Processo nº 0000411-77.2012.8.10.0128
ID: 276305953
Tribunal: TJMA
Órgão: 1ª Vara de São Mateus
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0000411-77.2012.8.10.0128
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Secretaria de Vara. Processo-Crime: Nº 411-77.2012.8.10.0128 (18146/2012). Autor: Ministério Público Estadual. Promotor: Dr. Clodomir Bandeira Lilma Neto. Réus: Cheila Magalhães Costa e Ozaniel Rodri…
Secretaria de Vara. Processo-Crime: Nº 411-77.2012.8.10.0128 (18146/2012). Autor: Ministério Público Estadual. Promotor: Dr. Clodomir Bandeira Lilma Neto. Réus: Cheila Magalhães Costa e Ozaniel Rodrigues Pinheiro Advogado: Dr. Ivo Rezende Aragão Incidência penal: Artigos 33 e 35, da Lei N.º 11.343/2006. Vítima: A Saúde Pública. SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA Vistos, etc. O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no exercicio de suas atribuições constitucionais e legais, com exercício nesta Comarca, ofertou denúncia com base nos argumentos fáticos e jurídicos delineados no procedimento administrativo inquisitorial CHEILA MAGALHÃES COSTA E OZANIEL RODRIGUES PINHEIRO, pela prática de fato típico definido nos artigos 33 e 35 da Lei nº 11.343/2006 (Nova Lei de Drogas), na modalidade trazer consigo substância entorpecente, Alcalóide Cocaina na forma de base, popularmente conhecida como "crack" de acordo com a lista "F" da Portaria nº 344, de 12.05.98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. lrrogam-lhes a persecutio criminis de ff. 02-04 do caderno processual a prática dos delitos sob o nomem juris de tráfico de drogas e associação criminosa. Narra a peça inaugural que: "No dia 10 de fevereiro de 2012, por volta das 11:30 horas, na Rua Ribamar Marão, Bairro Tucum, Alto Alegre, os denunciados foram presos em flagrante por terem em depósito droga, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar." Noticia, mais que: *... os policiais militares receberam vária denúncias anônimas, por telefone, informando sobre a venda de substancia entorpecente e movimentação de usuários comprando a droga conhecida como "crack" na residência dos denunciados, inclusive mencionando que na dafa acima mencionada eles haviam recebido uma grande quantidade de droga. As denúncias mencionavam, ainda, que quando o denunciado Ozaniel não se encontrava na residência, quem vendia a droga era a sua companheira, ora denunciada, Cheila Magalhães. Diante dessas informações, os policiais foram até o local para realizar a abordagem. Ao chegarem ao local, os Soldados PM Valdimar e Oliveira bateram na porta, enquanto o Cabo PM João Costa Silva se deslocou para os fundos da casa, momento em que percebeu quando o denunciado jogou uma sacola contendo duas pedras de "crack" de aproximadamente 415 (quatrocentos e quinze) gramas. Em seguida, o denunciado jogou, pelo quintal da residência, uma lata contendo 60 (sessenta) cabeças de "crack"já confeccionadas para serem comercializadas. " Em virtudes das circunstância mencionadas, os policiais entraram no domicilio dos acusados e apreenderam os bens descritos na auto de apreensão, f. 13. Detidos os Denunciados e arrecadada a substância, estes foram encaminhados à respectiva Delegacia de Polícia local e, após verificou-se através do Auto de Constatação de Substância Entorpecente, f. 14, que a referida substancia tratava-se do entorpecente popularmente conhecida como "crack". Nos primeiros depoimentos prestados junto a dita autoridade policial, o denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro confessou o crime que lhe foi imputado, narrando o modus operandi do delito, enquanto que sua companheira, coautora, disse que seu marido realmente comercializava entorpecentes, mas ela não pactua com a conduta do companheiro. As versões dos acusados se compatibilizaram com os depoimentos dos políciais que efetuaram o flagrante. Foi ordenado a notificação dos acusados, para oferecer defesa prévia por escrito, no prazo de 10 (dez) dias (art.55, Lei 11.343/06), f. 37-38. Devidamente notificado para o fim de oferecer defesa prévia por escrito, os denunciados, apresentaram conforme ff. 40-41. Em juízo de análise de admissibilidade da presente peça acusatória, foi verificado os pressupostos da existência e validade da relação jurídico-processual e, estando a denúncia em consonância com os ditames formais do artigo 41 do Código de Processo