Processo nº 3005225-36.2025.8.06.0064
ID: 332812520
Tribunal: TJCE
Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 3005225-36.2025.8.06.0064
Data de Disponibilização:
23/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEX VENANCIO MACHADO
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Caucaia 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia Rua Sérvulo Braga Moreira, s/n, Novo Pabussu - CEP 61600-272, Fone: (85) 3108-1607, Caucaia-CE - E-mai…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Caucaia 3ª Vara Cível da Comarca de Caucaia Rua Sérvulo Braga Moreira, s/n, Novo Pabussu - CEP 61600-272, Fone: (85) 3108-1607, Caucaia-CE - E-mail: caucaia.3civel@tjce.jus.br PROCESSO nº. 3005225-36.2025.8.06.0064 CLASSE - ASSUNTO: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) - [Indenização por Dano Material, Empréstimo consignado, Análise de Crédito] PROCESSO(S) EM APENSO: [] AUTOR: CAMILA GONCALVES PAIVA REU: ITAU UNIBANCO S.A., PICPAY SERVICOS S.A, NU PAGAMENTOS S.A., RECARGAPAY DO BRASIL SERVICOS DE INFORMATICA LTDA DECISÃO Visto em inspeção. Trata-se de Ação de Indenização por Danos Materiais e Morais com Pedido de Tutela Provisória de Urgência, ajuizada por CAMILA GONÇALVES PAIVA em desfavor de ITAU UNIBANCO S.A., PICPAY INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO S/A, NU PAGAMENTOS S.A. e RECARGAPAY INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA, todos devidamente qualificados nos autos. A parte autora, em sua petição inicial (ID 160071381), narra, em síntese, ter sido vítima de um elaborado esquema fraudulento perpetrado por terceiros que se passaram por prepostos de instituições financeiras. Relata que, em 25 de fevereiro de 2025, por volta das 16 horas, recebeu uma ligação telefônica do número (11) 96264-4410, na qual um indivíduo que se identificou como "Carlos", suposto atendente do Banco Nubank, a informou sobre um empréstimo no valor de R$ 3.000,00 que teria sido contratado em sua conta bancária, operação que a autora prontamente negou ter solicitado. Sob o pretexto de adotar "protocolos de segurança" para resguardar sua conta, o suposto atendente a instruiu a aguardar um novo contato por meio do aplicativo WhatsApp, o que ocorreu momentos depois, originado do mesmo número telefônico, com uma mensagem que indicava estar em atendimento com um "especialista do Nubank". Aduz a autora que, acreditando tratar-se de um procedimento legítimo, seguiu as instruções apresentadas, iniciando-se, então, uma série de exigências que resultaram em significativos prejuízos financeiros. O indivíduo "Carlos" a teria instruído a realizar diversas transações financeiras, incluindo a conversão do limite do cartão de crédito em saldo disponível, a contratação de novos empréstimos, a realização de compras na função débito, a utilização de cheque especial e a efetivação de múltiplas transferências via PIX para contas de supostos gerentes bancários. Todas essas operações, segundo a narrativa, eram justificadas como medidas de segurança, com a promessa de que os valores seriam integralmente restituídos ao término do procedimento, sendo a autora reiteradamente advertida de que, caso não seguisse as orientações, sua conta bancária poderia ser bloqueada. Informa que, ao ser questionada se possuía contas em outras instituições financeiras, respondeu afirmativamente, mencionando manter relações com as plataformas PicPay, Nubank, Itaú, RecargaPay e InfinitePay. Diante disso, foi orientada a acessar inicialmente o aplicativo do Banco Nubank e seguir as diretrizes impostas. Na sequência, foi instruída a aguardar novo contato via WhatsApp, desta vez pelo número (22) 93300-3627, de um interlocutor que se identificou como "Luiz Alberto", alegando ser representante da Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) e responsável por tratar das providências junto ao Banco Itaú, com o objetivo de evitar acessos indevidos ou fraudes. No decorrer da conversa com "Luiz Alberto", a requerente alega ter sido compelida a seguir um "protocolo de segurança", que consistia na gravação da tela de seu dispositivo móvel, supostamente para assegurar a integridade de seus aplicativos bancários. Além disso, alega que foi instada