Processo nº 0001978-12.2019.8.10.0060
ID: 326579872
Tribunal: TJMA
Órgão: 2ª VARA CRIMINAL DE TIMON
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0001978-12.2019.8.10.0060
Data de Disponibilização:
16/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOSELIO SALVIO OLIVEIRA
OAB/PI XXXXXX
Desbloquear
PUBLICAÇÃO DE SENTENÇA. JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE TIMON/MA. PROCESSO Nº: 0001978-12.2019.8.10.0060. AÇÃO:AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283). AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. A…
PUBLICAÇÃO DE SENTENÇA. JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE TIMON/MA. PROCESSO Nº: 0001978-12.2019.8.10.0060. AÇÃO:AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283). AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. ADVOGADO: JOSELIO SALVIO OLIVEIRA - OAB/PI5636 ACUSADOS: ALAN CARNEIRO DA SILVA e REINALDO BARBOSA RIBEIRO. O MM. Juiz de Direito Clênio Lima Corrêa, Titular da 2ª Vara Criminal da Comarca de Timon/MA, Estado do Maranhão, por título e nomeação legal... FAZ SABER a todos quantos que o presente edital, virem ou dele conhecimento tiverem, para que tomem ciente da presente SENTENÇA: 1.RELATÓRIO O Ministério Público Estadual, no uso de suas atribuições legais e constitucionais, ofertou a exordial acusatória em desfavor de ALAN CARNEIRO DA SILVA e REINALDO BARBOSA RIBEIRO, como incursos nas penas do artigo 317, § 1º, c/c art. 29 do Código Penal. Consta na denúncia Id 69232944: “ no dia 05/09/2017, por volta das 19h00 e no dia 21/10/2018, a partir das 19h00, nesta cidade, no Posto de Fiscalização da AGED, nos limites dos estados do Piauí/Maranhão, nas proximidades dos Posto Fiscal de Timon/MA, os denunciados Alan Carneiro da Silva e Reinaldo Barbosa Ribeiro, no desempenho de suas atividades funcionais como servidores da Agência Estadual de Defesa Agropecuária (AGED), com desígnio de ação manifestada pelo dolo, solicitaram vantagem pecuniária, infringindo o seu dever funcional, na medida que realizavam a retenção de veículos, alegando falhas e incorreções inexistentes nas GTA's (Guia de Trânsito Animal), condicionando a sua liberação ao pagamento de dinheiro. Segundo restou apurado, inúmeras denúncias foram apresentadas no Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo (e-OUV), dando conta de pagamentos de propinas envolvendo servidores da AGED (Agência Estadual de Defesa Agropecuárias), no período de 2017 e 2018, constantes às fls. 05/23, o que resultou na abertura de processo de sindicância e, posteriormente, em Procedimento Administrativo para apurar as faltas funcionais dos servidores. Conforme narra os autos, no dia 05/09/2017, por volta das 07h30min, o motorista Valdeir Ernesto Bezerra (Telmo de Declaração de fls. 113), relatou que estava transportando cabeças de gado e quando passou no Posto Fiscal de Timon, dirigiu-se ao guichê da AGED onde foi atendido pelo denunciado Reinaldo Barbosa Ribeiro, oportunidade em que informou que a idade dos Animais não conferia com o que constava na GTA, por isso iria acionar o médico veterinário para realizar a fiscalização, entretanto, após horas e mesmo com a insistência da testemunha cobrando a presença do médico, este não compareceu. Acrescentou o motorista VALDEIR que, estava viajando com sua esposa e neto e que diante do calor insuportável um motorista que estava ao seu lado falou: “Tu ainda meio entendeu o que o funcionário da AGED esta querendo”... “Ele tó querendo dinheiiro, oferece dinheiro para ele”. Diante disso, resolveu seguir o conselho do motorista e ofereceu a quantia de R$ 100,00 (cem reais) para ele liberar a carga, no entanto, não foi aceito pelo denunciado, visto que foi exigido o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) para liberar a carga. Ao final, acabaram acertando e o motorista pagou a quantia de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais). A testemunha VALDEIR, posteriormente, denunciou o fato à o que culminou com o início das investigações, fls. 22/23. Narra ainda, a testemunha acima mencionada, que reencontrou o segundo denunciado em outra oportunidade no Posto Fiscal da AGED e este, como represália, passou uma hora fiscalizando a carreta e a documentação, momento em que disse a Reinaldo Barbosa Ribeiro, que cumprisse seu papel e não levasse nada para o lado pessoal, no entanto, este retrucou: “Você não soube me denunciar, pois vamos ver quem vai sair ganhando aqui na fronteira”. Ouvido perante a autoridade policial o segundo denunciado Reinaldo Barbosa Ribeiro afirmou que estava de plantão na data supracitada, alegando que a carga foi retida em razão do GTA (Guia de Trânsito Animal) está preenchida de forma errônea, visto que constavam garrotes de treze a vinte quatro meses e que, em razão da sua experiência deduzir que os animais tinham mais de trinta e seis meses. Afirmou ainda que não lavrou o auto de infração, posto que a SEFAZ havia liberado, como também não acionou a médica veterinária porque entendeu que não era necessário, visto que a mesma sempre mandava liberar. Nos autos consta a cópia da GTA em nome de Hildebrando Gonçalves dos Santos, carimbada pela AGED em 05.09.17, às 08h02inin, onde podemos verificar a quantia de 20 bovinos machos, com idade de 25 a 36 meses. Restou apurado ainda que, na data de 21/10/2018, a partir de 19h00, a equipe plantonista formada pelos denunciados Alan Carneiro da Silva e Reinaldo Barbosa Ribeiro abordaram e retiveram 08 (oito) veículos com carregamento de bovinos, provenientes da Fazenda Extra, Povoado Chapada da Estiva - Uruçuí/PI com destino ao Frigotil de Timon/MA, e atuando com o mesmo modus operandi, constrangendo os motoristas, mediante falsas alegações de que as GTA’s não estavam preenchidas de