Processo nº 5005304-29.2024.8.13.0352
ID: 274957078
Tribunal: TJMG
Órgão: Unidade Jurisdicional da Comarca de Januária
Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Nº Processo: 5005304-29.2024.8.13.0352
Data de Disponibilização:
21/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS HENRIQUE VIEIRA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Januária / Unidade Jurisdicional da Comarca de Januária Praça Arthur Bernardes, 208, Fórum Doutor Aureliano Porto G…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Januária / Unidade Jurisdicional da Comarca de Januária Praça Arthur Bernardes, 208, Fórum Doutor Aureliano Porto Gonçalves, Centro, Januária - MG - CEP: 39480-000 PROCESSO Nº: 5005304-29.2024.8.13.0352 CLASSE: [CÍVEL] PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA (14695) ASSUNTO: [Sistema Remuneratório e Benefícios, Piso Salarial, Admissão / Permanência / Despedida] AUTOR: CRISTINA SANTANA MARINHO CPF: 031.168.846-25 RÉU: ESTADO DE MINAS GERAIS CPF: 18.715.615/0001-60 SENTENÇA Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.099/95, eis o resumo dos principais fatos relativos ao processo: I - BREVE RESUMO DOS FATOS CRISTINA SANTANA MARINHO promoveu ação de cobrança em face do ESTADO DE MINAS GERAIS. Relata, em síntese, que é servidora pública do Estado de Minas Gerais, detentora do cargo de magistério, tendo seu regime jurídico-administrativo disciplinado pelo Estatuto do Pessoal do Magistério Público do Estado de Minas Gerais, contido na Lei Estadual nº 7.109/1977. Contudo, afirma que, apesar do vínculo jurídico-administrativo precário, adquiriu diversos direitos decorrentes das suas atividades laborais, não alcançado pela prescrição quinquenal, requerendo: a) o recebimento do FGTS, a incidir sobre sua remuneração; b) a declaração do direito de receber como vencimento básico o piso salarial nacional conforme seu nível de escolaridade, nos termos da Lei 11.738/2008; c) a restituição do desconto previdenciário sobre do rateio do FUNDEB; d) o terço constitucional de férias sobre 60 (sessenta) dias. O Estado de Minas Gerais apresentou contestação ao ID 10253756852, alegando, preliminarmente, ilegitimidade passiva, incompetência absoluta, inépcia da inicial, impugnação à justiça gratuita e Grupo Representativo 22 do TJMG. No mérito, requereu a improcedência a demanda. Impugnação à contestação no ID 10265613693. É o necessário. Decido. II- FUNDAMENTAÇÃO A causa comporta o julgamento antecipado, nos moldes do art. 355, I, do CPC, notadamente porque a matéria controvertida é essencialmente de direito e as questões de fato encontram-se esclarecidas pelos documentos já acostados aos autos. II.1. Das preliminares A) Da suspensão do processo em razão do Grupo de Representativos 22 – TJMG A presente demanda não se amolda à controvérsia assentada no Grupo de Representativos nº 22, que trata sobre a possibilidade de aplicação conjunta dos Temas nos 551 (RE nº 1.066.677/MG) e 916 (RE nº 765.320/MG), uma vez que versa apenas sobre o Direito ao FGTS, em razão de contratação nula de pleno direito, realizada em desconformidade com o art. 37, IX, da Constituição da República, caso de evidente aplicação direta do Tema n º 916 (RE nº 765.320/MG). Sendo assim, rejeito a preliminar suscitada. B) Da ilegitimidade do Estado de Minas Gerais - Desconto previdenciário FUNDEB A discussão cinge-se em torno do direito ou não da parte autora ao recebimento da restituição dos valores descontados a título de contribuição previdenciária do INSS sobre a parcela referente ao rateio FUNDEB. No caso dos autos, verifico que os valores descontados do FUNDEB ocorreram a título de contribuição previdenciária realizada pelo instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal, parte da administração direta da União. É cediço na doutrina e jurisprudência que as autarquias são detentoras de personalidade jurídica e de patrimônio próprio, possuindo legitimidade para responderem passivamente nas ações em que são demandadas. Desse modo, o Estado de Minas Gerais não possui competência para atender ao pedido de restituição dos valores. Logo, mostra-se