habitacionais a serem construídas e que, durante tal a construção, seriam pagos aluguéis sociais aos que necessitassem. Não obstante não tenha sido apresentado documento formal apontando um devido planejamento de realocação dos habitantes desalojados de suas residências, bem como planos de aluguéis sociais, consta uma lista de contemplados a residências no Bairro do Novo Horizonte, Valença-Bahia, dentre os quais, aqueles residentes no Bairro da Bolívia conforme documento em Id. 430560824, indicando que houve, ainda que informalmente, uma promessa de contraprestação para aqueles que foram desocupados das suas propriedades. Todavia, apesar de não ter sido estabelecido um prazo formal para a entrega das residências, denota-se que, desde a desocupação até o momento da prolação da presente decisão decorreram mais de 12 anos sem que houvesse a entrega das unidades habitacionais prometidas. Durante este período a autora, junto com inúmeros outros moradores, se encontram sem casa, indenização ou qualquer outro tipo de contraprestação, residindo, muitos deles, em casas alugadas as custas de aluguéis sociais - muitos dos quais implementados por decisões judiciais - em residências marcadas pela sua falta de estrutura e precariedade. Segundo o ente municipal, não há ilícito praticado na situação em análise tendo em vista que o mero atraso de obras desta natureza não enseja o dever de indenizar, bem como as intercorrências são atribuídas a empresa prestadora de serviços de construção. A título de menção, a aludida obra pública é eivada de intercorrências entre o Município contratante e a empresa contratada. Unicamente a título de menção, nos termos do que consta aos autos, em 2 de junho de 2008, a empresa Andrade Galvão firmou o Contrato nº 395/2008 com o Município de Valença para serviços de urbanização, parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O Município atrasou os repasses financeiros, levando a empresa a continuar os serviços sem pagamento. Após atraso superior a 90 dias, a empresa ingressou com Ação Cautelar, resultando em acordo judicial reconhecendo a dívida. Após a celebração do acordo, a obra foi retomada, mas o Município voltou a atrasar os pagamentos, inclusive de serviços anteriores ao acordo. A empresa tentou resolver a questão com o Município, sem sucesso. Em 13 de março de 2017, o Município rescindiu unilateralmente o contrato após o vencimento do prazo contratual. A empresa impetrou Mandado de Segurança, conseguindo a suspensão da rescisão. O Município foi então obrigado a receber a obra no estado em que se encontrava, conforme liminar concedida pelo juízo. Tais informações foram corroboradas pelo laudo pericial acostado em juízo, bem como consta em ID. 364487061, cópia de decisão liminar prolatada nos autos 0501168-35.2017.8.05.0271, determinando que o Município receba a obra objeto do Contrato nº 395/2008 no estado em que ela se encontra, devendo recebê-la lavrando-se o necessário termo de recebimento. Em documentação Id. 364486448 consta o termo de entrega da obra entre a empresa Andrade Galvão e o Município de Valença, datada em 04 de agosto de 2017. Ou seja, a obra em si demorou cerca de 5 anos para ficar pronta, sendo a obra entregue desde o ano de 2017, todavia, até o presente momento, a autora - e outros moradores da região desocupada -, não receberam as unidades habitacionais, encontrando-se em situação de vulnerabilidade social e sem qualquer contraprestação pelos danos sofridos a título da perda de suas propriedades. Além disto, denota-se que as unidades habitacionais que, em tese, seriam destinadas aos moradores da região desocupada, nos termos do laudo pericial juntado aos autos, encontram-se ocupadas por invasores de forma irregular, sem adoção de quaisquer medidas para proceder com a entrega das unidades habitacionais a quem de direito. Diante de todos estes fatos analisados, se torna evidente a prática de ilícitos e irregularidades por parte do réu que trouxeram danos a parte autora, justificando o dever de indenizar. É evidente que, em razão de práticas atribuídas ao ente municipal - ora réu -, a autora teve fragilizada a sua dignidade enquanto pessoa humana, em decorrência da perda de sua propriedade sem devida indenização ou contraprestação, vulnerando sobremaneira o seu direito fundamental a moradia, com danos nas esferas patrimoniais - condizentes ao valor do imóvel perdido - e morais - decurso de mais de uma década sem residência e residindo na casa de terceiros ou por meio de aluguel social. Como reiterado no curso da presente decisão, foi determinada desocupação de imóvel em detrimento as disposições da lei de desapropriação e lei de licitações, havendo uma promessa de permuta entre residências não cumprida. É evidente que houve lesão ao direito de propriedade do autor, ensejando o dever de indenização por parte do ente público, sob pena de figurar hipótese de enriquecimento sem causa. A título de analogia, a situação analisada se assemelha bastante com os institutos da desapropriação indireta e apossamento administrativo, sendo ambas situações fatos administrativos pelos quais o Estado