forma correta, solicitaram o valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) por cada caminhão, para que fossem liberados. Toda empreitada criminosa veio à tona a partir da denúncia feita na Ouvidoria Geral do Estado (NUP: 65441.000068/2018-82 e NUP: 65381.000197/2018-22), em que relata que na data mencionada, 10 (dez) caminhões carregados de bovinos, proveniente da Fazenda Extra seguiam viagem com destino ao Frigotil de Timon, donde 02 (dois) foram fiscalizados e seguiram viagem sem qualquer problema, visto que passaram em horário diverso dos plantões dos denunciados. Os outros 08 (oito) caminhões, começaram a chegar na barreira zoofitosanitária da AGED a partir das 19h, horário de plantão dos denunciados ALAN e REINALDO. O primeiro caminhão a chegar, por volta das 19h00 ou 19h30 estava sendo transportado pelo motorista VALDEIR DE SOUZA FERREIRA (Termo de declaração às fls. 179), o segundo e terceiro caminhão chegaram por volta das 19h00 ou 20h00, cujos motoristas eram CRISTIANO DOS NASCIMENTO SOUSA (Termo de Declaração fls. 184), e MARCOS VINÍCIUS GOMES (Termo de Declaração de fls. 168), o quarto caminhão chegou ao local por volta das 20h30min, conduzido pelo motorista LUCINDO ANTÔNIO SARMENTO DANTAS (Termo de Declaração de fls. 163). Um dos últimos caminhões a chegar ao local, por volta das 22h00 ou 23h00 estava sendo conduzido pelo motorista FRANCISCO GILES MENDES LUIS (Termo de Declaração de fls. 156). Em que pese os outros motoristas não comparecerem para prestar esclarecimentos, verifica-se nos autos, através dos depoimentos dos demais motoristas que todos os caminhões foram abordados entre o horário de 19h00 às 23h00. Conforme apurado, todos os veículos foram retidos sob a mesma alegação de que as idades dos animais eram incompatíveis com aquelas descritas da GTA’s. As negociações quanto ao pagamento e o valor da propina, inicialmente, foram realizadas diretamente entre os denunciados ALAN e REINALDO e o motorista-testemunha MARCOS VINÍCIUS, que de imediato ligou para a testemunha FRANCISCO SARMENTO DE QUEIEOGA, proprietário dos veículos, informando da situação e que os denunciados estavam solicitando dinheiro para liberar a carga. Em razão da situação aventada, FRANCISCO SARGENTO foi até o local e passou a negociar com os denunciados que diminuíram o valor da propina de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) para R$ 100,00 (cem reais), por cada caminhão apreendido, oportunidade em que ligou para a testemunha SÉRGIO MENDES DOS SANTOS, chefe do setor de transportes do Frigotil, que de imediato determinou que fosse refutada a proposta de pagamento de dinheiro, visto que as GTA's estavam preenchidas corretamente. Diante da negativa de pagamento dos valores por parte do proprietário dos caminhões, os denunciados ALAN e REINALDO permaneceram com os veículos apreendidos até a manhã seguinte, quando a nova equipe plantonista assumiu, oportunidade em que o fiscal-testemunha MÁRIO ERNANES FERREIRA CUTRIM recebeu o plantão e verificando que não havia qualquer irregularidade nas GTA’s, liberou os veículos, (Termo de depoimento às fls. 143/144). As testemunhas Lucindo Antônio Sarmento, Marcos Vinicius Gomes, Francisco Sarmento de Queiroga, reconheceram os denunciados ALAN e REINALDO como sendo os fiscais da AGED que estavam no Posto Fiscal no dia 21/10/2018, assim como, confirmaram que foram eles que solicitaram o dinheiro para liberação do caminhão, conforme Termo de Reconhecimento Fotográfico de fls. fls.169/170; 176/177. Ouvidas a testemunha ADAIANA CLAUDIA MORÃO DE CARVALHO (Termo de Declaração de fls. 222), médica veterinária, e Responsável Técnica e Administrativa do PFFA de Timon, informou que o procedimento padrão quando a Guia de Transito Animal está irregular deve ser lavrado o Auto de Infração e o retorno da carga à origem. E no caso de dúvida, quanto à idade dos animais, deve ser acionado o médico veterinário. Relatou ainda que, em nenhum dos dois casos foi acionada, em que pese está sempre disponível seu celular para esses casos, inclusive, em horário noturno e finais de semana. O procedimento a ser adotado, no caso dos autos, e esclarecido pela testemunha ADAIANA, também foram confirmados pelas testemunhas MÁRIO ERNANES FERREIRA CUTRIM, auxiliar de fiscal agropecuário (Termo de Declaração de fls. 225) e YNADY FERREIRA COSTA, médica veterinária e Fiscal Estadual Agropecuária da AGED/MA (Termo de Declaração de fls. 243). Asseveraram que tais medidas são necessárias visando o bem estar animal, visto que não devem permanecer por mais de 12 horas embarcados. Ouvido perante a autoridade policial o segundo denunciado REINALDO BARBOSA RIBEIRO (fls. 226/227); negou o recebimento de qualquer valor e que os animais foram retidos em razão de divergências entre as GTA’s e os animais. Esclareceu que no primeiro momento em 05/09/2017, não acionou o médico veterinário, porque entendeu que não era necessário; já no segundo momento em 21/10/2018, afirma que foi um erro seu não ter ligado para sua Chefe Imediato e que, não o fez, em razão do horário que era por Volta de 01h00. O primeiro denunciado ALAN CARNEIRO DA SILVA (fls. 231/232) irdormou que quando GTA apresenta divergência tem discricionariedade de reter a carga e providenciar outra GTA em doze horas, lavrar o auto de infração e retornar a carga ou apenas retornar a carga. Esclareceu que, no caso dos caminhões com destino ao Frigotil não achou necessário lavrar o auto de infração, realizando apenas a retenção da carga para providenciar outra guia de trânsito, além de não ser necessário acionar a médica veterinária. DA TIPICIDADE Em assim sendo, a conduta dos denunciados ALAN CARNEIRO DA SILVA e REINALDO BARBOSA RIBEIRO de constranger os motoristas, mediante falsas