evidente a ilegitimidade da parte ré, devendo o INSS responder pelo pedido da autora. Ressalto, neste ponto, que embora o ente estadual seja responsável tributário por efetuar os descontos previdenciários sobre o contracheque da parte autora, tal valor é repassado para os cofres da União, ao Instituto Nacional do Seguro Social. Ademais, nos termos do art. 109, I, da Constituição da República compete aos juízes federais processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. Ante ao exposto, reconheço a ilegitimidade passiva do Estado de Minas Gerais em face do pedido de repetição de indébito tributário. C) Da inépcia da inicial O réu sustenta que os pedidos da parte autora são incompatíveis e que a petição inicial deverá ser indeferida por inépcia. Tenho que tal alegação não merece prosperar. Isso, pois a descrição dos fatos e delimitação do objeto se deu de forma clara e precisa, não sendo imprescindível que subsista vastos elementos probatórios quando da distribuição da ação, o que será melhor apreciado na análise do mérito da demanda. Logo, suposta ausência de provas não caracteriza elemento de acolhimento da preliminar levantada. Ademais, a narração dos fatos e sua causa de pedir leva a conclusão lógica dos pedidos, não pairando dúvidas acerca da pretensão autoral. É o que basta para rejeitar a preliminar. D) Da impugnação à justiça gratuita A preliminar de impugnação ao pedido de gratuidade de justiça não merece acolhimento, especialmente considerando que o processo tramita no âmbito dos Juizados Especiais, regidos pela Lei nº 9.099/1995, que, em seu art. 54, dispõe que não há cobrança de custas e honorários advocatícios nas ações em primeiro grau de jurisdição, salvo em caso de litigância de má-fé. Registre-se que o preenchimento dos requisitos para concessão da gratuidade de justiça será analisada pela Turma Recursal, em caso de eventual interposição de recurso. Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida. II.2. Do mérito II.2.1 – Do direito ao recebimento de FGTS A escolha do Poder Executivo pela contratação temporária prescinde de concurso público, quando em casos indicados pela lei. Para tanto, estabelece o art. 37, inciso IX, da Constituição Federal: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público; (Vide Emenda constitucional nº 106, de 2020). Não obstante, a contratação por tempo determinado, segundo as diretrizes traçadas pelo texto constitucional, deve ser regida por regime jurídico próprio, por confecção de cada ente federativo. No Estado de Minas Gerais, a Lei n. 18.185/2019 dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional de interesse público. Ocorre que a aludida lei foi objeto de uma ação direta de inconstitucionalidade de n. 1.0000.16.074933-9/000, onde foi questionado a constitucionalidade os art. 2°, incisos IV, V, VI, alíneas a, b, c, d e §1º, art. 4º, incisos III, IV e §1º, III e IV. Na referida ação direta de inconstitucionalidade, o Tribunal Mineiro entendeu que as hipóteses previstas no art. 2º, incisos IV, V, VI e alíneas a, b, c, d e §1º, da Lei Estadual nº 18.185/09 são genéricas e ordinárias da Administração Pública e não se coadunam com os princípios constitucionais da acessibilidade e do concurso público, uma vez que não especificam objetivamente a contingência que evidencia a situação de urgência. Assim, ficou reconhecida a inconstitucionalidade do art. 2º, incisos IV, V, VI, alíneas a, b, c, d e §1º, a declaração deve se estender também ao art. 4º, incisos III, IV e §1º, III e IV, todos da Lei Estadual n. 18.185/09. E, para evitar danos a ordem jurídica, houve modulação dos efeitos, conferindo eficácia prospectiva da decisão da ADI, de modo a convalidar os contratos celebrados até 26 de abril de 2017, pelo prazo máximo de 250 (duzentos e cinquenta) dias, ou seja, 31 de dezembro de 2017. Os contratos celebrados pela parte autora com o Réu não se alinha aos termos da modulação temporal concedida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, pois houve diversas renovações contratuais contrárias à Lei Estadual n. 18.185/09. Veja-se: Lei Estadual n. 18.185/09 