a realizar novas operações financeiras, incluindo a contratação de empréstimos, transferências de valores e reconhecimento facial em todas as suas contas vinculadas aos aplicativos PicPay, Nubank, Itaú, RecargaPay e InfinitePay. Ainda sob o pretexto da segurança, aponta que foi induzida a transferir expressivos montantes para contas de terceiros, supostamente vinculadas a "gerentes" das instituições bancárias mencionadas, sendo destinatários dessas transferências: Aryanne Cardoso de Araújo, Lucas dos Santos Nascimento, Kamyla Sanches Pereira e Francielle Carvalho. Detalha o modus operandi em cada instituição: No âmbito da conta Nubank, alega ter sido induzida a contratar um empréstimo de R$ 3.220,00 (a ser quitado em 36 parcelas de R$ 175,03, totalizando R$ 6.301,08) e a utilizar seu cartão de crédito para compras na função débito nos valores de R$ 3.200,00 e R$ 897,21, direcionadas à sua conta na plataforma InfinitePay (que, segundo informa, opera como uma máquina de pagamento por aproximação em seu celular). Também teria sido levada a converter parte do limite do cartão de crédito em saldo (operações de R$ 427,21 e R$ 350,00), o que acarretou a incidência de IOF e encargos. Em relação à conta Itaú, sob orientação de "Luiz Alberto", afirma ter contratado um empréstimo de R$ 9.900,00 (parcelado em 36 vezes de R$ 812,17, totalizando R$ 29.238,12). Logo após, realizou múltiplas transferências via PIX (nos valores de R$ 999,00, R$ 500,00, R$ 1.000,00, R$ 3.000,00 e R$ 499,99) para sua própria conta na plataforma PicPay, sob a justificativa de que os valores seriam posteriormente encaminhados aos supostos "gerentes". Também foi compelida a utilizar o limite de seu cheque especial. Os extratos juntados (ID 160074336) demonstram o crédito do empréstimo de R$ 9.900,00 em 25/02/2025 e diversas transferências subsequentes. Na conta PicPay, novamente induzida por "Luiz Alberto", contratou um empréstimo pessoal de R$ 3.045,89 (a ser amortizado em 24 parcelas de R$ 267,57, totalizando R$ 6.421,68). Na sequência, realizou transferências PIX para Aryanne Cardoso de Araújo (R$ 3.045,89, R$ 1.498,99 e R$ 1.318,66), para Lucas dos Santos Nascimento (R$ 500,00 e R$ 1.000,00, além de uma tentativa de R$ 3.000,00 para Agatha da Silva Pereira, que foi negada e redirecionada para Lucas dos Santos Nascimento), e para Kamyla Sanches Pereira (R$ 1.749,00, após transferir este valor de sua conta Itaú para sua conta PicPay). Na conta InfinitePay, recebeu os valores de R$ 3.110,72 e R$ 872,18 (oriundos de compras no débito realizadas com o cartão Nubank) e os transferiu via PIX para Francielle Carvalho. Por fim, na conta RecargaPay, foi constrangida a realizar transações via PIX para Francielle Carvalho nos valores de R$ 1.299,00 e R$ 1.298,00. Narra que, diante do avançado horário do dia 25 de fevereiro de 2025, o suposto atendente "Luiz Alberto" informou que retomaria o contato às 07h do dia seguinte. Desconfiada da situação, a requerente indica que se dirigiu à Delegacia Metropolitana de Caucaia, onde registrou o Boletim de Ocorrência nº 201-1457/2025 (ID 160072652 e ID 160072659). Na tentativa de minimizar prejuízos adicionais, e por orientação policial, transferiu o montante remanescente de sua conta no Banco Itaú (R$ 1.000,00 e, no dia seguinte, R$ 2.700,00) para um terceiro de sua confiança, Felipe Lincoln Rodrigues da Silva. Afirma que, no dia 26 de fevereiro de 2025, o suposto atendente voltou a contatá-la, exigindo a realização de um último protocolo de segurança junto ao Banco Itaú. Diante da recusa da requerente, foi informada que a devolução dos valores somente ocorreria após a conclusão integral do procedimento. O falso atendente, ao verificar as movimentações bancárias da requerente, constatou as transferências para Felipe Lincoln Rodrigues da Silva e passou a compeli-la a solicitar a devolução dos valores. Por fim, diante da negativa da requerente em prosseguir com as transações fraudulentas, foi-lhe arbitrariamente exigido o pagamento da quantia de R$ 29.238,12, sob a alegação de sua suposta não colaboração. A autora alega ter sofrido um prejuízo financeiro total de R$ 45.196,10, conforme laudo técnico contábil anexado. Sustenta que, em momento