se apropria de bem particular, sem observância dos requisitos da declaração e da indenização prévia (FILHO, 2020). Em situações desta natureza, os titulares lesados fazem jus ao direito de indenização. Neste sentido se posiciona o TJBA: PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA . ACORDÃO APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, REJEITADA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 35, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41. INDENIZAÇÃO. ART. 26 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. ANULAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL PARA APLICAÇÃO DO VALOR PACTUADO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR CONTEMPORÂNEO À AVALIAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Salvador em face da sentença proferida pelo M .M. Juiz de Direito da 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador/BA, nos autos da Ação indenizatória por Desapropriação Indireta com Pedido Liminar tombada sob 8033383-48.2019.8.05.0001, julgou procedente o pleito autoral e declarou expropriado o bem imóvel descrito na exordial. A desapropriação indireta ocorre quando o Estado se apropria de bem particular sem que haja essa declaração de utilidade pública e sem oferta de indenização prévia. O artigo 35, do Decreto-lei nº 3.365/41, dispõe: "Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reinvidicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos. No que tange ao pleito de anulação da perícia judicial para constar à título de indenização o valor pactuado em R$ 707.000,00 (setecentos e sete mil reais), ratificado para R$827.456,00 e (oitocentos e vinte e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis reais) , razão não assiste ao apelante, em que pese o acordo firmado, entretanto, o próprio recorrente não deu cumprimento o acordado, de forma que deu azo ao ajuizamento do pleito indenizatório, em razão de sua inadimplência. Outrossim, o artigo. 26 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, prevê que o valor da indenização, em caso de desapropriação, é contemporâneo à avaliação e não ao valor do bem à época da desapropriação ou de acordo firmado. Art. 26: No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível nº 8033383-48.2019.8.05.0001, de Salvador/BA, apelante MUNICÍPIO DE SALVADOR, apelada PIATÃ EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO ao apelo, nos termos do voto da Relatora. (TJ-BA - APL: 80333834820198050001 6ª V DA FAZENDA PÚBLICA DE SALVADOR, Relator: MARIA DE FATIMA SILVA CARVALHO, SEGUNDA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 02/02/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL. DESTINAÇÃO PÚBLICA. INDENIZAÇÃO. VIA ORDINÁRIA. I - O ato de desapropriação consiste na possibilidade de o Poder Público, fundado em interesse público, despojar, compulsoriamente, indivíduo de bem particular, mediante pagamento de indenização prévia, justa e, em regra, em dinheiro. II - A imissão do Poder Público na posse do bem expropriado, antes do pagamento da referida indenização, configura a desapropriação indireta, cabendo ao particular às vias judiciais para o recebimento do quantum correlato. III - Evidenciado que no curso da ação de interdito proibitório foi concluída a obra no interesse da coletividade, sendo o bem integrado ao domínio público, deve o proprietário do bem desapropriado indiretamente utilizar a via ordinária para a obtenção da indenização correlata. RECURSO NÃO PROVIDO (TJ-BA - APL: 05708329520148050001, Relator: HELOISA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI, QUARTA CAMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/02/2020) A menção aos institutos da desapropriação indireta e desapossamento administrativo são importantes para destacar que todas as vezes que o Estado utilizar do seu poder para proceder com a tomada da propriedade de sujeitos de direitos fora dos padrões determinados em lei, praticará ato ilícito passível de indenização. Na situação exposta é evidente que houve um ato de retirada da propriedade a margem de previsões legais, sem indenização prévia, com base em uma permuta de imóveis sem previsão contratual expressa, de tal forma que é evidenciado ato irregular e ilícito do Estado passível de reparação. É importante que se frise que, na situação fática, foram violados os direitos de propriedade e moradia, em verdadeira quebra de confiança por parte do Estado para com a autora. Assim, nos termos do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilícito, e aquele que comete ato ilícito e causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo (art. 186 e 927, ambos do Código Civil). In casu, considerando que se trata de entidade da Administração Direta, qual seja o município, a sua responsabilidade por danos é objetiva nos termos do artigo 37, §6° da CFRB/88, dispensando comprovação de dolo ou culpa. Contudo, unicamente a título de argumentação, descabe a tese da ré de que o atraso das obras são atribuídos a empresa contratada, haja vista o fato incontestável que os atrasos foram imputados a ausência de repasse de verbas por