Art. 2° Consideram-se hipóteses de necessidade temporária de excepcional interesse público, para fins de contratação temporária nos termos desta Lei: [...] IV - carência de pessoal em decorrência de afastamento ou licença de servidores ocupantes de cargos efetivos, quando o serviço público não puder ser desempenhado a contento com o quadro remanescente, ficando a duração do contrato administrativo limitada ao período da licença ou do afastamento; V - número de servidores efetivos insuficiente para a continuidade dos serviços públicos essenciais, desde que não haja candidatos aprovados em concurso público aptos à nomeação, ficando a duração dos contratos limitada ao provimento dos cargos mediante concurso público subsequente; e Art. 4° As contratações de que trata esta Lei serão feitas com a observância dos seguintes prazos máximos: III - dois anos, nos casos do inciso IV, na área de saúde, do inciso V, na área de educação, e do inciso VI do caput do art. 2º; (Redação dada pela Lei nº 22257/2016). § 1º É admitida a prorrogação dos contratos: III - no caso do inciso V do caput do art. 2º, por até um ano na área de educação, por até cinco anos na área de defesa social e por até três anos nas áreas de segurança pública, vigilância, meio ambiente e saúde; (Redação dada pela Lei nº 22257/2016). Segundo consta, a autora foi contratada para prestar serviços de Professora de Educação Básica, havendo diversos contratos entre o período de 2013 a 2024 (cargo 3 – ID 10249986854) e 2016 a 2024 (cargo 4 – ID 10249993001). Assim, vislumbra-se que houve renovação irregular do contrato de prestação de serviço pactuado entre a parte autora e o Estado de Minas Gerais e, como consequência, deve ser declarada a nulidade. Dessa forma, considerando que houve, sem a prévia realização de concurso público, sucessivas contratações precárias, as quais, em conjunto, perduraram, por prazo superior ao legalmente permitido, quanto aos cargos 3 e 4, o que demonstra que a necessidade da Administração Pública não é temporária, mas permanente. Nesse cenário, ante o descompasso com o ordenamento jurídico, não há dúvidas quanto à nulidade dos negócios jurídicos celebrados entre as partes, o que atrai a incidência do art. 19-A da Lei 8.036/1990, assim redigido: Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001) Parágrafo único. O saldo existente em conta vinculada, oriundo de contrato declarado nulo até 28 de julho de 2001, nas condições do caput, que não tenha sido levantado até essa data, será liberado ao trabalhador a partir do mês de agosto de 2002. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.164-41, de 2001). É o que, sobre o tema, decidiu o Supremo Tribunal Federal, em precedentes vinculantes (art. 988, § 5º, inciso II, Código de Processo Civil): APELAÇÃO CÍVEL - SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL - FHEMIG - SUSPENSÃO NACIONAL DE PROCESSOS - INAPLICABILDIADE - STF-ADI 5090 - PRELIMINAR - CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA IRREGULAR - CONTRATO TEMPORÁRIO - IRREGULARIDADE - RENOVAÇÕES SUCESSIVAS - NULIDADE - STF - RE 765.320. - A suspensão nacional de processos determinada pelo STF na ADI nº 5.090, que se refere à remuneração de valores já depositados nas contas dos trabalhadores vinculadas ao FGTS - tratada nos art. 13 da Lei nº 8.036/90 e no art. 17 da Lei nº 8.177/91, normas objeto da ADI nº 5.090 - não se aplica às ações de cobrança de débito atribuído à Fazenda Pública em virtude da nulidade de contrato administrativo, que possui regramento próprio para fins de atualização monetária, a Lei nº 11.960/09, com a interpretação dada pelo STF no RE nº 870.947/SE.