Processo nº 0004967-87.2022.8.08.0012
ID: 324641114
Tribunal: TJES
Órgão: Cariacica - Comarca da Capital - 5ª Vara Criminal - Violência Doméstica
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO
Nº Processo: 0004967-87.2022.8.08.0012
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Cariacica - Comarca da Capital - 5ª Vara Criminal - Violência Doméstica Avenida Meridional, 1000, Fórum Doutor Américo Ribeiro Coelho, Alto Laje, CA…
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Cariacica - Comarca da Capital - 5ª Vara Criminal - Violência Doméstica Avenida Meridional, 1000, Fórum Doutor Américo Ribeiro Coelho, Alto Laje, CARIACICA - ES - CEP: 29151-230 Telefone:(27) 32465555 EDITAL DE INTIMAÇÃO DE SENTENÇA 30 (TRINTA) DIAS Nº DO PROCESSO: 0004967-87.2022.8.08.0012 AÇÃO :AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO SUMÁRIO (10943) Autor: AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO Acusado: WILLIAN BATISTA SODRE. MM. Juiz(a) de Direito da VITÓRIA - Cariacica - Comarca da Capital - 5ª Vara Criminal - Violência Doméstica, por nomeação na forma da lei, etc. FINALIDADE DAR PUBLICIDADE A TODOS QUE O PRESENTE EDITAL VIREM que fica(m) devidamente intimado(s) A VÍTIMA: JESSICA DE ASSIS ROZARIO, filha de MARIA DA PENHA DE ASSIS ROZARIO nascida em 10/03/1991 - ATUALMENTE EM LUGAR INCERTO E NÃO SABIDO, acima qualificados, de todos os termos da sentença de fls. dos autos do processo em referência. SENTENÇA SENTENÇA Vistos em inspeção – 2024. Cuidam os presentes autos de Ação Penal Pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual, ora denunciante, por intermédio de sua ilustre presentante legal, em desfavor de Willian Batista Sodré, ora denunciado, devidamente qualificado na exordial acusatória, imputando-lhe a prática dos seguintes fatos criminosos: “...; Consta do Inquérito Policial que serve de base à presente denúncia, que nos dias 05 de dezembro de 2021, 14 de dezembro de 2021 e no dia 05 de julho de 2022, na Rua Nestor Vieira, 19, bairro Dom Bosco, Cariacica/ES, o denunciado, de forma livre e consciente, no âmbito de suas relações íntimas de afeto e se prevalecendo das relações domésticas, ofendeu a integridade física de Jéssica de Assis Rozario, sua companheira, a ameaçou, por palavras, de causar mal injusto e grave, descumpriu decisão judicial que deferiu Medidas Protetivas de Urgência em seu desfavor, violou seu domicílio e a perseguiu, reiteradamente, ameaçando-lhe a integridade física e psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Denota-se do procedimento investigativo que a vítima e o denunciado se relacionavam por, aproximadamente, 4 (quatro) anos, possuindo uma filha em comum. Consta no IP n° 0004971-27.2022.8.08.0012 que em 05 de dezembro de 2021, por volta das 18h, WILLIAN, após uma discussão, empurrou Jéssica e lhe desferiu dois socos no estômago, causando lesões descritas no Laudo de Lesões Corporais de fl. 21. No momento da agressão Jéssica segurava no colo a filha do casal, de um ano de idade, e foi lançada contra a parede, o que causou lesões em seus braços. Em razão de tais fatos a vítima solicitou e foram deferidas medidas protetivas de urgência, no processo n. 0010292-77.2021 8 08.012, tendo sido o denunciado intimado em 07 de dezembro de 2021. A partir de então, conforme apurado no IP nº 0004969-57.2022.8.08,0012, WILLIAN passou a perseguir Jéssica, reiteradamente, ameaçando sua integridade física e psicológica, perturbando sua liberdade e privacidade. WILLIAN passou a ligar insistentemente para a vítima, ameaçando-a, dizendo que "o que ela fez terá consequências", que a vítima "está fudida", que é para "rezar para a policia não pegá-lo." No dia 14 de dezembro de 2021 o denunciado WILLIAN descumpriu as medidas protetivas deferidas, invadiu o domicílio da vítima, sem sua autorização, tendo quebrado uma janela e amassado uma estante na sala. A vítima não estava em casa no momento. No dia 17 de dezembro de 2021 o denunciado ligou para o celular da vítima aproximadamente vinte vezes, mandou sessenta e dois áudios e várias mensagens de texto. Após bloquear o celular do denunciado, WILLIAN passou a mandar mensagens para vítima por outros números desconhecidos. Restou apurado ainda, no IP n° 0004967-87.2022.8.08.0012, que no dia 05 de julho de 2022, WILLIAN novamente invadiu o domicílio da vítima, sem sua autorização, quebrou uma janela, espalhou materiais de trabalho (bijuterias) da vítima pela casa e pelo quintal, além de quebrar alguns deles. Na ocasião, WILLIAN deixou uma faca ao lado das bijuterias, para ameaçar a vítima, além de quatro bilhetes com ameaças, dizendo "isso é pelo que você fez com nosso irmão", "a nossa tropa vai te pegar, você e seu namorado", "outra coisa, suas dívidas serão pagas" (fls. 15/17). A vitima retornou para casa 13h e constatou ainda o sumiço de seu uniforme de trabalho, duas bolsas, a certidão de nascimento da filha, e outros documentos e bens pessoais. A energia da casa também foi cortada, fazendo com que a vítima perdesse alguns alimentos que estavam na geladeira. O irmão do denunciado, Michel, devolveu para Jéssica as bolsas subtraídas e a certidão de nascimento da filha, que estavam no carro de WILLIAN...;” (os destaques constaram do original). Derradeiramente, concluiu o “Parquet”, por sua ilustre presentante legal, que os fatos descritos na denúncia subsume-se aos tipos penais insertos nos arts. 129, § 13, 147, “caput” (duas vezes); 147-A e 150, “caput”, todos do Código Penal e, sob a incidência da Lei Maria da Penha e, por fim, no art. 24-A da Lei Federal nº 11.340/2006. A denúncia veio acompanhada com os autos dos inquéritos policiais nºs 1.127/2021, 84/2022 e 667/2022, todos iniciados através de portaria. Pelo ato judicial de fls. 24 e verso, proferido em data de 20.09.2022, foi recebida a peça inculpativa e determinada a citação do Denunciado para compor a presente relação jurídico-processual, bem como a intimação do mesmo para apresentar resposta à acusação no decêndio legal. Em tal oportunidade foi ordenado o arquivamento dos procedimentos investigativos nºs 1127/2021 e 84/2022 que foram objeto de denúncia única no presente feito reunindo em conjunto os fatos apurados no inquérito policial nº 667/2022, ao passo que não há necessidade de tramitação simultânea dos procedimentos nºs 0004969-57.2022.8.08.0012 e 0004971-27.2022.8.08.0012, podendo os mesmos funcionarem apenas como meros expedientes administrativos. A citação pessoal do Acusado se encontra certificada à fl. 28. A nobre defesa constituída pelo Réu, por ocasião de sua resposta à acusação encartada às fls. 32-42, arguiu, preliminarmente, a inépcia da denúncia, bem como ventilou a tese de “bis in idem” em relação aos crimes de ameaça e de descumprimento veiculados na demanda penal nº 0005765-48.2022.8.08.0012, além da tese de nulidade do ato intimatório das medidas protetivas pelo Denunciado. Meritoriamente, discordou da narrativa fática contida na denúncia. Ao final, apresentou rol de testemunhas. Pelo “decisum” de fls. 46-47, foram rejeitadas as defesas processuais e, depois de verificada a viabilidade da denúncia designou-se audiência de instrução e julgamento para o dia 12.12.2022, às 13:40 horas. Consta, à fl. 58, termo de audiência instrutória, em que estou efetivado o seguinte: 1) diante da ausência justificada do IPMP ao ato processual, a defesa do Réu formulou pedido libertário e, 2) despacho ordenando vista dos autos à instituição ministerial quanto ao pleito libertário e, após, à conclusão. Por força do despacho de fl. 65, foi designada audiência de instrução em continuação para o dia 21.09.2023, às 13:40 horas. Em audiência instrutória realizada de modo telepresencial, a qual se encontra atermada às fls. 78-79, cujo ato se encontra armazenado em “nuvem” no seguinte link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL – onde restou consumado o seguinte: 1) foi nomeada para o ato, como defensora da Vítima, a Dra. Rita de Cassia Avila Gratz – OAB/ES nº 16.219; 2) oitiva da Ofendida; 3) inquirição dos informantes Maria Aparecida Luminato e Mychel Fagner Batista Sodré arrolados pela defesa; 4) interrogatório do Acusado; 5) na fase do art. 402 do Estatuto Processual Penal nada foi requerido; 6) o órgão ministerial e a ilustre dedefsa dativa da Vítima apresentaram, respectivamente, suas alegações finais orais e, finalmente; 7) despacho determinando a intimação da douta defesa do Réu para razões finais, por memoriais, com posterior conclusão dos autos para sentença. Ao apresentar razões finais de fls. 87-92, a douta defesa constituída pelo Réu, pugnou, em epítome, pela absolvição do Acusado face a debilidade do conjunto probatório. Subsidiariamente, requestou a desclassificação do crime de lesão corporal para a contravenção de vias de fato. Autos conclusos em data de 06.10.2023. É o que cabia relatar de mais importante. Passo a decidir, na forma do art. 93, inciso IX, da Constituição da República Federativa do Brasil, bem como do art. 381 do Estatuto Processual Penal. MOTIVAÇÃO. Inexistindo questões/objeções processuais a serem apreciadas, estando presentes os pressupostos processuais, e tendo sido observado o devido processo constitucional, passo a análise do mérito da demanda, com uma breve introdução acerca da prova no processo penal. Aponta Mittermayer, que a prova é o complexo dos motivos produtores da certeza. É sabido: que cabe ao órgão acusador o ônus de provar a existência de um fato penalmente ilícito, a sua realização pelo denunciado e a culpa (“stricto sensu”); enquanto a defesa cabe demonstrar a inexistência de dolo, causas extintivas da punibilidade, causas excludentes da antijuridicidade e eventuais causas dirimentes da culpabilidade. Após análise de todo acervo probatório, o julgador formará sua convicção à luz do art. 155, “caput”, do Estatuto Processual Penal, que consagrou o sistema do livre convencimento motivado ou da persuasão racional. Pois bem. Passo ao exame dos fatos criminosos imputados ao Denunciado, de forma individualizada, em cotejo com as provas que foram trazidas para o caderno processual. 1. DO CRIME DE LESÃO CORPORAL (ART. 129, § 13, DO CÓDIGO PENAL). “Obter dictum”, após longo período norteado por critérios liberais, o Estado se despertou para a identificação de grupos fragilizados em razão de fatos adversos, dentre os quais o de maior expressão social está o discriminado por gênero. A violência contra a mulher tornou-se invisível aos olhos da sociedade, tolerante e, por isso mesmo, no exercício de um surdo pacto de silêncio. O silêncio da vítima conjugado com a indiferença da sociedade são, sem dúvida, o combustível mais poderoso para a continuidade da violência. Sobremais, ninguém ignora o grave quadro de violência em relação à mulher, conforme demonstram os dados estatísticos existentes. A título exemplificativo, com números mais recentes, temos que a cada dois segundos uma mulher sofre violência verbal e/ou física: 12.500.000 (doze milhões e quinhentos mil) ou o equivalente a 21,8% (vinte e um por cento e oito décimos por cento) das mulheres foram vítimas de ofensa verbal, como insulto, humilhação ou xingamento; 4.600.000 (quatro milhões e seiscentos mil) ou o equivalente 8,9% (oito por cento e nove décimos por cento) das mulheres foram tocadas ou agredidas fisicamente por motivos sexuais; 1.700,000 (um milhão e setecentos mil) ou o correspondente a 3,9% (três por cento e nove décimos por cento) de mulheres que foram ameaçadas com faca ou arma de fogo; e, 1.600.000 (um milhão e seiscentos mil) ou o equivalente a 3,6% (três por cento e seis décimos por cento) de mulheres que sofreram espancamento ou tentativa de estrangulamento – o número representa três por minuto (Fonte: Visível e Invisível: A vitimização de mulheres no Brasil – 2ª Edição (Datafolha/FBSP, 2019). Em mesma senda, ao divulgar a edição do “Atlas da Violência do ano de 2017”, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), através de estudo por si realizado em conjunto com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelou que em 28,5% (vinte e oito por cento e cinco décimos por cento) dos homicídios de mulheres, as mortes foram dentro de casa, o que o se relaciona a possíveis casos de feminicídio e violência doméstica e, entre 2012 e 2017, os agentes pesquisadores apontou que a taxa de homicídios de mulheres fora da residência caiu 3,3% (três por cento e três décimos por cento), enquanto a dos delitos cometidos dentro das residências aumentou 17,1% (dezessete por cento e um décimo por cento). Ante ao deplorável quadro alhures descrito, a Constituição da República instituiu como um dos princípios fundamentais do Estado a dignidade da pessoa humana, dentro da garantia de que todos são iguais, sem distinção alguma. Ao tratar da especial proteção à família, estabeleceu no art. 228, § 8º, que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. No plano legislativo, diversas leis foram elaboradas para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Entre essas, a Lei Federal nº 10.224/2001, versando sobre o assédio sexual no trabalho; a Lei Federal n° 10.455/2002, tratando do afastamento e prisão do agressor; a Lei Federal nº 10.714/2003, instituindo número telefônico destinado a atender denúncias de violência contra a mulher e a Lei Federal nº 10.778/2003, que tornou obrigatório aos hospitais e clínicas médicas preencher questionário específico de informação sobre atendimento médico à mulher vítima de agressão. lém disso, a tutela diferenciada da mulher, ao menos em tese, era garantida por convenções internacionais, visando a garantia dos direitos humanos e recriminando qualquer forma de discriminação. Dentre elas, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (promulgada pelo Decreto nº 4.377/2002) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (promulgada pelo Decreto nº 1.973/1976). A Lei Federal nº 11.340/2006, alcunhada ordinariamente “Lei Maria da Penha”, a despeito de não ter sido o primeiro diploma a tratar de questões consentâneas com a violência doméstica, inaugurou um novo paradigma na história das ações afirmativas, tendo por escopo criar mecanismos para coibir e prevenir a violência contra a mulher. Por seu turno, a Lei Federal nº 14.188/2021 introduziu na nossa Lei Adjetiva Penal o § 13 ao art. 129, com a seguinte redação: “Art. 129. 