algum, as instituições financeiras envolvidas procederam à devida comunicação para confirmação da regularidade ou averiguação da origem suspeita das movimentações, e que, em decorrência do não pagamento dos valores oriundos dos contratos fraudulentos, passou a ser insistentemente cobrada e teve seu nome inscrito em cadastros de inadimplentes (ID 160074328 e prints anexos à inicial), especificamente perante o Banco Itaú e a instituição Nubank. Tentativas de solução administrativa junto às requeridas restaram infrutíferas. Diante desse cenário, postula a concessão dos benefícios da justiça gratuita, a inversão do ônus da prova e, em sede de tutela de urgência, a imediata suspensão dos descontos indevidos incidentes sobre suas contas bancárias (Itaú, PicPay e Nubank) relativos aos empréstimos fraudulentos, utilização indevida de cheque especial e conversão irregular do limite do cartão de crédito; a retirada imediata de seu nome dos órgãos de proteção ao crédito; e a cessação das cobranças realizadas pelas instituições financeiras, sob pena de multa diária. Ao final, requer a declaração de inexistência dos débitos e contratos fraudulentos, a condenação das rés à repetição em dobro do indébito, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00, e indenização pela perda do tempo útil também no valor de R$ 15.000,00, além da condenação em custas e honorários advocatícios. É o breve relato. Passo a decidir. 1. DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA A parte autora, em sua petição inicial (ID 160071381), pleiteia a concessão dos benefícios da justiça gratuita, juntando declaração de hipossuficiência (ID 160072210), na qual afirma não possuir condições de arcar com as custas e despesas processuais sem prejuízo do sustento próprio e de sua família. A autora qualifica-se como operadora de caixa e os fatos narrados indicam um severo abalo em suas finanças. A presunção de veracidade da alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural, conforme o artigo 99, § 3º, do Código de Processo Civil, aliada aos elementos constantes nos autos que corroboram a situação de vulnerabilidade financeira da requerente, justifica o deferimento do benefício. Diante do exposto, DEFIRO os benefícios da gratuidade da justiça à parte autora, nos termos do artigo 98 e seguintes do Código de Processo Civil. Determino as anotações necessárias. 2. DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO/MEDIAÇÃO A parte autora manifestou interesse na realização de audiência de conciliação ou mediação, nos termos do artigo 319, inciso VII, do Código de Processo Civil. Contudo, a experiência forense demonstra que, em litígios envolvendo instituições financeiras e alegações de fraude complexas como a narrada nos autos, a probabilidade de obtenção de uma transação satisfatória em sede de audiência de conciliação inicial é, frequentemente, reduzida. A natureza da controvérsia, que envolve a apuração de responsabilidade por atos de terceiros, a validade de múltiplos contratos e a análise de sofisticados esquemas fraudulentos, demanda, em regra, uma instrução processual mais aprofundada para a formação do convencimento judicial e para que as partes possam mensurar adequadamente os riscos e benefícios de uma eventual composição, o que, por vezes, inviabiliza um acordo em estágio preliminar. Ademais, a designação de audiência de conciliação em casos de baixa probabilidade de acordo pode, paradoxalmente, retardar o andamento processual, em detrimento do princípio da celeridade e da duração razoável do processo. O artigo 334, § 4º, inciso II, do Código de Processo Civil, faculta ao juiz dispensar a audiência de conciliação quando não se admitir a autocomposição ou quando as circunstâncias da causa evidenciarem ser improvável a obtenção de acordo. Considerando a complexidade da matéria fática e jurídica, a multiplicidade de rés e a natureza das alegações de fraude, entendo que a realização da audiência de conciliação neste momento processual não se mostra a medida mais eficaz para a célere resolução da lide. Nada impede, contudo, que as partes busquem a autocomposição a qualquer tempo, ou que o Juízo, em momento oportuno, reavalie a conveniência de designar a audiência, caso surjam elementos que indiquem maior probabilidade de acordo. Assim, DEIXO DE DESIGNAR a audiência de conciliação ou mediação prevista no artigo 334 do Código de Processo Civil, por considerar improvável a transação neste estágio processual. 