alegações de que as GTA’s não estavam preenchidas de forma correta, com o intuito de solicitar dinheiro para liberação dos veículos, além de ritos animais por horas embarcados, não observando o procedimento regular descritos na Instrução Normativa 44/2007 e Decreto n° 30.608/2014, que prevê a lavratura do auto de infração e aplicação de multa, não cabendo a discricionariedade do fiscal em reter a carga em até 12 horas para correção da guia, amolda-se ao tipo penal descrito no art. 317, § 1º do Código Penal, em concurso de pessoas, do art. 29 do diploma penal pátrio. Destarte a autoria delitiva está devidamente evidenciada, bem como a materialidade do delito é inconteste. DO REQUERIMENTO O Ministério Público, restando comprovada a autoria e a materialidade delituosa, vem perante Vossa Excelência, DENUNCIAR ALAN CARNEIRO DA SILVA e REINALDO BARBOSA RIBEIRO como incursos nas penas do artigo 317, § 1º, c/c art. 29 do Código Penal. Ante todo o exposto, e diante dos demais elementos de provas encartados nas peças de informação que integram o Inquérito Policial, que a esta serve de sustentação, este Órgão do Ministério Público requer, vez recebida a presente peça acusatória, a citação dos denunciados para apresentarem defesa inicial, instaurando-se o competente processo-crime contra os supranominados como recurso nas penas ditas anteriormente, ouvidas as testemunhas abaixo arroladas para virem depor em Juízo, sob as cominações legais, ultimando-se o processo com a condenação dos denunciados.” A denúncia veio acompanhada de IP 035/2019-2°DICRIF/SECCOR, Id 69232947. Em 05/11/2019, Id 69232954, foi determinada a notificação dos réus. Notificados pessoalmente, os acusados apresentaram resposta a acusação Id 69232960. Em 09/01/2020, foi recebida a denúncia, Id 69232955. Audiência de instrução realizada em 11/09/2023, Id 101073982, ocasião em que foram ouvidas as testemunhas de acusação e defesa e interrogados os acusados. Alegações finais do Ministério Público por meio de memoriais Id 117194113, reiterando os termos da denúncia e pugnando pela condenação dos acusados ALAN CARNEIRO DA SILVA E REINALDO BARBOSA RIBEIRO, no tipo penal descrito no art. 317, § 1º, c/c art. 29, todos do Código Penal, nos termos da Denúncia. Alegações finais a defesa de ALAN CARNEIRO DA SILVA E REINALDO BARBOSA RIBEIRO, Id 131625949, pugnando pela ABSOLVIÇÃO dos acusados dos crimes a ele imputados nos moldes do artigo 386 , incisos V , VII do Código de Processo Penal. Tudo bem visto e ponderado, passo a decidir. 2.FUNDAMENTAÇÃO O deslinde da presente causa, como de resto nas demais, passa, necessariamente, pelas respostas aos seguintes questionamentos: há prova nos autos de que o crime, efetivamente, ocorreu (materialidade delitiva) e de que o ora denunciado é o seu autor (autoria criminosa)? Dito isto, e cientes de que indícios de prova não se confundem com a prova em si, distinguindo-se os institutos, em última análise, pelo fato de aquele primeiro induzir à conclusão acerca da existência do fato e este demonstrar sua existência efetiva, vale dizer, neste primeiro momento, que existem provas tanto acerca da autoria quanto da materialidade delitivas. Como consabido, a doutrina Processual Penal prevê pelo menos três sistemas, a saber: i) o inquisitivo; ii) o acusatório e iii) o misto. Tem-se, pois, no inquisitivo, o sistema caracterizado pela concentração de poderes nas mãos do julgador que, neste particular, também exerce a função de acusador. Nas palavras de NUCCI, neste tipo de sistema “a confissão do réu é considerada a rainha das provas; não há debates orais, predominando procedimentos exclusivamente escritos; os julgadores não estão sujeitos à escusa; o procedimento é sigiloso; há ausência de contraditório e a defesa é meramente decorativa”1. O sistema acusatório, ao revés, caracteriza-se pela nítida separação entre o órgão julgador e o acusador; o contraditório está presente; a liberdade do réu é a regra; há a possibilidade de recusa do julgador e vigora a publicidade dos procedimentos. Por fim, o misto seria aquele que, surgido após a Revolução Francesa, uniu características dos dois primeiros sistemas, dividindo o processo em duas grandes fases: uma instrução preliminar e no bojo da qual prevaleceria o sistema inquisitivo, sendo, portanto, sigilosa e sem a aplicação do contraditório; e a fase de julgamento, onde ganharia relevância o sistema acusatório, com características como a publicidade, oralidade, contraditório e concentração dos atos processuais. No Brasil, em que pese a divergência doutrinária existente, prevalece o entendimento de que se tem por adotado o sistema acusatório, amparado na ideia insculpida na própria Constituição Federal que, às claras, optou por um sistema com a separação de funções de julgar, acusar e defender, uma vez que, dentre outras normas, elege o Ministério Público como órgão competente para o oferecimento da ação penal (art. 129, inciso I, da CF/88). Diante de tal panorama e com nítido propósito garantista, tem-se que o magistrado não pode, sob pena de serem violados princípios como o contraditório e ampla defesa, proferir decreto condenatório com base em provas colhidas apenas na fase de investigação e passíveis de repetição na fase processual. Dito de outro modo, precisamente porque elaboradas para além do manto do contraditório e, portanto, sem a participação do investigado, as provas colhidas durante a fase de investigação, sob os olhos do sistema inquisitivo, não podem receber do magistrado o rótulo de incontestáveis, salvo quanto àquelas ditas documentais e urgentes, como o são os exames de corpo de delito, os laudos cadavéricos e os demais exames periciais de caráter urgente. Pensando nisso foi que o legislador pátrio estatuiu no