Penal, bem como presentes as condições da ação insertas no artigo 395 do mesmo diploma processual acima citado, por força da Lei nº 11.719/08, que lhe deu nova redação, foi recebida a denúncia contra os acusados, pela prática dos crimes previsto no arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06, para o fim de declarar instaurada a Ação Penal e seguir o processo nos seus ulteriores termos, f. 48-49. Em ff. 54-57, contém o Laudo de Exame Químico de Substância que constatou que a substancia apreendida pela polícia trata-se de do Alcalóide na forma de base, conhecida vulgarmente como "crack", conformea lista "F" da Portaria nº 344, de 12.05.98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. Em cumprimento às regras do art. 56 da Lei nº 11.343/06, foi designada audiência de instrução e julgamento. Na oportunidade os denunciados foram interrogados, ff. 62-65. Durante a instrução foram ouvidas duas testemunhas às ff. 66-08. Não houve indicação de testemunhas pela defesa dos acusados. Encerrada a instrução, foi aberto às partes o prazo para apresentação de memoriais, f. 70. Em sede de alegações finais, o Ministério Público Estadual (ff. 71-73), requereu a condenação do réu Ozaniel Rodrigues Pinheiro, como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06; e quanto à acusada Cheila Magalhães Costa, requereu a absolvição por faltas de provas. À Defesa dos denunciados, por sua vez, alegaram: a) nulidades das provas por causa quea investigação se iniciou por denúncia anônima; b) as provas foram obtidas ilicitamente, porque houve violação do domicílio dos infratores; c) não existem provas para condenação dos acusados e d) pediram a causa de diminuição do art. 33, 8 4º, da Lei 11.343/2006. Os autos vieram-me conclusos, é o sucinto Relatório. Decido, observando o disposto no art. 93, inciso IX da Carta Magna. Motivação. Não há preliminares a serem apreciadas e estando o processo em ordem, com o procedimento regular previsto na Lei nº 11.343/2006 (Nova Lei de Drogas), passo à análise das acusações, a fim de se passar ao julgamento do mérito. De logo, registra-se por oportuno, que não há necessidade de conversão do julgamento em diligência para o julgamento da causa. As provas colhidas fornecem suficientes elementos para a recomposição dos fatos, permitindo segura conclusão, de modo que nada se precisa a ela acrescer. Antes de adentrar na autoria e materialidade dos delitos em tela, entendo pertinente ser discutido a priori as questões levantadas pela defesa sobre a nulidade das provas colhidas neste caderno processual. Inicialmente, a defesa alegou que denúncia anônima não pode ensejar a instauração de um inquérito policial, uma vez que a "prova produzida a partir da denúncia anônima é inconstitucional e macula de nulidade todo o processo". Não assiste nenhuma razão ao Causídico. O presente inquérito policial foi instaurado a partir de auto de prisão em flagrante e, não a partir de denúncia anônima como alega a defesa. Se fosse instaurado a partir de delação anônima, a autoridade policial teria baixado uma portaria. Sucede que a partir da mencionada denúncia, foi enviada uma guarnição da polícia militar, a fim de fazer uma apuração sumária e preliminar do delito que supostamente estaria sendo cometido. Sendo que a partir da dessa inspeção policial inicial que ocorreu o fiagrante do crime de tráfico de entorpecentes. Desse modo, o que fez instaurar o inquérito policial não foi a denúncia anônima, mas sim a prisão em fiagrante dos infratores. À conduta dos policiais está em conformidade com a Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que entende ser possível a abertura de inquérito policial a partir de provas colhidas em apuração sumária advinda de delação anônima: HABEAS CORPUS. "DENÚNCIA ANÔNIMA" SEGUIDA DE INVESTIGAÇÕES EM INQUÉRITO POLICIAL. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS E AÇÕES PENAIS NÃO DECORRENTES DE "DENÚNCIA ANÔNIMA". LICITUDE DA PROVA COLHIDA E DAS AÇÕES PENAIS INICIADAS. ORDEM DENEGADA. Segundo precedentes do Supremo Tribunal Federal, nada impede a deflagração da persecução penal pela chamada denúncia anônima", desde que esta seja seguida de diligências realizadas para averiguar os fatos nela noticiados (86.082, rel. min. Ellen Gracie, DJe de 22.08.2008; 90.178, rel. min. Cezar Peluso, DJe de 26.03.2010; e HC 95.244, rel. min. Dias Toffoli, DJe de 30.04.2010). No caso, tanto as interceptações telefônicas, quanto as ações penais que se pretende trancar decorreram não da alegada "notícia anônima", mas de investigações levadas a efeito pela autoridade policial. A alegação de que o deferimento da interceptação telefônica teria violado o disposto no art. 2º, e Il, da Lei 9.296/1996 não se sustenta, uma vez que a decisão da magistrada de primeiro grau refere-se à existência de indícios razoáveis de autoria e à imprescindibilidade do monitoramento telefônico. Ordem denegada. (STF – HC: 99490 SP, Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 23/11/2010, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-020 DIVULG 31-01-2011 PUBLIC 01-02-2011 EMENT VOL-02454-02 PP-00459) Também não merece prosperar a tese da obtenção ilícitas das provas, em virtude de ter havido a violação ilegal do domicílio dos infratores para obter tais provas. No caso em questão, não houve invasão ilegal da residência dos acusados. O art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal permite a violação do domicílio para se efetuar prisão em flagrante, em qualquer horário, do agente infrator, vejamos: XI a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; "Sendo assim, resta saber se os policiais agiram albergado nesta excludente de ilicitude. Consta nos autos que o policial João Costa Silva Filho, durante a apuração preliminar do delito em tela, se posicionou ao fundo do domicílio dos acusados, sendo que ele observou quando o denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro estava jogando para fora de sua residência as drogas que caracterizaram o presente delito. Ora nesse exato momento, ocorreu o flagrante do delito, uma vez que o policial encontrou o agente praticando o delito do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, na modalidade trazer consigo substancia entorpecente. Sendo que o policial já poderia efetivar, nesse momento, a prisão do agente com a invasão do domicílio dos acusados. Neste caso, restou caracterizado o flagrante próprio, real ou verdadeiro, conforme ensina Nestor Távora e Rosmar Rodrigues: "Dá-se o flagrante próprio quando o agente é surpreendido cometendoa infração penal ou quando acaba de cometê-la. É a modalidade que mais se aproxima da origem da palavra flagrante, pois há um vínculo de imediatidade entre a ocorrência da infração e a realização da prisão" Sendo assim, antes de os policiais adentrarem na residência dos denunciados, o flagrante delito já estava caracterizado. Ainda, os agentes estatais poderiam ter adentrado no domicílio dos infratores mesmo sem haver a concordância dos proprietários, pois já estavam amparados na excludente do flagrante delito prevista no art. 5, inc. XI, da Constituição Federal. Desta forma, entendo que a operação policial foi plenamente lícita e as provas obtidas nessa operação não possuem nenhum tipo de mácula que as tornem nulas. Pois bem. Passarei analisar agora a autoria e materialidade do delito. Em relação ao denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro, vejo nos autos elementos suficientes a demonstrar que a sua conduta encaixa-se perfeitamente na figura típica do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, (Nova Lei de Drogas), na modalidade trazer consigo substância entorpecente, Alcalóide Cocaina na forma de base popularmente conhecida como "crack" de acordo coma lista "F" da Portaria nº 344, de 12.05.98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, ou seja, é verdade no dia 10 de fevereiro de 2012, por volta das 11:30 horas, na Rua Ribamar Marão, Bairro Tucum, Alto Alegre, o denunciado tinha em depósito droga, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Sabe-se que O tráfico de drogas é crime de perigo, pois põe em risco a integridade. social, e o bem jurídico protegido pela tutela penal é a saúde pública. Para sua configuração "TÁVORA, Nestor; ALENCAR Rosmar Rodrigues. Curso de P al Penal. 