- No âmbito estadual e municipal, diferentes leis regulamentam a relação contratual, o regime jurídico e os seus regramentos. No Estado de Minas Gerais, está em vigor a Lei Estadual nº 18.185/09, que dispõe sobre a contratação por prazo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. - O acesso a cargo ou emprego público, de acordo com os requisitos da lei, será mediante concurso, sempre observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade. - É nula a contratação temporária sucessivamente prorrogada ou efetivada sem a devida observância das hipóteses legais previstas na legislação de regência. - O Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário (RE) 765320, em Repercussão Geral reconhecida, reafirmou jurisprudência no sentido de que, nos casos de contratos irregulares, no regime administrativo, sem concurso, gera, como efeitos jurídicos, o pagamento do FGTS. (TJMG - Apelação Cível 1.0056.13.017674-8/001, Relator(a): Des.(a) Renato Dresch , 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 16/12/2021, publicação da súmula em 17/12/2021). APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - AÇÃO ORDINÁRIA - CONTRATO TEMPORÁRIO PARA ATENDER A NECESSIDADE DE EXCEPCIONAL INTERESSE PÚBLICO - TESES FIRMADAS NO RE 765.320/MG E NO RE 1.066.677/MG - CONTRATAÇÃO IRREGULAR - DIREITO APENAS AO SALDO DE SALÁRIO, ÀS FÉRIAS, AO TERÇO CONSTITUCIONAL, AO DÉCIMO TERCEIRO E AO FGTS - ILEGITIMIDADE DO VÍNCULO RECONHECIDA - SALDO DE SALÁRIO E FGTS NÃO REQUERIDOS - DÉCIMO TERCEIRO E FÉRIAS QUITADOS - TERÇO DE FÉRIAS DEVIDO APENAS EM PARTE DO PERÍODO, À VISTA DA AUSÊNCIA DE SUA QUITAÇÃO - HORAS EXTRAS, GRATIFICAÇÃO COMPLEMENTAR, ADICIONAL DE INSALUBRIDADADE E QUINQUÊNIO - DESCABIMENTO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA 1. O Supremo Tribunal Federal reconheceu, no RE 765.320/MG, que a contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público realizada em desconformidade com os preceitos do art. 37, IX da Constituição da República não gera quaisquer efeitos jurídicos válidos, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. 2. Posteriormente, ao julgar o RE 1.066.677/MG (Tema n. 551), à luz do caput e do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, para definir a possibilidade, ou não, de extensão de direitos dos servidores públicos efetivos aos servidores e empregados públicos contratados para atender necessidade temporária e excepcional do setor público, a mesma Corte Suprema firmou a seguinte tese de repercussão geral: "Servidores temporários não fazem jus a décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, salvo (I) expressa previsão legal e/ou contratual em sentido contrário, ou (II) comprovado desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações". 3. Verificada a irregularidade dos contratos firmados entre os autores e a Administração Pública, cabível, apenas, o pagamento de férias, terço de férias, décimo terceiro, saldo de salário e FGTS, estes dois últimos sequer requeridos. 4. Comprovado que as férias foram gozadas e devidamente remuneradas no período imprescrito, os ex-servidores não têm direito a ser novamente indenizados, sob pena de locupletamento ilícito. 5. O pagamento pela fundação ré, a cada 6 meses de contrato temporário, de acréscimo de 50% da remuneração, equivale à quitação de 13º salário nos anos de 2007 a 2009. Parcela que passou a ser paga sob essa rubrica a partir de 2010. 6. Denotando-se, das folhas de ponto e dos contracheques carreados aos autos, não ter havido apenas o pagamento do 1/3 (terço) de férias nos anos de 2007 a 2009, somente a estes valores fazem jus os autores. 7. O art. 39, § 1º, inciso II, do Texto Constitucional ressalta a necessidade de que sejam observados, para fins remuneratórios, os requisitos para investidura no cargo, os quais são nitidamente distintos em relação a servidores efetivos e aqueles contratados temporariamente. Impossibilidade de equiparação salarial entre servidores efetivos e contratados temporários com fundamento no princípio da isonomia, ainda que exerçam a mesma função. Inteligência da Súmula n. 339 do STF. 8. Descabimento das demais parcelas devidas, por sua própria natureza, apenas aos servidores estatutários com vínculo efetivo. 9. Recurso provido em parte. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.12.129345-0/002, Relator(a): Des.