3. DA TUTELA DE URGÊNCIA A parte autora pleiteia a concessão de tutela de urgência para que sejam imediatamente suspensos os descontos relativos aos contratos fraudulentos em suas contas bancárias, para que seu nome seja retirado dos cadastros de inadimplentes e para que cessem as cobranças, sob pena de multa diária. A concessão da tutela de urgência, nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, exige a presença concomitante de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. No caso em tela, o perigo de dano afigura-se presente. A autora, qualificada como operadora de caixa, alega ter sofrido um prejuízo financeiro considerável (R$ 45.196,10) e estar suportando descontos e cobranças decorrentes de operações fraudulentas, além da negativação de seu nome. Tais circunstâncias, se verdadeiras, comprometem sua subsistência e sua reputação creditícia, configurando um dano de difícil reparação, especialmente considerando a natureza alimentar de seus rendimentos e a essencialidade do crédito na vida civil contemporânea. Os extratos bancários (ID 160074336 e 160074332) indicam, de fato, a utilização de limites e a existência de saldo devedor em diversos períodos. Contudo, a probabilidade do direito, requisito essencial para a concessão da medida liminar, não se encontra suficientemente demonstrada neste momento processual, em juízo de cognição sumária. A narrativa da petição inicial (ID 160071381), que não esclarece toda a dinâmica dos fatos, acompanhada de Boletim de Ocorrência (ID 160072659 e 160072652), descreve uma situação complexa em que a autora, após ser contatada por supostos prepostos bancários, foi induzida a realizar uma série de ações que facilitaram ou consumaram as fraudes. A autora relata ter seguido instruções de terceiros, fornecido acesso ou informações que permitiram a contratação de empréstimos, a realização de transferências para contas de desconhecidos (Aryanne Cardoso de Araújo, Lucas dos Santos Nascimento, Kamyla Sanches Pereira, Francielle Carvalho), a utilização de cheque especial e outras movimentações financeiras. Embora a autora alegue ter agido de boa-fé e sob coação e engano, a dinâmica dos fatos narrados, especialmente a interação prolongada com os fraudadores, a realização de múltiplos procedimentos em diversas plataformas (Nubank, Itaú, PicPay, InfinitePay, RecargaPay) e a transferência voluntária de valores para contas de pessoas físicas indicadas pelos golpistas, aponta para a ocorrência de um golpe perpetrado por terceiros com participação ativa, ainda que involuntária e induzida, da vítima. A conduta da autora de seguir as instruções dos fraudadores, incluindo a gravação da tela do celular e a realização de operações financeiras complexas sem buscar confirmação direta e segura com as instituições financeiras por canais oficiais e indubitáveis, pode configurar um fortuito externo. Este, por sua vez, é caracterizado como um evento que, embora possa ter alguma relação com a atividade bancária, não decorre diretamente de uma falha intrínseca na prestação do serviço do banco, mas sim da ação astuciosa de um terceiro fraudador e da adesão da vítima ao engodo. A responsabilidade objetiva das instituições financeiras, consagrada na Súmula 479 do STJ ("As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias"), embora amplamente reconhecida em casos de fraude e falha na segurança de seus sistemas, não é absoluta. A caracterização do fortuito externo, que tem o condão de romper o nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano sofrido pelo consumidor, exige uma análise aprofundada das circunstâncias fáticas, o que somente será plenamente possível após a instauração do contraditório e a dilação probatória. Nesse sentido, colaciono julgados do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará que abordam situações análogas: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSAÇÃO FRAUDULENTA VIA PIX. GOLPE TELEFÔNICO . CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA QUE FORNECEU INFORMAÇÕES SENSÍVEIS E SEGUIU INSTRUÇÕES DO ESTELIONATÁRIO. FORTUITO EXTERNO CONFIGURADO. AUSENTE FALHA NO SERVIÇO. RECURSO DESPROVIDO . I. Caso em exame 1. Recurso de Apelação Cível interposto contra sentença que julgou improcedente ação de restituição de valores c/c indenização por danos morais, ajuizada por consumidor vítima de golpe telefônico, no qual terceiros, mediante falsa identificação como prepostos do banco, obtiveram acesso ao dispositivo móvel e realizaram operação via PIX no valor de R$ 1.910,30 . II. Questão em discussão 2. Verificação da possibilidade de responsabilização civil da instituição financeira por danos decorrentes de golpe telefônico praticado por terceiros e da configuração de excludentes de responsabilidade, como culpa exclusiva da vítima e fortuito externo, à luz das normas consumeristas. III . Razões de decidir 3. A relação jurídica entre as partes caracteriza-se como consumerista, regendo-se pelo Código de Defesa do Consumidor (arts. 2º e 3º, CDC). Todavia, a responsabilidade civil objetiva da instituição financeira, com base na teoria do risco do empreendimento, não é absoluta, sendo afastada nas hipóteses de excludentes, como culpa exclusiva da vítima e fortuito externo (art . 14, § 3º, CDC). 4. No caso, restou configurada a culpa exclusiva da vítima, que forneceu informações sensíveis e seguiu instruções de terceiro, possibilitando o acesso indevido à conta bancária. Tal conduta demonstra negligência no cumprimento de deveres mínimos de cautela . 5. O golpe ocorreu fora do âmbito da atividade bancária e sem relação com falha na prestação de serviços, caracterizando fortuito externo, que rompe o nexo causal e exclui a responsabilidade do banco. 6. Precedentes deste e . Tribunal e do STJ reconhecem que, em casos semelhantes, inexiste responsabilidade do banco diante da contribuição exclusiva do consumidor para a ocorrência do dano. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso conhecido e desprovido . Sentença de improcedência mantida. _____________________________ Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VIII, 14, § 3º, II; CPC, arts. 85, § 11, 98, § 3º, 373, I . Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 479; TJCE, Apelação Cível nº 0113641-57.2019.8.06 .0001, Rel. Des. José Ricardo Vidal Patrocínio, julgado em 22/02/2023; TJCE, Agravo Interno Cível nº 0110920-35.2019 .8.06.0001, Rel. Des . Emanuel Leite Albuquerque, julgado em 15/06/2022. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer e desprover o recurso, nos termos do voto do relator. Fortaleza, 25 de novembro de 2024. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO Relator (TJ-CE - Apelação Cível: 02002580420238060058 Cariré, Relator.: FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO, Data de Julgamento: 17/12/2024, 4ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 17/12/2024) DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. FRAUDE BANCÁRIA . TRANSFERÊNCIAS VIA PIX. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA E FORTUITO EXTERNO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO . I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente ação de reparação de danos morais e materiais decorrentes de fraude bancária, envolvendo transferências via PIX realizadas pela autora para conta de terceiros. II . Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em: (i) determinar se houve falha na prestação de serviços pela instituição financeira que justifique sua responsabilização pelos danos alegados; e (ii) avaliar a existência de nexo causal entre a conduta da instituição e o prejuízo sofrido pela autora. III. Razões de decidir 3 . A responsabilidade da instituição financeira é afastada quando o evento danoso decorre de transações realizadas voluntariamente pelo correntista, com uso de senha pessoal. 4. Configura-se culpa exclusiva da vítima quando esta realiza transferências para conta de terceiros desconhecidos, acreditando estar efetuando transação comercial legítima. 5 . O golpe praticado por terceiros, fora do âmbito das atividades da instituição financeira, caracteriza fortuito externo, excluindo a responsabilidade do fornecedor de serviços. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação conhecido e desprovido . Sentença mantida. Tese de julgamento: a) A instituição financeira não responde por prejuízos decorrentes de transferências bancárias realizadas voluntariamente pelo correntista, ainda que induzido por fraude de terceiros, configurando-se culpa exclusiva da vítima. b) O golpe praticado por terceiros, alheio à organização da instituição financeira, caracteriza fortuito externo e exclui sua responsabilidade pelos danos causados ao consumidor."Dispositivos relevantes citados: CDC, art . 14, § 3º, II; CPC, art. 85, §§ 2º e 11º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1005026/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2018, DJe 06/12/2018 . ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em unanimidade, CONHECER do presente recurso e NEGAR-LHE provimento, nos termos do voto do relator. Fortaleza, data informada pelo sistema. JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR DJALMA TEIXEIRA BENEVIDES Relator (TJ-CE - Apelação Cível: 02024794720238060029 Acopiara, Relator.: DJALMA TEIXEIRA BENEVIDES, Data de Julgamento: 22/10/2024, 4ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 23/10/2024) A alegação de que a autora foi induzida a erro por terem os golpistas conhecimento prévio de alguns de seus dados bancários é um ponto relevante que será objeto de detida análise meritória, mas que, por si só, não confere a robustez necessária à probabilidade do direito para fins de deferimento da tutela de urgência neste estágio inicial do processo. A cessação imediata dos descontos e a exclusão de registros de inadimplência, sem uma comprovação mais clara da ausência de qualquer participação da autora na contratação ou da falha exclusiva das instituições financeiras que permitiu a fraude, poderia gerar um prejuízo inverso às requeridas, que, em tese, concederam créditos e processaram transações. A complexidade da fraude narrada, que envolve a atuação coordenada de terceiros, a utilização de engenharia social e a participação, ainda que involuntária e de boa-fé, da própria vítima na consumação do golpe (ao seguir instruções e realizar as operações), demanda uma cognição exauriente para a formação de um juízo de valor definitivo sobre a responsabilidade de cada parte envolvida. Portanto, neste juízo de cognição sumária, não se vislumbra a probabilidade do direito alegado de forma inequívoca e robusta o suficiente para a concessão da tutela de urgência pleiteada. A questão da validade dos contratos de empréstimo, da regularidade das transações e da responsabilidade das instituições financeiras pela fraude será devidamente apurada no curso da instrução processual, após a apresentação das contestações e a produção das provas pertinentes. Diante do exposto, INDEFIRO o pedido de tutela de urgência. 4. DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA A parte autora pleiteia a inversão do ônus da prova com base no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, alegando sua hipossuficiência técnica, informacional e econômica frente às instituições financeiras rés. De fato, a relação jurídica estabelecida entre a autora e as instituições financeiras requeridas (ITAU UNIBANCO S.A., PICPAY INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO S/A, NU PAGAMENTOS S.A. e RECARGAPAY INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA) é de consumo, aplicando-se as normas do Código de Defesa do Consumidor. As instituições financeiras são fornecedoras de serviços e, como tal, submetem-se às disposições consumeristas, conforme entendimento consolidado na Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça. No que tange à inversão do ônus da prova, é imperioso distinguir a inversão ope judicis (judicial), prevista no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, da inversão ope legis (legal), decorrente da própria sistemática de responsabilidade civil estabelecida no diploma consumerista. Embora a petição inicial tenha invocado o dispositivo que trata da inversão a critério do juiz, a natureza da controvérsia em casos de fraude bancária, especialmente no que concerne à regularidade da contratação de