4º edição. Editora Jus não é necessária a existência de dano efetivo, bastando a potencialidade ou iminência do dano à saúde. É o chamado crime de perigo comum. Com relação a autoria e a responsabilidade penal do réu, Ozaniel Rodrigues Pinheiro, necessário se torna proceder o estudo das provas carreadas no caderno processual, cotejando- as com os fatos descritos na denúncia. O Laudo Pericial de ff. 54/57 é indene de dúvida e atesta que a substância apreendida em poder dos denunciados trata-se do Alcalóide Cocaína na forma de Base, vulgarmente conhecida por "crack", o qual é extraído das folhas da planta cientificamente denominada Erytroxylon Coca Lam, que o caracteriza como substancia entorpecente, conforme a lista "F" da Portaria Nº 344/98- ANVISA/MS. Ante a prova material, a materialidade resta inafastável. No respeitante à autoria, também não tenho dúvidas, uma vez que o Ministério Público Estadual, por meio da prova testemunhal, logrou êxito em provar a imputação. No Interrogatório Policial, f. 11, o réu Ozaniel Rodrigues Pinheiro confessa a autoria delitiva, declarando-se "que é verdadeira a imputação que lhe é feita... que adquiriu toda a droga apreendida de um indivíduo desconhecido na cidade de Bacabal/MA na data de ontem 09.02.2012... No mesmo sentido, todas as testemunhas afirmaram no inquérito policial que a droga apreendida pertencia ao citado acusado. Podivm, 2010, p. 513. Ainda na fase policial, f. 12, a companheira da denunciada Cheila Magalhães Costa declarou que: "... tem conhecimento que seu companheiro Ozaniel Rodrigues Pinheiro comercializa a droga popularmente conhecida por crack..." Na audiência de instrução, os depoimentos dos policiais, ff. 66/68, mostraram-se harmonioso e coerente com todos depoimentos prestados no inquérito policial e com os fatos narrados na inicial acusatória. Apesar de os denunciados em interrogatório perante a autoridade judicial se retratarem da acusação, esses depoimentos não entram em total contradição com os depoimentos dos policiais. Na verdade, existem pontos nos depoimentos dos denunciados que se conciliam com os dos policiais. O denunciado, Ozaniel Rodrigues Pinheiro, declarou no interrogatório judicial, ff. 66/67, que a droga que foi apreendida estava em terreno baldio ao fundo do seu quintal. Sendo que tal fato também foi narrado pelos policiais nos seus depoimentos. Tanto no inquérito policial e tanto na Audiência de Instrução, as testemunhas afirmaram que acharam a droga no terreno ao fundo do quintal dos acusados. Na verdade, o denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro, apenas fez omitir no interrogatório judicial que foi ele que lançou as drogas para fora de sua residência. Ainda, os denunciados afirmaram que nenhuma droga foi achada no domicílio deles. De fato, na operação policial não foi apreendida nenhuma droga dentro da residência dos acusados, mas sim no terreno baldio ao fundo da casa dos réus. Em nenhum momento, os policiais afirmaram que acharam drogas dentro da residência, o que foi apreendido dentro da casa dos réus foram objetos relacionado com o delito, como celular, quantia em dinheiro trocado, aparelho de DVDe etc... Vislumbro que os depoimentos dos acusados fizeram foi ratificar a versão apresentada pelos policiais, visto que existem pontos que os depoimentos entram em harmonia e coerência. Na verdade, a retratação dos acusados fez foi elucidar um ponto contraditório que existia na instrução criminal, pois os réus no interrogatório policial confessaram que a droga foi apreendida em casa, enquanto que os policiais afirmaram que a droga foi apreendida em um terreno baldio ao fundo do quintal dos acusados. Portanto, estou convencido de que o delito ocorreu na forma narrada na denúncia. A autoria, em que pese não confessada, é atestada pelas testemunhas. A tese defensiva da ausência de provas para condenação do réu Ozaniel Rodrigues Pinheiro não merece guarida. Com isso estou convicto de que o denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro deverá ser responsabilizado nas penas do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, (Nova Lei de Drogas). "Art. 33, Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fomecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - Reclusão, de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa." Nos dias atuais, em que o aumento da criminalidade está ligado direta ou indiretamente com o tráfico de drogas - também com o desemprego, a exclusão social etc. -, sob o aspecto jurídico, é consensual o entendimento de que a punição do comércio nocivo deve ser agravada, e de forma exemplar. À mesma conclusão não se pode ter em relação à denunciada Cheila Sabe-se que para a imputação de um fato delituoso a alguém, necessário que haja comprovação do que se denomina de autoria delitiva, ou seja, a participação, mínima que seja, do