(a) Áurea Brasil , 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 02/12/2021, publicação da súmula em 07/12/2021). Diante dos fundamentos acima expostos, concluo que parte a autora tem direito ao recebimento do FGTS. Cumpre ressaltar que a fixação dos valores será realizada em sede de cumprimento de sentença, momento oportuno para que sejam efetivados os cálculos sob a égide do contraditório e da ampla defesa. Além disso, deve-se respeitar o prazo prescricional quinquenal aplicável às pretensões contra a Fazenda Pública, na forma do art. 1º, do Decreto nº 20.910/32. II.2.2 – Do piso salarial O cerne do litígio perpassa por aferir o direito da autora, professora da rede pública estadual contratada, aos reajustes relativos ao piso nacional da educação. Da análise dos documentos juntados aos autos, verifico que a parte autora laborou para o ente requerido por meio de contratações temporárias sucessivas no cargo de professora de educação básica (convocada/designada). Nesse cenário, tendo em vista se tratar de servidora designada via contrato temporário e não de servidora efetiva, esta não se enquadra aos termos da Lei n.º 15.293/2004 e, consequentemente, às disposições da Lei Estadual n.º 21.710/2015, bem como da Lei Federal n.º 11.738/2008. É o que se extrai, a propósito, da interpretação conjunta das leis mencionadas: Art. 1º Ficam instituídas, na forma desta lei, as seguintes carreiras dos Profissionais de Educação Básica, que integram o Grupo de Atividades de Educação Básica do Poder Executivo: I - Professor de Educação Básica - PEB; II - Especialista em Educação Básica - EEB; III - Analista de Educação Básica - AEB; IV - Assistente Técnico Educacional - ATE; V - Assistente Técnico Educacional - ATE; VI - Analista Educacional - ANE; VII - Assistente de Educação - ASE; VIII - Auxiliar de Serviços de Educação Básica - ASB. Parágrafo único - A estrutura das carreiras instituídas no "caput" deste artigo e o número de cargos de cada uma delas são os constantes no Anexo I. Art. 2º Para os efeitos desta lei considera-se: I - grupo de atividades o conjunto de carreiras agrupadas segundo sua área de atuação; II - carreira o conjunto de cargos de provimento efetivo agrupados segundo sua natureza e complexidade e estruturados em níveis e graus, escalonados em função do grau de responsabilidade e das atribuições da carreira; III - cargo de provimento efetivo a unidade de ocupação funcional do quadro de pessoal privativa de servidor público efetivo, com criação, remuneração, quantitativo, atribuições e responsabilidades definidos em lei e direitos e deveres de natureza estatutária estabelecidos em lei complementar; IV - quadro de pessoal o conjunto de cargos de provimento efetivo e de provimento em comissão de órgão ou de entidade; V - nível a posição do servidor no escalonamento vertical dentro da mesma carreira, contendo cargos escalonados em graus, com os mesmos requisitos de capacitação e mesma natureza, complexidade, atribuições e responsabilidades; VI - grau a posição do servidor no escalonamento horizontal no mesmo nível de determinada carreira; VII - unidade escolar a escola de educação básica, o conservatório de música, o centro estadual de educação continuada ou o centro de educação profissional de órgão ou de entidade a que se refere o art. 5º desta lei. (grifo nosso). Lei Estadual n.º 21.710/2015 Art. 3º Os valores do vencimento das carreiras do Grupo de Atividades de Educação Básica do Poder Executivo, de que trata a Lei nº 15.293, de 2004, e do Abono Incorporável de que trata o art. 8º serão reajustados por lei específica, em decorrência de atualizações do valor do piso salarial profissional nacional dos profissionais do magistério público da educação básica de que trata a Lei Federal nº 11.738, de 2008. Parágrafo único. Os reajustes de que trata o caput se darão na mesma periodicidade prevista na lei federal a que se refere o caput. Dessa feita, a Lei nº 22.062/2016, a qual alterou a Lei nº 21.710/2015, e que dispõe sobre a política remuneratória das carreiras do Grupo de Atividades de Educação Básica do Poder Executivo, em que pese tenha ignorado o reajuste anual remuneratório de 7,64%, anunciado pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), em sua Portaria n.