'omissis'. (…). § 13. Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro anos).” Restando expostas as ponderações de ordem propedêutica, passo a analisar acerca da materialidade e da autoria do crime em epígrafe. Da materialidade. Decorre, basicamente, dos seguintes elementos: 1) do boletim unificado nº 46508293 (fls. 02-03 do feito investigativo nº 1.127/2021 – autos nº 0004971-27.2022.8.08.0012 em apenso); 2) das declarações prestadas em ambos os estágios da persecução penal pela vítima Jéssica de Assis Rozário (fls. 05 e verso do fascículo informativo nº 1.127/2021 – autos nº 0004971-27.2022.8.08.0012 em apenso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL); 3) do laudo de exame de lesões corporais nº 20.845 (fl. 21 do procedimento administrativo nº 1.127/2021 – autos nº 0004971-27.2022.8.08.0012 em apenso) e, finalmente; 4) da confissão qualificada do Acusado em sendas policial e judicial (fls. 22-23 do procedimento investigativo nº 1.127/2021 em apenso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL). Da autoria. Insta ressaltar que, no caso em tela, não pairam dúvidas acerca da prática do crime de lesão corporal por parte do denunciado Willian Batista Sodré, posto que, de fato, no limiar da noite do dia 05.12.2021, na Rua Nestor Vieira, nº 19, bairro Dom Bosco, nesta municipalidade, ofendeu a integridade física de sua ex-companheira Jéssica de Assis Rozário, em razão da condição de pertencer ao gênero feminino, quando a agrediu com um empurrão, lançando-a à parede, estando ela com a filha no colo, cujas lesões corporais se notam do laudo pericial nº 20.845 (fl. 21 do inquérito policial nº 1.127/2021), que atestou o seguinte: “...; duas equimoses arroxeadas, medindo cerca de 30x20 milímetros, sendo uma no braço direito e outra no antebraço direito...;” (destaquei). Ao ser interrogado em ambas as fases da persecução penal (fls. 22-23 do procedimento investigativo nº 1.127/2021 em apenso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), o Denunciado admitiu ter empurrado a Vítima, a despeito de invocado a excludente de ilicitude de legítima defesa sua e de terceiro. Todavia, a autoria do crime pelo Denunciado se encontra apoiada no que relatou, com harmonia e segurança, a ofendida Jéssica de Assis Rozário em senda policial (fl. 21), cuja versão foi por ela mantida em senda judicial (link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL). Vejamos: “...; A vítima comparece para registrar boletim de ocorrência em desfavor de Willian Batista Sodré, com que tem um relacionamento amoroso há 04 anos; que o casal possui uma filha de 01 ano e 01 mês de idade; que o casal mora uma casa própria da vítima; que a vítima relata que já foi agredida fisicamente pelo William registrou boletim, porém ele nunca foi preso e nem pediu medida protetiva; que nesse momento registra novamente um boletim contra William, pois foi agredida fisicamente por ele, na data de ontem (05/12/2021), por volta das 18:00 horas; que o casal estava na casa da mãe do William, Que estava em um churrasco; que quando já estava indo embora, por volta das 17:00 horas, aconteceu um desentendimento entre a mãe do William e a vítima; que a mãe do William ficou nervosa e tentou agredir a vítima que estava dentro do carro, com a filha no colo, momento William arrancou com o carro e foram embora; que quando chegaram em casa, por volta das 18:00 horas, o casal começou a discutir e William falava que a culpa era da vítima; que também dizia, que era ela quem era muito nervosa e que a mãe dele quem tinha razão; que nesse momento o William empurrou a vítima; que a vítima se defendeu e foi na direção do William; que então William lhe empurrou novamente e a filha começou a chorar; que a vítima pegou a filha no colo; que a discussão continuou e William deu dois socos no estômago da vítima, quando ela estava com a filha no colo; que não chegou a cair no chão, porque encostou na parede...;” (destaquei). “...; que quando o fato do dia 05/12/21 (IP 1127/21), aconteceu ainda era companheira de Willian; que foi um total de 06 (seis) anos de relacionamento; que durante esse tempo, chegou a receber um tapa de Willian, oportunidade em que ele estava alcoolizado; que, entretanto, ele lhe pediu desculpas e a declarante aceitou; que, a bem da verdade, o problema de Willian é com o álcool; que ele sempre bebeu, mas, há cerca de 03 (três) anos, quando bebe, ele tem ficado grosseiro, ignorante e mentiroso; que no dia 05/12/21, a mãe de Willian, Sandra, entrou em contato e os chamou para irem até a casa dela para um churrasco; que perguntada como é sua relação com Sandra, informa '(...) a gente se tolera'; que concordou em ir com Willian para lá e pediu que ele não bebesse muito; que, quando pediu Willian para irem embora, Sandra comentou algo como '(...) você tem que levantar a mão pro alto pelo marido que você tem, porque você é uma preguiçosa'; que deu uma resposta qualquer a ela e se virou para ir embora; que, quando já estava sentada no carro, Sandra chegou a tentar esbofetear a declarante, mas ela desviou e não foi atingida; que foram para casa e lá perguntou a Willian se ele tinha visto o que a mãe dele havia feito; que Willian disse algumas coisas, dentre elas ‘(...) você mereceu’ o que deixou a declarante furiosa e os dois passaram a discutir; que acrescenta '(...) eu acabei jogando algumas coisas na cara dele, que eu sempre sustentei a casa. Aí quando peguei minha filha no colo, ele me deu um soco no estômago. Quando eu levei esse soco, eu acho que eu bati na parede porque la no DML constatou lesão no meu braço e ele não me machucou no braço. Ele me empurrou e me deu soco no estômago', que perguntada quantos socos recebeu, uma vez que no boletim está registrado que foram dois, afirma '(...) eu acho que foram dois, sim. Foi um em seguida do outro, bem rápido'; que nega ter dado tapas no rosto de Willian...;” (destaquei). É cediço que a prova da materialidade/autoria nas infrações penais praticadas no contexto doméstico e familiar embasa-se em muito na palavra da ofendida, evidentemente, desde que corroborada pelos demais elementos probatórios carreados aos autos, tendo em vista que o delito em destaque (art. 129, § 13, do CP), é praticado, via de regra, às ocultas, longe dos olhares das pessoas, estando presentes na cena criminosa apenas o agressor e a vítima (v.g. STJ, agravo regimental no agravo em recurso especial nº 2.202.116/DF, cujo relator foi o Exmo. Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 13.12.2022 e publicado em 15.12.2022. TJES, apelação criminal nº 0000804-67.2022.8.08.0011, de relatoria do Exmo. Desembargador Helimar Pinto, julgado em 12.05.2023 e publicado em 24.05.2023). Diante de tal situação, as vítimas são suas grandes testemunhas. Não confiar em suas palavras, só quando se arregimentam elementos seguros de que possuem imaginação doentia ou quando agem por vingança irracional, dentro, logicamente, do sistema de apreciação de provas adotado pelo legislador processual penal, qual seja, o do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, conforme preceitua o art. 155, “caput”, do Estatuto Processual Penal. Os elementos de prova acima concatenados denotam com clareza a prática do delito em comento, na medida em que os dados fornecidos pela Ofendida no âmbito informativo e, depois convalidada na fase processual, sob as balizas do contraditório e da ampla defesa, encontram eco nas lesões apontadas no laudo pericial nº 20.845 (fl. 21 do inquérito policial nº 1.127/2021), de modo que, comprovado de que o Réu lesionou fisicamente a Vítima ao empurrá-la, não há espaço algum para um decreto absolutório, considerando as versões coesas prestadas pela vitimada Jéssica de Assis Rozário em ambos os estágios da persecução penal. A propósito, assim se posicionou recentemente nosso egrégio Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento da apelação criminal nº 62170023840, de relatoria do Exmo. Desembargador Helimar Pinto: “APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LESÃO CORPORAL. ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. NÃO OCORRÊNCIA, PALAVRA DA VÍTIMA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Pelo conjunto probatório, especialmente a palavra da vítima e o exame pericial de lesões corporais, não há como acolher a tese de absolvição...;” (fonte: www.tjes.jus.br – destaquei). Sendo insofismável que o Denunciado ofendeu a integridade física da vítima Jéssica de Assis Rozário, não deixando o corpo probatório coligido ao presente caderno processual qualquer margem de dúvida quanto à ocorrência da famigerada conduta, resta ainda saber se teria àquele (Denunciado) agido amparado ou não pela causa excludente de ilicitude da legítima defesa, conforme alegou sua ilustre defesa, com base no que fora relatado pelo Acusado em ciclos administrativo e processual (fls. 22-23 do procedimento investigativo nº 1.127/2021 em apenso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL). A meu sentir, a tese defensiva não merece prosperar. O Código Penal nos fornece o conceito de legítima defesa, trazendo no bojo do tipo não incriminador permissivo do art. 25, os seus elementos caracterizadores: “Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.” Pois bem. A vítima Jéssica de Assis Rozário, em sendas administrativa e processual, narrou que, no dia do fato, houve uma discussão travada entre ela e o então convivente, ora Réu, ocasião em que este a empurrou, tendo a mesma (Vitimada) se chocado com a parede. A tese defensiva ora plasmada e autodefendida pelo Réu se escora no fato de que, primeiro foi estapeado e, para defender-se, precisou empurrar a Vítima. A alegação do Acusado se mostra vazia e solteira. Explico. Primeiro porque estavam no local do evento apenas Ofendida e Denunciado e, há prova pericial nos autos de que houve apenas danos à integridade física da Vítima e, nada corrobora a versão do Acusado, até porque a própria Ofendida disse que estava com a filha do ex-casal no colo quando fora empurrada pelo Denunciado e, nenhum momento estapeou ou tentou agir em posição contrária à agressão que sofrera em fato pretérito ao ato que desencadeou as lesões na Vitimada. Ademais, ainda que se admitisse que o ato primário lesivo por parte da Vítima, a contraposição física exercida pelo Réu seria, deveras, totalmente imoderada e descomedida. Nesse caso, a conduta reativa do Denunciado, caso fosse aceita, se mostraria desproporcional à investida da Ofendida contra ele, comportamento que também afasta o reconhecimento da legítima defesa. A propósito, assim se posicionou nosso egrégio Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento da apelação criminal nº 026180014164, de relatoria do Exmo. Desembargador Willian Silva: “APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL GRAVE. LEGÍTIMA DEFESA. ATUAÇÃO EM EXCESSO. AUSÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIA. RECONHECIMENTO DA OCORRÊNCIA DOS FATOS PELO PRÓPRIO RECORRENTE. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DIANTE DO LAUDO DE EXAME NÃO DESCONSTITUÍDO. RECURSO DESPROVIDO. O art. 25 do CP autoriza sua aplicação e o consequente reconhecimento da legítima defesa quando houver o emprego moderado de meios necessários para repelir injusta agressão, atual ou iminente. A atuação em excesso requer o reconhecimento da culpabilidade do agente. Tendo o Recorrente reconhecido a ocorrência dos fatos tal como descrito pela vítima, não há como se falar em ausência de prova de autoria do crime. Não é possível se proceder à desclassificação do tipo de lesão corporal grave para o de lesão corporal (leve) quando o agente não é capaz de desconstituir prova consubstanciada em Laudo de exame corporal realizado oficialmente. Recurso desprovido” (Fonte: www.tjes.jus.br–destaquei). Sendo assim, não cabe aqui, sob nenhuma circunstância, se falar em absolvição. Com relação a tese ventilada pela combativa defesa constituída em sede de alegações finais, de desclassificação do crime de lesão corporal para a contravenção penal de vias de fato, tal pleito subsidiário não merece a tutela pretendida. A conduta do Réu em empurrar a Vítima, lesionando-a teve como consequência as lesões descritas no laudo de exame de lesões corporais nº 20.845 (fl. 21 do inquérito policial nº 1.127/2021), não há espeço para acolhimento da tese desclassificatória defensiva. A propósito, assim se posicionou nosso egrégio Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento da apelação criminal nº 048180247248, de relatoria do Exmo. Desembargador Willian Silva: “LESÃO CORPORAL. LEI MARIA DA PENHA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA A CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO. NÃO CABIMENTO. PENA-BASE. EXCESSO INEXISTÊNCIA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO. 1. “...Omissis...”. 2. Não há de se falar em desclassificação do delito de lesão corporal para a contravenção penal de vias de fato (Art. 21 da Lei 3688/41), uma vez que devidamente demonstrado nos autos a ocorrência de ofensa à integridade física da vítima. 3. “...Omissis...”. 4. Recurso desprovido” (fonte: www.tjes.jus.br – destaquei). Deste modo, à luz dos elementos suso mencionados, resta demonstrada, de forma irrefutável, a prática do crime de lesão corporal (art. 129, § 13, do CP) por parte do denunciado Willian Batista Sodré, não havendo que se falar em insuficiência de provas hábeis a arrimar um édito condenatório. 1.1. DAS CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES E AGRAVANTES. Tendo em vista a confissão qualificada do Acusado em sendas policial e processual (fls. 22-23 do procedimento investigativo nº 1.127/2021 em apenso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), em atenção ao entendimento firmado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.972.098/SC, cuja relatoria ficou a cargo do Exmo. Ministro Ribeiro Dantas, de que “o réu fará jus à atenuante do art. 65, III, “d”, do CP quando houver admitido a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória, e mesmo que seja ela parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada”, milita em prol do Denunciado a circunstância atenuante prevista no art. 65, inciso III, letra “d”, do Digesto Repressivo. Entrementes, milita em desfavor do Denunciado a circunstância agravante elencada no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Digesto Repressivo, que possui a seguinte redação: “Art. 61 – São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime: (…). f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica.” Em relação a circunstância agravante prevista no art. 61, letra “f”, do Código Penal, vejamos como decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do agravo regimental no recurso especial nº 1.991.610/MS, em que a relatoria ficou a cargo do Exmo. Ministro Sebastião Reis Júnior: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. LESÃO CORPORAL EM AMBIENTE DOMÉSTICO. VIOLAÇÃO DO ART. 61, II, F, DO CÓDIGO PENAL. RESTABELECIMENTO DA AGRAVANTE DO CRIME PRATICADO PREVALECENDO-SE DE RELAÇÕES DOMÉSTICAS. NÃO OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. JURISPRUDÊNCIA DE AMBAS AS TURMAS. PREVALÊNCIA DO VOTO VENCIDO DA APELAÇÃO CRIMINAL QUE SE IMPÕE. 1. [...] o Superior Tribunal de Justiça entende que "a aplicação da agravante prevista no art. 61, II, f, do CP, de modo conjunto com outras disposições da Lei n. 11.340/2006 não acarreta bis in idem, pois a Lei Maria da Penha visou recrudescer o tratamento dado para a violência doméstica e familiar contra a mulher" (AgRg no AREsp 1.079.004/SE, Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 13/6/2017, DJe 28/6/2017) - (AgRg no HC n. 720.797/SC, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 25/3/2022). 2. Consoante orientação desta Corte Superior, a aplicação da agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea f, do Código Penal de modo conjunto com outras disposições da Lei n. 11.340/2006 não consubstancia bis in idem, pois a Lei Maria da Penha visou recrudescer o tratamento dado para a violência doméstica e familiar contra a mulher (AgRg no AREsp n. 1.954.688/MS, Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, DJe de 3/10/2022)...;” (fonte: www.stj.jus.br – destaquei). 1.2. DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DE PENA. Inexistem. 2. DOS CRIMES DE AMEAÇA (ART. 147, “CAPUT” DO CÓDIGO PENAL). Estabelece o art. 147, “caput”, do Código Penal o seguinte: “Art. 147. Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave. Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.” A ameaça é a manifestação idônea da intenção de causar a alguém qualquer mal injusto ou grave. Conforme preleciona Rogério Greco, em “Curso de Direito Penal”, Vol. II, 8ª edição, editora Impetus, pág. 507: “O delito de ameaça talvez seja, à primeira vista, de pouca importância, principalmente levando em consideração as penas a ele cominadas. Entretanto, a experiência demonstra que, na verdade, a ameaça é o primeiro degrau para o cometimento de infrações penais efetivamente graves.” O art. 147 do Código Penal aponta os meios que pode o autor se valer para concretizar a ameaça, podendo a mesma ser praticada por intermédio de palavras, escritos, gestos ou qualquer outra forma hábil a tanto. Exige ainda o tipo em análise que o mal prometido pelo agente seja injusto e grave, capaz de infundir temor à vítima, caso venha a ser efetivamente cumprido o prenúncio. Pois bem. Expostas as considerações doutrinárias acerca do tipo penal em epígrafe, passo a análise da materialidade e autoria delitivas. 2.1. DO FATO OCORRIDO NO DIA 17.12.2021. Da materialidade. Decorre, basicamente, dos seguintes elementos: 1) do boletim unificado nº 46591594 (fls. 03 e verso-04 do feito informativo nº 84/2022) e, 2) das declarações prestadas em ambos os estágios da persecução penal pela vítima Jéssica de Assis Rozário (fls. 05 e 18-19 e verso do procedimento investigativo nº nº 84/2022 e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL). Da autoria. Insta ressaltar que, no caso em testilha, do conjunto probatório amealhado aos autos, emergem evidências palpáveis e inequívocas que apontam ter o denunciado Willian Batista Sodré, de fato, no dia 17.12.2021, ameaçou verbalmente a vítima Jéssica de Assis Rozário, sua ex-convivente, ao telefoná-la e dizer que “o que ela fez terá consequências", “que a vítima está fudida" e “que é para rezar para a polícia não pegá-lo", tendo o Denunciado logrado êxito nos intentos de causar à Vítima temor e perturbação psíquica. Importa o realce de que os termos intimidadores empregados pelo Denunciado perfeitamente se situam no tipo penal em destaque, eis que as aludidas expressões incutiram na Vítima temor e perturbação assaz causadores de abalo à paz de espírito. Sobre o tema, assim leciona o doutrinador Rogerio Greco em sua obra “Código Penal: comentado. – 11. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017.p. 676”: “....; Como a imaginação das pessoas é fértil e não tendo o legislador condições de catalogar todos os meios possíveis ao cometimento do delito de ameaça, o art. 147 do Código Penal determinou que fosse realizada uma interpretação analógica, ou seja, após apontar, casuisticamente, alguns meios em virtude dos quais poderia ser cometido o delito de ameaça, vale dizer, após uma fórmula exemplificativa – palavra, escrito ou gesto –, a lei penal trouxe uma fórmula genérica – ou qualquer outro meio simbólico...;” (destaquei). Interrogado nas etapas informativa e judicial (fls. 15-16 e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), o Acusado negou a prática do delito em testilha. Contudo, há substrato probatório apto a sustentar a condenação pelo crime de ameaça em tela, consoante relatos prestados pela ofendida Jéssica de Assis Rozário em fase judicial (link:https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), onde convalida o que dissera outrora à autoridade policial, às respectivas fls. 05 e 18-19 e verso – do procedimento informativo nº 84/2022 em apenso. Vejamos: “...; a vítima comparece a esta delegacia especializada para registrar boletim de ocorrência em desfavor de William Batista Sodré, com quem teve um relacionamento amoroso ha 04 anos; que o casal possui uma filha de 01 ano e 01 mês de idade…; relata ainda que o Sr. Willian liga para a noticiante todo o tempo; relata ainda que o Sr. Willian ameaça a vida da noticiante dizendo que o que a vítima fez tem consequências, que a vítima está fudida, que é para a noticiante rezar para a polícia não pegá-lo; que entendeu ser uma ameaça a vida...;” (destaquei). “...; que perguntada, conforme o boletim, se ele disse que 'o que ela fez tem consequências', que ela 'estava fudida e que 'era para ela rezar para a policia não pegá-lo', afirma (...) ele disse tudo isso aí...;” (destaquei). Deveras, é cediço que em delito deste jaez (crime de ameaça no âmbito doméstico e familiar), pela usual ausência de outras testemunhas no “locus delicti”, a palavra da vítima acaba por assumir essencial relevância, e, quando encontra ressonância nas demais provas coligidas aos autos – o que se vislumbra na hipótese vertente – serve de arrimo a um édito condenatório (v.g. STJ, recurso ordinário em habeas corpus nº 108.350/RN, cujo relator foi o Exmo. Ministro Ribeiro Dantas. TJES, apelação criminal nº 0008458-47.2018.8.08.0011, de relatoria do Exmo. Desembargador Fernando Zardini Antonio). Por derradeiro, ressalto que o crime de ameaça foi praticado no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, haja vista que o Denunciado e a Vítima foram conviventes, restando configurada inegável violência de natureza psicológica, atraindo, portanto, a incidência da Lei Federal nº 11.340/2006, na forma de seu art. 5°, inciso III. Os elementos de prova acima concatenados estabelecem, como certa a prática do delito em tela, haja vista que o Acusado, resolveu incutir à Vitimada promessa de mal injusto e grave, resultando em causar a Ofendida temor e intimidação, ao verbalmente dizê-la que “o que ela fez terá consequências", “que a vítima está fudida" e “que é para rezar para a polícia não pegá-lo". Destarte, à luz dos elementos probatórios coligidos aos autos, convenço-me, na forma do sistema adotado pelo art. 155, “caput”, do Estatuto Processual Penal, que o denunciado Willian Batista Sodré praticou as condutas tipificadas no art. 147, “caput”, do Código Penal. 2.1.1. DAS CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES E AGRAVANTES. Inexistem circunstâncias atenuantes. Entrementes, recai sobre o Acusado a circunstância agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Digesto Repressivo, já reconhecida no item “1.1” deste “decisum”. 2.1.2. DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DE PENA. Inexistem. 