art. 155, caput, do Código de Processo Penal, com redação conferida pela Lei 11.690/2008 que, litteris: O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Grifou-se). Noutro giro, também se sabe que para que se prolate um decreto condenatório é necessário, por decorrência do princípio in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu), que se tenha um juízo de certeza acerca das elementares e circunstâncias do crime, assim entendido o fato típico (a previsão em lei de uma conduta que tenha importado a violação a um comando proibitivo – tipicidade formal), ilícito (i.e, em desconformidade com o ordenamento jurídico) e culpável (o agente imputável, livre e conscientemente, mesmo podendo agir de modo diverso, opta por praticar a conduta contrária ao Direito) (teoria tripartida). De maneira que, havendo dúvida sobre qualquer deles, ipsu factu, inexistindo prova suficiente à condenação, impõe-se a absolvição do acusado. Na irreparável lição do mestre Renato Brasileiro de Lima2, ao referir-se ao princípio da presunção de inocência, hoje estampado no inciso LVII, do art. 5º de nossa Carta Constitucional (“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”): Consiste, assim, no direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença transitada em julgado, ao término do devido processo legal, em que o acusado tenha se utilizado de todos mãos de prova pertinentes para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação (contraditório). E mais à frente arremata3: O in dubio pro reo não é, portanto, uma simples regra de apreciação das provas. Nas verdade, deve ser utilizado no momento da valoração das provas: na dúvida, a decisão tem de favorecer o imputado, pois não tem ele a obrigação de provar que não praticou o delito. Antes, cabe à parte acusadora (Ministério Público ou querelante) afastar a presunção de não culpabilidade que recai sobre o imputado, provando além de uma dúvida razoável que o acusado praticou a conduta delituosa cuja prática lhe é atribuída. (Grifos nossos). Acerca do princípio do contraditório, leciona aquele mesmo autor, ao citar Joaquim Canuto Mendes de Almeida que: De acordo com esses conceitos, o núcleo fundamental do contraditório estaria ligado à discussão dialética dos fatos da causa, devendo se assegurar a ambas as partes, e não somente à defesa, a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos praticados no curso do processo. Eis o motivo pelo qual se vale a doutrina da expressão “audiência bilateral”, consubstanciada pela expressão em latim audiatur et altera pars (seja ouvida também a parte adversa). Seriam dois, portanto, os elementos do contraditório: a) direito a informação; b) direito de participação. O contraditório seria, assim, a necessária informação ás partes e a possível reação a atos desfavoráveis4. Pois bem. Em análise do processo, constata-se que são imputadas aos réus duas ações distintas, ocorridas em datas diferentes. No dia 05 de setembro de 2017, os réus teriam exigido da vítima, Valdeir Ernesto Bezerra, a quantia de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) para a liberação de seu caminhão. Posteriormente, em 21 de outubro de 2018, os réus teriam retido diversos caminhões, exigindo de cada um a quantia de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) para a liberação. Diante da distinção temporal e da natureza diversa das ações, faz-se necessária a análise separada de cada conduta, a fim de facilitar a compreensão e o julgamento do caso. A materialidade dos crimes se apresenta nas NUP: 65441.000068/2018-82; 65381.000197/2018-22; 65441.000080/2017-14, 65441.000079/2017-8, 65399.000510/2017 -52, 65441.000042/2017-53 e depoimento das vítimas. O exame da autoria é subsidiado, precipuamente, pela prova oral produzida na instrução criminal, consistente no depoimento das testemunhas, vítimas, depoimento dos réus e provas documentais acostadas. a) conduta do dia 05/09/2017 Inicialmente, foi ouvida a vítima, Valdeir Ernesto Bezerra, que reconheceu o acusado REINALDO BARBOSA RIBEIRO como a pessoa a quem pagou para liberar a carga, afirmando que ALAN CARNEIRO DA SILVA não foi visto por ele no local ou lhe pediu nenhuma vantagem. Relatou que no dia 05/09/2017, estava conduzindo um caminhão carregado de gado da cidade de Açailândia com destino a Arapiraca, Alagoas. Ao passar por Timon, encontrou o acusado Reinaldo, que estava de plantão na fiscalização sanitária. No momento em que foi carimbar a Guia de Trânsito Animal (GTA), que estava corretamente preenchida, Reinaldo foi até o caminhão e alegou que o gado transportado não correspondia ao descrito na GTA, pois a idade dos animais era inferior à informada no documento. Diante disso, a carga ficou retida no posto fiscal das 8h às 13h. Em determinado momento, alguém comunicou à vítima que seria necessário pagar R$ 250,00 para a liberação do gado. Valdeir efetuou o pagamento diretamente ao acusado Reinaldo, que imediatamente liberou o caminhão. Após o ocorrido, a vítima entrou em contato com a pessoa que lhe vendeu o gado e preencheu a GTA, que confirmou que os dados estavam corretos. Diante disso, Valdeir dirigiu-se à delegacia da AGED em Caxias-MA, onde formalizou uma denúncia contra Reinaldo. Contou ainda que, após realizar a denúncia, passou novamente pelo posto fiscal onde Reinaldo estava de serviço. Dessa vez, o acusado reteve o caminhão novamente e, ao invés de liberar a carga, determinou que ela retornasse à origem. Na ocasião, dirigiu-se à vítima e disse: "Agora tu volta lá na delegacia e me denuncia de novo", acrescentando: "Você vai ver lá na frente o que vai acontecer com você". Contou que após o ocorrido, decidiu parar de negociar gado no Maranhão e que algum tempo depois, soube que Reinaldo havia sido