empréstimos, à segurança dos sistemas e à prevenção de movimentações atípicas, impõe uma distribuição dinâmica do ônus probatório que se alinha com a responsabilidade objetiva do fornecedor. A responsabilidade das instituições financeiras é objetiva, fundada na teoria do risco da atividade, conforme o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Isso significa que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços. A segurança dos sistemas bancários, a autenticação das transações e a prevenção de fraudes são inerentes à atividade desenvolvida pelas instituições financeiras, configurando um risco do empreendimento. Nesse contexto, a prova da regularidade das contratações dos empréstimos e demais operações financeiras contestadas pela autora, da autenticidade da manifestação de vontade, da inexistência de falha na segurança dos sistemas que tenha permitido ou facilitado a atuação de terceiros fraudadores, e da observância dos protocolos de segurança é ônus das instituições financeiras requeridas. São elas que detêm o controle dos registros de contratação, dos dados de acesso, dos logs de transações, dos endereços IP, dos protocolos de segurança e de todas as informações técnicas necessárias para comprovar a legitimidade das operações e a ausência de vulnerabilidades em seus serviços. A autora, por sua vez, é a parte manifestamente hipossuficiente em termos técnicos e informacionais para produzir tal prova de forma exaustiva. Assim, em relação aos meios utilizados para as contratações dos empréstimos e demais produtos financeiros, à autenticidade das autorizações para as transferências e pagamentos, e à eventual falha sistêmica ou de segurança que possa ter contribuído para a ocorrência da fraude, o ônus da prova recai sobre as instituições financeiras demandadas, cada qual na esfera de sua atuação nos fatos narrados. Elas deverão comprovar a regularidade das operações contestadas, a autenticidade da manifestação de vontade da autora em cada uma delas, a observância dos protocolos de segurança e a ausência de qualquer vulnerabilidade em seus sistemas que tenha sido explorada pelos fraudadores. Portanto, DECLARO a inversão do ônus da prova, determinando que as rés ITAU UNIBANCO S.A., PICPAY INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO S/A, NU PAGAMENTOS S.A. e RECARGAPAY INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA comprovem a regularidade das contratações e transações financeiras objeto da lide, bem como a segurança de seus respectivos sistemas e a ausência de falha na prestação de seus serviços, nos termos da responsabilidade objetiva e do risco do empreendimento (art. 14, CDC). 5. CONCLUSÃO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta: a) DEFIRO o pedido de gratuidade da justiça formulado pela parte autora; b) INDEFIRO o pedido de tutela de urgência, nos termos da fundamentação supra; c) DEIXO DE DESIGNAR a audiência de conciliação ou mediação prevista no artigo 334 do Código de Processo Civil; d) DECLARO a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, cabendo às rés comprovarem a regularidade das contratações e transações impugnadas, bem como a segurança de seus sistemas e a ausência de falha na prestação dos serviços. Diante das deliberações acima, determino as seguintes providências: I. CITEM-SE as rés ITAU UNIBANCO S.A., PICPAY INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO S.A., NU PAGAMENTOS S.A. e RECARGAPAY INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA., para, querendo, apresentarem contestação no prazo legal de 15 (quinze) dias úteis, sob pena de revelia e presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial, nos termos do artigo 344 do Código de Processo Civil. II. Na citação, deverá constar expressamente a inversão do ônus da prova ora deferida, com a advertência de que caberá a cada parte ré, no âmbito de sua responsabilidade nos fatos narrados, comprovar a regularidade das operações e a segurança de seus sistemas. III. INTIME-SE a parte autora, por seus advogados, para ciência desta decisão. Cumpra-se. Caucaia/CE, data da assinatura digital. Willer Sóstenes de Sousa e Silva Juiz de Direito
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