2.2. DO FATO OCORRIDO NO DIA 05.07.2022. Como se sabe, a palavra da Vítima em que crimes desta natureza possui peso diferenciado, quando se apresentam na cena criminosa apenas Vítima e Agressor, desde que àquela versão se alinhe aos demais elementos constantes dos autos. Pois bem. Conforme já mencionado no relatório, o “Parquet”, por sua ilustre presentante legal, pugnou pela condenação do acusado Willian Batista Sodré na ira do art. 147, “caput”, do Código Penal, por ter supostamente, no dia 05.07.2022, deixado no interior da residência de sua ex-convivente, ora vítima Jéssica dos Santos Rozario, uma arma branca (faca) ao lado das bijuterias da mesma (Vitimada), bem como teria deixado no referido ambiente domiciliar quatro bilhetes com ameaças, dizendo "isso é pelo que você fez com nosso irmão", "a nossa tropa vai te pegar, você e seu namorado", "outra coisa, suas dívidas serão pagas". Em decorrência do episódio acima, o titular da demanda penal denunciou o Acusado pela prática das intimidações figurativas listadas alhures. Contudo, depois de esgotada a fase probatória, não foram os autos municiados de prova segura de cometimento do crime em tela pelo Réu, como se verá adiante. De acordo com a peça acusatória, a Vítima teria sido alvo de ameaças de morte por parte do Acusado, quando este compareceu à vivenda dela (Ofendida), lá deixando o artefato (faca), além de bilhetes manuscritos com dizeres ameaçadores. Ocorre que não foi amealhada aos autos prova categórica de que o Réu adentrou à moradia da Vítima no dia do evento criminoso, tão pouco lá deixara os bilhetes de cunho intimidador. Ao ser ouvida na fase investigativa (fls. 08 e verso e 14-15 e verso), a vítima Jéssica de Assis Rozario declarou o seguinte: “...; a Noticiante comparece a esta Unidade Policial e relata que possui medida protetiva em desfavor da pessoa de Willian Batista Sodre expedida pela 5ª Vara Criminal de Cariacica ano 2021; a Noticiante relata que o autor no mês de julho/22 foi preso devido descumprimento da medida protetiva; a Noticiante relata que no dia 04/07/22 entrou no sistema do Tribunal de Justiça e ficou sabendo que o Autor se encontrava solto; a noticiante relata que na data e hora acima citada ao chegar em casa se deparou com a janela de sua residência quebrada, que tem certeza ter sido o Autor, uma vez que o Autor chegou na residência de sua mãe após sair do presídio no dia 05/07/22; a Noticiante relata que além da janela quebrada, seus materiais de trabalho (bijuterias) se encontravam espalhados no quintal e dentro de casa e alguns quebrados; a Noticiante relata alega ter sido o Autor ter entrado em sua casa e alega que ele deixou uma faca ao lado dos materiais da noticiante de trabalho; a Noticiante relata que foi deixado 4 bilhetes escrito a mão em que acha que a letra é do Autor e que estava escrito nos bilhetes “isso é pelo o que você fez com o nosso irmão" "a nossa tropa vai te pegar, você e seu namorado" "outra coisa suas dívidas vão ser pagas"; a Noticiante não trouxe os bilhetes e relata estarem em casa, que possui fotos da casa do jeito que ficou quando chegou em casa...;” (destaquei). “...; que sobre o IP 667/22, do dia 05/07/22 afirma que estava na casa de sua irmã quando precisou ir até sua casa pegar documentos da filha para levá-la ao médico; que lá quando chegou, já viu a janela da sala quebrada e seus materiais de bijuterias espalhados pelo quintal; que entrou na casa e viu quatro bilhetes (que agora faz juntar aos autos), em um deles estava escrito “as suas dívidas estão pagas”, no outro “isso é pelo que você fez o nosso irmão”, em outro “nossa tropa vai pegar você e seu namorado” e no último “e tem mais”, que reconhece a letra dos bilhetes como sendo a de Willian; que afirma que Willian tentou dar a entender que os “meninos do tráfico” da região fizeram isso para vingá-lo...”;” (destaquei). Em senda processual (link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL, embora tenha a Ofendida mantido as versões externadas outrora à autoridade policial, sua versão não se mostra segura o suficiente para amparar a pretensão acusatória. Digo isto pautado no fato de que a Vítima não estava em sua moradia no momento em que foram deixados os bilhetes e a faca para intimidá-la. O fato de o Réu estar insistindo, até de forma excessiva, na retomada do relacionamento amoroso com a Vítima, não pode ser elemento probatório o bastante para cravar ter sido aquele quem deixou os bilhetes intimidadores e a faca, esta junto as bijuterias da Ofendida. O Réu, nos dois momentos em que foi interrogado ((fls. 11-12 e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL, negou a prática do delito em testilha. Para sustentar a autoria do delito pelo Réu, a Vítima se escorou em um relato prestado por seu ex-cunhado “Michel”, irmão do Denunciado, o qual teria entregue à Vitimada alguns pertences e documentos dos quais deu falta no dia do evento delituoso e teriam sido encontrados no interior do veículo do próprio Acusado. Na mesma esteira, a Ofendida asseverou em esfera processual de que o Acusado chegou a enviar uma fotografia para a irmã da Vítima da invasão à vivenda dela e queimando uma roupa da Vitimada no dia dos fatos. Contudo, tais pontos não são fortes o suficiente para dirigir ao Denunciado o cometimento do delito em comento, já que o Acusado nega ter sido ele quem teria escrito os bilhetes, além do fato de que a irmã da Vítima que teria recebido a fotografia enviado pelo Réu no dia dos eventos não foi inquirida na fase informativa para esclarecimento dos fatos em apreço, tão pouco em juízo, pontos estes que a meu sentir, fragilizam a tese acusatória. A propósito, vejamos como decidiu em caso similar o colendo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o agravo em recurso especial nº 1.940.381/AL, de relatoria do Exmo. Ministro Ribeiro Dantas: “PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO A HOMICÍDIO TENTADO. TESE DE LEGÍTIMA DEFESA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA PARA SUA REJEIÇÃO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. TESTEMUNHO INDIRETO (HEARSAY TESTIMONY) QUE NÃO SERVE PARA FUNDAMENTAR A CONDENAÇÃO. OFENSA AO ART. 212 DO CPP. AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO, PELA POLÍCIA, DAS TESTEMUNHAS OCULARES DO DELITO, IMPOSSIBILITANDO SUA OUVIDA EM JUÍZO. FALTA TAMBÉM DO EXAME DE CORPO DE DELITO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 6º, III E VII, E 158 DO CPP. DESISTÊNCIA, PELO PARQUET, DA OUVIDA DE DUAS TESTEMUNHAS IDENTIFICADAS E DA VÍTIMA. GRAVES OMISSÕES DA POLÍCIA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO QUE RESULTARAM NA FALTA DE PRODUÇÃO DE PROVAS RELEVANTES. TEORIA DA PERDA DA CHANCE PROBATÓRIA. DESCONSIDERAÇÃO DO DEPOIMENTO DO REPRESENTADO. EVIDENTE INJUSTIÇA EPISTÊMICA. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL, A FIM DE ABSOLVER O RECORRENTE. 1 a 5. “...Omissis...”. 6. "Nas hipóteses em que o Estado se omite e deixa de produzir provas que estavam ao seu alcance, julgando suficientes aqueles elementos que já estão à sua disposição, o acusado perde a chance - com a não produção (desistência, não requerimento, inviabilidade, ausência de produção no momento do fato etc.) -, de que a sua inocência seja afastada (ou não) de boa-fé. Ou seja, sua expectativa foi destruída" (ROSA, Alexandre Morais da; RUDOLFO, Fernanda Mambrini. A teoria da perda de uma chance probatória aplicada ao processo penal. Revista Brasileira de Direito, v. 13, n. 3, 2017, p. 462). 7. Mesmo sem a produção de nenhuma prova direta sobre os fatos por parte da acusação, a tese de legítima defesa apresentada pelo réu foi ignorada. Evidente injustiça epistêmica - cometida contra um jovem pobre, em situação de rua, sem educação formal e que se tornou pai na adolescência -, pela simples desconsideração da narrativa do representado...;” (Fonte: www.stj.jus.br – destaquei). Na mesma esteira, o irmão do Réu, Sr. Mychel Fagner Batista Sodré, inquirido em estágio processual, não confirmou a versão da Vítima de que teria entregue a ela a certidão de nascimento da filha do Réu e da Vítima e duas bolsas, as quais teriam sido extraviadas da vivenda da Ofendida no dia do evento delituoso em tela. Nesse caso, penso que os elementos trazidos para o caderno processual são insuficientes para alicerçar um juízo de certeza que um decreto condenatório necessita, diante do princípio constitucional da presunção de não culpabilidade (art. 5º, inciso LVII, da CRFB), que dele decorre o princípio “in dubio pro reo”. A propósito, assim se posicionou nosso egrégio Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento da apelação criminal nº 0001957-94.2017.8.08.0049, cuja relatoria ficou a cargo do Exmo. Desembargador Fernando Zardini Antonio: “APELAÇÃO CRIMINAL. VIAS DE FATO. ART. 21, DO DECRETO-LEI N. 3.688/41, DUAS VEZES, N/F DA LEI N. 11.340/06. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. PLEITO DE CONDENAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. ART. 386, VII, CPP. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. PRINCÍPIO DO “IN DUBIO PRO REO”. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. No contexto das relações domésticas e de coabitação, é pacífico neste colegiado o entendimento segundo o qual a palavra da vítima reveste-se de especial relevância na elucidação de casos de violência doméstica ou familiar, sobretudo porque praticados, de ordinário, na intimidade do lar, longe da presença de terceiros. Entretanto, é também verdade que o relato da vítima não é absoluto, devendo ser avaliado em confronto com os demais elementos de prova amealhados no decorrer da instrução processual. 2. No caso em apreço, as parcas provas produzidas sob o crivo do contraditório judicial, são insuficientes para comprovar a autoria delitiva do apelado. 3. Mostra-se, por isso, inviável proceder a condenação do recorrido com base tão única e exclusivamente na palavra da vítima, sem considerar os demais elementos amealhados aos autos, devendo, nessa hipótese, imperar o princípio in dubio pro reo, procedendo-se a absolvição do réu na forma do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Absolvição mantida. 4. Recurso conhecido e improvido” (fonte: www.tjes.jus.br – destaquei). A fim de reforçar o meu entendimento, não podemos perder de vista para a hipótese concreta, que no processo penal brasileiro, vigora o princípio “in dubio pro reo”, pelo qual estando o julgador em uma situação de dúvida, deve esta beneficiar o acusado. Desta feita, diante da precariedade dos elementos de cognição encartados aos autos, entendo que merece o denunciado Wiilian Batista Sodre ser absolvido pela suposta prática do crime de ameaça datado de 05.07.2022, porquanto eventual condenação pelo crime previsto no art. 147, “caput” da Lei Substantiva Penal, beiraria a ilegalidade e a arbitrariedade. 3. DO CRIME DE PERSEGUIÇÃO. Preconiza o art. 147-A do Código Penal: “Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.” O crime descrito no art. 147-A, “caput”, do Digesto Penal, foi introduzido recentemente na Lei Substantiva Penal pela Lei Federal nº 14.132, publicada no dia 01º.04.2021. De acordo com a redação do citado dispositivo, o crime de “perseguição” assim se efetiva quando o agente persegue alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Na lição do saudoso Damásio E. de Jesus, em artigo científico intitulado “stalking”, tal é “uma forma de violência na qual o sujeito ativo invade a esfera de privacidade da vítima, repetindo incessantemente a mesma ação por maneiras e atos variados, empregando táticas e meios diversos: ligações nos telefones celular, residencial ou comercial, mensagens amorosas, telegramas, ramalhetes de flores, presentes não solicitados, assinaturas de revistas indesejáveis, recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída da escola ou do trabalho, espera de sua passagem por determinado lugar, frequência no mesmo local de lazer, em supermercados etc”. Restando expostas as ponderações de ordem propedêutica, passo a analisar acerca da materialidade e da autoria do crime em epígrafe. Depois de percorrida a instrução probatória, convencido estou de que não há provas inequívocas do cometimento do delito em mote, conforme fundamentos adiante alinhavados. De acordo com a denúncia, o Réu, no dia 17.12.2021, teria ligado para o celular da Vítima aproximadamente vinte vezes, bem como supostamente enviou sessenta e dois áudios e várias mensagens de texto para ela (Ofendida), além de, depois de ter tido o número do celular bloqueado pela Vitimada, o Denunciado passou a enviar mensagens para a mesma (Vítima) por outros números desconhecidos. A denúncia se apoiou no que disse a vítima Jéssica de Assis Rozario, que ao ser ouvida em duas oportunidades (fls. 05 e verso do fólio investigativo nº 84/2022 e 14-15 e verso), declarou o seguinte à autoridade policial: “...; relata ainda que durante a madrugada da data de hoje (17/12/21) não conseguiu trabalhar pois o Sr. Willian ligou para o celular da noticiante umas 20 vezes e mandou 62 áudios e também mandou mensagens de texto que tentou bloquear o telefone do autor, porém ele conseguiu outros números e mandou mensagens através de números desconhecidos da noticiante que o autor ainda invadiu seu instagran e mudou a senha da noticiante...;” (destaquei). “...; que sobre a madrugada do dia 17/12/21, afirma que recebeu inúmeras ligações e mensagens de Willian…; que perguntada se e quando bloqueou o número de telefone de Willian, afirma (..) eu acho que eu bloqueei ele depois dessas mensagens (juntadas)'...;” (destaquei). Em que pese a Vítima tenha, por ocasião da audiência instrutória mantida as versões por ela apresentadas em fase informativa, tenho que a sanha persecutória por parte do Réu não restou inconteste, haja vista que durante esse período o ex-casal manteve contatos para tratar de assuntos atinentes à filha em comum. Esse ponto fulcral foi também apontado pelo Denunciado em seus interrogatórios policial e processual, oportunidade em que, além de negar ter perseguido a Ofendida, afirmou que os contatos feitos se deram no propósito de reatamento do relacionamento amoroso e em tratativas decorrentes do processo de separação. Logo, a meu sentir, não restou demonstrado nos autos provas suficientes de que o Réu exercia perseguição atroz em face da Vitimada, razão pela qual, em comunhão com a posição adotada pela instituição ministerial e defesas da Vítima e do Acusado, deve ser este absolvido. Nesse sentido, assim já decidiu o egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, quando julgou a apelação criminal nº 0705366-56.2023.8.07.0016, cuja relatoria ficou a cargo do Exmo. Desembargador Roberval Casemiro Belinati: “APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA E DE PERSEGUIÇÃO. RAZÕES DA CONDIÇÃO DE SEXO FEMININO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRETENSÃO CONDENATÓRIA. MATERIALIDADE E AUTORIA NÃO COMPROVADAS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Confirma-se a sentença que absolveu o réu da imputação da prática dos crimes de descumprimento de medidas protetivas de urgência e de perseguição contra mulher por razões do sexo feminino, praticados em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher. 2. Da valoração do conjunto probatório, não se pode extrair que as condutas praticadas pelo acusado se amoldam, objetiva e subjetivamente, aos crimes que lhe foram imputados. 