parte do município, elemento este inclusive reconhecido por meio de laudo pericial, processo instaurado e provas documentais. Ainda, descabe a tese de ausência de entrega das residências também por culpa da empresa contratada, pois, desde o ano de 2017 a obra foi entregue e até a presente data não foram entregues as unidades habitacionais prometidas ou algum tipo de indenização, não cabendo alegar que as unidades estão invadidas, pois, havendo ciência de tamanha ilicitude, o réu poderia e deveria ter adotado as medidas necessárias para proceder com a regularização da situação. Ainda é crível que se pontue que, apesar de não haver uma estipulação de prazo para entrega das unidades supostamente permutadas - haja vista ausência de termo nesse sentido, restando tão somente elementos indiciários -, não se mostra razoável o transcurso de mais de 12 anos para a entrega de unidades habitacionais, prazo este excessivo e em descompasso com sua potencial finalidade indenizatória. Além disto, é irrazoável prolongar o cumprimento de tal determinação ad eternum, haja vista que, a uma, a autora segue sem seu imóvel ou indenização, e a duas, o ente municipal segue custeando aluguéis sociais a todas as pessoas que foram desalojadas e não receberam seus imóveis. Nestes termos, configurado o ilícito, passo a apreciar os requerimentos de indenização a título de danos materiais e morais. Como visto nos autos, a parte autora vem a juízo requerer a indenização material ligada a potencial indenização pelo seu imóvel entregue ao município, cujo valor, nos termos da inicial seria de aproximadamente em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). O dano material é decorrente de um dever de indenizar, pautado em pressupostos estabelecidos em lei. Segundo a obra de Tartuce (2020), em vistas ao quanto estabelecido em lei, os quatro pressupostos para elencar o dever de indenizar são: 1) conduta; 2) culpa; 3) nexo de causalidade; 4) dano. Importante novamente salientar que por expressa previsão legal, ao se tratar de entidade da administração pública o elemento culpa é dispensado, em razão da responsabilidade objetiva derivada da Teoria do Risco Administrativo. Nesse sentido é a previsão do artigo 37, §6° da Constituição Federal e Artigo 43 do Código Civil. Na situação em análise é evidente a conduta - retirada de propriedade sem contraprestação e regularidade legal -, o nexo de causalidade, sendo dispensada a culpa. Assim, do ponto de vista procedimental, verifica-se que a parte autora conseguiu apresentar fatos constitutivos do seu direito, ao passo que o réu não logrou êxito em apresentar fatos impeditivos, modificativos ou extintivos das pretensões autorais (Art. 373 do CPC), configurando então os elementos autorizadores da configuração da responsabilidade e dever de indenizar. No que tange a quantificação do dano, o autor arbitrou o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) sem apresentação de lastro documental que embase a quantificação deste dano. Todavia, em leitura do laudo pericial acostado aos autos, o perito, considerando as características do imóvel conforme fotografias apresentadas nos autos, com área total informada no Termo de Ciência de 52,30m² e com base em pesquisa realizada sobre terrenos e casas à venda na região deste objeto, calcula-se o valor atualizado do terreno e sua construção em R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais), servindo, portanto, para a devida quantificação do dano. Deste modo, ao caso estão preenchidos os elementos caracterizadores de dano material, motivo pelo qual reconheço o dever de indenização em razão de danos materiais no valor quantificado pelo perito. Sobre os danos morais, tem-se que o autor formulou sua pretensão alegando que em razão da perda do seu imóvel passou anos morando em casas de terceiros, sem devido auxílio por parte do ente municipal, o que lhe ocasionou danos na esfera de personalidade, haja vista o sofrimento e estresse emocional em razão da perda de seus bens e agravamento de situação de vulnerabilidade social. Em relação ao dano moral, cumpre esclarecer que não há neste instituto, uma finalidade de acréscimo patrimonial para a vítima, mas sim de compensação pelos males suportados. O grau de culpa do ofensor ou a sua eventual conduta intencional deve ser levado em conta pelo juiz para a quantificação do dano moral (Enunciado n. 458). Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos para a configuração do dano moral a saber: a) existência de uma ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade. Deve ficar claro que para a caracterização do dano moral não há obrigatoriedade da presença de sentimentos humanos negativos, conforme enunciado aprovado na V Jornada de Direito Civil: "o dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou sofrimento". Já os bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito constitucional subjetivo - essência de todos os direitos personalíssimos -, e é o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral.3 Nesse contexto, "sempre que demonstrada a ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, dispensa-se a comprovação de dor e sofrimento para configuração de dano moral". Segundo doutrina e jurisprudência do STJ, onde se vislumbra a violação de um direito fundamental, assim eleito pela Constituição Federal, também se alcançará, por consequência, uma inevitável violação da dignidade do ser humano. A compensação nesse caso independe da demonstração da dor, traduzindo-se, pois, em consequência in re ipsa, intrínseca à própria conduta que injustamente atinja a dignidade do ser humano. Aliás, cumpre ressaltar que essas sensações (dor e sofrimento), que costumeiramente estão atreladas à experiência das vítimas de danos morais, não se traduzem no próprio dano, mas têm nele sua causa direta".4 Na situação em análise é evidente a ocorrência dos danos morais, tendo em vista que o autor foi retirado de imóvel da sua propriedade, com uma promessa não cumprida de permuta de imóveis a titulo de indenização, havendo o decurso de 12 anos sem resposta ou contraprestação por parte do réu, em evidente quebra de confiança, lesão ao direito de propriedade, fragilidade do direito a moradia e violação a dignidade da pessoa humana, que justificam o dever de indenização a titulo de danos morais. Uma vez verificada a presença do dano moral, é momento de atribuir a devida quantificação da referida indenização. O magistrado, ao quantificar o dano moral, deve considerar as circunstâncias do caso e agir com a devida proporcionalidade considerando tanto o caráter ressarcitório, quanto o pedagógico da referida medida. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.5 Assim, verifica-se que o valor requerido pela parte autora exorbita a proporcionalidade. Ainda que presentes os requisitos autorizadores da medida, o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) não parece cabível ao presente caso, ainda quando considerados os danos acarretados para a sua vida, pois caso deferido o pedido, se estaria diante de potencial enriquecimento indevido, razão pela qual este magistrado alterará o valor a ser pago, razão pela qual entendo pela redução do montante para o quantum de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais). DISPOSITIVO. Ante ao exposto, defiro a preliminar arguida pelo réu Andrade Galvão Engenharia, reconhecendo a sua ilegitimidade passiva com consequente exclusão do presente processo, bem como JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ARTIGO 487, INCISO I, DO CPC, para condenar o réu MUNICÍPIO DE VALENÇA: a) pagar indenização a titulo de danos materiais condizentes ao valor do imóvel desocupado nos termos do laudo pericial no valor de R$ 5.230,00 (cinco mil duzentos e trinta reais); b) pagar indenização a titulo de danos morais no valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais); c) proceder ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% sobre o valor da condenação. Consigno que por se tratar de condenação imposta à Fazenda Pública, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional 113/2021, o cálculo dos juros de mora e da correção monetária incidirá, uma única vez, até o efetivo pagamento, pelo índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, acumulado mensalmente. Ainda registre-se que, relativamente à indenização concedida por danos morais, o termo inicial para incidência dos juros de mora é a data do evento danoso, em aplicação à Súmula 54 do STJ. Já a correção monetária deve incidir desde a data do julgamento em que a indenização foi arbitrada, de acordo com a súmula 362 do STJ Considerando as situações fáticas que norteiam a presente ação, ainda determino o que se segue: 1. No caso de pagamento de aluguel social, deve o mesmo ser mantido até que haja o efetivo trânsito em julgado da presente decisão ou cumprimento da sentença; 2. Caso as partes, em cooperação e prezando pela autocomposição, entendam que o cumprimento da decisão pode ser substituído por obrigação de fazer pautada na entrega da unidade habitacional objeto da suposta permuta ao invés ou em redução a indenização material, manifestem-se em juízo na fase de cumprimento de sentença. Transitada em julgado a presente decisão, certifique-se e após promova-se a baixa e arquivamento caso necessários. Vistas ao MP para que tenha ciência da presente decisão. Intime-se as partes. P.R.I.C 1 STJ - AgInt no REsp: 1617147 TO 2016/0199197-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 04/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/09/2023. 2 (TJ-MG - Apelação Cível: 5016954-92.2021.8.13.0024, Relator: Des.(a) Baeta Neves, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024). 3 (STJ, REsp 1.245.550/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 17.03.2015, DJe 16.04.2015) 4 (REsp 1.292.141/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 04.12.2012, publicado no seu Informativo n. 513). 5 STJ - REsp: 318379 MG 2001/0044434-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 20/09/2001, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04.02.2002 VALENÇA/BA, data da assinatura eletrônica. Leonardo Rulian Custódio Juiz de Direito
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