º 31/2017, a partir de janeiro de 2017, não atinge a parte autora, haja vista que esta não figura como servidora efetivada da área da educação, conforme anteriormente frisado. Do mesmo modo, a parte demandante não se encontra agasalhada pelas Portarias Interministeriais do MEC n.º 08/2017 e n.º 06/2018, as quais previram, respectivamente, o reajuste de 6,84% e 4,17% nos vencimentos básicos e abonos pagos aos servidores efetivos da área da educação. Cabe ressaltar, ainda, que o reajuste nos vencimentos base e abonos pagos aos servidores da área de educação do Estado de Minas Gerais somente podem ser fixados através de lei específica do ente competente, conforme dicção expressa do artigo 3º da Lei Estadual n.º 21.710/2015, supracitada, e não mediante Portaria Interministerial do MEC, a qual não tem natureza de “lei formal em sentido estrito”. Desse modo, não há falar em declaração do suposto direito autoral de recebimento, como vencimento básico, do piso salarial nacional, conforme seu nível de escolaridade, nos termos da Lei n.º 11.738/2008, de modo que a improcedência do pedido, neste ponto, é medida que se impõe. II.2.3 - Do pedido de complementação do terço de férias Com relação ao terço de férias é imperioso salientar que o artigo 39, parágrafo 3º, da Constituição Federal de 1988, estendeu ao servidor público o direito ao "gozo de férias constituinte anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal" (art. 7º, XVII, da CF). Em se tratando de servidor público do Estado de Minas Gerais, sobre a matéria assim preceitua o art. 1º do Decreto nº 29.230/89, in verbis: Art. 1º - A vantagem de 1/3 (um terço) sobre a remuneração, de que trata o inciso XVII, do artigo 7º, da Constituição Federal, devida ao servidor público estadual, será paga no mês de início do gozo das férias anuais com base na remuneração vigente à época. A parte autora fundamenta seu pedido no art. 129 da Lei nº 7.109, de 1977, in verbis: Art. 129 - O ocupante de cargo do magistério gozará de férias anualmente: I - quando em exercício nas escolas, 60 (sessenta) dias, coincidentes com as férias escolares, sendo 30 (trinta) consecutivos e 30 (trinta) segundo o que dispuser o órgão próprio do Sistema; II - quando em exercício nos demais órgãos do Sistema, 25 (vinte e cinco) dias úteis, observada a escala organizada de acordo com a conveniência do serviço. Parágrafo único - Não é permitido acumular férias ou levar à sua conta qualquer falta ao trabalho. Verifico que, no caso em exame, a autora juntou aos autos contracheques (ID 10250009841) e histórico funcional (ID 10249986854/ 10249993001), como prova de vínculo com o ente réu, decorrente de Admissões como Professora de Educação Básica, figurando, contudo, como designada/ convocada. Ou seja, a parte autora não é servidora efetiva do ente réu. Nesse contexto, cumpre ressaltar que a Lei nº 7.109/77 aplica-se a ocupantes de cargo efetivo, nomeados para o cargo após a realização de concurso público, o que não ocorre em relação à parte autora. Portanto, não se aplica ao presente caso a Lei nº 7.109/77, porquanto a autora se subordina a um regime administrativo especial, que não se confunde com o regime estatutário. Além disso, conforme se verifica na Resolução nº 4.494, de 06 de fevereiro de 2021, da Secretaria de Estado da Educação, há somente 30 (trinta) dias de férias escolares, sendo considerado recesso a pausa no meio do ano letivo, ou seja, são 30 (trinta) dias de férias e 30 (trinta) dias de recesso, diluídos durante o ano, segundo o Calendário Escolar. Vejamos: Art. 3º - O Calendário Escolar traz as seguintes datas e programações, distribuídas ao longo das 40 semanas letivas para organização anual e das 20 semanas letivas para a organização semestral: I - Férias escolares: 01 de fevereiro a 02 de março. II - Início do ano escolar e letivo: a. Início do ano escolar: 03 de março; b. Início do ano/1º semestre letivo: 08 de março; c. Início do 2º semestre letivo: 03 de agosto. III - Dias destinados ao planejamento, reuniões e formação continuada dos profissionais das escolas. a. 03, 04 e 05 de março; b. 21 e 22 de dezembro. IV - Dias destinados aos estudos independentes de recuperação com os estudantes. a. 17 