3. Uma condenação somente pode ter supedâneo em provas concludentes e inequívocas, não sendo possível condenar alguém sem a prova plena e inconteste, e, não sendo esta a hipótese dos autos, cumpre manter a absolvição do apelado...;” (fonte: www.tjdft.jus.br – destaquei). Desta feita, diante da precariedade dos elementos de cognição encartados aos autos, entendo que merece o denunciado Wilian Batista Sodre ser absolvido, porquanto eventual condenação pelo crime previsto no art. 147-A, § 1º, inciso II, da Lei Substantiva Penal, beiraria a ilegalidade e a arbitrariedade. 4. DOS CRIMES DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO (ART. 150, “CAPUT”, DO CÓDIGO PENAL). Preconiza o Art. 150, “caput”, do Código Penal: “Art. 150 – Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.” Segundo o renomado doutrinar Rogério Greco, em sua obra “Código Penal: comentado. – 11. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017, pp. 726-728”, o delito de violação de domicílio trata-se de crime comum; doloso, de mera conduta, de forma livre, comissivo (na modalidade de entrar) e omissivo (na modalidade de permanecer); instantâneo ou permanente (pois a sua consumação se perpetua enquanto houver a violação do domicílio com a permanência do agente em casa alheia ou em suas dependências); monossubjetivo, podendo, também, ser visualizado como unissubsistente (se houver concentração de ato, como ocorre com a modalidade permanecer), ou plurissubsistente (como acontece, como regra, com a modalidade entrar); de ação múltipla ou de conteúdo variado (podendo o agente entrar e ainda permanecer em casa alheia ou em suas dependências, devendo ser responsabilizado por uma única infração penal). Admite tentativa. Para Greco, o objeto material são as casas ou suas dependências. O objeto jurídico é a tranquilidade doméstica. Ainda segundo o doutrinador acima, o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Noutro viés, o sujeito passivo é aquele identificado pelo tipo do art. 150 do Código Penal por meio da expressão de quem de direito. Na verdade, não somente a pessoa a quem a lei atribui a faculdade de negar ou consentir o ingresso em sua casa pode ser considerado sujeito passivo do crime de violação de domicílio. Isso porque, como no delito em estudo se procura proteger a paz doméstica, a tranquilidade no lar, a liberdade que todos nós temos o direito de exercer dentro de nossa casa, qualquer morador poderá figurar como sujeito passivo da referida infração penal, independentemente do regime que se adote, ou seja, de subordinação ou de igualdade, também não se exigindo qualquer característica especial do sujeito passivo, que pode ser qualquer pessoa capaz de compreender o mal prometido. Por fim, destaca Rogério Greco que o elemento subjetivo do tipo é o dolo, seja ele direto ou mesmo eventual, sem, contudo, previsão de modalidade culposa. Restando expostas as ponderações de ordem propedêutica, passo a analisar acerca da materialidade e da autoria dos crimes em epígrafe. 4.1. DO FATO OCORRIDO NO DIA 14.12.2021. Da materialidade. Decorre, basicamente, dos seguintes elementos de cognição: 1) do boletim unificado nº 46591594 (fls. 03 e verso-04 do fólio investigativo nº 84/2022 em apenso); 2) das declarações declarações extrajudiciais da vítima Jéssica de Assis Rozario em ambos os estágios da persecução penal (fls. 05 e 18-19 e verso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL) e, 3) da confissão parcial do Réu em estágios policial e processual (fls. 15-16 e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL) Da autoria. Insta ressaltar que, no caso em tela, restou comprovada, de forma suficiente, a prática por parte do denunciado Willian Batista Sodre, do crime de violação de domicílio, posto que, de fato, no dia 14.12.2021, ingressou clandestinamente à residência de sua ex-convivente Jéssica de Assis Rozario, situada à Rua Nestor Vieira, nº 19, bairro Dom Bosco, nesta municipalidade. O acervo probatório coligido durante ambas as fases da persecução penal demonstrou, com plenitude, a certeza do cometimento do crime em apreço pelo Acusado, cujas provas serão adiante externadas. Ao ser inquirido na fase investigativa, às fls. 15-16, bem como em juízo (link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), o Denunciado confessou, em parte, a prática do fato criminoso que lhe foi imputado na peça incoativa, ao admitir que, de fato, foi à vivenda de sua ex-convivente, ora Vítima, no entanto, somente se dirigiu ao local para consertar o micro-ondas a pedido da própria Ofendida. Deveras, a confissão extrajudicial do Denunciado, quando tomada por termo nos autos, sob o crivo das garantias constitucionais – em especial do contraditório – constitui uma das modalidades de prova com maior efeito de convencimento, simplificando a instrução e conferindo ao julgador a certeza moral de uma condenação justa. Se não bastasse a confissão parcial do Acusado, vejamos o que declarou a Vítima em fase extrajudicial, às respectivas fls. 05 e verso e 18-19 e verso: “...; relata ainda que o Sr. Willian não vem cumprindo a decisão judicial e na data acima citada o Sr. Willian invadiu a residência; que o Sr. Willian quebrou sua janela e amassou sua estante da sala; relata ainda que no momento não estava em casa porém o Sr willian confirmou ter ido na casa da noticiante alegando ter ido para consertar o micro-ondas...;” (destaquei). “...; que sobre o IP 084/22, de 14/12/21 informa que chegou do trabalho pela manhã e percebeu, já do lado de fora, que a janela da sala estava com o vidro trincado e um pouco aberta; que lá dentro, percebeu que a estante de aço, que fica na sala, estava amassada, que acredita que Willian tenha se apoiado nessa estante para entrar, que pelo jeito como a casa estava, acredita que Willian só tenha passado a noite lá, pois a declarante não deu falta de nada; que ligou para Willian perguntando o motivo dele ter ido até lá, tendo ele respondido que foi para consertar o micro-ondas pois sabia que a declarante estava sem gás de cozinha; que perguntada como ele sabia disso, afirma (...) desde antes dele sair, eu já tava sem gás. Ai eu passei uns dias na casa do meu irmão e continuei sem comprar…” (destaquei). Em ciclo dialético (link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), a Ofendida confirmou os fatos por ela externados em cenário pré-procesual. No caso em análise, a prova colhida em ambas as esferas da persecução penal apontaram sobejamente que o Réu adentrou à residência da Ofendida, sem permissão e autorização dela, violando, assim, a conduta típica versada no art. 150, “caput”, da Lei Substantiva Penal. A tese de que ingressou à vivenda da Vítima a pedido desta não restou provada nos autos, cuja alegação do Acusado se mostrou sozinha e soltura se confrontada com as demais provas coligidas. Deste modo, à luz dos elementos suso mencionados, resta demonstrada, de forma irrefutável, a prática do crime de violação domiciliar (art. 150, “caput”, do CP) por parte do denunciado Willian Batista Sodre, não havendo que se falar em insuficiência de provas hábeis a arrimar um édito condenatório. 4.1. DAS Circunstâncias atenuantes E AGRAVANTES. Tendo em vista a confissão parcial do Acusado em ambos os estágios da persecução penal, em atenção ao entendimento firmado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do recurso especial nº 1.972.098/SC, cuja relatoria ficou a cargo do Exmo. Ministro Ribeiro Dantas, de que “o réu fará jus à atenuante do art. 65, III, “d”, do CP quando houver admitido a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória, e mesmo que seja ela parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada, milita em prol do Denunciado a circunstância atenuante prevista no art. 65, inciso III, letra “d”, do Digesto Repressivo. Por outro lado, incide em desfavor do Réu a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Digesto Repressivo, já reconhecidas em linhas anteriores. 4.1.2. DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO E AUMENTO DE PENA. Inexistem. 4.2. DO FATO OCORRIDO NO DIA 05.07.2022. De antemão, penso que a pretensão acusatória em destaque não pode ser abrigada, como se verá adiante. Pois bem. De acordo com a denúncia, teria o Acusado no dia 05.07.2022 ingressado clandestinamente à residência da Vítima, quando conjecturalmente “quebrou uma janela, espalhou materiais de trabalho (bijuterias) da vítima pela casa e pelo quintal, além de quebrar alguns deles”. A pretensa acusação inicial teve, por alicerce, a declaração extrajudicial da Vítima (fls. 08 e 14-15 e verso), onde relatou o seguinte: “...; a noticiante relata que na data e hora acima citada ao chegar em casa se deparou com a janela de sua residência quebrada, que tem certeza ter sido o Autor, uma vez que o Autor chegou na residência de sua mãe após sair do presídio no dia 05/07/22; a Noticiante relata que além da janela quebrada, seus materiais de trabalho (bijuterias) se encontravam espalhados no quintal e dentro de casa e alguns quebrados; a Noticiante relata alega ter sido o Autor ter entrado em sua casa e alega que ele deixou uma faca ao lado dos materiais da noticiante de trabalho; a Noticiante relata que foi deixado 4 bilhetes escrito a mão em que acha que a letra é do Autor e que estava escrito nos bilhetes “isso é pelo o que você fez com o nosso irmão" "a nossa tropa vai te pegar, você e seu namorado" "outra coisa suas dívidas vão ser pagas"; a Noticiante não trouxe os bilhetes e relata estarem em casa, que possui fotos da casa do jeito que ficou quando chegou em casa; a Noticiante relata que havia duas carteiras dela uma com documentos e outra da loja da Noticiante que foi levado, que sumiu também a certidão de nascimento da filha do casal; que sumiu também os uniformes da Noticiante que trabalha como técnica de enfermagem; que sumiu também duas bolsas que ela usa para trabalhar, uma chapinha e um secador; a Noticiante relata ainda que sua energia foi desligada, perdendo vários alimentos que estavam dentro da geladeira; a Noticiante relata que quer ser ressarcida dos danos causados pelo autor em sua residência e seus pertences; que não foi possível acionar a perícia para o local devido a noticiante alegar não ter ninguém em casa e que não tem como deixar ninguém para esperar a perícia no local e que a casa se encontra fechada; que a Noticiante foi informada de que precisa sempre ter alguém para receber a perícia da polícia civil; a noticiante relata que não se encontra na residência onde o fato ocorreu, que no momento se encontra morando na residência de uma irmã ...;” (destaquei). “...; que sobre o IP 667/22, do dia 05/07/22 afirma que estava na casa de sua irmã quando precisou ir até sua casa pegar documentos da filha para levá-la ao médico; que lá quando chegou, já viu a janela da sala quebrada e seus materiais de bijuterias espalhados pelo quintal; que entrou na casa e viu quatro bilhetes (que agora faz juntar aos autos), em um deles estava escrito as suas dívidas estão pagas, no outro isso é pelo que você fez o nosso irmão, em outro “nossa tropa vai pegar você e seu namorado e no último e tem mais, que reconhece a letra dos bilhetes como sendo a de Willian”; que afirma que Willian tentou dar a entender que os 'meninos do tráfico' da região fizeram isso para vingá-lo; que acha que Willian foi solto no dia 04/07/22 mas Sandra lhe disse que ele só apareceu na manhã daquele dia 05/07/22; que deu falta de duas bolsas de colo, secador de cabelo, chapinha, seus uniformes de trabalho, roupas de sair, sua carteira contendo