acusado no fato delituoso, requisito sem o qual não se pode obter uma condenação crível, posto que a justiça, antes de mais nada, não pune por punir. Pois, somente a total certeza pode conduzir a um juízo de reprovação. Todavia, pelo que se apura do caderno processual, mormente pelos depoimentos colhidos e confrontados, não há como provar que a acusada realmente praticou o delito que lhe foi imputado. Perscrutei toda prova carreada ao processo. Na esfera inquisitorial nada ficou demonstrado a ponto de calcar uma sentença condenatória. A acusada, quando interrogado em Juízo, negou a autoria delitiva. As testemunhas arroladas pela acusação não souberam precisar qual era participação da denunciada no delito em tela. Ão final da instrução criminal, a Acusação não conseguiu o arcabouço probatório suficiente a comprovar o envolvimento da denunciada Cheila Magalhães Costa na empreitada criminosa perpetuada por seu companheiro Ozaniel Rodrigues Pinheiro. Os Juízos aceitos no processo criminal serão sempre de certeza, jamais de probabilidade, que equivale a insegurança. Estaria este magistrado, se assim procedesse, violando, expressamente, os princípios constitucionais insculpidos nos incisos LIV e LV, da Carta Magna. Neste sentido, a doutrina majoritária tem ensinado: "Para que o juiz possa proferir um decreto condenatório é precisos que haja prova da materialidade delitiva da autoria. Na dúvida, a absolvição se impõe. Evidente que a prova deve ser séria, ao menos sensata. Mas ainda: prova séria é aquela colhida sob o criv ntraditógio. Na hipótese de na instrução não ter sido feita nenhuma prova a respeito da autoria, não pode o juiz louvar-se no apurado na fase inquisitorial presidida pela autoridade policial. Não que o inquérito não apresente valor probatório; este, contudo, somente poderá ser levado em conta se na instrução surgir alguma prova, quando, então, é lícito ao juiz considerar tanto as provas do inquérito quanto aquelas por ele colhidas, mesmo porque, não fosse assim, estaria proferindo um decreto condenatório sem permitir ao réu o direito constitucional do contraditório. Idem se a única prova colhida for a palavra do co-réus. É possível até tenham eles razão, mas nem por isso deverá sua palavra se sobrepor ao preceito constitucional, que exige regular contraditório. Assim, se o Código não permite possam as partes formular reperguntas ao réu, obviamente se um co-réu acusa o outro, não havendo nova prova a ser considerada, a solução certa, deixando de lado a famigerada idéia do "jus corrigendi" é a absolvição, com fulcro no inciso Vi, do art. 386 do CPP" (Código de Processo Penal Comentado, Fernando Costa Tourinho Filho, 1. ed., 1996, p. 576-577, Saraiva)" Nesta senda é a mais lúcida jurisprudência, coligada junto aos tribunais pátrios, "APELAÇÃO CRIMINAL - RECEPTAÇÃO - SENTENÇA ABSOLUTÓRIA - RECURSO MINISTERIAL - PRETENDIDA CONDENAÇÃO - FALTA DE MATERIALIDADE - OBJETO NÃO ENCONTRADO - AUTORIA - NEGATIVA PELO RÉU - DEPOIMENTO ISOLADO - PROVA FRÁGIL - ABSOLVIÇÃO MANTIDA RECURSO IMPROVIDO Ausente a materialidade, já que o objeto nem sequer foi encontrado, e se o réu nega a todo momento a autoria delitiva, pesando em seu desfavor apenas o depoimento de uma testemunha, a manutenção da sentença absolutória é medida que se impõe, homenageando-se o princípio in dúbio pro reo. APELAÇÃO CRIMINAL - FURTO QUALIFICADO - CONCURSO DE PESSOAS - CONDENAÇÃO - RECURSO DEFENSIVO - PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO - MATERIALIDADE COMPROVADA - AUTORIA CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL DO RÉU RETRATAÇÃO - IRRELEVÂNCIA - AMPARO NA DELAÇÃO FEITA PELO CO-RÉU E NOS DEMAIS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO - PROVA SUFICIENTE - CONDENAÇÃO MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO - Não há como acolher o pedido absolutório se o réu, não obstante retratação em juizo, confessa a prática delitiva na fase policial com riqueza de detalhes, mormente quando esta confissão encontra sustentação na delação feita pelo co-réu e nos demais elementos de prova existentes nos autos. (TJMS ACr 2007.022238-4/0000-00 Naviraí - Rel. Des. Romero Osme Dias Lopes - J. 19.12.2007)" Aqui, mesmo diante desse tênue indício, que, repito, não está corroborado na fase de jurisdicionalização da prova e, até mesmo porque a Constituição Federal tutela a presunção de inocência, que somente