Processo nº 0801486-03.2023.8.10.0074
ID: 321821129
Tribunal: TJMA
Órgão: 3ª Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0801486-03.2023.8.10.0074
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL SESSÃO INICIADA EM 16/06/2025 E ENCERRADA EM 23/06/2025 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0801486-03.2023.8.10.0074 1º APELANTE: THALISON RICHADSON DA SILVA EVERTON DEFENSOR PÚ…
TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL SESSÃO INICIADA EM 16/06/2025 E ENCERRADA EM 23/06/2025 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0801486-03.2023.8.10.0074 1º APELANTE: THALISON RICHADSON DA SILVA EVERTON DEFENSOR PÚBLICO: IGOR SILVÉRIO FREIRE 2º APELANTE: NAILDE SOUZA MARTINS DEFENSOR PÚBLICO: LAÉRCIO FONTES DE OLIVEIRA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO INCIDÊNCIA PENAL: ARTS. 33, CAPUT, E 35 DA LEI N.º 11.343/06 ORIGEM: JUÍZO DA VARA ÚNICA DE BOM JARDIM/MA RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DA GRAÇA PERES SOARES AMORIM DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DOSIMETRIA DA PENA. NATUREZA E QUANTIDADE DE DROGAS. CONCURSO DE AGENTES. CONDUTA SOCIAL DESFAVORÁVEL. TRÁFICO PRIVILEGIADO. RECURSOS DESPROVIDOS COM REFORMA EX OFFICIO DA PENA DE UMA DAS RÉS. I. CASO EM EXAME Apelações criminais interpostas por Thalison Richardson da Silva Everton e Nailde Souza Martins contra sentença que os condenou pelos crimes de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e associação para o tráfico (art. 35, caput, da mesma lei), em razão de flagrante ocorrido em 03 de maio de 2023, em Bom Jardim/MA, quando foram encontrados com 51 papelotes de maconha, uma porção média de crack e R$ 390,00 em espécie. Os recursos se restringem à dosimetria da pena, não impugnando autoria ou materialidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) definir se a valoração negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime, na 1ª fase da dosimetria, foi devidamente fundamentada; (ii) estabelecer se houve bis in idem na consideração da natureza e quantidade de drogas em mais de uma fase da dosimetria quanto à ré Nailde; (iii) determinar se a conduta social do réu Thalison foi corretamente valorada como desfavorável; (iv) verificar se é aplicável a causa de diminuição do tráfico privilegiado ao réu Thalison. III. RAZÕES DE DECIDIR A diversidade das substâncias entorpecentes apreendidas (maconha e crack), sua forma de acondicionamento (fracionadas em 51 papelotes) e a presença de dinheiro em espécie caracterizam o chamado "kit tráfico", evidenciando preparação para a mercancia e justificando a valoração negativa da culpabilidade. A existência de concurso de agentes, demonstrado pela coabitação no imóvel associado à facção criminosa PCM, divisão de tarefas entre os réus e unidade de desígnios, configura circunstância do crime desfavorável, distinta da associação para o tráfico, sem configurar bis in idem. A conduta social do réu Thalison foi corretamente valorada como negativa com base em depoimentos testemunhais prestados sob o contraditório, os quais apontaram sua atuação em nome de facção criminosa logo após sua saída do sistema prisional, evidenciando envolvimento organizado com o tráfico. O envolvimento do réu Thalison com organização criminosa afasta a aplicação do tráfico privilegiado, pois evidencia dedicação a atividades criminosas, nos termos da jurisprudência consolidada. Em relação à ré Nailde, constatou-se bis in idem ao se considerar a natureza e quantidade de drogas tanto na 1ª quanto na 3ª fase da dosimetria, motivo pelo qual a pena-base foi reformada ex officio de 7 anos e 6 meses para 6 anos e 3 meses. Aplicada a atenuante da menoridade relativa (art. 65, I, do CP) e a causa de diminuição do tráfico privilegiado (art. 33, §4º, da Lei 11.343/2006) à ré Nailde, resultando em pena final de 3 anos, 2 meses e 15 dias de reclusão. IV. DISPOSITIVO E TESE Recursos desprovidos. Pena da ré Nailde Souza Martins reformada ex officio. Tese de julgamento: A diversidade e a forma de acondicionamento das drogas apreendidas justificam a valoração negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime na dosimetria da pena. A