CPF, cartão de ticket, cartão SUS e a certidão de nascimento de sua filha; que ele também levou a botija de gás e vendeu, segundo Michel, irmão dele; que sabe que foi Willian quem pegou essas coisas pois, na semana passada, Michel devolveu à declarante as duas bolsas levadas e a certidão da filha e disse que os encontrou dentro do carro de Willian; que a energia da casa também foi cortada, na oportunidade dessa invasão, fazendo que com que alimentos que estavam resfriados na geladeira estragassem...;” (destaquei). Em cenário processual ((link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), a ofendida Angélica de Oliveira Araújo confirmou a versão por ela externada em senda investigativa. Em que pese tenha a Vítima confirmado em juízo as declarações por ela externadas em senda extrajudicial, tenho que as provas dos autos não admitem a condenação do Réu pelo delito em comento. Justifico. A Ofendida afirmou estar convicta de que o Réu estivera, contra a vontade dela, em sua residência no dia 05.07.2022. Contudo, tal conclusão parte da ideia de que o Denunciado não se mostrava satisfeito com o término do relacionamento com a Ofendida. Cheguei a esse ponto depois de cotejar todos os dados contidos nos autos, dentre os quais, o fato de que, quando da noticiada invasão domiciliar a Ofendida não se encontrava presente em sua moradia. Outro elemento importante a ser considerado é o fato de que não houve testemunha que tenha visto o Acusado adentrando clandestinamente à vivenda da Ofendida, tão pouco há registro fotográfico ou audiovisual de que seja o Denunciado aquele quem ingressara, de modo clandestino, à mencionada residência. Cabe anotar que o Sr. Mychel Fagner Batista Sodré, irmão do Réu, inquirido em etapa dialética negou estar em posse de qualquer documento em nome da sobrinha – filha do ex-casal (Vítima e Réu), o que torna insubsistente a versão da Vítima de que teria recebido pelas mãos do citado Informante a certidão de nascimento e duas bolsas, as quais teriam sido subtraídas do interior da vivenda da Ofendida. Os bilhetes juntados aos autos às fls. 16-19 não foram comprovadamente subscritos pelo Réu que negou tê-los assinado. O fato de a Vítima crer que o Réu seja o subscritor dos bilhetes acostados aos autos não o coloca no local do fato quando do cometimento do suposto delito em tela. A suspeita se distingue da certeza, posto que para estar presente não pode haver hesitação, ao passo que àquela se encontra no campo da dúvida e, esta, como se sabe, deve ser resolvida em proveito do Acusado, por força do princípio “in dubio pro reo”. Desta feita, diante da precariedade dos elementos de cognição encartados aos autos, entendo que merece o Denunciado ser absolvido pelo fato ocorrido no dia 05.07.2022, porquanto eventual condenação pelo crime previstos no art. 150, “caput”, da Lei Substantiva Penal, beiraria a ilegalidade e a arbitrariedade. 5. DOS CRIMES DE DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA (ART. 24-A DA LEI FEDERAL Nº 11.340/2006). Estabelece o art. 24-A da “Lei Maria da Penha” o seguinte: “Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.” Trata-se de crime parasitário ou acessório (demanda a prática de crime precedente ou antecedente); próprio (demanda sujeito qualificado, qual seja, aquele indivíduo que tem sua liberdade restrita pelas medidas protetivas disciplinadas pela Lei “Maria da Penha”); formal (não exige para sua consumação um resultado naturalístico, embora possa ocorrer); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo do tipo implica em ação) ou omissiva (deixa de realizar a conduta determinada na decisão judicial ou administrativa que deferiu a medida protetiva); instantâneo (o resultado não se prolonga no tempo); unissubjetivo (pode ser praticado por um único sujeito ativo); plurissubsistente (a ação é composta por vários atos); admite tentativa na forma comissiva. O sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, porquanto podem figurar como agressores e, portanto, estarem sujeitos às medidas cautelares de proteção previstas na lei “Maria da Penha”. Já o sujeito passivo direto ou primário é o Estado, que teve uma ordem judicial desrespeitada, enquanto que a vítima indireta (secundária) é a própria vítima da violência doméstica, que segundo o espírito da lei protetiva somente contempla pessoa do gênero feminino. O objeto material é a decisão judicial. O bem jurídico tutelado é o normal funcionamento da Administração da Justiça, com o escopo especial de assegurar o prestígio e a garantia da potestade estatal, representada pelo Poder Judiciário, que é violada pelo descumprimento da medida protetiva judicialmente imposta. De forma secundária, o bem jurídico é a liberdade pessoal e a segurança da vítima, violadas pelo descumprimento da medida. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, a vontade livre e consciente de descumprir medida protetiva. Não admite a figura da modalidade culposa. Alice Bianchini, Mariana Bazzo e Silvia Chakian, em obra intitulada “Crimes Contra Mulheres – Lei Maria da Penha – Crimes Sexuais – Feminicídio”, 2ª edição, editora JusPodivm, ano 2020, pág. 137, ao discorrerem acerca do tipo penal em apreço, assim lecionam: “A opção legislativa de criminalizar a conduta, a nosso ver, está em linha com os objetivos traçados pela Lei Maria da Penha (criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher – art. 1º) e com os preceitos da Teoria Feminista do Direito, que ao trazer para o centro da discussão uma perspectiva do tema a partir do olhar das vítimas mulheres, busca uma interpretação da questão jurídica que se coadune com a realidade vivida por elas e sirva de instrumento para a diminuição da violência...;”. Pois bem. Analisando os autos, observo que a pretensão absolutória encontra eco na prova dos autos. Justifico. O Réu, apesar da decisão concessiva de medidas protetivas proferida nos autos nº 0010292-77.2021.8.08.0012 das quais restou previamente intimado, não somente se aproximou da residência de sua ex-convivente, ora Vítima, bem como ela (Ofendida) manteve contato, não respeitando as medidas protetivas de não aproximação e contato. Vejamos o que declarou a vítima Jéssica de Assis Rozario em senda investigativa (fls. 05 e 18-19 e verso do inquérito policial nº 84/2022 – autos nº 0004969-57.2022.8.08.0012): “...; relata ainda que no momento não estava em casa, porém o Sr. Willian confirmou ter ido na casa da Noticiante alegando ter ido para consertar o micro-ondas; relata ainda que o Sr. Willian liga para a Noticiante todo o tempo; relata ainda que o Sr. Willian ameaça a vida da Noticiante dizendo que o que a vítima fez tem consequências, que a Vítima está fudida, que é para a noticiante rezar para a polícia não pegá-lo’; que entendeu ser uma ameaça a vida; relata ainda que durante a madrugada da data de hoje (17/12/21) não conseguiu trabalhar pois o Sr. Willian ligou para o celular da noticiante umas 20 vezes e mandou 62 áudios e também mandou mensagens de texto; que tentou bloquear o telefone do Autor, porém ele conseguiu outros números e mandou mensagens através de números desconhecidos da Noticiante; que o Autor ainda invadiu seu ‘instagran’ e mudou a senha da Noticiante; que deseja representar criminalmente contra o Sr. Willian; que não deseja casa abrigo; que já possui medida de proteção...;”(destaquei). “...; que sobre o IP 084/22, de 14/12/21 informa que chegou do trabalho pela manhã e percebeu, já do lado de fora, que a janela da sala estava com o vidro trincado e um pouco aberta; que lá dentro, percebeu que a estante de aço, que fica na sala, estava amassada, que acredita que Wilian tenha se apoiado nessa estante para entrar; que pelo jeito como a casa estava, acredita que Wilian só tenha passado a noite lá, pois a declarante não deu falta de nada; que ligou para Willian perguntando o motivo dele ter ido até lá, tendo ele respondido que foi para consertar o micro-ondas pois sabia que a declarante estava sem gás de cozinha; que perguntada como ele sabia disso, afirma (...) desde antes dele sair, eu já tava sem gás. Aí eu passei uns dias na casa do meu irmão e continuei sem comprar. Ele disse que tinha ido lá consertar pra eu poder fazer a mamadeira da neném; que, conforme ele alegou, a declarante nega que ele tenha estado lá para isso na presença dela; que perguntada se chegou a pedir que ele consertasse o aparelho, afirma (...) se eu pedi, pode ter sido só mais pra frente, já no inicio desse ano, quando eu precisei dele pra cuidar da Valentina e a gente acabou voltando', que sobre a madrugada do dia 17/12/21, afirma que recebeu inúmeras ligações e mensagens de Willian; que afirma (...) ele me ameaçava falando que tava na porta do Meridional me esperando, pra eu descer pra gente conversar. Falava também que ia me pegar e pegar meu namorado, sendo que eu sequer tinha outra pessoa. Aí falava que eu era uma safada, que ele ia tirar minha filha de mim', que sobre as mensagens juntadas, afirma (...) é...aí não tem muita coisa de ameaça, não', que perguntada, conforme o boletim, se ele disse que 'o que ela fez tem consequências', que ela 'estava fudida’ e que era para ela rezar para a polícia não pegá-lo', afirma '(...) ele disse tudo isso ai. Sobre esse negócio da polícia não pegar ele, foi um dia que ele me disse que a polícia tinha ido na casa dele, mas que eram amigos dele, por isso haviam deixado por menos que Willian sempre foi mentiroso e ninguém deve ter ido até lá, que perguntada se e quando bloqueou o número de telefone de Wilian, afirma (...) eu acho que eu bloqueei ele depois dessas mensagens (juntadas)'; que depois de reatarem, Willian continuou com a ideia fixa de que a declarante estava se envolvendo com outra pessoa e não queria mais trabalhar, que no dia que ela tinha que ir trabalhar, Willian mudava, ficava alterado, ciumento; que ele conseguiu ter acesso a contas de e-mail e redes sociais da declarante e, quando a declarante ia trabalhar, ele ligava dizendo que a localização não 'batia' com o endereço do hospital em que ela trabalha...;” (destaquei). Em senda judicial (link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), a Ofendida confirmou o que dissera à autoridade policial. Todavia, ao confrontar tais declarações com as versões do Réu por ele fornecidas em fases extrajudicial e processual (fls. 15-16 e verso e link: https://drive.google.com/drive/u/1/folders/1dk5mYdEzF4lS0Y25yS8c0IiWXuvx95uL), vejo que há provas seguras de que, mesmo com a vigência das medidas protetivas a Ofendida manteve contato com o Acusado. Explico. Como bem assinalou o órgão ministerial em sede de razões finais, a Vítima, ainda que protegida com as medidas protetivas, manteve contato com o Acusado, consentindo, assim, com sua aproximação. Digo isso pautado no fato de que embora não mais estivessem convivendo amorosamente, o ex-casal manteve contato, podendo extrair das próprias conversas juntadas pela Ofendida às fls. 07-12 e verso em que a mesma responde algumas das mensagens enviadas pelo Denunciado, notadamente à fl. 10-verso. Observo das provas acostadas aos autos de que as partes ainda mantinham contato durante os dias 14.12.2021 e 17.12.2021, posto que havia possibilidade de reconciliação do ex-casal, tanto é que ao compulsar o procedimento de medidas protetivas em apenso, observo que às fls. 46-47, consta o BU nº 48216146 em que narra que a Ofendida confirmou ter retomado a convivência amorosa com o Denunciado no mês de janeiro/2022, ou seja, não muito depois dos noticiados atos de descumprimento de medida protetiva em tela. Penso, a partir desses dados, que a Vítima, ao permitir a manutenção de contato com o Réu, transmitiu a ele o sentimento de que as medidas protetivas não mais surtiam efeitos. Se de um lado, deve o Ofensor cumprir as medidas protetivas, de outro, a destinatária das citadas medidas, qual seja, a Vítima, deve também adotar postura compatível ao seu cumprimento, de maneira que manter contato com o Acusado na vigência das medidas protetivas transmite a sensação automática de que não mais se encontra sob situação de risco. Desse modo, face ao consentimento da Ofendida, fica caracterizada que o fato em tela é atípico. A propósito, vejamos como decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Agravo regimental no agravo em recurso especial nº 2.330.912/DF, de relatoria do Exmo. Ministro Ribeiro Dantas: “PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA (ART. 24-A DA LEI N. 11.340/2006). APROXIMAÇÃO DO RÉU COM O CONSENTIMENTO DA VÍTIMA. INEXISTÊNCIA DE LESÃO OU AMEAÇA AO BEM JURÍDICO TUTELADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O consentimento da vítima para aproximação do réu afasta eventual ameaça ou lesão ao bem jurídico tutelado pelo crime capitulado no art. 24-A, da Lei n. 11.340/2006. 