preso por corrupção. Por ocasião do exercício de seu direito de defesa o acusado REINALDO BARBOSA RIBEIRO negou ter recebido qualquer quantia da vítima valdeir ernesto bezerra. Sobre o ocorrido no dia 05/09/2017 e destacou que Alan Carneiro da Silva não estava de plantão no dia 05/09/2017. Relatou que Valdeir chegou ao posto fiscal com um caminhão carregado de bois e, ao realizar a fiscalização, constatou inconformidade entre a GTA e a nota fiscal. A GTA indicava que os animais eram destinados à engorda, com idade entre 24 e 36 meses, enquanto a nota fiscal registrava que os bois eram para abate, com idade acima de 36 meses. Diante dessa divergência, Reinaldo verificou a carga e, em sua percepção, os animais correspondiam à descrição da nota fiscal, e não da GTA. Para esclarecer a questão, acionou os veterinários da AGED para que confirmassem a idade dos animais. No entanto, após algumas horas, os veterinários não compareceram ao posto. Como o mês de setembro é um período de temperaturas elevadas e o posto não dispõe de cobertura ou pátio adequado para abrigar os animais, e considerando que a divergência era apenas entre GTA e nota fiscal (sendo que os valores dos animais na nota fiscal eram superiores aos da GTA), optou por liberar a carga para evitar riscos à saúde dos animais. A seu turno ALAN CARNEIRO DA SILVA, nego ou o fato imputado e afirmou que não no plantão do posto fiscal no dia 05/09/2017. Sobre a conduta do dia 05/09/2017, de que ter-se-ia exigido da vítima Valdeir Ernesto Bezerra quantia para a liberação da cargas, entendo que tal fato é devidamente comprovado pelos depoimentos da vítima que confirmou o pagamento dos valores e que somente teve seu veiculo liberado após pagar a quantia exigida, vindo a registrara a NUP 65441.000042/2017-53, junto à procuradoria do Estado. A vítima apontou de forma firme o denunciado REINALDO BARBOSA RIBEIRO, como a pessoa que, aproveitando-se de sua condição de técnico agropecuário, No dia 05/09/2017 exigiu vantagem indevida para efetuar liberação de carga de animais. No crime de corrupção passiva o elemento subjetivo do delito é o dolo que consiste ’solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa da tal vantagem’ e se consuma no momento em que o funcionário público solicita, recebe ou aceita a promessa de vantagem indevida. Assim, entendo que, considerando a robustez das provas e a coerência do depoimento da vítima condenação a REINALDO BARBOSA RIBEIRO se impõe. Outrossim, em termos de prova convincente, a palavra da vítima, cumulado ao contundente acervo probatório constante aos autos, preponderam sobre as do réu. Esta preponderância resulta de um juízo de razoabilidade, devem-se examinar suas declarações pelos elementos que contêm, confrontando-os com as outras provas ou indícios obtidos na instrução. Se a prova sobrevive depois desta análise, ela é forte para condenação, não importando quem a trouxe. Nunca é demais insistir que o panorama jurisprudencial tende a afirmar que a prova testemunhal consistente na palavra da vítima tem suficiente valor probante para o amparo de um decreto condenatório. Os relatos da vítima ao se mostrar seguro e coerente, merecem ser considerados elementos de convicção idôneos, senão vejamos: PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO SIMPLES. MATERIALIDADE DELITIVA E AUTORIA COMPROVADA. DOSIMETRIA. EM DESACORDO COM OS DITAMES DO ARTIGO 59 DO ESTATUTO PENAL. REDIMENSIONAMENTO. 1. É válido o reconhecimento do réu feito pela vítima em juízo. As palavras da vítima, quando aliadas aos demais elementos do processo, são suficientes para embasar um édito condenatório. Acriminado reconhecido perante a Autoridade Policial e em juízo. 2. Inexistência de produção de prova da defesa capaz de confirmar a versão do apelante ou afastar a robusta prova produzida em seu desfavor. 3. Dosimetria. Culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade valoradas negativamente de forma equivocada pelo juízo. Violência já integra o tipo penal e não pode exasperar pela culpabilidade. Registros Criminais sem trânsito em julgado, não podem exasperar a pena nos antecedentes e personalidade do agente. Quanto a conduta social, o simples fato do réu ser usuário de drogas, não o coloca como elemento pernicioso para sociedade. Precedentes. 4. Apelo conhecido e parcialmente provido apenas para redimensionar a pena corporal, mantendo, no resto, a decisão guerreada. (TJMA, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, PROCESSO CRIMINAL | RECURSOS | APELAÇÃO CRIMINAL PROCESSO Nº.: 0000997-92.2018.8.10.0035 – COROATÁ Relator: Des. José Joaquim Figueiredo dos Anjos, Julgado em 06/05/2022) No que diz respeito à participação da acusada ALAN CARNEIRO DA SILVA, observo que a escala de serviços, Id 69232948, revela que ele não estava de plantão serviço no dia 05/09/2017, assim como a vítima confirma que ele não exigiu nenhum valor, nem o viu no dia dos fatos, assim, não se demonstrou na instrução provas de sua participação no delito. Pelo que sua absolvição se impõe. b) Conduta do dia 21/10/2018, retenção de vários caminhões e exigência da quantia de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) de cada caminhão para a liberação. De fato testemunhas relatam ter recebido queixas de motorista sobre a existência de cobrança para liberação de cargas de gado, entretanto, não conseguem identificar a pessoa que exigiu a vantagem. Vejamos: A testemunha Sérgio Mendes dos Santos, chefe do setor de transporte de animais da Frigotil, relatou que dez caminhões transportando gado do sul do Piauí foram retidos no posto da AGED em Timon. A retenção ocorreu sob a justificativa de divergência entre a idade dos animais informada na Guia de Trânsito Animal (GTA) e a carga