de julho para as turmas com organização semestral; b. 20 de dezembro para as turmas com organização semestral e anual. V - Término do ano escolar e letivo: a. Término do 1º semestre letivo: 16 de julho; b. Término do ano/2º semestre letivo: 17 de dezembro; c. Término do ano escolar: 22 de dezembro. VI - recessos escolares comuns: a. 01 de abril; b. 19 a 31 de julho e 01 a 02 de agosto; c. 06 de setembro; d. 11, 13, 14 e 15 de outubro; e. 01 de novembro; f. 23 a 31 de dezembro; (...) (destaquei) Sobre o tema, colaciono precedente do egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais: EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA - NÃO CONHECIMENTO - APELAÇÃO CÍVEL - SERVIDORA EFETIVADA PELA LC Nº 100/2007 - MAGISTÉRIO - REGIME JURÍDICO ESTATUTÁRIO - TERÇO CONSTITUCIONAL - DIREITO RECONHECIDO PELO ART. 39°, §3°, DA CR/88 - PAGAMENTO DO ADICIONAL DE FÉRIAS AO RECESSO ESCOLAR - LEI ESTADUAL N. 7.109/1977 - INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA - IMPOSSIBILIDADE - PROVIMENTO DO RECURSO. - O fato da autora ter sido contratada pelo Estado de Minas Gerais, em caráter temporário, no período anterior à edição da LC nº 100/07, não transmuda a natureza do vínculo estabelecido durante a vigência de referida norma, na qual estabelecida relação jurídica de natureza administrativa, estatutária, vinculados os servidores como se efetivos fossem, incluídos direitos e deveres correspondentes.- Apesar da previsão constante do art. 39, §3°, da CR/88, não há que se falar em incidência do terço constitucional de férias no lapso temporal correspondente ao recesso escolar, tendo em conta corresponder à prerrogativa da própria Administração Pública, e não ao direito subjetivo de férias do professor estadual.- Recurso provido. (TJMG - Ap Cível/Rem Necessária 1.0313.15.014210-4/001, Relator(a): Des.(a) Carlos Levenhagen , 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/05/2018, publicação da súmula em 15/05/2018). (grifei) Nesse sentido, os recessos não podem ser confundidos com as férias propriamente ditas, de 30 (trinta) dias consecutivos, sobre as quais recairá o terço constitucional ora requerido. Pelos fundamentos acima expostos, o pleito autoral, neste ponto, deve ser julgado improcedente. III- DISPOSITIVO Ante exposto: a) JULGO PROCEDENTE o pedido para: a.1) RECONHECER o direito da autora à percepção do FGTS, cargos 3 e 4; a.2) CONDENAR o Estado de Minas Gerais a pagar à autora os valores referentes ao Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço no período não prescrito em que laboraram por meio de contratos sucessivos. A importância do FGTS, nos termos da Lei 8.036/90, corresponde a 8% (oito por cento) da remuneração paga à parte autora, nos termos da fundamentação retro. Sobre tais valores, advindos das diferenças a serem pagos à autora, deverão incidir o IPCA-E, a título de correção monetária, desde a data de não pagamento de cada parcela até a data da citação. A partir da citação, deverá ser aplicada a taxa SELIC, englobando os juros de mora e correção monetária, nos termos da Emenda Constitucional nº 113/2021. b) JULGO IMPROCEDENTE os pedidos de pagamento do complemento do terço constitucional de férias e do piso salarial. Por conseguinte, extingo o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. c) Quanto ao pedido de restituição do desconto previdenciário sobre o rateio do FUNDEB pago em 2021, JULGO EXTINTO processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC, em virtude da ilegitimidade passiva do Estado de Minas Gerais. Não há condenação em custas processuais e honorários advocatícios, nos termos do art. 55, da Lei 9099/95. Dispensado o reexame necessário (artigo 11, da Lei nº 12.153/09). Havendo recurso tempestivamente aviado, ouça-se a parte contrária e, em seguida, remetam-se os autos à Turma Recursal. Transitada em julgado, arquive-se, com baixa. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Januária, data da assinatura eletrônica. LAURA HELENA XAVIER FERREIRA Juiz(íza) de Direito Unidade Jurisdicional da Comarca de Januária
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