2. No caso, restando incontroverso nos autos que a própria vítima permitiu a aproximação do réu, autorizando-o a residir com ela no mesmo lote residencial, em casas distintas, é de se reconhecer a atipicidade da conduta. 3."Ainda que efetivamente tenha o acusado violado cautelar de não aproximação da vítima, isto se deu com a autorização dela, de modo que não se verifica efetiva lesão e falta inclusive ao fato dolo de desobediência" (HC n. 521.622/SC, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 12/11/2019, DJe de 22/11/2019). 4. Agravo regimental desprovido” (fonte: www.stj.jus.br – destaquei). Nesse caso, o consentimento da Ofendida torna atípica a conduta perpetrada pelo Réu, já que fatalmente contribuiu para tal comportamento. Desta feita, diante da precariedade dos elementos de cognição encartados aos autos, entendo que merece o Denunciado ser absolvido, porquanto eventual condenação pelos crimes previstos no art. 24-A da Lei Federal nº 11.340/2006, beiraria a ilegalidade e a arbitrariedade. 6. DO CONCURSO DE CRIMES. Considerando que restou comprovado nos autos que o Denunciado, mediante ações diversas e destacadas no tempo, praticou três infrações penais em diferentes ocasiões, com desígnios autônomos e isolados, há de ser reconhecida a incidência do concurso material heterogêneo, o que permite a aplicação cumulativa das penas em que o mesmo (Denunciado) haja incorrido. DISPOSITIVO. Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL para CONDENAR o denunciado WILLIAN BATISTA SODRÉ, já qualificado nos autos, nas iras dos arts. 129, § 13, 147, “caput” (fato ocorrido em 17.12.2021) e, 150, “caput”, (fato ocorrido em 14.12.2021), todos do Código Penal e, sob a incidência da Lei Maria da Penha e ABSOLVÊ-LO das iras dos arts. 147, “caput” e 150, “caput”, (fatos ocorridos no dia 05.07.2022) e, art. 147-A, § 1º, inciso II, todos do Digesto Penal e, na forma da Lei Maria da Penha, com fundamento no art. 386, inciso VII, do Estatuto Processual Penal, no art. 24-A da Lei Federal nº 11.340/2006 (duas vezes), “ex vi” do art. 386, inciso III, do mesmo Estatuto Processual. DO CRIME DE LESÃO CORPORAL CONTRA A MULHER EM RAZÃO DO SEXO FEMININO. A culpabilidade não merece maior reprovação; antecedentes imaculados, após consulta que fiz junto ao sistema “e-Jud”, em cotejo com o enunciado sumular nº 444 do colendo Superior Tribunal de Justiça; não há elementos esclarecedores da conduta social do Denunciado; a personalidade não há como ser aferida, diante da ausência de parecer nos autos de profissional habilitado; o motivo do crime não justifica o recrudescimento da pena-base; as circunstâncias do fato justificam maior rigor na aplicação da pena, uma vez que o fato criminoso foi cometido quando a Vítima se encontrava com a filha do ex-casal no colo; as consequências extrapenais não restaram demonstradas nos autos e, o comportamento da vítima não enseja valoração negativa para a conduta do Acusado. Sopesando, pois, as circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis ao Denunciado, e levando em consideração a pena em abstrato do art. 129, § 13, do Código Penal (reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos), FIXO A PENA-BASE EM 1 (UM) ANO, 4 (QUATRO) MESES E 15 (QUINZE) DIAS DE RECLUSÃO, A QUAL TORNO DEFINITIVA, considerando que a despeito de militar em favor do Acusado a circunstância atenuante prevista no art. 65, inciso III, letra “d”, do Código Penal e, incidir, por outro lado, a circunstância agravante prevista no art. 61, inciso II, letra “f”, do Código Penal, ambas devidamente reconhecidas neste ato judicial, diante do concurso da circunstância atenuante da confissão e da agravante de ter sido o crime praticado com violência contra a mulher, entendo que deva ocorrer a compensação entre ambas (v.g., STJ, agravo regimental no agravo em recurso especial nº 689.064/RJ, de relatoria da Exma. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06.08.2015 e publicado em 26.08.2015 – Informativo nº 568 do colendo STJ), não há modificação do quanto de pena imposto na primeira fase, já que também inexistem causas de diminuição e de aumento de pena a serem consideradas. Registro que me utilizei da fração de 1/8 (um oitavo) sobre o intervalo que flutua entre as penas mínima e máxima em abstrato para negativar as circunstâncias do fato para fixar a pena-base acima do mínimo legal (v.g. STJ, agravo regimental no agravo regimental no agravo no habeas corpus nº 773.645/MS, de relatoria do Exmo. Ministro Rogerio Schietti Cruz, julgado em 18.04.2023 e publicado em 03.05.2023). DO CRIME DE AMEAÇA. A culpabilidade não merece maior censura; antecedentes imaculados, após consulta que fiz junto ao sistema “e-JUD”, em cotejo com o enunciado sumular nº 444 do colendo Superior Tribunal de Justiça; a conduta social não restou esclarecida nos autos; a personalidade não há como ser aferida, diante da ausência de parecer nos autos de profissional habilitado; motivo do crime justifica o recrudescimento da pena-base, a violência psicológica praticada teve como mola propulsora o sentimento de posse; as circunstâncias do fato não recomendam maior severidade na exasperação da reprimenda; as consequências extrapenais não restaram demonstradas nos autos; o comportamento da vítima não incentivou a ação do agente; e a situação econômica do Denunciado, presumidamente, não é boa, já que declarou em seu interrogatório processual de fls. 79 que labora como “técnico de ar condicionado”. Sopesando, pois, as circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis ao Denunciado, e levando em consideração a pena em abstrato do art. 147, “caput”, do Código Penal (detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa), FIXO A PENA-BASE EM 1 (UM) MÊS E 18 (DEZOITO) DIAS DE DETENÇÃO. Inexistem circunstâncias atenuantes. Entrementes, milita em desfavor do Réu a circunstância agravante prevista no art. 61, inciso II, letra “f”, do Código Penal, devidamente reconhecida no corpo deste “decisum”, impondo, assim, a exasperação da pena em 1/6 (um sexto) sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima em abstrato (v.g. STJ, agravo regimental no habeas corpus nº 739.080/RS, de lavra do Exmo. Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 14.06.2022 e publicado em 20.06.2022 – “...; 3. É firme o entendimento desta Corte Superior que as agravantes não necessariamente incidem sobre o resultado da pena-base, cujo acréscimo de 1/8 (um oitavo) para cada circunstância negativa multiplica o intervalo de pena decorrente da diferença entre a pena mínima e máxima cominadas ao tipo, para então somar à pena mínima. 4. Nesse contexto, as agravantes incidirão sobre a pena-base se for maior ou igual ao intervalo de pena em abstrato do preceito secundário, caso contrário, malgrado haver pena concreta dosada, as agravantes serão fixadas com parâmetro na base de cálculo das circunstâncias judiciais, sob pena de as agravantes serem menos gravosas do que meras circunstâncias judiciais. Doutrina. 5. Na hipótese, a decisão proferida pelas instâncias antecedentes está em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, haja vista que a fração de 1/6 incidiu sobre o intervalo da pena em abstrato por ser maior que a pena-base, em atenção sistema hierárquico da pena, estabelecido no art. 68 do Código Penal. 6. Agravo regimental não provido” fonte: www.stj.jus.br – destaquei), alcançando, assim, O PATAMAR DE 2 (DOIS) MESES E 13 (TREZE) DIAS DE DETENÇÃO, CUJA REPRIMENDA INTERMEDIÁRIA FIXO DEFINITIVAMENTE, diante da ausência de outras circunstâncias agravantes, bem como causas de diminuição e aumento de pena. Deixo de aplicar a pena de multa, uma vez que o preceito secundário do art. 147 do Código Penal não prevê a possibilidade de aplicação cumulativa da mesma (multa) com a pena de detenção, não se podendo deslembrar que a escolha da pena de multa no caso concreto iria de encontro com os fundamentos da Lei Federal nº 11.340/2006, tendo em vista, ainda, o julgamento do recurso especial nº 2.049.327/RJ, julgado em 14.06.2023 e publicado em 16.06.2023, processado sob o rito de “recurso repetitivo” (art. 1.016 do CPC), de relatoria do Exmo. Ministro Sebastião Reis Júnior (Tema Repetitivo nº 1189 – tese firmada: “A vedação constante do art. 17 da Lei n. 11.340/2006 [Lei Maria da Penha] obsta a imposição, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de pena de multa isoladamente, ainda que prevista de forma autônoma no preceito secundário do tipo penal imputado”). DO CRIME DE VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. A culpabilidade não merece maior reprovação; antecedentes imaculados, ante a consulta feita por mim no sistema “e-Jud” e à luz do enunciado sumular nº 444 do colendo STJ; a conduta social não restou esclarecida nos autos; a personalidade não há como ser aferida, diante da ausência de parecer nos autos de profissional habilitado; o motivo do crime não devem promover o recrudescimento da pena; as circunstâncias do fato não autorizam a exasperação da reprimenda; as consequências extrapenais não devem pender em desfavor do Acusado, eis que não há provas de que o delito causou danos outros; e o comportamento da vítima não incentivou a ação do agente. Sopesando, pois, as circunstâncias judiciais favoráveis e desfavoráveis ao Denunciado, e levando em consideração a pena em abstrato do art. 150, “caput”, do Código Penal (detenção, de um a três meses, ou multa), FIXO A PENA-BASE EM 1 (UM) MÊS DE DETENÇÃO, A QUAL FIXO DEFINITIVAMENTE, considerando que a despeito de militar em favor do Acusado a circunstância atenuante prevista no art. 65, inciso III, letra “d”, do Código Penal e, incidir, por outro lado, a circunstância agravante prevista no art. 61, inciso II, letra “f”, do Código Penal, ambas devidamente reconhecidas neste ato judicial, diante do concurso da circunstância atenuante da confissão e da agravante de ter sido o crime praticado com violência contra a mulher, entendo que deva ocorrer a compensação entre ambas (v.g., STJ, agravo regimental no agravo em recurso especial nº 689.064/RJ, de relatoria da Exma. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 06.08.2015 e publicado em 26.08.2015 – Informativo nº 568 do colendo STJ), não há modificação do quanto de pena imposto na primeira fase, já que também inexistem causas de diminuição e de aumento de pena a serem consideradas. Abstenho-me de impor a pena acessória de multa, uma vez que o preceito secundário do art. 150, “caput”, do Código Penal, não prevê a possibilidade de aplicação cumulativa da mesma (multa) com a pena de detenção, não se podendo deslembrar que a escolha da pena de multa no caso concreto iria de encontro com os fundamentos da Lei Federal nº 11.340/2006. DO CÚMULO MATERIAL. Considerando que restou reconhecido o concurso material de infrações penais, conforme regra prevista no art. 69 do Código penal, aplico o cúmulo material de penas fixadas acima, que totalizam o montante de 1 (UM) ANO, 4 (QUATRO) MESES E 15 (QUINZE) DIAS DE RECLUSÃO e 3 (TRÊS) MESES E 13 (TREZE) DIAS DE DETENÇÃO. O regime inicial de cumprimento da pena será o ABERTO, na forma do art. 