transportada. Os motoristas, no entanto, informaram que lhes foi cobrado o valor de R$ 150,00 por caminhão para que a carga fosse liberada. Sérgio explicou que a retenção ocorreu durante a madrugada e que, no dia seguinte, com a troca de plantão, os caminhões foram liberados normalmente, sem a necessidade de qualquer pagamento. Ele afirmou não saber o nome do servidor responsável por dificultar a liberação da carga mediante exigência de dinheiro. Já a testemunha Francisco Sarmento de Queiroga relatou que era proprietário de caminhões e prestava serviço transportando gado para o frigorífico Frigotil. Ele mencionou que uma de suas cargas foi retida no posto da AGED em Timon, mas não se recorda de ter efetuado qualquer pagamento para a liberação. Sobre as operações da AGED em Timon, na data foram ouvidos servidores da AGED, que confirmaram a retenção e a posterior liberação das cargas, mas não sabem se ouve ou quem pediu dinheiro para liberação das cargas. Ouvida em juízo, a testemunha Adaiana Cláudia Morão de Carvalho, médica veterinária da AGED, relatou que, ao chegar ao trabalho no dia seguinte aos fatos, foi informada por sua superiora, Dra. Jocélia, sobre cargas que estavam retidas no posto fiscal. No entanto, afirmou que desconhecia essa retenção, seu motivo e a quantidade de cargas envolvidas, mas soube que o veterinário Mário Cutrim havia realizado a liberação. Explicou que a carga deve estar de acordo com a Guia de Trânsito Animal (GTA) e que, caso haja inconsistências entre a carga e a GTA, caracteriza-se uma infração, devendo a carga retornar à origem. Além disso, destacou que, conforme o Manual de Manejo e Bem-Estar Animal, os animais devem ser transportados em um prazo máximo de 12 horas, mas não soube informar se esse prazo foi respeitado na situação em questão. A testemunha esclareceu que, na prática, as cargas não são efetivamente retidas, apenas ficam paradas para conferência da documentação e averiguação dos animais, sendo liberadas em seguida. Caso haja dúvidas ou divergências na GTA, como diferenças no número de machos e fêmeas, um veterinário é acionado para resolver a questão e agilizar a liberação. Por fim, afirmou não ter tido conhecimento de qualquer solicitação de dinheiro por parte dos fiscais para liberar os animais e, pelo que soube, a liberação ocorreu de forma regular pelo servidor Mário, após a conferência dos animais dentro do processo administrativo padrão. Por sua vez a testemunha Ynady Ferreira Costa, médica veterinária da AGED, relatou não ter tomado conhecimento de que os acusados tenham pedido dinheiro para liberar as cargas de animais retidas de forma indevida. A testemunha Mário Ernanes Ferreira Cutrim afirmou que assumiu o plantão seguinte ao dos acusados. Ao receber o plantão, foi informado sobre uma suposta divergência entre a idade dos animais transportados e a idade registrada na Guia de Trânsito Animal (GTA). Diante disso, realizou a checagem dos caminhões, conversou com os responsáveis pelo transporte, conferiu os animais e a validade da GTA, não constatando qualquer irregularidade. Como os animais já estavam retidos há um longo período, procedeu com a liberação e comunicou sua decisão à chefia. Acrescentou que não recebeu nenhuma reclamação sobre eventual pedido de dinheiro para liberação da carga. As testemunhas Jerry Wilson Macedo Martins, Eginaldo de Sousa Martins e Auriesley Rocha da Silva, que trabalham na AGED em Timon junto aos acusados, afirmaram que, até onde sabem, os acusados não possuem histórico de problemas durante o trabalho. Relataram ainda que ambos responderam a uma sindicância relacionada aos fatos e foram absolvidos. Explicaram que a irregularidade mais comum identificada na fiscalização é a divergência entre a idade dos animais e a informação na GTA. Quando essa discrepância é constatada, pode resultar em multa ou na necessidade de retorno da carga à origem, sendo concedido um prazo para que o motorista providencie a correção da GTA. A testemunha Paulo Mendes Santos Bastos, motorista de caminhão, declarou que passa frequentemente pelo posto da AGED em Timon e sempre tem sua carga averiguada, apresentando a nota fiscal na SEFAZ e a GTA na AGED. Afirmou que nunca lhe foi cobrado qualquer valor para liberar a carga. Relatou ainda que trabalha com transporte de carga viva há mais de 10 anos e nunca ouviu falar que os acusados exigissem dinheiro para liberar mercadorias. Por fim, a testemunha Luciano Farias Ramos, vigilante do posto fiscal, afirmou que nunca presenciou os acusados pedindo ou recebendo dinheiro para liberar cargas. O acusado ALAN CARNEIRO DA SILVA, ao exercer seu direito de defesa, confirmou que estava de plantão no dia 21/10/2018, data em que ocorreu a retenção dos veículos da frigotil. Explicou que, nesse dia, 11 caminhões (gaiolas) transportando gado passaram pelo posto fiscal. Duas gaiolas foram liberadas antes do início de seu plantão, enquanto cinco foram fiscalizadas e liberadas durante o seu turno, pois a documentação estava em conformidade com as normas. No entanto, quatro gaiolas foram retidas devido à inconformidade entre a documentação zoossanitária e a carga transportada. Segundo ele, a Guia de Trânsito Animal (GTA) indicava que os animais eram jovens (garrotes), mas, na verificação, constatou-se que os animais no caminhão eram adultos (bois). Diante dessa irregularidade, foi determinado um prazo de 12 horas para que os motoristas regularizassem a documentação, sendo possível a liberação imediata caso o problema fosse sanado antes desse prazo. Alan explicou que, em situações como essa, o Manual de Atuação do Barreirista prevê três possibilidades: retorno da carga, retorno com multa ou retenção até a regularização da documentação. Optou por seguir a orientação