configuração do concurso de pessoas não se confunde com a associação para o tráfico e pode ser valorada negativamente como circunstância judicial. A conduta social do réu pode ser considerada desfavorável com base em depoimentos testemunhais consistentes que indiquem seu envolvimento com facções criminosas. O envolvimento com organização criminosa afasta a incidência da causa de diminuição do tráfico privilegiado prevista no art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/2006. É vedado o bis in idem na dosimetria da pena, impondo-se a reforma ex officio quando a natureza e quantidade das drogas forem valoradas em mais de uma fase da dosimetria. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XLVI e LV; CP, arts. 59, 65, I, 68 e 44, III; Lei nº 11.343/2006, arts. 33, caput e §4º, e 35, caput. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AgRg no HC 513.940/MS, Rel. Min. Jorge Mussi, T5, j. 11.02.2020, DJe 26.02.2020; STJ, AgRg no HC 639.519/SC, Rel. Min. Felix Fischer, T5, j. 02.03.2021, DJe 08.03.2021; STJ, AgRg no HC 807.845/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, T5, j. 11.04.2023, DJe 14.04.2023. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos de Apelação Criminal na Ação Penal nº. 0801486-03.2023.8.10.0074, “unanimemente e em acordo com o parecer ministerial, a Terceira Câmara de Direito Criminal negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora”. Votaram os Senhores Desembargadores Maria da Graça Peres Soares Amorim (Relatora), José Nilo Ribeiro Filho e Talvick Afonso Atta de Freitas. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato. São Luís, MA, data do sistema. Desembargadora Maria da Graça Peres Soares Amorim Relatora RELATÓRIO Trata-se de Apelações Criminais interpostas por Thalison Richardson da Silva Everton (1º Apelante) e Nailde Souza Martins (2ª Apelante) contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Bom Jardim/MA (ID 39619028), pela qual foram condenados, respectivamente, às penas de 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 750 (setecentos e cinquenta) dias-multa, como incurso no crime do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06) e a 4 (quatro) anos e 1 (um) mês de reclusão, em regime semiaberto, e 475 (quatrocentos e setenta e cinco) dias-multa, como incurso no crime do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06 (tráfico de drogas privilegiado). Assinala-se que prisão preventiva do 1º Réu foi mantida, enquanto a 2ª Ré responde em liberdade. Segundo descreve a denúncia (ID 39618954), no dia 03 de maio de 2023, na cidade de Bom Jardim/MA, os denunciados Thalison Richardson da Silva Everton e Nailde Souza Martins foram presos em flagrante por estarem de posse de substâncias entorpecentes, consistindo em 51 (cinquenta e um) papelotes de maconha e uma porção de crack, além de quantia em dinheiro, circunstâncias que evidenciariam a prática do tráfico ilícito de drogas. Consta que a abordagem ocorreu após denúncia de que indivíduos ligados à facção criminosa PCM estariam utilizando uma residência para a comercialização de entorpecentes. O MP informa que no momento da detenção, Nailde tentou ocultar parte da droga em sua vestimenta e cavidade vaginal, sendo necessário atendimento médico para sua remoção. As razões recursais da 1ª Apelante estão dispostas no ID 39619068, pelas quais busca a reforma da sentença condenatória proferida pelo juízo de primeiro grau, notadamente no que se refere à indevida valoração negativa das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. A defesa sustenta, em síntese, que a majoração da pena-base foi arbitrária, especialmente no que tange à culpabilidade, conduta social e circunstâncias do crime, uma vez que a quantidade e natureza das drogas apreendidas não justificam o aumento da pena, inexistindo comprovação material da suposta vinculação do apelante a facção criminosa. Ademais, considerando que o réu é primário, possui bons antecedentes e foi absolvido do crime de associação para o tráfico, faz jus à aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06. Por fim, requer-se a revisão da dosimetria da pena, afastando-se as exasperações indevidas e aplicando-se o redutor do tráfico privilegiado, com a consequente redução da reprimenda imposta. Por sua vez, as razões recursais do 2º Apelante encontram-se no ID 39619094, em que requer a reforma da sentença condenatória, especificamente no que tange à indevida valoração negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime. Sustenta que a pequena quantidade de drogas apreendida não justifica a exasperação da pena-base, conforme precedentes dos Tribunais Superiores. Ademais, a alegação de concurso de pessoas não pode ser utilizada como fator de majoração da reprimenda, visto que a própria sentença absolveu a recorrente do crime de associação para o tráfico. Diante disso, requer-se a readequação da dosimetria da pena, com a fixação da pena-base no mínimo legal, garantindo-se a observância dos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. Contrarrazões do Ministério Público nos IDs 39619096 e 39619070, em que requer o desprovimento de ambos os recursos. Em parecer elaborado pelo Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato, digno Procurador de Justiça, a PGJ manifesta-se pelo conhecimento e desprovimento dos recursos (ID 40904066). É o relatório. VOTO Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos interpostos. Conforme relatado, o Ministério Público do Estado do Maranhão denunciou Thalison Richardson da Silva Everton e Nailde Souza Martins pelos crimes de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006) e associação para o tráfico (art. 35, caput, da mesma lei). Segundo consta na denúncia, no dia 03 de maio de 2023, em Bom Jardim/MA, os réus foram presos em flagrante na posse de 51 (cinquenta e um) papelotes de maconha, uma porção média de crack e R$ 390,00 (trezentos e noventa reais). A abordagem policial ocorreu após denúncia anônima de que um casal desconhecido estaria ocupando uma casa associada à facção criminosa PCM. Thalison, que havia saído recentemente do presídio, foi identificado como membro da facção, enquanto Nailde tentou esconder drogas em suas partes íntimas e subornar uma funcionária do hospital para descartar a substância. O MP sustentou que os réus atuavam de forma estável e organizada no tráfico local, razão pela qual foram denunciados. Inconformados com a sentença recorrida, os apelantes recorreram. Em primeiro plano, destaca-se que os apelantes não impugnam os elementos atinentes à autoria e materialidade delitiva, de modo que não serão objeto de análise, consistindo a insatisfação recursal nos termos relativos à dosimetria. Em relação a dosimetria, sabe-se que cada uma das três etapas de fixação da pena (art. 68 do CP) deve ser suficientemente fundamentada pelo juiz sentenciante. Busca-se, com tal imposição, além de garantir a correta individualização da sanção penal, assegurar ao réu o exercício da ampla defesa, ambos direitos fundamentais de todo cidadão (CF, art. 5º, XLVI e LV). No que se refere à primeira fase da dosimetria, correspondente ao estabelecimento da pena-base, a majoração da sanção mínima legalmente prevista para o crime imputado ao acusado deve ser justificada pela presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, concretamente demonstradas, conforme dispõe o art. 59 do Código Penal. In casu, o magistrado de base fixou a pena-base do réu Thalison Richardson da Silva Everton em 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão, bem como fixou a pena-base de Nailde Souza Martins em 07 (sete) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Em relação ao primeiro réu, conforme consignado em sentença, a culpabilidade foi considerada desfavorável devido à apreensão de duas substâncias ilícitas (maconha e cocaína). A conduta social e circunstâncias do crime também foram negativas, pois o réu integra organização criminosa e agiu em concurso de pessoas. Os antecedentes, personalidade, motivos e consequências do crime foram neutros ou favoráveis. De outro lado, também na primeira fase da dosimetria, o magistrado destacou que a culpabilidade de Nailde Souza Martins foi considerada desfavorável devido à apreensão de duas substâncias ilícitas (maconha e cocaína). As circunstâncias do crime também foram negativas, pois a ré agiu em concurso de pessoas. Os antecedentes, conduta social, personalidade, motivos e consequências do crime foram neutros ou favoráveis. Para melhor compreensão, transcrevo trecho da sentença relativa à dosimetria dos réus: “III.I. THALISON RICHARDSON DA SILVA EVERTON 1) A culpabilidade consiste no grau de reprovabilidade social da conduta. In casu, verifico que a atuação do acusado desbordou dos limites do tipo penal, pois dois tipos de substâncias ilícitas foram apreendidas, qual seja, maconha e cocaína. Deste modo, atento à natureza das substâncias (art. 42 da Lei nº 11.343/2006), a culpabilidade é DESFAVORÁVEL ao réu. 2) O acusado não possui antecedentes criminais, de sorte que tal circunstância lhe é FAVORÁVEL. 3) A conduta social consiste no conceito que o acusado tem perante a sociedade. No caso, o acusado integra facção criminosa, que existe com o escopo de praticar crimes, assim, provocando medo e insegurança na sociedade, de modo que essa circunstância é DESFAVORÁVEL ao réu. 4) A personalidade consiste nos atributos psicológicos do acusado. Não há informações técnicas nos autos quanto a tal aspecto subjetivo do réu, razão pela qual tal circunstância judicial é FAVORÁVEL. 5) Os motivos do crime consistem no móvel ou no desiderato do ilícito penal. No caso, o motivo do crime se constitui pelo desejo de obtenção de lucro fácil, o qual já é punido pela própria tipicidade e previsão do delito. Assim, tal circunstância também é FAVORÁVEL. 6) As circunstâncias do crime, consistente nos meandros que permearam a prática delitiva. No caso, a prática do crime de tráfico em concurso de pessoas, representa um plus que deve ser adequadamente sancionado. (…) Assim, as circunstâncias do crime são DESFAVORÁVEIS ao denunciado. 7) As consequências do crime consistem em circunstâncias que ultrapassam os limites do tipo penal, se encontram inseridas na própria figura típica. Ademais, o dano à saúde pública decorre do próprio tipo penal do tráfico, razão pela qual tal circunstância é FAVORÁVEL. 8) Por fim, não há que se cogitar acerca do comportamento da vítima. Desta feita, havendo duas circunstâncias judiciais negativas, FIXO a pena-base em 8 (oito) anos e 9 (nove) meses de reclusão. (…) III.II. NAILDE SOUZA MARTINS 1) A culpabilidade consiste no grau de reprovabilidade social da conduta. In casu, verifico que a atuação da acusada desbordou dos limites do tipo penal, pois dois tipos de substâncias ilícitas foram apreendidas, qual seja, maconha e cocaína. Deste modo, atento à natureza das substâncias (art. 42 da Lei nº 11.343/2006), a culpabilidade é DESFAVORÁVEL à ré. 2) A acusada não possui antecedentes criminais, de sorte que tal circunstância lhe é FAVORÁVEL. 3) A conduta social consiste no conceito que a acusada tem perante a sociedade. No caso, não foi possível aferir referida circunstância, de modo que é FAVORÁVEL à ré. 4) A personalidade consiste nos atributos psicológicos da acusada. Não há informações técnicas nos autos quanto a tal aspecto subjetivo da ré, razão pela qual tal circunstância judicial é FAVORÁVEL. 5) Os motivos do crime consistem no móvel ou no desiderato do ilícito penal. No caso, o motivo do crime se constitui pelo desejo de obtenção de lucro fácil, o qual já é punido pela própria tipicidade e previsão do delito. Assim, tal circunstância também é FAVORÁVEL. 6) As circunstâncias do crime, consistente nos meandros que permearam a prática delitiva. No caso, a prática do crime de tráfico em concurso de pessoas, representa um plus que deve ser adequadamente sancionado. (…) Assim, as circunstâncias do crime são DESFAVORÁVEIS à denunciada. 7) As consequências do crime consistem em circunstâncias que ultrapassam os limites do tipo penal, se encontram inseridas na própria figura típica. Ademais, o dano à saúde pública decorre do próprio tipo penal do tráfico, razão pela qual tal circunstância é FAVORÁVEL. 8) Por fim, não há que se cogitar acerca do comportamento da vítima. Desta feita, havendo duas circunstâncias judiciais negativas, FIXO a pena-base em 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de reclusão. ( Grifei, ID 39619026). Da análise da sentença, infere-se que os réus tiveram a circunstância atinente à culpabilidade desvalorada, uma vez que foram apreendidas duas substâncias entorpecentes de natureza diversa (maconha e crack), o que indicaria maior gravidade na conduta. Os réus, por seu turno, afirmam, em síntese, que tanto a natureza quanto a quantidade da droga consubstanciam circunstância única, devendo serem analisadas conjuntamente. Deste modo, em que a pese a natureza das drogas apreendidas, a quantidade de drogas revela-se ínfima, de modo que a culpabilidade não deveria ter sido negativada. Pois bem. Ante a apreensão de substâncias entorpecentes, verifico que a culpabilidade dos réus deve ser substancialmente agravada. As quantidades apreendidas (41,733g de maconha e 25,138g de crack), embora não expressivas isoladamente, ganham relevância penal pela diversidade das drogas e forma de acondicionamento. A maconha distribuída em 51 papelotes pequenos evidencia clara preparação para comercialização fracionada, demonstrando organização delitiva. A presença simultânea de crack, droga de elevado potencial lesivo, em porção média, reforça a gravidade da conduta. O valor apreendido de R$ 390,00, ainda que moderado, corrobora o contexto de mercancia quando associado ao fracionamento minucioso das drogas. Ademais, a forma de acondicionamento das drogas, especialmente os 51 papelotes de maconha, revela sofisticação e premeditação na atividade criminosa, afastando qualquer hipótese de mero porte para consumo pessoal. O crack, substância de altíssimo poder viciante e destruição social, sendo encontrado em quantidade considerável (25,138g), demonstra o elevado grau de periculosidade da conduta dos réus e seu desprezo pela saúde pública. A combinação destes elementos - diversidade de drogas, fracionamento em doses individuais e dinheiro em espécie - configura o chamado "kit tráfico", circunstância frequentemente reconhecida como indicativa da mercancia ilícita. Os tribunais superiores têm entendimento consolidado de que a variedade de substâncias entorpecentes constitui causa de especial reprovabilidade da conduta, justificando maior rigor na fixação da pena-base. Tal posicionamento reflete a necessidade de resposta penal proporcional à gravidade da conduta e ao dano potencial causado à sociedade. Isto posto, nego provimento ao recurso interposto pelo primeiro apelante, Thalison Richadson da Silva Everton. Por outro lado, quanto a 2ª apelante, Nailde Souza Martins, observo que a natureza e quantidade da droga foi desvalorada tanto na 1ª quanto na 3ª fase da dosimetria de modo que, para evitar bis in idem, afasto a negativação da referida circunstância judicial na 1ª fase da dosimetria, de modo que, nos termos do Tema Repetitivo 1214, o qual obriga a redução proporcional da pena-base quando afastada circunstância judicial desfavorável, recalcula-se a pena base para 6 (seis) anos e 3 (três) meses. Por conseguinte, no pertinente a circunstância judicial atinente a circunstâncias, os réus apontam, em síntese, que apesar de terem sido condenados por tráfico de drogas, foram absolvidos da acusação do crime de associação para o tráfico, o que demonstra que o concurso de agentes não foi fator determinante para a prática delitiva, não merecendo, assim, maior reprovação. Suscitam contradição do juízo a quo, o qual afastou a associação para o tráfico mas, ao mesmo tempo, reconheceu o concurso de pessoas para gravar a circunstâncias. Sem razão. O crime de associação para o tráfico e o reconhecimento do concurso de pessoas não se confundem, uma vez que suas premissas fáticas são diversas. Enquanto o tipo penal inerente à associação para o tráfico exige as elementares da permanência e estabilidade, o concurso de agentes para o tráfico não exige o mesmo grau de estabilidade temporal e organização entre os agentes, podendo o tráfico ocorrer até mesmo de modo eventual. Destarte, conforme se extrai dos autos, verifica-se a configuração do concurso de pessoas na prática do crime de tráfico de drogas, na medida em que ambos os denunciados, Thalison Richardson da Silva Everton e Nailde Souza Martins, agiram de forma coordenada e com unidade de desígnios para a consecução da