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal. Inaplicável a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, por força do enunciado sumular nº 588 do colendo Superior Tribunal de Justiça. Por outro lado, presentes os requisitos do art. 77, “caput”, do Código Penal, suspendo condicionalmente a pena privativa de liberdade aplicada, pelo prazo de 02 (dois) anos, mediante cumprimento das seguintes condições: I) proibição de frequentar bares, boates, prostíbulos e assemelhados (art. 78, § 2º, “a”, do CP); II) comparecimento bimestral em juízo para justificar as suas atividades, nos termos do artigo 78, § 2º, “c”, do CP; e, III) não se ausentar da Comarca por mais de 15 (quinze) dias sem a devida autorização judicial (art. 78, § 2º, “b”, do CP), garantindo ao Acusado, quando da submissão do mesmo à audiência admonitória, o direito de recusar o presente benefício (sursis da pena) e cumprir a reprimenda que lhe foi imposta, conforme entendimento sedimentado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do agravo regimental no recurso especial nº 1.715.153/ES, de relatoria do Exmo. Ministro, à época, Nefi Cordeiro, que assim decidiu: “PENAL. PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. POSSIBILIDADE DE RECUSA NA AUDIÊNCIA ADMONITÓRIA. INSTITUTO FACULTATIVO. DECISÃO IMPUGNADA. MERO INCONFORMISMO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Esta Corte possui a orientação de que somente após o trânsito em julgado e designada audiência admonitória pelo juízo da execução penal é que poderá o apenado renunciar ao sursis, caso não concorde com as condições estabelecidas e entenda ser mais benéfico o cumprimento da pena privativa de liberdade (REsp 1.384.417/DF, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, DJe 06/04/2015)...;” (fonte: www.stj.jus.br – destaquei). Condeno o Denunciado ao pagamento de custas processuais, cabendo ao juízo da execução penal deferir ou não o benefício da gratuidade de justiça. Com relação a fixação do valor mínimo para a reparação do dano causado pelo delito à vítima Jéssica de Assis Rozario, consoante determina o art. 387, inciso IV, do Estatuto Processual Penal, entendo que tal pedido merece ser contemplado. Justifico. Por oferecimento da denúncia, a ilustre presentante do “Parquet”, no tópico “a” da referida peça acusatória, pugnou pela condenação do Acusado ao pagamento de verba indenizatória pelo dano moral experimentado pela Vitimada. No caso dos autos, o pleito de condenação por reparação moral ainda na fase inaugural deste feito criminal permitiu que a defesa do Acusado por ocasião da resposta à acusação, durante a audiência instrutória e das alegações finais pudesse se contrapor aquele pleito, obedecendo, assim, aos primados constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Nesse pormenor, havendo sido demonstrada a prática dos crimes de lesão corporal, ameaça e violação domiciliar, cujos danos extrapolam a estrutura corpórea da ofendida Jéssica de Assis Rozário, transcrevo, com a devida vênia, o que bem equacionou o Exmo. Ministro Rogerio Schietti, que ao relatar o recurso especial repetitivo nº 1.675.874/MS, acentuou que: “...; Malgrado não caiba, neste âmbito, questionar as raias da experimentação e da sensibilização fundadas na perspectiva de cada um, urge, todavia, sem mais, manter os olhos volvidos ao já não mais inadiável processo de verdadeira humanização das vítimas de uma violência que, de maneira infeliz, decorre, predominantemente, da sua simples inserção no gênero feminino. (…). As dores sofridas historicamente pela mulher vítima de violência doméstica são incalculáveis e certamente são apropriadas em grau e amplitude diferentes. Sem embargo, é impositivo, posto que insuficiente, reconhecer a existência dessas dores, suas causas e consequências. É preciso compreender que defender a liberdade humana, sobretudo em um Estado Democrático de Direito, também consiste em refutar, com veemência, a violência contra as mulheres, defender sua liberdade (para amar, pensar, trabalhar, se expressar), criar mecanismos para seu fortalecimento, ampliar o raio de sua proteção jurídica e otimizar todos os instrumentos normativos que de algum modo compensem ou minimizem o sofrimento e os malefícios causados pela violência sofrida na condição de mulher.” (…). E, como visto linhas atrás, o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário têm, ao longo dos últimos anos, avançado significativamente no enfrentamento do tema, na compreensão de que a Lei Maria da Penha teve por escopo minimizar os efeitos das sucessivas exposições da situação de violência doméstica vivenciada pela mulher, até então novamente vitimizada durante o processo de responsabilização do seu agressor. Em verdade, ainda precisa o Judiciário avançar na otimização dos princípios e das regras desse novo subsistema jurídico introduzido em nosso ordenamento com a Lei n. 11.340/2006, vencendo a timidez hermenêutica e melhor estruturando as Varas de Violência Doméstica (ou Juizados de Defesa da Mulher), a fim de que possam concretizar, com o suporte processual já existente, o atendimento integral à mulher em situação de violência doméstica, reduzindo sensivelmente a revitimização e as possibilidades de violência institucional, consubstanciadas em sucessivas oitivas e pleitos perante juízos diversos. No âmbito da reparação dos danos morais – visto que, por óbvio, os danos materiais dependem de comprovação do prejuízo, como sói ocorrer em ações de similar natureza –, a Lei Maria da Penha, complementada pela reforma do Código de Processo Penal já mencionada, passou a permitir que o juízo único – o criminal – possa decidir sobre uma importância que, relacionada à dor, ao sofrimento e à humilhação da vítima, incalculáveis sob o ponto de vista matemático e contábil, deriva da própria prática criminosa experimentada, esta, sim, carente de comprovação mediante o devido processo legal. A humilhação, a dor moral, a mácula aos conceitos de dignidade, de valor perante a sociedade, são, de fato, de difícil ou impossível mensuração; todavia, decorrem, inequivocamente, da situação de quem é vítima de uma agressão, verbal, física ou psicológica, na condição de mulher. Como alerta Ela Wiecko Volkmer de Castilho, aliás: [...] a violência física quase sempre está acompanhada de maltrato psicológico e, em muitos casos, de abuso sexual. Contudo, sem embargo de quão severas sejam as consequências físicas da violência, a maioria das mulheres considera que os efeitos psicológicos são mais prolongados e devastadores […] Trazendo mais especificamente para a realidade brasileira, Rios do Amaral (2011, p. 4) observa que "a maioria esmagadora dos registros policiais sinaliza que a violência psicológica é, sim, o bem mais atingido das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar" (Violência psicológica. A mulher e a justiça: a violência doméstica sob a ótica dos direitos humanos. BARBOSA, Thereza Karina de Figueiredo Gaudêncio (org.). Brasília: AMAGIS-DF, 2016, p. 36). De maneira inequívoca, os episódios que envolvem violência doméstica contra a mulher causam sofrimento psíquico, com intensidade que, por vezes, chega a provocar distúrbios de natureza física e até mesmo o suicídio da vítima. A despeito, assim, da natural subjetividade sobre o que efetivamente deva ser considerado bem jurídico a vindicar a especial tutela do Direito Penal, "é preciso compreender a violência de gênero, doméstica ou não, sob o viés dos direitos humanos" (CAMARGO DE CASTRO, Ana Lara. Violência de gênero e reparação por dano moral na sentença penal. Boletim IBCCRIM. Ano 24 – n. 280. São Paulo, mar/2016, p. 13). Entendo, pois, não haver razoabilidade na exigência de instrução probatória acerca do dano psíquico, do grau de humilhação, da diminuição da autoestima, etc., se a própria conduta criminosa empregada pelo agressor já está imbuída de desonra, descrédito e menosprezo ao valor da mulher como pessoa, à sua própria dignidade. O que se há de exigir como prova, mediante o respeito às regras do devido processo penal – notadamente as que derivam dos princípios do contraditório e da ampla defesa –, é a própria imputação criminosa – sob a regra, decorrente da presunção de inocência, de que o ônus probandi é integralmente do órgão de acusação –, porque, uma vez demonstrada a agressão à mulher, os danos psíquicos dela resultantes são evidentes e nem têm mesmo como ser demonstrados. A própria condenação pelo ilícito penal já denota o tratamento humilhante, vexatório e transgressor à liberdade suportado pela vítima” (destaquei). Consoante fundamentos acima externados, verificando-se o presumido dano extrapatrimonial experimentado pela Ofendida em decorrência das violência física e psicológica sofrida, deve o julgador fixar um valor líquido e certo ao destinatário postulante de acordo com seu prudente arbítrio. Aponta o saudoso jurista Caio Mário da Silva Pereira, que o fundamento da reparabilidade pelo dano moral, está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo se conformar a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos. Quanto à sua quantificação, entendo que o dano moral não pode servir de enriquecimento ilícito para a parte que postula. Não menos certo, entretanto, que não poderá representar quantia ínfima, devendo ser observada a Teoria do Desestímulo, ou seja, o valor da indenização não deve enriquecer ilicitamente o ofendido, mas há de ser suficientemente elevada para desencorajar novas agressões à honra alheia. Na verdade, o critério de fixação do “quantum” nas indenizações por dano moral refoge aos parâmetros tradicionais de indenização por dano material. Explico: neste, o mecanismo de reparação funciona exatamente de acordo com a materialidade do dano, sendo, portanto, uma função reparatória. O que já não ocorre no dano moral, que é intangível. Ou seja, não é possível quantificar a dignidade e, por isso, repará-la. A função da responsabilidade civil, na hipótese do dano moral, é compensatória. A despeito da censura que deve ter a comportamento criminoso como o adotado pelo Réu que praticou violência física e psicológica contra a vítima Jéssica de Assis Rozário, conforme já mencionado em linhas pretéritas, deve ser levada em consideração também a situação econômica do Agressor para arbitramento do dano moral, cuja informação presente nos autos revela que o Réu é pessoa de parcos recursos financeiros. Portanto, utilizando de um critério de proporcionalidade adotado pelo Excelso Pretório (v.g., recurso extraordinário com agravo nº 1.260.888/MS, de lavra do Exmo. Ministro Alexandre de Moraes, julgado em 17.03.2020 e publicado em 20.03.2020), bem como o colendo Superior Tribunal de Justiça (v.g. Agravo regimental no agravo em recurso especial nº 1.399.309/MS, de relatoria do então Ministro Nefi Cordeiro, julgado em 19.03.2019 e publicado em 26.03.2019) que recomenda a avaliação do grau de culpa, do nível socioeconômico da vítima Jéssica de Assis Rozário e, ainda, do porte econômico do Réu, no arbitramento do dano moral, penso que a Ofendida, deva ser minimamente compensada no montante de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) a título de dano moral, até porque o caráter indenizatório também possui objetivo pedagógico, na medida em que pretende evitar o comportamento, pelo Ofensor, de conduta semelhante (Teoria do Desestímulo). Sendo assim, com fincas no art. 387, inciso IV, do Estatuto Processual e, no art. 91, inciso I, do Digesto Penal, CONDENO o Acusado ao pagamento da importância de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) à vítima Jéssica de Assis Rozário em virtude do dano moral sofrido por ela, corrigido com juros de mora no percentual de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso (enunciado sumular nº 54 do colendo STJ) e correção monetária pelo IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial), a partir do arbitramento (enunciado sumular nº 362 do colendo STJ), sem prejuízo de que a citada Ofendida, considerando que a presente condenação se trata de reparação civil mínima, venha à busca do quanto total perante a esfera cível. Em análise ao disposto no art. 387, § 1°, do Estatuto Processual Penal, considerando a ausência de notícias do envolvimento do Acusado em outras infrações penais, tendo respondido toda esta demanda penal em liberdade, deixo de decretar sua custódia cautelar. Deixo de dar efetividade ao art. 387, § 2º, do Estatuto Processual Penal, eis que o Acusado já foi condenado a cumprir pena no regime aberto. Diante do teor desta sentença, torno DEFINITIVAS as medidas protetivas de urgência deferidas por ocasião da decisão proferida na demanda em apenso (autos nº 0010292-77.2021.8.08.0012), sendo que as mesmas (medidas protetivas), terão duração até quando perdurar a situação de risco da Ofendida, nos termos do art. 19, § 6º, da Lei Federal nº 11.340/2006, com a redação lhe foi dada pela Lei Federa nº 14.550/2023. Sentença registrada no sistema “e-Jud”. Publique-se. Intimem-se, atentando-se, ainda, para o disposto no § 2º do art. 201 do Estatuto Processual Penal. Oportunamente, com o trânsito em julgado deste “decisum”, determino que sejam tomadas as A) Lance-se o nome do Acusado no rol dos culpados, na forma do art. 5º, inciso LVII, da Constituição da República Federativa do Brasil; B) Expeça-se a competente guia de execução criminal, para as providências cabíveis à espécie, observando as Resoluções nºs 113/2010 e 223/2016 do CNJ e os Atos Normativos nºs 01/2019, 026/2019 e 019/2022, todos do egrégio TJES; C) Oficie-se à Justiça Eleitoral, através do sistema Infodip, comunicando a condenação do Acusado, para cumprimento do disposto no art. 71, § 2º, do Código Eleitoral, c/c o art. 15, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil; D) Oficie-se, para anotações, aos órgãos de estatística criminal do Estado e, finalmente; E) Dê-se efetividade ao Ato Normativo Conjunto TJES/PGE nº 01/2021. Tudo cumprido, determino o arquivamento dos autos, com as cautelas de estilo. Diligencie-se. CARIACICA, 19.04.2024. ENEAS JOSE FERREIRA MIRANDA Juiz(a) de Direito ADVERTÊNCIAS O(s) acusado(s), terá(ão) 05 (cinco) dias para, querendo, apresentar recurso, após o prazo de 30 (trinta) dias a contar da publicação do presente Edital E, para que chegue ao conhecimento de todos, o presente edital vai afixado no Fórum, lugar de costume e publicado na forma da lei. COLATINA-ES, 12 de julho de 2.025. ENEAS JOSÉ FERREIRA MIRANDA JUIZ DE DIREITO
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