de aplicar a medida menos gravosa, e como os animais seriam abatidos em Timon, considerou mais adequado reter a carga até que a documentação fosse corrigida, em vez de determinar o retorno. Acrescentou que o manual estabelece um prazo máximo de 12 horas para retenção de carga viva ou vegetal e que, caso a documentação não seja regularizada dentro desse período, deve-se aplicar multa e determinar o retorno da carga. No fim do plantão, repassou a documentação ao servidor que assumiu o turno seguinte e afirmou não saber o que aconteceu depois. Negou ter solicitado valores para a liberação dos caminhões e disse não entender os motivos da acusação. Já o acusado REINALDO BARBOSA RIBEIRO em relação à ocorrência de 21/10/2018, explicou que, por volta das 20h, chegou a primeira gaiola da Frigotil, que foi fiscalizada e liberada. Pouco depois, chegaram mais quatro veículos, que também foram liberados após a verificação. No entanto, esses caminhões permaneceram no posto aguardando a chegada dos demais veículos do comboio. Por volta das 22h, chegaram mais quatro caminhões, nos quais foi constatada inconformidade na idade dos animais registrada na GTA em relação à nota fiscal. Como já era noite e não havia risco imediato para a saúde dos animais, decidiu reter os veículos até que a GTA fosse corrigida. Explicou que a fiscalização avalia a estrutura morfológica dos animais, analisando características como tamanho do cupim e dos testículos, para verificar se correspondem às informações contidas na GTA e na nota fiscal. Segundo ele, a irregularidade mais comum ocorre quando a GTA registra animais de maior valor, enquanto a nota fiscal menciona animais de menor valor, o que pode indicar tentativa de pagar menos impostos. Por fim, afirmou que a AGED não possui infraestrutura para manter os animais retidos por longos períodos, razão pela qual a orientação é, sempre que possível, liberar a carga ou, quando necessário, aplicar multa e determinar o retorno dos animais à origem. Como visto na instrução a imputação feita de exigência de pagamento no dia 21/10/2018 para liberação de cargas diversos caminhões as testemunhas relatam não ter maiores informações sobre o caso, pois apenas ouviram dizer que havia sido exigido dinheiro para liberar a carga, entretanto ressaltam que as cargas foram liberadas regularmente, sem necessidade de pagar qualquer valor. Assim a imputação não se demostrou sua ocorrência, ficando apenas na esfera do “ ouvi dizer” Condenar qualquer pessoa nessas circunstâncias, seria temerário, pois a prolação de um decreto condenatório exige a formação de um juízo seguro, inquestionável e insofismável acerca da existência do fato, da sua autoria, bem como dos demais elementos constitutivos do crime (tipicidade formal e material, antijuridicidade e culpabilidade), só alcançável com uma instrução criminal regular e integral. Essa, inclusive, é a diretriz lançada pelo Código de Processo Penal, que veda a prolação de um juízo condenatório tendo por base apenas elementos indiciários. Friso que não se trata de atribuir total validade à versão da ré, mas sim, de não vislumbrar provas cabais de ter a ré a participação no fato. Embora a tese do Ministério Público possa ser a verdadeira, não se pode afastar a possibilidade de também ser crível a versão da ré de que não tenha participação no delito. Entendo que as provas produzidas durante a instrução processual devem tornar-se seguras para autorizar uma condenação, não devendo satisfazer-se o magistrado apenas com indícios ou suposições, como observo no caso em análise. Se os indícios foram suficientes para o oferecimento da denúncia, o mesmo não se diz pela condenação, que deve ser segura e sem dúvidas. E como se sabe, a dúvida deve militar em prol dos acusados. É certo que o Estado deseja a paz social; todavia, para impor-se, é mister que o faça segundo as normas que ele mesmo editou. Diante do contexto, não vejo provas que dêem a este magistrado a certeza necessária de que o acusado praticou o delito se lhe imputado. E nesses casos, é sempre bom lembrar que melhor atende aos interesses da justiça absolver um suposto culpado do que condenar um inocente, impondo-se a aplicação do velho brocardo “in dúbio pro reo”. Magalhães Noronha leciona que: "[...] Do ônus da prova. A prova da alegação incumbe a quem a fizer, é o princípio dominante em nosso Código. Oferecida a denúncia cabe ao Ministério Público a prova do fato e da autoria; compete-lhe documentar a existência concreta do tipo ("nullum crimem sine typo") e de sua realização pelo acusado. [...] Este também tem a seu cargo o onus probandi. [...]. Vê-se, pois, que o ônus da prova cabe às partes. Há uma diferença, porém. A da acusação há de ser plena e convincente, ao passo que, para o acusado, basta a dúvida."[...]" [in Curso de Direito Processual Penal, 6ª ed. São Paulo: 1973, p.88-89]. Assim, a partir da análise destes elementos de convicção, resta evidente que não há prova suficiente para afirmar com certeza e de modo inequívoco que os acusados dia 21/10/2018 solicitaram vantagem indevida para liberar as cargas retidas. 3.DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES EM PARTE as acusações contidas na denúncia para o fim de: CONDENAR REINALDO BARBOSA RIBEIRO, brasileiro; casado, técnico de fiscalização agropecuária, CPF 971.292.593-53, filho de Manoel Barbosa Ribeiro e Maria Neusa da Silva Ribeiro, residente na Rua Malta, nº 5581, Loteamento porto Alegre, Teresina -Pi, pela prática do crime previsto nos artigos 317, § 1º, do Código Penal. ABSOLVER ALAN CARNEIRO DA SILVA, brasileira, natural de Teresina/Pl, nascida em 29/08/1 ALAN CARNEIRO DA SILVA brasileiro; casado, técnico de fiscalização agropecuária, RG 2919354-0/SSP/MA, CPF 811.543.803-00, filho de Feitosa da Silva e Farida Araujo Carneiro, residente na Rua 13, nº1715, Timon/MA pela prática dos crimes previstos no art.317, § 1º , do Código Penal. Por consequência, e em observância ao sistema trifásico consagrado no art. 68 do Código Penal, passo à dosimetria da pena, individualizando-a inclusive (art. 5º, XLV e XLVI, da Constituição Federal). 