atividade ilícita. A comunhão de esforços é demonstrada, de forma inequívoca, tanto pela coabitação no imóvel vinculado à facção criminosa PCM quanto pela conduta compartilhada de guarda e ocultação dos entorpecentes. Ressalta-se que, no momento da abordagem, Nailde trazia consigo, ocultos no sutiã e em suas partes íntimas, 51 porções de maconha e uma porção média de crack, além de R$ 390,00 em espécie, indicando clara divisão de tarefas entre os agentes, ao passo que Thalison, egresso recente do sistema prisional e integrante da referida facção, encontrava-se presente e identificado como responsável pelo local. Tais circunstâncias evidenciam o liame subjetivo entre os agentes, indispensável à caracterização do concurso de vontades. Nesse sentido, cito a seguinte precedente: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E DE RECEPTAÇÃO. DOSIMETRIA. PENA-BASE . FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME DE TRÁFICO. CONCURSO DE AGENTES . ARGUMENTOS CONCRETOS. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. DECISÃO MANTIDA. INSURGÊNCIA DESPROVIDA . (...) 3. As circunstâncias do crime se referem ao modus operandi empregado na prática do delito, e, no caso dos autos, os aspectos ressaltados pelo colegiado, ou seja, "ainda que o concurso de agentes não tenha sido fator determinante para a prática delitiva, este possibilita maior probabilidade no exaurimento do crime, merecendo, assim, maior reprovação no caso concreto", representam elementos que ultrapassam ao inerente do tipo penal em tela e merecem reflexos mais gravosos na fixação da pena. 4 . Não houve bis in idem na elevação da pena-base pela consideração do concurso de agentes no crime de tráfico de drogas, notadamente porque o réu não foi processado pelo crime de associação para o tráfico, caso em que o concurso de pessoas constitui elementar do delito de associação. 5. Mantém-se a decisão singular que reconsiderou a decisão anterior, para não conhecer do habeas corpus, por se afigurar manifestamente incabível, e para não conceder a ordem de ofício, em razão da ausência de constrangimento ilegal a ser sanado. 6 . Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no AgRg no HC: 513940 MS 2019/0161356-9, Relator.: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 11/02/2020, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/02/2020) Isto posto, nego provimento aos recursos dos réus, neste particular. No pertinente a dosimetria de Thalison Richardson da Silva Everton, antevê-se também que o réu manifesta-se pela reforma da sentença quanto a circunstância judicial atinente a conduta social. Em suas razões, argumenta que a valoração negativa da conduta social do réu foi indevida, pois foi fundamentada apenas em testemunhos, especialmente de policiais, sem comprovação material de que ele integrava uma facção criminosa. Sem razão. Primeiramente, a conduta social, nos termos do art. 59 do Código Penal, deve ser analisada a partir do comportamento do réu na sociedade, o que inclui sua relação com organizações criminosas e o impacto de suas ações no meio em que está inserido. No caso concreto, a sentença de primeiro grau fundamentou adequadamente a valoração negativa dessa circunstância, com base em elementos concretos constantes dos autos, tais como depoimentos testemunhais de agentes públicos que confirmaram sua vinculação a uma facção criminosa e sua atuação no tráfico de drogas a mando da organização. A alegação de que tal conclusão teria se baseado exclusivamente em provas testemunhais ignora que a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece a validade dos depoimentos de policiais quando coerentes e harmônicos com os demais elementos de prova. Cumpre observar que o fato de o comando sentencial encontrar fundamento no depoimento dos policiais responsáveis pela prisão do recorrente, não retira a legitimidade da condenação, porquanto tais declarações foram prestadas sob o manto do contraditório e da ampla defesa, revestindo-se de credibilidade, sem olvidar que a defesa não impugnou em nenhum momento referidos testemunhos. Sobre a matéria, nossas Cortes Superiores firmaram entendimento no sentido de que o fato de as testemunhas arroladas pela acusação serem os mesmos policiais que participaram da operação que culminou na apreensão de substâncias entorpecentes não afasta a validade de seus depoimentos, mormente quando corroborados com o conjunto probatório colhido na fase processual, tendo em vista a circunstância de que prestados, reitere-se, com regular observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Nesse sentido, o STJ tem assentado que: “(...) ‘Segundo a jurisprudência consolidada desta Corte, o depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova’ (HC n. 449.657/SP, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe de 14/8/2018)” (AgRg no HC 639.519/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 02/03/2021, DJe 08/03/2021). Ademais, a ausência de denúncia ou condenação específica pelo crime de associação para o tráfico (art. 35 da Lei nº 11.343/2006) não impede a constatação da ligação do réu com uma facção criminosa. Reitera-se que a caracterização da associação para o tráfico exige requisitos próprios, como estabilidade e divisão de tarefas, enquanto a ligação com organização criminosa pode ser demonstrada por outras provas, como testemunhos, registros carcerários e relatórios de inteligência policial. No caso concreto, há elementos suficientes para afastar a aplicação do tráfico privilegiado, uma vez que o envolvimento do réu com o crime organizado demonstra que ele não se trata de um agente ocasional ou de menor periculosidade, mas sim de alguém inserido em um esquema criminoso estruturado. Neste aspecto, os policiais informaram o juízo que o réu Thalison Richardson da Silva Everton pertencia a facção criminosa. Neste aspecto, destaca-se o depoimento da testemunha Ronald Costa da Cruz, verbis: “QUE a ocorrência foi apresentada pela Polícia Militar; QUE denúncias afirmavam que havia um casal novo, de fora; QUE THALISON estava com um alvará de soltura rasurado, amassado; QUE os policiais levaram eles para a delegacia para fazer revista na acusada, pois estavam sem policial militar do sexo feminino; QUE ao realizar pesquisas no SIISP, observaram que o acusado THALISON estava com aproximadamente uma semana que havia saído da unidade prisional; QUE uma das cautelares era que ele não poderia se ausentar da comarca de São Luís/MA; QUE havia autodeclaração de faccionado do PCM; QUE na delegacia, foi detectada que a acusada NAILDE estava com drogas na vagina; QUE foram até o hospital para realizar o procedimento de retirada da droga; QUE segundo a investigadora BARBARA a acusada NAILDE tentou dar um dinheiro ou subornar a técnica de enfermagem para se desvencilhar d a droga; QUE ao voltar, faltava realizar a revista na parte de cima (blusa, sutiã) da acusada NAILDE, momento em que correu e tentou se desfazer da droga e dinheiro no vaso sanitário; QUE tinha aproximadamente 50 porções de drogas prontos para venda e dinheiro tinha aproximadamente R$ 300,00 (trezentos reais); QUE havia também uma porção média de crack para dividir; QUE após a operação RAISUL, o acusado THALISON veio para Bom Jardim/MA, a mando da facção, para tomar conta do tráfico; QUE ele não tem parentes em Bom Jardim/MA, chegou direto do presídio para Bom Jardim/MA e informou que veio a trabalho, mas não soube explicar o motivo; QUE eles alegaram que são companheiros”. (Trecho da sentença, Id. 39619028). Isto posto, nego provimento ao recurso de apelação interposto por Thalison Richardson da Silva Everton, neste particular. Destarte, ante a fundamentação desenvolvida, mantenho a dosimetria realizada pelo juízo a quo na 1ª fase da dosimetria pertinente ao réu Thalison Richardson da Silva Everton e reformar a pena base atinente a ré Nailde Souza Martins, recalculando-a em 6 (seis) anos e 3 (três) meses. Prosseguindo, no que pertine à segunda fase da dosimetria, assinala-se que em relação ao primeiro réu, Thalison Richardson da Silva Everton, infere-se que não foram constatadas circunstâncias agravantes ou atenuantes. Particularmente, em relação a atenuante da confissão, esta não restou caracterizada uma vez que o réu não admitiu a traficância, nos termos da Súmula 630 do STJ. No que se refere a segunda ré, Nailde Souza Martins, o juízo a quo reconheceu a atenuante da menoridade relativa (art. 65, I, do CP), tendo reduzido a pena-base em 1/6 (um sexto). Isto posto, considerando o novo patamar da pena-base em 6 (seis) anos e 3 (três) meses, recalcula-se a pena intermediária para 05 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias. Por fim, já na terceira fase da dosimetria, observa-se que o juízo a quo reconheceu a causa de diminuição ao tráfico privilegiado (art. 33, §4º, da Lei n.º 11.343/06) tão somente em relação a segunda ré, Nailde Souza Martins, afastando a minorante em relação ao réu Thalison Richardson Freitas da Silva, uma vez que este teria envolvimento com facções criminosas, in casu, com o PCM. Pois bem. No tocante ao pedido de aplicação do tráfico privilegiado ao primeiro réu, verifica-se que o recurso não merece acolhida. Isso porque, reitera-se, o concurso de pessoas e a associação para o tráfico são institutos jurídicos distintos, com características e requisitos próprios. O concurso de pessoas, previsto nos artigos 29 a 31 do Código Penal, refere-se à união eventual e transitória de indivíduos para a prática de um crime específico, como o tráfico de drogas, sem que haja vínculo estável entre eles. Nessa hipótese, cada agente responde pelo crime com pena individualizada conforme sua participação. Já a associação para o tráfico, descrita no artigo 35 da Lei nº 11.343/2006, trata-se de crime autônomo, que exige vínculo estável e permanente entre ao menos duas pessoas, com o fim específico de praticar reiteradamente crimes relacionados ao tráfico. Trata-se, portanto, de conduta distinta e com pena própria, que pode coexistir com o crime de tráfico. Por outro lado, conforme exposto acima, resta inconteste que o 1º réu tem vínculo com facção criminosa o que, ineludivelmente, consubstancia causa idônea para afastar a minorante do tráfico privilegiado, uma vez que denota que o recorrente dedica-se, em algum grau, à atividade criminosa diversa. Cita-se: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO. INCIDÊNCIA DO BENEFÍCIO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO (ART. 33, § 4º, DA LEI N . 11.343/2006). MULA. QUANTIDADE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE E TRANSPORTE INTERESTADUAL . FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE PARA SE NEGAR A INCIDÊNCIA DA REDUTORA. AUSÊNCIA DE PROVAS DE QUE O AGENTE SE DEDICA À ATIVIDADE CRIMINOSA OU INTEGRA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1 . Para a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa, podendo a reprimenda ser reduzida de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), a depender das circunstâncias do caso concreto. (...) 4. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no HC: 807845 SP 2023/0077979-0, Relator.: REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 11/04/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/04/2023) Isto posto, nego provimento ao recurso de apelação do 2º réu, neste particular. No pertinente a 2ª ré, considerando a nova pena intermediária calculada em 05 (cinco) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias e, aplicando-se o mesmo entendimento adotado pelo juízo a quo, o qual, desvalorando a qualidade e a quantidade de droga apreendida, fixou a fração de diminuição do tráfico privilegiado em 1/3 (um terço), recalcula-se a pena final para 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 15 (quinze) dias. Por fim, a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos mostra-se incabível no caso concreto, nos termos do art. 44, III, do Código Penal, diante da existência de circunstância judicial desfavorável devidamente fundamentada na 1ª fase da dosimetria. Ante o exposto, em acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, conheço dos recursos para NEGAR-LHES PROVIMENTO, reformando a sentença ex officio tão somente quanto a dosimetria da 2ª ré para evitar bis in idem. É como voto. Sala das Sessões da Terceira Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís/MA, data do sistema. Desembargadora Maria da Graça Peres Soares Amorim Relatora
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