cede com a existência de prova firme e idônea, a ser produzida pelo titular da ação penal -, não tenho, em hipótese alguma, como acolher a tese acusatória, face à indiscutível insuficiência de provas. O decreto absolutório se impõe. E, como se sabe, o julgador dirige o processo e toda a atividade probatória para a formação de uma certeza a respeito dos fatos ocorridos. Quando, encerrada a instrução criminal, não se consegue alcançá-la, nesta hipótese, tem o dever de absolver, pois o homem é livre e o Estado, por seus órgãos, antes de ter o direito de restringir sua liberdade, tem o dever de garanti-la. Por fim, quanto alegação da Defesa sobre a aplicação do art. 33, 84º, da Lei 11.343/06, deixo para aprecia-la na dosimetria da pena do acusado. Parte Dispositiva. 2 Decisão extraída do CDROM Editora Plenum, adquirido pelo EX POSITIS, presentes os indícios de autoria e materialidade do delito, ausente "qualquer causa de exclusão de ilicitude, culpabilidade e extinção de punibilidadee não sendo o caso de desclassificação, por tudo que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL, para condenar o acusado Ozaniel Rodrigues Pinheiro, nas iras do art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06; enquanto a acusada Cheila Magalhães Costa ABSOLVO das imputações que contra a mesma pesam nesses autos, com base no artigo 386, V, do Código de Processo Penal. Dosimefria. Em razão disso, passo a dosar as respectivas penas a serem aplicadas ao denunciado Ozaniel Rodrigues Pinheiro, em estrita observância ao disposto no art. 68, caput, do Código Penal, Passo à análise das circunstâncias judiciais relacionadas no art. 59, Código Penal, com correspondência no art. 42, da Lei nº 11.343/06: A culpabilidade é grave, pois o acusado estava na posse de grande quantidade de drogas, merecendo censura a conduta, mormente pelos efeitos nocivos da droga a toda a sociedade, especialmente por funcionar como um elemento desagregador de famílias e inibidor do trabalhado. Sobre seu antecedente apesar de existir um inquérito policial contra o réu na sua folha de antecedentes criminais, tal fato não pode agravar sua pena conforme súmula 444 do STJ3, sendo assim considero favorável seus antecedentes; quanto a conduta social do agente, visualizo como favorável, pois no boletim de vida pregressa do acusado consta que ele sustenta três filhos e ainda não existe nada no boletim que desabone sua conduta . À personalidade não é possível declinar a partir da conduta delitiva cometida; os motivos não justificam a ação, uma vez que o agente praticou o delito motivado em obter vantagem financeira fácil; as circunstâncias não o favorece, dada a dissimulação e utilização de imóvel * Súmula 444: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e açõespepais e ara agravar a pena-base" alheio para furtar-se da responsabilidade; as consegiiências do crime são negativas, uma vez que o acusado vendia "crack", substância entorpecente que além de causar dependência química nos usuários, podem levá-los a morte; o comportamento da vítima em nada contribuiu para o evento danoso. Fixação da Pena-Base. Visando o que dispõe o art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, e diante das circunstâncias judiciais acima expostas, condeno o réu OZANIEL RODRIGUES PINHEIRO, e fixo a pena base, afastada do mínimo legal, ou seja, 07 (sete) anos de reclusão. Inexistem agravantes, contudo em favor do réu milita a atenuante do art. 65, III, alinea "d", do Código Penal, em virtude de o acusado ter confessado a prática delitiva perante autoridade policial, mesmo que posteriormente tenha se retratado no interrogatório judicial. A atenuante deve ser aplicada sempre quando a sentença condenatória se aproveita da confissão do acusado na sua fundamentação. Nesse sentido existem precedentes no STJ: Ementa: HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. PENA DE 21 ANOS DE RECLUSÃO E DEPAGAMENTO DE 190 DIAS-MULTA. ALEGAÇÃO DE CONDENAÇÃO BASEADA EXCLUSIVAMENTE EM CONFISSÃO REALIZADA PERANTE A AUTORIDADE POLICIAL. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE PROVA. IMPROCEDÊNCIA. APLICAÇÃO DAATENUANTE DE CONFISSÃO, QUANDO UTILIZADA PARA EMBASAR A CONDENAÇÃO.PRECEDENTES DO STJ. ORDEM CONCEDIDA. 1. Não há ilegalidade na utilização de provas realizadas na fase de inquérito, desde que confirmadas pelas produzidas em juizo, sob o crivo do contraditório. 2. Deve ser reconhecida, em favor do paciente, a atenuante do art. 65, Ill, d, do Código Penal, quando confessada, perante a autoridade policial, a prática do delito, sendo tal declaração utilizada para fundamentar a condenação. 3 . Ordem concedida, em parte, determinando que o Tribunal a quo proceda a uma nova dosimetria da pena, levando-se em consideração a atenuante de confissão. (STJ - HABEAS CORPUS HC 160222 MG 2010/001 1480-9 Data de publicação: 15/06/2011) Sendo assim, reduzo a pena-base para 5 (cinco) anos e (oito) meses. Não milita em favor do réu causa de diminuição e nem de aumento de pena. Por fim, vou rebater a última alegação da defesa, que é a aplicação do art. 33, 8 4º, da Lei 11.343/2006, em favor do réu. Essa causa de diminuição especial de pena possui quatro requisitos para sua concessão: a) ser primário; b) ter bons antecedentes; c) não se dedicar a atividade criminosa e d) não integrar organização criminosa. Quanto ao requisito de não se dedicar a atividade criminosa, visualizo que o condenado não preenche tal requisito, uma vez que consta nos autos que o denunciado se dedicava ao tráfico de drogas e que tal conduta não era esporádica; sendo ainda que a Defesa não conseguir nem elidir essa constatação e nem provar que o mesmo tinha ocupação lícita. Desta forma, entendo incabível a aplicação do art. 33,84º, da Lei 11.343/2006. Fixo a pena de multa em 50 (cinquenta) dias-multa a um trigésimo do salário mínimo, abaixo do mínimo legal, face a sua apertada situação financeira do agente (CP, art. 60). Portanto, fixo a pena definitiva em 05 (cinco) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa a um trigésimo do salário mínimo. Do Regime: Com apoio no art. 668, do Código de Processo Penal, e arts. 33 e 35, ambos do Código Penal, determino o cumprimento da pena referente ao crime de tráfico de drogas, iniciando-se em regime semiaberto, na Penitenciária Agrícola de Pedrinhas, na Capital do Estado, num total de 05 (cinco) anos e 08 (oito) mês de reclusão. Deve-se frisar que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, no Habeas Corpus (HC) 111840 durante sessão extraordinária realizada no dia 27 de junho de 2012, incidentalmente a inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 2º da Lei 8.072/90, com redação dada pela Lei 11.464/07, O qual prevê que a pena por crime de tráfico será cumprida, inicialmente, em regime fechado. Além disso, a Corte Suprema já vem firmando jurisprudência no sentido que é possível até a conversão da pena privativa de liberdade para pena restritiva de direito para o crime de tráfico (HC nº 97256, HC nº 102678, ARE nº 663261). Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade, tendo em vista que não visualizo nenhuma das razões motivadoras de decreto preventivo de prisão previstas nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal. Designo a Penitenciária Estadual de, Pedrinhas para o cumprimento da pena privativa de liberdade. Oportunamente, após o trânsito em julgado desta decisão, tomem-se as seguintes providências: 1) Lance-se o nome do réu no rol dos culpados (CP, artigo 393, Il); 2) Expeça-se guia de recolhimento do réu ou, caso transite em julgado esta decisão somente à acusação, expeça-se guia de execução provisória: Gabinete do Juiz de Direito - Marcoauto Marques 17 3) Oficie-se ao TRE-MA, comunicando a condenação do réu, com sua devida identificação, acompanhada de fotocópia da presente decisão, para cumprimento do quanto do disposto pelos arts. 71, parágrafo 2º, do Código Eleitoral clc 15, III, da Carta Magna Vejo ainda que não é mais conveniente a guarda da droga apreendida, uma vez restando o findo processo, com a sentença. Assim, determino, nos termos do art. 72 da Lei nº 11.343/06 a destruição da droga apreendida conforme auto de f. 13, cujo procedimento deverá ser executado pela autoridade de polícia judiciária competente, na presença do representante do Ministério Público, mediante auto circunstanciado, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, tudo nos termos dos 8 8 1º e 2º, do art. 32 da mencionada Lei de Drogas. Todas as folhas seguem devidamente rubricadas (CPP, art. 388). Publique-se. Registre-se. Intime-se. São Mateus-MA, "Casa da Justiça" em 18 de março de 2014. Juiz de Direito Marco Aurélio Barrêto Marques Titular da Comarca de São Mateus
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