4.DOSIMETRIA E REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA Para fixação da pena base, levando em consideração as diretrizes do artigo 59, do Código Penal. a) Quanto à culpabilidade, não há elementos que justifiquem sua valoração de forma negativa, vez que não transborda da normalidade; b) Quanto aos antecedentes criminais, nada a se valorar, vez que segundo certidão de antecedentes Id 69232953 não foi identifica condenação criminal anterior com trânsito em julgado; c) Quanto à sua conduta social, nada a se valorar; d) Quanto à personalidade do agente: não há nos autos elementos para qualificá-la; e) Quanto aos motivos, também não há elementos que mereçam valoração; f) Quanto às circunstâncias do crime, nada a se valorar; g) Quanto às consequências do crime, nada a se valorar Considerando as circunstâncias judiciais acima analisadas, fixo a PENA BASE em 02 (dois) anos de RECLUSÃO e MULTA de 10 (dez) dias-multa. Não há atenuante ou agravante, assim fica a pena intermediária estabelecida em 2 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Presenta a causa de aumento do § 1º, do art.317, pelo que majoro a pena em 1/3 (um terço), alçando-a ao patamar de 2 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Não há causas de diminuição de pena. Fixo, portanto, a PENA DEFINITIVA em 2 (dois) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa. O valor do dia-multa será calculado na base de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, atento à situação econômica do réu, devendo ser recolhida dentro de 10 (dez) dias do trânsito em julgado desta sentença, sendo facultado ao réu, mediante requerimento, o pagamento em parcelas mensais, nos termos previstos no art. 50 do Código Penal, sob pena de, por inadimplemento, ser considerada dívida de valor, deverá ser pago metade, ao Fundo Penitenciário e a outra metade, ao Fundo de Modernização e Reaparelhamento do Judiciário – FERJ, nos termos do art. 3º, XXVI, da Lei Complementar nº 48/2000, modificada pela Lei Complementar 124/2009. Não há prazo a ser detraído. Como é cediço, o benefício da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos reclama, para sua concessão, a presença cumulativa dos requisitos constantes do art. 44, do Código Penal, quais sejam: I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Com efeito, considerando circunstâncias judiciais analisadas, PROCEDO À SUBSTITUIÇÃO da pena aplicada por uma pena restritiva de direito, a saber, i) PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE, a ser cumprida pelo mesmo período de tempo fixado para a pena privativa de liberdade ainda a ser cumprida, em local e condições a serem fixadas em audiência admonitória específica da execução penal II) prestação pecuniária equivalente a 02 (dois) salários mínimos a serem destinados a entidade indicada pelo juízo de execução. Considerando o quantum de pena aplicado, em caso de revogação da substituição, deverá o acusado iniciar o cumprimento da pena em regime ABERTO, na forma do art. 33, §2º, alínea c, do Código Penal. Deixo para o juízo da execução a estabelecimento do local e condições do cumprimento da pena. 5. CONSIDERAÇÕES GERAIS Considerando que a atual sistemática processual extirpou de nosso ordenamento jurídico a prisão automática decorrente de sentença penal condenatória recorrível, há que se frisar, neste momento, a permanência ou não dos requisitos previstos nos artigos 312 e 313, do Código de Processo Penal e que autorizam a prisão preventiva do acusado. Nesta perspectiva, verifico que o réu respondeu ao processo em liberdade sem notícias de que tenham tentado causar embaraços ao regular tramite processual e não vislumbrando os requisitos legais deixo de decretar a prisão preventiva e garanto aos acusados a possibilidade de aguardar julgamento de eventual recurso em liberdade. Condeno o acusado ao pagamento das custas judiciais. Considerando a inexistência de pedido expresso e em atenção ao princípio do contraditório, deixo de fixar valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, ex vi do quanto disposto no art. 387, IV, do Código de Processo Penal5. 6. DISPOSIÇÕES FINAIS Oportunamente, após o trânsito em julgado desta sentença, tomem-se as seguintes providências: expeça-se GUIA DE RECOLHIMENTO DEFINITIVA à Vara de Execução Penal competente; em caso de condenação em custas, calcule-se o valor das custas judiciais e intime(m)-se o(s) condenado(s) para o pagamento, no prazo de 10 (dez) dias; Expeça-se a carta de execução dos réus; Oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral deste Estado, comunicando a condenação do réu, com sua devida identificação, acompanhada de fotocópia da presente decisão, para cumprimento do quanto disposto nos arts. 71, § 2º, do Código Eleitoral c/c 15, III, da Constituição Federal. Oficie-se ao órgão responsável pelo registro de antecedentes, fornecendo informações sobre a condenação do réu; Determino, ainda, a incineração de eventuais drogas e objetos ilícitos apreendidos relativos ao presente caso. Notifique-se o Ministério Público (art. 390, CPP). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpridas tais diligências, arquivem-se os autos, com baixa na distribuição. Timon/MA, data do sistema. CLÊNIO LIMA CORRÊA Juiz Titular da 2ª Vara Criminal Comarca de Timon/MA Timon, data do sistema.
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear